
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000888-35.2014.4.03.6118
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: LUIZ CARLOS PORTO SOARES, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: RUBENS GARCIA FILHO - SP108148-A
APELADO: LUIZ CARLOS PORTO SOARES, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: RUBENS GARCIA FILHO - SP108148-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000888-35.2014.4.03.6118
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: LUIZ CARLOS PORTO SOARES, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: RUBENS GARCIA FILHO - SP108148-A
APELADO: LUIZ CARLOS PORTO SOARES, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: RUBENS GARCIA FILHO - SP108148-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de embargos de declaração opostos pelo INSS contra o acórdão (ID 129051628) que de ofício, fixou os critérios de atualização do débito, deu provimento à apelação da parte autora, para reconhecer o labor em condições especiais no período de 02.05.79 a 10.03.2006 e determinar ao INSS a revisão da RMI de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, consideradas as verbas reconhecidas na sentença trabalhista transitada em julgado, na apuração dos salários de contribuição utilizados no período base de cálculo, e o pagamento das diferenças decorrentes do recálculo desde a data do requerimento administrativo; negou provimento à apelação do INSS e, com fulcro no §11º do artigo 85 do Código de Processo Civil, majorou os honorários de advogado em 2% sobre o valor arbitrado.
Alega o INSS que a decisão é omissa, obscura e contraditória quanto à falta de interesse de agir da parte autora, ao reconhecer o cômputo de verbas reconhecidas em reclamação trabalhista, sem prévio requerimento administrativo, o que equivaleria a propor a ação sem prévio requerimento; quanto ao reconhecimento do labor em condições especiais em razão da exposição a inflamáveis em período posterior a 05.03.97. Argumenta, ainda, que os efeitos financeiros não podem ser fixados na DER.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000888-35.2014.4.03.6118
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: LUIZ CARLOS PORTO SOARES, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: RUBENS GARCIA FILHO - SP108148-A
APELADO: LUIZ CARLOS PORTO SOARES, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: RUBENS GARCIA FILHO - SP108148-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
De acordo com o art. 1.022 do Código de Processo Civil de 2015, os embargos de declaração possuem função processual específica, que consiste em integrar, esclarecer, complementar ou retificar a decisão embargada.
Sobre a questão do interesse de agir da parte autora, é verdade que o art. 5º, XXXV, da Constituição, assegura o pleno acesso ao Poder Judiciário para a proteção dos cidadãos em caso de lesão ou ameaça a direito. Contudo, essa garantia fundamental não deixa de trazer em si a exigência da existência de uma lide, justificando a atuação do Poder Judiciário como forma democrática de composição de conflitos, o que também se revela como interesse de agir (necessidade e utilidade da intervenção judicial).
Existindo lide (provável ou concreta), é perfeitamente possível o acesso direto à via judicial, sem a necessidade de prévio requerimento na via administrativa.
Contudo, em casos nos quais a lide não está claramente caracterizada, vale dizer, em situações nas quais é potencialmente possível que o cidadão obtenha a satisfação de seu direito perante a própria Administração Pública, é imprescindível o requerimento na via administrativa, justamente para a demonstração da necessidade da intervenção judicial e, portanto, do interesse de agir que compõe as condições da ação. Imprescindível, assim, a existência do que a doutrina processual denomina de fato contrário a caracterizar a resistência à pretensão do autor.
Deveras, de acordo com o entendimento jurisprudencial adotado por esta Corte Regional, tratando-se de ação de cunho previdenciário, ainda que não se possa condicionar a busca da prestação jurisdicional ao exaurimento da via administrativa, tem-se por razoável exigir que o autor tenha ao menos formulado um pleito administrativo - e recebido resposta negativa - de forma a demonstrar a necessidade de intervenção do Poder Judiciário ante a configuração de uma pretensão resistida.
Conclui-se, assim, pela aplicação aos segurados da exigência de prévia provocação da instância administrativa para obtenção do benefício e, somente diante de sua resistência, viabilizar a propositura de ação judicial.
Aliás, é nesse sentido a decisão do Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário 631.240/MG, com repercussão geral reconhecida:
"RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO E INTERESSE EM AGIR.
1. A instituição de condições para o regular exercício do direito de ação é compatível com o art. 5º, XXXV, da Constituição. Para se caracterizar a presença de interesse em agir, é preciso haver necessidade de ir a juízo.
2. A concessão de benefícios previdenciários depende de requerimento do interessado, não se caracterizando ameaça ou lesão a direito antes de sua apreciação e indeferimento pelo INSS, ou se excedido o prazo legal para sua análise. É bem de ver, no entanto, que a exigência de prévio requerimento não se confunde com o exaurimento das vias administrativas.
3. A exigência de prévio requerimento administrativo não deve prevalecer quando o entendimento da Administração for notória e reiteradamente contrário à postulação do segurado.
4. Na hipótese de pretensão de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido, considerando que o INSS tem o dever legal de conceder a prestação mais vantajosa possível, o pedido poderá ser formulado diretamente em juízo - salvo se depender da análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração-, uma vez que, nesses casos, a conduta do INSS já configura o não acolhimento ao menos tácito da pretensão.
5. Tendo em vista a prolongada oscilação jurisprudencial na matéria, inclusive no Supremo Tribunal Federal, deve-se estabelecer uma fórmula de transição para lidar com as ações em curso, nos termos a seguir expostos.
6. Quanto às ações ajuizadas até a conclusão do presente julgamento (03.09.2014), sem que tenha havido prévio requerimento administrativo nas hipóteses em que exigível, será observado o seguinte: (i) caso a ação tenha sido ajuizada no âmbito de Juizado Itinerante, a ausência de anterior pedido administrativo não deverá implicar a extinção do feito; (ii) caso o INSS já tenha apresentado contestação de mérito, está caracterizado o interesse em agir pela resistência à pretensão; (iii) as demais ações que não se enquadrem nos itens (i) e (ii) ficarão sobrestadas, observando-se a sistemática a seguir.
7. Nas ações sobrestadas, o autor será intimado a dar entrada no pedido administrativo em 30 dias, sob pena de extinção do processo. Comprovada a postulação administrativa, o INSS será intimado a se manifestar acerca do pedido em até 90 dias, prazo dentro do qual a Autarquia deverá colher todas as provas eventualmente necessárias e proferir decisão. Se o pedido for acolhido administrativamente ou não puder ter o seu mérito analisado devido a razões imputáveis ao próprio requerente, extingue-se a ação. Do contrário, estará caracterizado o interesse em agir e o feito deverá prosseguir.
8. Em todos os casos acima - itens (i), (ii) e (iii) -, tanto a análise administrativa quanto a judicial deverão levar em conta a data do início da ação como data de entrada do requerimento, para todos os efeitos legais.
9. Recurso extraordinário a que se dá parcial provimento, reformando-se o acórdão recorrido para determinar a baixa dos autos ao juiz de primeiro grau, o qual deverá intimar a autora - que alega ser trabalhadora rural informal - a dar entrada no pedido administrativo em 30 dias, sob pena de extinção. Comprovada a postulação administrativa, o INSS será intimado para que, em 90 dias, colha as provas necessárias e profira decisão administrativa, considerando como data de entrada do requerimento a data do início da ação, para todos os efeitos legais. O resultado será comunicado ao juiz, que apreciará a subsistência ou não do interesse em agir." (Tribunal Pleno, Rel. Min. Roberto Barroso,DJe 10/11/2014).
Neste contexto, conforme se observa do precedente em tela, não obstante a necessidade de prévio requerimento administrativo, bem como de julgados em sentido contrário do E. Superior Tribunal de Justiça, o Supremo Tribunal Federal, em sede de recurso com repercussão geral reconhecida, fez ressalva expressa no tocante à possibilidade do ajuizamento da ação nas hipóteses de pedidos de revisão de benefícios, como no caso em tela, que não depende da análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração.
Ademais, a apresentação ou não de provas na fase administrativa não configura ausência de interesse de agir do demandante, porquanto diz respeito ao mérito da questão propriamente dito, e não à presença das condições da ação.
Outrossim, o presente feito foi ajuizado em 14.04.2014, ou seja, antes do julgamento do RE 631.240, incidindo nas regras de transição nele estabelecidas, com base nas quais dispensa-se o prévio requerimento administrativo se manifesta a resistência à pretensão exordial, mediante apresentação pelo INSS de contestação.
No pertinente ao reconhecimento do labor em condições especiais, constam expressamente da decisão embargada, os fundamentos pelos quais foi reconhecido como especial o período impugnado (02.05.79 a 10.03.2006).
Por fim, com relação à fixação dos efeitos financeiros na DER, não vislumbro a ocorrência dos alegados vícios aventados pelo embargante, porquanto constantes da decisão embargada os fundamentos da fixação do termo inicial do pagamento das diferenças decorrentes da revisão do benefício, considerando-se, sobretudo, o entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça em sede de Incidente de Uniformização de Jurisprudência (STJ - Petição nº 9.582 - RS (2012/0239062-7), Primeira Seção, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 26/08/15).
Consoante jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça, “[...] o termo inicial dos efeitos financeiros da revisão de benefício previdenciário deve retroagir à data da concessão do benefício, uma vez que o deferimento da ação revisional representa o reconhecimento tardio de um direito já incorporado ao patrimônio jurídico do segurado” (REsp nº 1.732.289/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 24/4/2018, DJe 21/11/2018). No mesmo sentido: REsp nº 1745509/SP, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, julgado em 11/06/2019, DJe 14/06/2019.
Assim, o embargante não logrou demonstrar a existência de omissão ou de qualquer das hipóteses elencadas naquele dispositivo legal, requerendo, em verdade, o reexame de questões já apreciadas e devidamente fundamentadas no acórdão embargado, objetivando a sua reforma, o que só pode ser pleiteado por meio da via recursal adequada.
A insatisfação da parte com o resultado da decisão embargada não enseja a oposição de embargos de declaração.
Nesse sentido, aliás, a jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça (AgRg no REsp 1443216/RS, AgRg no AREsp 62.064/SP, EDcl no REsp 988.915/SP).
Por fim, mesmo os embargos para fim de prequestionamento têm como pressuposto de admissibilidade a demonstração da ocorrência de qualquer das hipóteses previstas nos incisos do art. 1.022 do CPC/15, não se fazendo necessária, para interposição de recursos aos Tribunais Superiores, alusão expressa a todos os dispositivos legais mencionados pelas partes, bastando tão somente que a matéria debatida seja totalmente ventilada no v. acórdão. Nesse sentido foi o que decidiu o STJ no AgRg no REsp 1485281/RJ, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 18/11/2014, DJe 24/11/2014.
Ante o exposto,
rejeito os embargos de declaração opostos pelo INSS.
É o voto.
E M E N T A
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. VERIFICAÇÃO DAS HIPÓTESES PREVISTAS NO ARTIGO 1.022 DO CPC/15. REQUERIMENTO PRÉVIO NA VIA ADMINISTRATIVA. AÇÃO AJUIZADA EM DATA ANTERIOR À DECISÃO PROFERIDA NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO 631.240/MG, COM REPERCUSSÃO GERAL. AÇÃO REVISIONAL DE BENEFÍCIO. RECURSO REJEITADO.
1. De acordo com o art. 1.022 do Código de Processo Civil, os embargos de declaração possuem função processual específica, que consiste em integrar, retificar ou complementar a decisão embargada.
2. De acordo com o entendimento jurisprudencial adotado por esta Corte Regional, tratando-se de ação de cunho previdenciário, ainda que não se possa condicionar a busca da prestação jurisdicional ao exaurimento da via administrativa, tem-se por razoável exigir que o autor tenha ao menos formulado um pleito administrativo - e recebido resposta negativa - de forma a demonstrar a necessidade de intervenção do Poder Judiciário ante a configuração de uma pretensão resistida (RE 631.240/MG, com repercussão geral).
3. No precedente, o STF fez ressalva expressa no tocante à possibilidade do ajuizamento da ação nas hipóteses de pedidos de revisão de benefícios, que não dependem da análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração.
4. Nas ações ajuizadas em data anterior ao julgamento do RE 631.240, há que se observar as regras de transição nela estabelecidas.
5. O embargante não logrou demonstrar a existência de omissão ou de qualquer das hipóteses elencadas naquele dispositivo legal.
6. A insatisfação da parte com o resultado da decisão embargada não enseja a oposição de embargos de declaração.
7. Os embargos para fim de prequestionamento têm como pressuposto de admissibilidade a demonstração da ocorrência de qualquer das hipóteses previstas nos incisos do art. 1.022 do CPC/15, não se fazendo necessária, para interposição de recursos aos Tribunais Superiores, alusão expressa a todos os dispositivos legais mencionados pelas partes.
8. Embargos de declaração rejeitados.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu rejeitar os embargos de declaração opostos pelo INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
