
| D.E. Publicado em 07/05/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Juiz Federal Convocado
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | OTAVIO HENRIQUE MARTINS PORT:10241 |
| Nº de Série do Certificado: | 11DE1711276A858D |
| Data e Hora: | 23/04/2018 15:49:05 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0021986-73.2014.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
Ação ajuizada em 9/11/2011 contra o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), objetivando o reconhecimento da natureza especial das atividades indicadas na inicial, com a consequente concessão da aposentadoria por tempo de contribuição.
Concedida a gratuidade da justiça.
Por força de determinação do juízo, o autor ingressou com requerimento administrativo (DER em 25/05/2012).
Ciência do INSS em 10/09/2012 (fls. 179, expressa em petição). Após comprovada a decisão do INSS, em caso de indeferimento, "aguarda o procurador a citação inicial".
Após o indeferimento da concessão administrativa, a autora ingressou com pedido de revisão do indeferimento e reafirmação da DIB para quando completados os 30 anos necessários à concessão do benefício, com o que o benefício foi concedido na via administrativa (DIB 03/07/2012).
O INSS pleiteou a extinção do feito sem resolução do mérito em petição de 07/03/2013, pela concessão administrativa do benefício (fls. 182/203). Posteriormente, considerada a petição como contestação considerada intempestiva pelo juízo.
A autora reiterou a necessidade de regular prosseguimento do feito, com a instrução e expedição de ofícios às empresas onde trabalhou (fls. 204).
Juntada aos autos a cópia do processo administrativo de concessão do benefício, por força do despacho de fls. 209.
Após a juntada do processo administrativo, a autora reafirmou a necessidade de prosseguimento da ação porque entre a concessão e o ajuizamento transcorreram aproximadamente 9 meses, devidas as diferenças daí decorrentes e também relativas ao reconhecimento da atividade especial nos termos em que pleiteia na inicial.
O juízo de primeiro grau julgou extinto o feito sem resolução do mérito, pela carência superveniente do direito de ação, nos termos do art. 267, VI, do CPC/1973.
Sentença proferida em 07/04/2014.
A autora apelou, pleiteando inicialmente a anulação da sentença, com o retorno dos autos à vara de origem e prosseguimento do feito, para o atendimento ao pedido inicial na íntegra, com DIB na data do ajuizamento.
Sem contrarrazões, subiram os autos.
É o relatório.
VOTO
Em tudo se assemelha o caso à situação prevista no § 3º do art. 515, do CPC.
O § 1º do art. 515 do CPC/1973 assim estatui:
O procedimento não ofende o princípio do duplo grau de jurisdição e atende o amplo acesso à justiça. Tendo havido a regular tramitação do processo em primeira instância, em causa que aborda questões unicamente de direito ou questões de fato cuja prova já foi produzida em primeira instância, cumpre a este Tribunal, em reconsiderando os fundamentos da sentença recorrida, examinar a lide integralmente, uma vez que o interesse de agir resta configurado.
Ao realizar o "julgamento da causa madura", o tribunal valoriza os modernos princípios da instrumentalidade e da efetividade do processo. Ademais, cumpre ressaltar que o § 3º do art. 515 do CPC/1973 deve ser interpretado em sintonia com o que dispõe o art. 330 do aludido diploma.
Segundo Carreira Alvim, citado por Gilson Delgado Miranda, na obra Código de Processo Civil Interpretado, ed. Atlas, p. 1558:
Presentes os requisitos do § 3º do art. 515 do CPC, formalizada a lide e inexistindo necessidade de produção de outras provas que as já existentes nos autos, uma vez que a questão discutida é matéria de direito, passo ao julgamento do mérito.
Isso porque remanesce interesse de agir da autora por força de diferenças consideradas devidas pela autora anteriores à DIB e também pela necessidade de análise do pedido relativo às condições especiais de trabalho de 21/08/1981 a 19/06/1986, 18/04/1989 a 24/01/1990, 01/02/1990 a 16/09/1991 (no deferimento administrativo, o INSS somente considerou como especiais as atividades exercidas de 01/12/1992 a 05/03/1997).
Dispunha o art. 202, II, da CF, em sua redação original:
A Lei nº 8.213, de 24.07.1991 (arts. 52 e seguintes) dispôs sobre o benefício previdenciário aqui pleiteado, devido ao segurado da Previdência Social que completar 25 anos de serviço, se mulher, ou 30 anos, se homem, evoluindo o valor do benefício de um patamar inicial de 70% do salário de benefício para o máximo de 100%, caso completados 30 anos de serviço, se do sexo feminino, ou 35 anos, se do sexo masculino. Estabeleceu, também, o requisito do cumprimento da carência de 180 contribuições mensais no caso de aposentadoria por tempo de serviço (art. 25, II).
Tal norma, porém, restou excepcionada, em virtude do estabelecimento de uma regra de transição, posta pelo art. 142 da Lei nº 8.213/91, para o segurado urbano já inscrito na Previdência Social por ocasião da publicação do diploma legal em comento, a ser encerrada no ano de 2011, quando, somente então, serão exigidas as 180 contribuições previstas no citado art. 25, II.
A EC 20, de 15.12.1998 (art. 9º) trouxe requisitos adicionais à concessão de aposentadoria por tempo de serviço. O dispositivo foi ineficaz desde a origem por ausência de aplicabilidade prática, razão pela qual o próprio INSS reconheceu não serem exigíveis quer a idade mínima para a aposentação, em sua forma integral, quer o cumprimento do adicional de 20%, aos segurados já inscritos na Previdência Social em 16.12.1998. É o que se comprova dos termos postos pelo art. 109, I, da Instrução Normativa INSS/DC nº 118, de 14.04.2005:
A legislação aplicável ao reconhecimento da natureza da atividade exercida pelo segurado - se comum ou especial -, bem como à forma de sua demonstração, é aquela vigente à época do exercício da atividade respectiva; tal entendimento visa não só amparar o próprio segurado contra eventuais alterações desfavoráveis, mas tem também por meta, induvidosamente, o princípio da segurança jurídica, representando uma garantia, ao órgão segurador, de que lei nova mais benéfica ao segurado não atingirá situação consolidada sob o império da legislação anterior, a não ser que expressamente prevista.
A atividade especial pode ser assim considerada mesmo que não conste em regulamento, bastando a comprovação da exposição a agentes agressivos por prova pericial, conforme já de há muito pacificado pelo extinto TFR na Súmula nº 198:
Até o advento da Lei nº 9.032, de 29.04.1995, a comprovação do exercício de atividade especial era realizada através do cotejo da categoria profissional do segurado, observada a classificação inserta nos Anexos I e II do citado Decreto nº 83.080/79 e Anexo do Decreto nº 53.831, de 25.03.1964, os quais foram ratificados expressamente pelo art. 295 do Decreto nº 357/91.
Com a edição da Lei nº 9.032/95, passou-se a exigir a efetiva demonstração da exposição do segurado a agente prejudicial à saúde, conforme a nova redação então atribuída ao § 4º do art. 57 da Lei nº 8.213/91.
Nesse sentido a jurisprudência do STJ:
Foi, então, editada a controversa Ordem de Serviço nº 600/98, alterada pela Ordem de Serviço nº 612/98, estabelecendo certas exigências para a conversão do período especial em comum:
As ordens de serviço impugnadas estabeleceram o termo inicial para as exigências da nova legislação relativa ao tempo de serviço especial. E com fundamento nessa norma infralegal é que o INSS passou a negar o direito de conversão dos períodos de trabalho em condições especiais.
Porém, com a edição do Decreto nº 4.827, de 03.09.2003, que deu nova redação ao art. 70 do Decreto nº 3.048 - Regulamento da Previdência Social -, de 06.05.1999, verificou-se substancial alteração do quadro legal, não mais subsistindo, a partir de então, o entendimento posto nas ordens de serviço em referência.
A jurisprudência do STJ firmou orientação no sentido da viabilidade da conversão de tempo de serviço especial para comum, em relação à atividade exercida após 28.05.1998:
O Decreto nº 4.882, de 18.11.2003, modificou o Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto nº 3.048/1999, restando alterado o conceito de "trabalho permanente", com o abrandamento do rigor excessivo antes previsto para a hipótese, conforme a nova redação do art. 65 do Decreto nº 3.048/99:
Para enquadrar-se ou não como especial a atividade exercida pelo segurado, é necessário verificar a legislação vigente à época do exercício da atividade.
Conforme entendimento da Nona Turma e também do STJ, possível o enquadramento por categoria profissional somente até a entrada em vigor da Lei 9.032/95, em 29/04/1995, que deu nova redação ao Art. 57, § 3º, da Lei 8.213/91.
A TNU dos Juizados Especiais Federais consolidou entendimento na Súmula 49: "Para reconhecimento de condição especial de trabalho antes de 29/04/1995, a exposição a agentes nocivos à saúde ou à integridade física não precisa ocorrer de forma permanente".
Após o início da vigência da Lei 9.032/95, para comprovar a efetiva exposição aos agentes nocivos, observa-se o que, à época do exercício da atividade, exigia o Regulamento: formulários SB-40 e DSS-8030 até a vigência do Decreto n. 2.172/97, e, após, a edição de referido Decreto, laudo técnico, devendo a empresa fornecer ao segurado o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), na forma da MP 1.523/96, convertida na Lei 9.528/97. É a posição firmada pelo STJ
O perfil profissiográfico previdenciário pode ser aceito a partir de 05.03.1997 para comprovar a exposição aos agentes nocivos.
Ressalto que a legislação brasileira, conquanto tenha estabelecido diversas formas de comprovação do tempo especial, sempre exigiu o laudo técnico para comprovação da exposição a ruído e calor.
O INSS abrandou a exigência relativa à apresentação de laudo técnico para atividades exercidas anteriormente a 1997, se apresentado PPP que abranja o período. O art. 258 da IN 77/2015 dispõe que a apresentação de PPP supre a necessidade de laudo técnico para aferição das condições especiais de trabalho nos períodos em que vigorava tal exigência.
Quanto ao EPC - Equipamento de Proteção Coletiva ou EPI - Equipamento de Proteção Individual, cujo uso poderia afastar a presença do agente nocivo, há que se ressaltar que essa interpretação só está autorizada a partir da edição da Lei 9.732, de 14.12.1998.
Há controvérsia acerca de ser ou não o seu fornecimento fator de afastamento da natureza especial da atividade.
Penso que a utilização do EPI - Equipamento de Proteção Individual é fator que confirma as condições especiais de trabalho. Quando o empregado necessita utilizar equipamentos de proteção na atividade que desenvolve é porque essa atividade é submetida a condições especiais. Não importa se o EPI utilizado é eficaz ou não. O que deve ser analisado é a natureza da atividade, se submetida ou não a condições especiais.
Na jurisprudência do STJ prevalece o entendimento de que o fornecimento e utilização do EPC ou EPI não descaracteriza a atividade especial (Cf. REsp 200500142380, DJ 10/04/2006).
Também nesse sentido a Súmula 9 da TNU - Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais: "O uso de Equipamento de Proteção Individual (EPI), ainda que elimine a insalubridade, no caso de exposição a ruído, não descaracteriza o tempo de serviço especial prestado".
O STF concluiu, em 04/12/2014, o julgamento do ARE 664335 (Dje 12/02/2015), com repercussão geral reconhecida, que fixa duas teses, por maioria de votos:
Quanto ao agente ruído, o Decreto 53.831/64 previu o limite mínimo de 80 decibéis para ser tido por agente agressivo - código 1.1.6 - e, assim, possibilitar o reconhecimento da atividade como especial, orientação que encontra amparo no que dispôs o art. 292 do Decreto 611/92 (RGPS). Tal norma é de ser aplicada até a edição do Decreto 2.172, de 05/03/1997, a partir de quando se passou a exigir o nível de ruído superior a 90 decibéis. Posteriormente, o Decreto 4.882, de 18.11.2003, alterou o limite vigente para 85 decibéis.
Lembro, por oportuno, o disposto na PET 9059, do Superior Tribunal de Justiça, cuja interpretação prática é:
No REsp 1398260 (Rel. Min. Herman Benjamin), em sede de recurso repetitivo, o STJ reconheceu, por maioria, a impossibilidade de aplicação retroativa do decreto que reduziu de 90 para 85 dB o limite de ruído no ambiente de trabalho para configuração do tempo de serviço especial (DJe 05/12/2014).
A autora pleiteia o reconhecimento das condições especiais de trabalho nas empresas/períodos abaixo citados:
O INSS já reconheceu administrativamente as condições especiais de trabalho de 01/12/1992 a 05/03/1997. A ausência de reconhecimento em 06/03/1997 e 07/03/1997 não gera efeitos no tempo de contribuição.
O formulário e o laudo técnico de fls. 145/150 comprovam a exposição a ruído superior a 80 dB, limite vigente à época da atividade exercida de 21/07/1981 a 19/06/1986.
A CTPS comprova que a autora trabalhou na função de rebarbadora de 18/04/1989 a 24/01/1990 e de 01/02/1990 a 16/09/1991. A atividade está enquadrada nos decretos regulamentadores (código 2.5.1 do anexo do Decreto 83.080/79).
Com o reconhecimento da atividade especial conforme acima especificado (períodos de 21/07/1981 a 19/06/1986, 18/04/1989 a 24/01/1990 e de 01/02/1990 a 16/09/1991), a autora tem direito ao benefício de aposentadoria por tempo de contribuição a partir da DER (21/05/2012).
Não é caso de retroação da DIB à data do ajuizamento. Somente com a citação, em tese, o INSS teria conhecimento do pedido, devendo ser este o termo inicial nos casos em que ausente o requerimento administrativo (como é o caso do pedido efetuado na inicial).
Porém, no caso concreto, a autora ingressou com pedido administrativo entre a data do ajuizamento e a data da citação, por força da determinação do juízo - por isso, a DIB deve ser fixada na DER original, em 25/05/2012, e não na DIB reafirmada.
As parcelas vencidas serão acrescidas de correção monetária a partir dos respectivos vencimentos e de juros moratórios a partir da citação.
A correção monetária será aplicada em conformidade com a Lei n. 6.899/81 e legislação superveniente, de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, observados os termos do julgamento final proferido na Repercussão Geral no RE 870.947, em 20.09.2017.
Os juros moratórios serão calculados de forma global para as parcelas vencidas antes da citação, e incidirão a partir dos respectivos vencimentos para as parcelas vencidas após a citação. E serão de 0,5% (meio por cento) ao mês, na forma dos arts. 1.062 do antigo CC e 219 do CPC/1973, até a vigência do CC/2002, a partir de quando serão de 1% (um por cento) ao mês, na forma dos arts. 406 do CC/2002 e 161, § 1º, do CTN. A partir de julho de 2.009, os juros moratórios serão de 0,5% (meio por cento) ao mês, observado o disposto no art. 1º-F da Lei n. 9.494/97, alterado pelo art. 5º da Lei n. 11.960/2009, pela MP n. 567, de 13.05.2012, convertida na Lei n. 12.703, de 07.08.2012, e legislação superveniente.
A autora já recebe o benefício, com o que os valores já recebidos devem ser descontados da condenação.
Honorários advocatícios fixados em 10% do valor da condenação, consideradas as prestações vencidas até a data da sentença.
DOU PARCIAL PROVIMENTO à apelação para afastar a extinção do feito sem resolução do mérito e, aplicando o art. 515, § 3º, do CPC, julgar procedente o pedido, reconhecendo as condições especiais de trabalho nos períodos pleiteados na inicial (ausente interesse de agir no período reconhecido na esfera administrativa) e conceder a aposentadoria por tempo de contribuição a partir da DER originária (21/05/2012). Correção monetária, juros e verba honorária nos termos da fundamentação.
É o voto.
OTAVIO PORT
Juiz Federal Convocado
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | OTAVIO HENRIQUE MARTINS PORT:10241 |
| Nº de Série do Certificado: | 11DE1711276A858D |
| Data e Hora: | 23/04/2018 15:49:02 |
