
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5012857-48.2020.4.03.6183
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOSE LOPES DA ROCHA
Advogado do(a) APELADO: SANDRA MARIA LACERDA RODRIGUES - SP163670-A
OUTROS PARTICIPANTES:
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5012857-48.2020.4.03.6183
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOSE LOPES DA ROCHA
Advogado do(a) APELADO: SANDRA MARIA LACERDA RODRIGUES - SP163670-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de embargos de declaração interpostos pela parte autora em face do acórdão proferido por esta Nona Turma que rejeitou a matéria preliminar e deu parcial provimento à apelação do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).
A parte embargante sustenta a ocorrência de vícios no julgado e pleiteia o reconhecimento do cerceamento ao direito de defesa, com o retorno dos autos ao juízo de origem para a realização de perícia técnica para a comprovação da especialidade pretendida.
Assim, requer nova manifestação e novo julgamento, inclusive para prequestionamento.
Contrarrazões não apresentadas.
É o relatório.
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5012857-48.2020.4.03.6183
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOSE LOPES DA ROCHA
Advogado do(a) APELADO: SANDRA MARIA LACERDA RODRIGUES - SP163670-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Conheço dos embargos de declaração, em virtude da sua tempestividade.
O artigo 1.022 do Código de Processo Civil (CPC) admite embargos de declaração quando, na sentença ou no acórdão, houver obscuridade, contradição ou omissão de ponto sobre o qual devia pronunciar-se o juiz ou o tribunal. Também admite embargos de declaração para correção de erro material, em seu inciso III.
Segundo Cândido Rangel Dinamarco, obscuridade é "a falta de clareza em um raciocínio, em um fundamento ou em uma conclusão constante da sentença"; contradição é "a colisão de dois pensamentos que se repelem"; e omissão é "a falta de exame de algum fundamento da demanda ou da defesa, ou de alguma prova, ou de algum pedido etc." (Instituições de Direito Processual Civil. V. III. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 685/686).
O acórdão embargado, porém, não padece de omissão, contradição ou obscuridade, por terem sido analisadas todas as questões jurídicas necessárias ao julgamento.
Evoca-se, aqui, a ainda pertinente lição do processualista Theotonio Negrão de que o órgão julgador não está obrigado a responder: (i) questionários sobre meros pontos de fato; (ii) questionários sobre matéria de direito federal exaustivamente discutida no acórdão recorrido; (iii) à consulta do embargante quanto à interpretação de dispositivos legais (nota 2ª ao art. 535, Código de Processo Civil e Legislação Processual em Vigor, Saraiva, 2003).
Na mesma diretriz está a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ):
"O julgador não está obrigado a responder a todas as questões suscitadas pelas partes, quando já tenha encontrado motivo suficiente para proferir a decisão. A prescrição trazida pelo art. 489 do CPC/2015 veio confirmar a jurisprudência já sedimentada pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça, sendo dever do julgador apenas enfrentar as questões capazes de infirmar a conclusão adotada na decisão recorrida." (STJ, EDcl no MS n. 21315/DF, S1 - DJe 15/06/2016)
Dessa forma, não assiste razão à parte autora.
Quanto ao pedido de retorno dos autos para produção de prova pericial em relação ao período não reconhecido como especial, cabia ao embargante, nos termos do artigo 373, I, do CPC, os ônus de comprovar a veracidade dos fatos constitutivos do direito invocado, por meio de prova suficiente e segura.
Nesse passo, a fim de demonstrar a natureza especial do labor desenvolvido nos lapsos vindicados, deve a parte suplicante carrear documentos aptos certificadores das condições insalubres em que permaneceu exposta, com habitualidade e permanência, como formulários padrão e laudos técnicos individualizados, cabendo ao magistrado, em caso de dúvida fundada, o deferimento de prova pericial para confrontação do material reunido à exordial.
Compete ao juiz a condução do processo, cabendo-lhe apreciar a questão de acordo com o que está sendo debatido. Dessa forma, o juiz não está obrigado a decidir a lide conforme pleiteado pelas partes, mas, sim, conforme seu livre convencimento, fundado em fatos, provas, jurisprudência, aspectos ligados ao tema e legislação que entender aplicável ao caso.
Se não houver dúvida fundada sobre as condições em que o segurado desenvolveu suas atividades laborativas, despicienda revela-se a produção de prova pericial para o julgamento da causa e, por consequência, não estará configurado cerceamento de defesa ou violação de ordem constitucional ou legal.
Conforme expressamente consignado no julgado recorrido, a parte autora não demonstrou que exerceu as suas atividades com a sujeição a agentes agressivos e nem que o alegado trabalho ocorreu nos moldes previstos nos instrumentos normativos, de modo que não se verificam o vícios apontados pelo embargante.
Como amplamente fundamentado:
"Contudo, não prospera o pleito de reconhecimento do caráter especial das atividades executadas nos interregnos de:
(i) 23/10/2000 a 31/5/2001 ("Companhia Santo Amaro e Automóveis" - atual "Santo Amaro Caminhões Ltda.") - embora a empresa esteja "ativa", conforme consulta ao Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ), não há nos autos, nenhum elemento de convicção que demonstre a sujeição a agentes nocivos.
Nesse aspecto, a parte autora não se desincumbiu do ônus que realmente lhe toca quando instruiu a peça inicial, qual seja: carrear prova documental como formulários padrão, laudo técnico individualizado e PPP - documentos aptos a individualizar a situação fática da autora e comprovar a especificidade ensejadora do reconhecimento de possível agressividade, inviabilizando, portanto, o enquadramento pretendido.
Desse modo, não é o caso de se admitir como prova emprestada, para fins de enquadramento das atividades desempenhadas pelo autor, laudos técnicos de outros empregados em empresas diversas daquelas em que o demandante trabalhou.
Assinale-se não haver notícia nos autos acerca de eventual recusa no fornecimento de formulários ou laudos por parte do ex-empregador do requerente.
Nesse contexto, cabe referir que o não enquadramento do lapso in comento se deve à ausência de documento apto a demonstrar a sujeição a agentes nocivos.
(ii) 21/8/2003 a 31/5/2006 e de 1º/6/2006 a 8/12/2018 (DER) - Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP (fls. 121/122 do pdf), regularmente emitido em nome do autor, aponta exposição, exclusiva, ao fator de risco “ruído” em nível inferior (81 dB) aos limites previstos em lei, situação que impede o reconhecimento da especialidade.
Com efeito, não é possível presumir que houve a exposição habitual e permanente a outros agentes agressivos, quando não indicada em formulário, PPP ou laudo técnico regularmente emitidos em nome do autor.
Saliente-se, ainda, que também não é o caso de se admitir os laudos técnicos de terceiros, como prova emprestada, para fins de enquadramento da atividade desempenhada nos intervalos supracitados.
Com efeito, o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) da parte autora, por ser individualmente elaborado e estar devidamente preenchido, com a indicação de responsável pelos registros ambientais, prevalece sobre a indicação da exposição a agentes nocivos existente em PPP ou laudo pericial de terceiro.
Assim, embora admissível a comprovação da especialidade por meio de prova emprestada, sobretudo quando observados os princípios do contraditório e da ampla defesa, na hipótese, a perícia técnica não autoriza o enquadramento pretendido.
Desse modo, não resta evidenciada a insalubridade asseverada durante esses períodos, de modo que devem ser considerados como tempo comum."
De todo modo, constitui dever legal do empregador elaborar e fornecer ao empregado PPP que demonstre corretamente as condições de trabalho por ele desenvolvidas, indicando possíveis agentes nocivos presentes no ambiente laborativo; obrigação que decorre, portanto, de relação empregatícia, motivo pelo qual, não compete ao juiz do processo previdenciário, senão à Justiça do Trabalho, nos termos do artigo 114 da CF/1988, processar e julgar os feitos que tenham por objeto discussões sobre o fornecimento de PPP ou sobre a correção ou não do seu conteúdo.
Nesse sentido (g.n.):
"PREVIDENCIÁRIO. CONVERSÃO DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO EM APOSENTADORIA ESPECIAL OU REVISÃO. CERCEAMENTO DE DEFESA NÃO CONFIGURADO. TRABALHO NA LAVOURA DE CANA-DE-AÇÚCAR. ATIVIDADE PENOSA. CABIMENTO. EXPOSIÇÃO AO AGENTE AGRESSIVO RUÍDO EM ÍNDICE ABAIXO DO LIMITE DE TOLERÂNCIA. LABOR ESPECIAL RECONHECIDO EM PARTE. NÃO PREENCHIDOS OS REQUISITOS PARA A CONCESSÃO DA APOSENTADORIA ESPECIAL. DETERMINADA A REVISÃO DA RMI. VERBA HONORÁRIA. - Conforme art. 373, inciso I, do Código de Processo Civil, constitui ônus da parte autora demonstrar fato constitutivo de seu direito. - Indeferido o pedido de produção de prova pericial, lastreado na preclusão. A comprovação do período laborado em atividade especial, no caso dos autos, deve ser feita por meio de apresentação de formulários próprios e por laudos respectivos ao seu exercício. Em nenhum momento se evidenciou, nos autos, recusa do empregador em fornecer os documentos. Caso a parte não disponha de laudos e de documentos hábeis à verificação de especiais condições, compete-lhe manejar a Justiça do Trabalho para obter documentos que evidenciem condições nocivas à saúde. - Preliminar rejeitada. - Configurado o trabalho na lavoura de cana-de-açúcar, cabível seu enquadramento como especial, ante a penosidade da função. Precedentes desta Corte. - Com relação ao lapso de 01/05/2009 a 04/01/2018, em que pese a parte autora tenha apresentado o PPP Id 108524053 p. 41/55, informando o labor como "Operadora de Plantadora", tem-se que o documento juntado aponta, em sua seção de registros ambientais, exposição a ruído de 84 dB (A), abaixo do limite considerado agressivo à época [85 dB (A)], pelo que impossível o reconhecimento da atividade especial nesse período. - Somando o período especial reconhecido neste feito, tem-se que a segurada não faz jus à aposentadoria especial, considerando-se que não cumpriu a contingência, ou seja, o tempo de serviço por período superior a 25 (vinte e cinco) anos, de modo a satisfazer o requisito temporal previsto no art. 57, da Lei nº 8.213/91, eis que comprova nestes autos 20 anos e 11 dias de labor especial. - Possível o reconhecimento do labor especial no intervalo de 20/04/1989 a 30/04/2009, com a devida conversão pelo fator 1,2, para condenar o INSS a proceder ao recálculo da renda mensal inicial do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição da parte autora. - Juros de mora e correção monetária fixados na forma explicitada. - Verba honorária de sucumbência recursal majorada na forma do § 11 do art. 85 do Código de Processo Civil. - Apelo da parte autora improvido. - Apelação do INSS improvida." (TRF3, APELAÇÃO CÍVEL ..SIGLA_CLASSE: ApCiv 6210415-43.2019.4.03.9999, Relator: Desembargador Federal JOAO BATISTA GONCALVES, 9ª Turma, DJEN DATA: 20/05/2021)
É certo que o ônus da prova quanto ao fato constitutivo de seu direito cabe à parte autora (artigo 373, inciso I, CPC e artigo 57, § 3º, da Lei n. 8.213/1991) e somente em situação excepcional, devidamente comprovada e após esgotados todos os meios cabíveis, é que se justifica a intervenção do Judiciário. Admitir-se o contrário, equivale transferir ao Juízo o dever e atribuição que compete à parte na comprovação de seu direito.
Acerca do tema, o Enunciado n. 203 do FONAJEF dispõe: "Não compete à Justiça Federal solucionar controvérsias relacionadas à ausência e/ou à inexatidão das informações constantes de PPP e/ou LTCAT para prova de tempo de serviço especial".
Assim, na situação em comento, a parte autora não logrou reunir elementos comprobatórios de haver trabalhado com exposição a agentes insalutíferos nas funções alegadas, e igualmente não se tem notícia de eventual manejo de reclamatória trabalhista.
Nesse panorama, não houve cumprimento do princípio dos ônus da prova (art. 373, I, CPC), de modo que deixo de acolher o inconformismo recursal nesse aspecto.
Nesse diapasão, os fundamentos utilizados no julgado embargado devem prevalecer.
À vista dessas considerações, visa a parte embargante ao amplo reexame da causa, o que é vedado em sede de embargos de declaração, estando claro que nada há a ser prequestionado, ante a ausência de omissão, contradição ou obscuridade.
Diante do exposto, nego provimento a estes embargos de declaração.
É o voto.
E M E N T A
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. AUSÊNCIA DE OMISSÃO, CONTRADIÇÃO, OBSCURIDADE OU ERRO MATERIAL. CONFIGURAÇÃO DE REEXAME DA CAUSA. VEDAÇÃO.
- O artigo 1.022 do Código de Processo Civil (CPC) admite embargos de declaração quando, na sentença ou no acórdão, houver obscuridade, contradição ou omissão de ponto sobre o qual devia pronunciar-se o juiz ou o tribunal, ou ainda para correção de erro material (inciso III).
- Analisadas as questões jurídicas necessárias ao julgamento, o acórdão embargado não padece de omissão, obscuridade ou contradição.
- Não configurados os vícios sanáveis por embargos de declaração, revela-se nítido o caráter de reexame da causa, o que é vedado nesta sede.
- Embargos de declaração desprovidos.
