
| D.E. Publicado em 21/11/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento ao agravo nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Juiz Federal Convocado
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EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM APELAÇÃO CÍVEL Nº 0033965-61.2016.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O Juiz Federal Convocado OTÁVIO PORT (Relator):MARIA FERNANDES DA SILVA opõe embargos de declaração, com fundamento no artigo no Art. 1.022 do CPC/2015.
O embargante alega que a decisão monocrática é omissa, uma vez que a autora preenche todos os requisitos para a obtenção do benefício.
Intimado para, querendo, complementar suas razões recursais, nos termos do art. 1.024, § 3º do CPC/2015, a autora não se manifestou.
É o relatório.
VOTO
O Juiz Federal Convocado OTÁVIO PORT (Relator):A decisão foi publicada após a vigência do novo CPC, razão pela qual a análise do recurso será efetuada com base na nova legislação.
Nos termos do Art. 1.022 do CPC/2015, os embargos de declaração são cabíveis quando o decisum for obscuro, contraditório ou omisso acerca da questão posta em debate, hipótese inexistente no caso dos autos.
Logo, é de se concluir que o autor pretende modificar a decisão proferida pela via imprópria, razão pela qual recebo os embargos de declaração como agravo, em atenção aos princípios da fungibilidade recursal e da economia processual.
A decisão analisou a matéria nos seguintes termos:
"Ação ajuizada contra o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, para o restabelecimento do benefício assistencial previsto no art. 203, V, da CF.
Segundo a inicial, o autor é pessoa com deficiência, não tendo condições de prover seu sustento ou de tê-lo provido por sua família, fazendo jus ao benefício.
Concedidos os benefícios da assistência judiciária gratuita.
O Juízo de 1º grau julgou procedente o pedido e condenou o INSS ao pagamento do benefício de prestação continuada, no valor de um salário mínimo mensal, desde a data da citação, em 22.09.2014, com honorários advocatícios fixados em 10% das prestações vencidas até a data da sentença.
Sentença proferida em 10.03.2016, não submetida ao reexame necessário.
Em apelação, o INSS sustenta que a renda mensal familiar per capita é superior a ¼ do salário mínimo, razão pela qual a apelada não faz jus ao benefício assistencial, postulando a reforma do julgado.
Sem contrarrazões, subiram os autos.
Parecer do Ministério Público Federal, opinando pelo provimento da apelação.
É o relatório.
Decido monocraticamente conforme precedente da lavra do Desembargador Federal Johonsom di Salvo, nos autos da apelação cível n. nº 0016045-44.2010.4.03.6100/SP, que adoto como razões de decidir, verbis:
Aplicável, ao caso, o enunciado da Súmula 568 do STJ: O relator, monocraticamente e no Superior Tribunal de Justiça, poderá dar ou negar provimento ao recurso quando houver entendimento dominante acerca do tema.
No caso dos autos, o julgamento da matéria está sedimentado em Súmula e/ou julgamentos de recursos repetitivos e de repercussão geral, ou matéria pacificada nos Tribunais.
O benefício da assistência social, de caráter não contributivo, tem como alguns de seus princípios norteadores a construção de uma sociedade livre, justa e solidária e o enfrentamento da pobreza no nosso País, que constituem os objetivos fundamentais consagrados no art. 3º, I e III, da Constituição Federal , garantindo-se os mínimos sociais àqueles que efetivamente necessitam.
A Lei nº 8.742, de 07.12.1993, regulamentou a Assistência Social, prevista no mencionado art. 203, V, da CF. Em seu art. 20, dispôs sobre as condições para a concessão do benefício: ser pessoa portadora de deficiência, ou idoso com 70 (setenta) anos ou mais - idade posteriormente reduzida para 67 (sessenta e sete) anos - e, em ambos os casos, sem condições de prover seu próprio sustento ou tê-lo provido pela família.
O Estatuto do Idoso - Lei nº 10.741, de 01.10.2003 - reduziu a idade mínima do idoso para 65 anos - art. 34.
O art. 20 da LOAS - Lei Orgânica da Assistência Social foi alterado pela Lei nº 12.435, de 06.7.2011 (DOU 07.7.2011), que adotou a expressão "pessoa com deficiência" e a idade de 65 (sessenta e cinco) anos ou mais já prevista no Estatuto do Idoso.
Também o conceito de pessoa com deficiência foi alterado pela nova lei. O § 2º do art. 20 passou a dispor:
O § 3º do art. 20 da Lei 8.742/93 estabelece que a renda per capita familiar deve ser inferior a ¼ do salário mínimo. A inconstitucionalidade desse dispositivo da LOAS - Lei Orgânica da Assistência Social foi arguida na ADIN nº 1.232-1, julgada improcedente por maioria de votos pelo Plenário do STF.
A questão não restou pacificada na jurisprudência do STJ e do próprio STF, que passaram a adotar o entendimento de que a ADIn nº 1.232-1 não retirou a possibilidade de aferição da necessidade por outros meios de prova que não a renda per capita familiar, mas, sim, que o § 3º do art. 20 estabeleceu uma presunção objetiva e absoluta de miserabilidade. Assim sendo, a família com renda mensal per capita inferior a ¼ do salário mínimo encontra-se em estado de penúria, configurando tal situação prova incontestável de necessidade do benefício, dispensando outros elementos probatórios. Daí que, caso suplantado tal limite, outros meios de prova poderiam ser utilizados para a demonstração da condição de miserabilidade, expressa na situação de absoluta carência de recursos para a subsistência.
Nesse sentido o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, no Recurso Especial nº 222778/SP, 5ª Turma, Rel. Min. Edson Vidigal, j. 04.11.1999, DJU 29.11.1999, p. 190:
A questão foi novamente levada a julgamento pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, que reconheceu a Repercussão Geral da matéria nos autos do Recurso Extraordinário 567985/MT, Rel. Min. Marco Aurélio, Rel. p/ Acórdão Min. Gilmar Mendes, j. 18/04/2013, publicado em 03.10.2013:
"... O requisito financeiro estabelecido pela lei teve sua constitucionalidade contestada, ao fundamento de que permitiria que situações de patente miserabilidade social fossem consideradas fora do alcance do benefício assistencial previsto constitucionalmente. Ao apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.232-1/DF, o Supremo Tribunal Federal declarou a constitucionalidade do art. 20, § 3º, da LOAS. 3. Decisões judiciais contrárias aos critérios objetivos preestabelecidos e Processo de inconstitucionalização dos critérios definidos pela Lei 8.742/1993. A decisão do Supremo Tribunal Federal, entretanto, não pôs termo à controvérsia quanto à aplicação em concreto do critério da renda familiar per capita estabelecido pela LOAS. Como a lei permaneceu inalterada, elaboraram-se maneiras de se contornar o critério objetivo e único estipulado pela LOAS e de se avaliar o real estado de miserabilidade social das famílias com entes idosos ou deficientes. Paralelamente, foram editadas leis que estabeleceram critérios mais elásticos para a concessão de outros benefícios assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004, que criou o Bolsa Família; a Lei 10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de Acesso à Alimentação; a Lei 10.219/01, que criou o Bolsa Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro a Municípios que instituírem programas de garantia de renda mínima associados a ações socioeducativas. O Supremo Tribunal Federal, em decisões monocráticas, passou a rever anteriores posicionamentos acerca da intransponibilidade do critérios objetivos. Verificou-se a ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro). 4. Declaração de inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993. 5. Recurso extraordinário a que se nega provimento" (destaquei).
Continuo mantendo o entendimento anterior porque, a meu ver, a fixação da renda per capita familiar inferior ao salário mínimo é excludente do bem-estar e justiça sociais que o art. 193 da Constituição Federal elegeu como objetivos da Ordem Social.
A fixação do salário mínimo como garantia do trabalhador e do inativo para fins de garantir sua manutenção e de sua família, com o mínimo necessário à sobrevivência com dignidade, representa um critério quantificador do bem-estar social que a todos deve ser garantido, inclusive aos beneficiários do benefício assistencial previsto no art. 203, V, da Constituição.
Nessa linha de entendimento, o correto seria que a renda per capita familiar, para fins de concessão do benefício assistencial de prestação continuada, previsto no art. 203, da Lei Maior, não pudesse ser superior a 1 (um) salário mínimo. Esse critério traria para dentro do sistema de Assistência Social um número bem maior de pessoas idosas e com deficiência. Seria dar a todos, dentro e fora do sistema de Assistência Social, o mesmo grau de dignidade e de bem-estar, reduzindo desigualdades sociais.
A declaração de inconstitucionalidade do § 3º do art. 20 da LOAS - Lei Orgânica da Assistência Social, na prática, resulta na inexistência de nenhum critério, abrindo a possibilidade de o intérprete utilizar todos os meios de provas disponíveis para a verificação da situação de miséria que a lei quer remediar.
Cabe à legislação infraconstitucional a definição dos critérios e requisitos para concessão do benefício, conforme prevê o art. 203, V, da Constituição Federal. Deve, para isso, obedecer aos princípios do art. 194, dentre eles a seletividade e distributividade. Ou seja, cabe ao legislador ordinário selecionar as contingências merecedoras de proteção e distribuí-las de acordo com o número de beneficiários e o orçamento de que dispõe.
A seletividade e a distributividade, contudo, por serem princípios setoriais, estão conformadas ao princípio geral do respeito à isonomia. Não pode a lei eleger como discrimen critério violador da isonomia.
A fixação do critério aferidor da necessidade é atribuição do legislador e não do juiz. Mas, diante do caso concreto, a jurisdição não pode ser negada por falta de critério legal.
A atividade legislativa não é do Poder Judiciário, de modo que não lhe cabe criar critério que substitua o previsto no § 3º do art. 20. Porém, parece razoável estabelecer presunção absoluta de miserabilidade quando a renda per capita familiar for inferior a metade do salario mínimo vigente, para que, em sendo superior, outras provas possam ser consideradas para averiguar a real necessidade de concessão do benefício.
No caso dos autos, a autora contava com 66 (sessenta e seis) anos quando ajuizou a ação, tendo, por isso, a condição de idosa.
O estudo social com fotos feito em 03.08.2015, às fls. 65/67, dá conta de que a autora reside sozinha, em casa própria, de alvenaria, contendo dois quartos, sala, cozinha e banheiro. A autora conta com a ajuda do filho Alexandre com alimentos e o pagamento das despesas com conta telefônica. A autora recebe cesta básica do Centro de Referência da Assistência Social do Município e remédios da Rede Municipal de Saúde. A renda da autora advém da pensão alimentícia do ex-marido, no valor de R$ 467,07 (quatrocentos e sessenta e sete reais e sete centavos) mensais.
A consulta ao CNIS (fl. 133) indica que a autora é beneficiária de pensão alimentícia, no valor de R$ 515,75 (quinhentos e quinze reais e setenta e cinco centavos).
Assim, a renda familiar per capita é superior à metade do salário mínimo.
Ademais, como bem salientou o ilustre representante do Ministério Público Federal, os elementos de prova existentes nos autos apontam em sentido contrário à alegada miserabilidade da autora.
Opinou o parquet Federal nos seguintes termos:
"(...) Além disso, conforme constatado pelo referido estudo social (fl. 66), a apelada possui 4 filhos, recaindo sobre eles o dever de alimentos nos termos do art. 2999 da Constituição, bem como do art. 1.696 do Código Civil. Ressalta-se que a autora declarou no estudo social receber assistência de seu filho Alexandre, "com alimentos e o pagamento das despesas como conta telefônica" (fl. 65). Não bastasse isso, verifica-se eu a autora pode pleitear a majoração da sai prestação alimentícia, que equivale, atualmente a apenas 15% do benefício e ex-cônjuge da autora (extrato do Sistema Único de Benefícios em anexo). Dessa forma, a apelada não necessita da assistência estatal, que é subsidiária à assistência familiar. Além disso, observa-se que o objetivo da assistência social é diverso daquele da previdência, uma vez que visa à concessão do mínimo existencial. Nos termos da Constituição Federal, a assistência social é subsidiária, tanto da previdência, quanto da assistência familiar, de forma que o benefício pleiteado somente será concedido quando a pessoa não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. Apesar de a renda familiar da apelada não ser confortável, o benefício pleiteado não deve ser concedido, uma vez que a assistência social visa retirar as pessoas da miserabilidade. Portanto, como a autora possui assistência familiar, bem como renda per capita de R$ 515,75, superior ao critério selecionado pelo legislador, e ainda que pode pleitear o aumento da pensão alimentícia, ela não faz jus ao benefício pleiteado, uma vez que não atende ao requisito "miserabilidade".". (...).
É de se observar, ainda, que o benefício assistencial não tem por fim a complementação da renda familiar ou proporcionar maior conforto ao beneficiário, mas sim, que se destina ao idoso ou deficiente em estado de penúria, que comprove os requisitos legais, sob pena de ser concedido indiscriminadamente em prejuízo daqueles que realmente necessitam, na forma da lei.
Dessa forma, não preenche a parte autora todos os requisitos necessários ao deferimento do benefício.
DOU PROVIMENTO à apelação para julgar improcedente o pedido.
Condeno a parte vencida no pagamento das custas e despesas processuais, além dos honorários advocatícios fixados em 10% do valor da causa, suspensa a sua exigibilidade por ser beneficiária da assistência judiciária gratuita, nos termos do art. 98, § 3º, do CPC/2015.
Int.".
A decisão agravada está de acordo com o disposto no art. 1.021 do CPC/2015, inclusive § 3º, baseado no princípio da dialética recursal, seguindo jurisprudência dominante, inclusive. Inexiste qualquer vício a justificar a sua reforma.
Recebo os embargos de declaração como agravo e NEGO-LHE provimento.
É o voto.
OTAVIO PORT
Juiz Federal Convocado
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| Signatário (a): | OTAVIO HENRIQUE MARTINS PORT:10241 |
| Nº de Série do Certificado: | 375D834FE46558B9 |
| Data e Hora: | 31/10/2017 19:08:06 |
