
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5012874-50.2021.4.03.6183
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. MARCELO VIEIRA
APELANTE: PAULO SERGIO DE MIRANDA
Advogado do(a) APELANTE: PAULO SERGIO DE MIRANDA - SP436134-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5012874-50.2021.4.03.6183
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. MARCELO VIEIRA
APELANTE: PAULO SERGIO DE MIRANDA
Advogado do(a) APELANTE: PAULO SERGIO DE MIRANDA - SP436134-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
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R E L A T Ó R I O
O EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO VIEIRA, RELATOR: Trata-se de ação ordinária em que se objetiva a concessão de aposentadoria especial ou, subsidiariamente, aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, mediante o reconhecimento de tempo comum e de período(s) trabalhado(s) em atividades especiais, sua conversão em tempo comum e cômputo aos demais períodos de trabalho urbano.
A sentença julgou improcedentes os pedidos relativos ao cômputo dos períodos de 01.09.1988 a 22.02.1990 (QUIMIS APARELHOS CIENTÍFICOS), 09.10.1990 a 04.12.1990 (SATIVA WORLD INDUSTRIAL LTDA), 01.04.1991 a 26.08.1991 (DEMEC INDÚSTRIA MECÂNICA LTDA), 14.01.1992 a 14.02.2013 (POLÍCIA MILITAR DO ESTADO DE SAO PAULO) e 01.10.2013 a 31.05.2016 (PRESSSEG SERVIÇOS DE SEGURANÇA), como exercidos em atividades especiais, e à condenação do INSS à concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, pleito afeto ao NB 42/199.292.047-5. Condenou a parte autora ao pagamento da verba honorária, arbitrada em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, ficando suspensa a execução, nos termos do artigo 98, parágrafos 2º e 3º do Código de Processo Civil. Custas na forma da lei.
Apela a parte autora, requerendo: a) o reconhecimento das atividades prestadas em período anterior à Lei 9.032/95, presunção “jures et de jure” de exposição a agentes nocivos em relação às categorias profissionais e ocupações previstas nos Decretos 53.831/64 e 83.080/79; b) o reconhecimento da atividade especial desempenhada como supervisor operacional de vigilante em postos de serviços armados ou, subsidiariamente, o sobrestamento dos pedidos iniciais principais (aposentadoria especial), até a decisão do Tema nº 1031; d) a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, após a conversão do tempo especial em comum Tema 942; c) a concessão da aposentadoria especial, somando se todos os períodos laborados em atividade especial: 09/10/1990 a 04/12/1990 - SATIVA WORLD INDUSTRIAL LTDA - 01/09/1988 a 22/02/1990 QUIMIS APARELHOS CIENTIFICOS - 01/04/1991 a 26/08/1991 – DEMEC INDUSTRIA - 14/01/1992 e 13/02/2013 POLÍCIA MILITAR DO ESTADO DE SÃO PAULO – 01/10/2013 a 31/05/2016 PRESSSEG SERVIÇOS DE SEGURANÇA. Em síntese: pleiteia condenação do INSS à concessão do benefício de Aposentadoria por Tempo de Contribuição e/ou Aposentadoria Especial, desde a data de entrada do requerimento (DER) em 20/08/2020, ou alternativamente, a concessão do benefício mais vantajoso, inclusive com a reafirmação da DER para a data em que todos os requisitos foram cumpridos, com a incidência de juros e correção monetária conforme Manual de Cálculos da Justiça Federal.
Sem contrarrazões, vieram os autos a este Tribunal.
É o relatório.
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5012874-50.2021.4.03.6183
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. MARCELO VIEIRA
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V O T O
O EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO VIEIRA, RELATOR: Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do(s) recurso(s) de apelação.
Preliminarmente, passo à análise da questão relativa à suposta ilegitimidade passiva ad causam do INSS quanto ao reconhecimento da especialidade do período de serviço militar estadual (14/01/92 a 14/02/2013).
Dispõe o art. 201, da Constituição Federal:
"Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados os critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a:
(...)
§ 9º. Para efeito de aposentadoria, é assegurada a contagem recíproca do tempo de contribuição na administração pública e na atividade privada, rural e urbana, hipótese em que os diversos regimes de previdência social se compensarão financeiramente, segundo critérios estabelecidos em lei".
A Lei de Benefícios disciplina ainda a contagem recíproca de tempo de serviço no caput do artigo 94 e inciso IV do artigo 96, que transcrevo:
"Art. 94. Para efeito dos benefícios previstos no Regime Geral de Previdência Social ou no serviço público é assegurada a contagem recíproca do tempo de contribuição na atividade privada, rural e urbana, e do tempo de contribuição ou de serviço na administração pública, hipótese em que os diferentes sistemas de previdência social se compensarão financeiramente." (Redação dada pela Lei nº 9.711, de 20.11.98)
"Art. 96. O tempo de contribuição ou de serviço de que trata esta Seção será contado de acordo com a legislação pertinente, observadas as normas seguintes:
I - não será admitida a contagem em dobro ou em outras condições especiais;(...)
Nos termos do art. 201, § 9º da Constituição Federal, bem como dos artigos 94, caput e 96 ambos da Lei nº 8.213/91, assegura-se ao INSS o direito de consignar na certidão de tempo de serviço a falta de recolhimento ou indenização das contribuições previdenciárias correspondentes ao período, para fins de contagem recíproca junto ao regime próprio de previdência do autor.
A iniciativa da compensação entre o Regime Geral da Previdência Social e o regime estatutário, e a correspondente prova da indenização, deverá partir do regime em que for concedido o benefício, consoante a elucidativa ementa do julgado seguinte:
"AGRAVO LEGAL. AVERBAÇÃO DE TEMPO DE SERVIÇO URBANO EXERCIDO SEM REGISTRO. PARCIAL PROCEDÊNCIA. SERVIDOR PÚBLICO. CONTAGEM RECÍPROCA. EXPEDIÇÃO DA RESPECTIVA CERTIDÃO DE TEMPO DE SERVIÇO URBANO VINCULADO AO REGIME GERAL. POSSIBILIDADE. EXERCÍCIO DO PODER-DEVER DO INSS. AGRAVO LEGAL DESPROVIDO.
- No presente caso, a parte autora afirma que trabalhou no escritório da Fazenda Cachoeira, na função de auxiliar de escritório, no período de 16.06.80 a 31.07.85. - Com respeito ao exercício da atividade urbana, o conjunto probatório revela razoável início de prova material. - De sua vez, a prova testemunhal corrobora a documentação contemporânea aos fatos e basta à comprovação da atividade de trabalhador urbano, para efeito de cômputo do tempo de serviço do segurado. - Comprovado se acha, portanto, o tempo de serviço no período de 20.01.84 a 1º.01.85.
- Cumpre salientar que incumbe aos empregadores recolher as contribuições previdenciárias, em decorrência da relação de emprego, a teor do art. 5º, I, e art. 69, I e III, da L. 3.807/60. - A certidão a ser expedida é assegurada a todos, nos termos do artigo 5º, XXXIV, "b", da Constituição, pois, no caso em tela, a sua obtenção se destina à defesa de direitos e esclarecimentos de situações de interesse pessoal relacionados à contagem recíproca. - Aliás, pondo uma pá de cal nessa questão, cumpre ter em mente que, na hipótese vertente, a autarquia carece de legitimidade para opor-se à certidão de contagem recíproca, em alegando faltar a indenização das contribuições correspondentes ao período reconhecido.
- Em sendo caso de servidor público, sempre quem tem essa legitimidade é o regime instituidor do beneficio, nos termos do artigo 4º da L. 9.796/99, isto porque a contagem recíproca é direito assegurado pela Constituição, independentemente de compensação financeira entre os regimes de previdência social, e pode nem sequer se concretizar se por algum motivo o servidor não utilizar a certidão. - Destarte, a legitimidade para exigir a prova da indenização das contribuições é do regime instituidor do benefício, isto é, do regime próprio do servidor (RPPS), por isso mesmo, reconhecido o tempo de serviço, descabe ao regime de origem (INSS) recusar-se a cumprir seu dever-poder de expedir a certidão de contagem recíproca. - Ressalte-se, com isso, que a parte autora, enquanto filiada ao Regime Geral de Previdência Social (RGPS), não está obrigada ao recolhimento das contribuições para aposentar-se (RE 148.510 SP, Min. Marco Aurélio). - Não, porém, quando se cogitar de regime próprio, pois, nesta hipótese, a autarquia poderá consignar que a utilização do tempo certificado, para fins de benefício em regime diverso do RGPS, poderá gerar indenização das contribuições previdenciárias correspondentes ao período trabalhado. - Agravo legal desprovido.(AC 00352224920014039999, DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS, TRF3 - SÉTIMA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:26/06/2013 .FONTE_REPUBLICACAO:.)
Constata-se que o autor pleiteia aposentadoria especial ou, subsidiariamente, aposentadoria por tempo de serviço/contribuição perante o Regime Geral de Previdência, mediante o reconhecimento de atividades especiais exercidas perante o regime geral da previdência, enquanto celetista e da atividade militar regida pelo regime próprio de previdência.
Neste contexto, no pertinente ao reconhecimento das atividades especiais exercidas por policiais militares estaduais, no caso em tela no período compreendido de 14/01/92 a 14/02/2013, o tema tem merecido atenção específica dos tribunais.
Nos casos em que a migração de regime ocorre compulsoriamente pela lei, o Supremo Tribunal Federal tem entendido possível a conversão de tempo de serviço especial, desde que anterior ao advento da Lei nº 8.112/90, pois a partir daí seria necessária a devida regulamentação exigida pela CF no artigo 40, §4º.
Contudo, no julgamento do Mandado de Injunção nº 721, em 30/11/2007, de Relatoria do Ministro Marco Aurélio, o STF considerou superada a exigência da regulamentação, reconhecendo à servidora o direito à aposentadoria especial, tendo em vista que o regime geral já disciplinava a matéria, conforme se verifica da transcrição do aresto:
"MANDADO DE INJUNÇÃO - NATUREZA. Conforme disposto no inciso LXXI do artigo 5º da Constituição Federal, conceder-se-á mandado de injunção quando necessário ao exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania. Há ação mandamental e não simplesmente declaratória de omissão. A carga de declaração não é objeto da impetração, mas premissa da ordem a ser formalizada.
MANDADO DE INJUNÇÃO - DECISÃO - BALIZAS. Tratando-se de processo subjetivo, a decisão possui eficácia considerada a relação jurídica nele revelada.
APOSENTADORIA - TRABALHO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS - PREJUÍZO À SAUDE DO SERVIDOR - INEXISTÊNCIA DE LEI COMPLEMENTAR - ARTIGO 40, §4º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. Inexistente a disciplina específica da aposentadoria especial do servidor, impõe-se a adoção, via pronunciamento judicial, daquela própria aos trabalhadores em geral - artigo 57,§1º, da Lei 8.213/91."
Assim, não resta dúvida ser possível o reconhecimento das atividades especiais.
No entanto, para o reconhecimento das atividades especiais do servidor, a ação deve ser proposta contra o ente público que arcará com o benefício de aposentadoria ou, em casos como o presente, em que se pleiteia a contagem recíproca, que arcará com a indenização ao órgão concessor, inclusive do tempo ficto.
Dessa forma, entendo que, no pertinente ao período de 14/01/92 a 14/02/2013 o INSS é parte ilegítima para o reconhecimento das atividades especiais, cabendo à parte autora demandar perante aquele Estado pugnando pelo reconhecimento judicial da insalubridade, razão pela qual a ação deve ser extinta quanto a tal período.
Por outro lado, não há óbice quanto à apreciação do pleito relativo ao reconhecimento das atividades especiais exercidas enquanto celetista, vez que vinculado ao regime geral da previdência, não sendo hipótese de ilegitimidade passiva do INSS.
Dessa forma, de ofício, julgo extinto o processo sem resolução do mérito, ante a ilegitimidade passiva ad causam relativamente ao reconhecimento das atividades especiais exercidas como policial militar estadual (14/01/92 a 14/02/2013).
Passo ao exame do mérito.
Aposentadoria por tempo de serviço/contribuição – requisitos
A aposentadoria por tempo de serviço, atualmente denominada aposentadoria por tempo de contribuição, admitia a forma proporcional e a integral antes do advento da Emenda Constitucional 20/98, fazendo jus à sua percepção aqueles que comprovem tempo de serviço (25 anos para a mulher e 30 anos para o homem na forma proporcional, 30 anos para a mulher e 35 anos para o homem na forma integral) desenvolvido totalmente sob a égide do ordenamento anterior, respeitando-se, assim, o direito adquirido.
Aqueles segurados que já estavam no sistema e não preencheram o requisito temporal à época da Emenda Constitucional 20 de 15 de dezembro de 1998, fazem jus à aposentadoria por tempo de serviço proporcional desde que atendam às regras de transição expressas em seu art. 9º, caso em que se conjugam o requisito etário (48 anos de idade para a mulher e 53 anos de idade para o homem) e o requisito contributivo (pedágio de 40% de contribuições faltantes para completar 25 anos, no caso da mulher e para completar 30 anos, no caso do homem).
Assim, até a edição da EC 113/2019, eram requisitos para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, de acordo com os arts. 52 e 142 da Lei 8.213/91, a carência e o recolhimento de contribuições (30 anos para a mulher e 35 anos para o homem), ressaltando-se que o tempo de serviço prestado anteriormente à referida Emenda equivale a tempo de contribuição, a teor do art. 4º da Emenda Constitucional 20/98.
Aposentadoria Especial
A aposentadoria por tempo de serviço especial teve assento primeiro no artigo 31 da Lei nº 3.807, de 26 de agosto de 1960, Lei Orgânica da Previdência Social - LOPS, que estabeleceu que seria concedida ao segurado que, contando no mínimo 50 (cinquenta) anos de idade e 15 (quinze) anos de contribuições, tivesse trabalhado durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade profissional, em serviços que, para esse efeito, fossem considerados penosos, insalubres ou perigosos, por Decreto do Poder Executivo.
Prevê ainda, o mencionado diploma legal, no art. 162, o reconhecimento de atividade especial prestada em data anterior à sua edição, na hipótese de seu cômputo ser mais benéfico ao segurado.
Como assentado pelas Cortes Superiores "tal hipótese, apesar de similar, não se confunde com a questão da legislação aplicável ao caso de concessão de aposentadoria, tampouco com aquela que diz respeito à possibilidade de aplicação retroativa da lei nova que estabeleça restrição ao cômputo do tempo de serviço. (...) Interpretação diversa levaria à conclusão de que o segurado, sujeito a condições insalubres de trabalho, só teria direito à aposentadoria especial após 15, 20 e 25 anos de trabalho exercida depois da Lei nº 3.807/60, desconsiderando, portanto, todo o período de labor, também exercido em tal situação, porém em data anterior à lei de regência." (Ag Rg no REsp nº 1015694, Sexta Turma, Rel. Min. Maria Thereza Assis de Moura, DJe 01/02/2011)
Essa norma foi expressamente revogada pela Lei nº 5.890, de 8 de junho de 1973, que passou a discipliná-la no artigo 9º, alterando, em efeitos práticos, apenas o período de carência de 15 (quinze) anos para 5 (cinco) anos de contribuição, mantendo no mais a redação original.
Sobreveio, então, o Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, reclassificando as atividades profissionais segundo os agentes nocivos e os grupos profissionais tidos por perigosos, insalubres ou penosos, com os respectivos tempos mínimos de trabalho.
Importante ressaltar que os Decretos nºs. 53.831/64 e 83.080/79 tiveram vigências simultâneas, de modo que, conforme reiteradamente decidido pelo C. STJ, havendo colisão entre as mencionadas normas, prevalece a mais favorável ao segurado. (REsp nº 412351, 5ª Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 21/10/2003, DJ 17/11/2003, pág. 355).
As atividades insalubres previstas nas aludidas normas são meramente exemplificativas, podendo outras funções ser assim reconhecidas, desde que haja similitude em relação àquelas legalmente estatuídas ou, ainda, mediante laudo técnico-pericial demonstrativo da nocividade da ocupação exercida. Nesse sentido, o verbete 198 da Súmula do TFR.
Após a promulgação da Constituição Federal de 1988, a matéria passou a ser prevista no inciso II do artigo 202 e disciplinada no artigo 57 da Lei nº 8.213/91, cuja redação original previa que o benefício de aposentadoria especial seria devido ao segurado que, após cumprir a carência exigida, tivesse trabalhado durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade profissional, sujeito a condições especiais que prejudicassem a saúde ou a integridade física, restando assegurada, ainda, a conversão do período trabalhado no exercício de atividades danosas em tempo de contribuição comum (§3º).
Em seguida, foi editada a Lei nº 9.032/95, alterando o artigo 57 da Lei nº 8.213/91, dispondo que a partir desse momento não basta mais o mero enquadramento da atividade exercida pelo segurado na categoria profissional considerada especial, passando a ser exigida a demonstração da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, que poderá se dar por meio da apresentação de informativos e formulários, tais como o SB-40 ou o DSS-8030.
Posteriormente, com a edição do Decreto n.º 2.172, de 05/03/1997, que estabeleceu requisitos mais rigorosos para a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, passou-se a exigir-se a apresentação de laudo técnico para a caracterização da condição especial da atividade exercida. Todavia, por se tratar de matéria reservada à lei, tal exigência apenas tem eficácia a partir da edição da Lei n.º 9.528, de 10/12/1997.
Cumpre observar que a Lei nº 9528/97 também passou a aceitar o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP, documento que busca retratar as características de cada emprego do segurado, de forma a facilitar a futura concessão de aposentadoria especial. Assim, identificado no documento o perito responsável pela avaliação das condições de trabalho, é possível a sua utilização para comprovação da atividade especial em substituição ao laudo pericial.
Ressalto que no tocante ao reconhecimento da natureza da atividade exercida pelo segurado e à forma da sua demonstração, deve ser observada a legislação vigente à época da prestação do trabalho, conforme jurisprudência pacificada da matéria (STJ - Pet 9.194/PR, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 28/05/2014, DJe 03/06/2014).
Nos termos da Súmula nº 68 da TNU, “o laudo pericial não contemporâneo ao período trabalhado é apto à comprovação da atividade especial do segurado”. A extemporaneidade do documento comprobatório das condições especiais de trabalho não prejudica o seu reconhecimento como tal, "pois a situação em época remota era pior ou ao menos igual a constatada na data da elaboração do laudo, tendo em vista que as condições do ambiente de trabalho só melhoraram com a evolução tecnológica."(Des. Fed. Fausto De Sanctis, AC nº 2012.61.04.004291-4, j. 07/05/2014); “inexiste exigência legal de contemporaneidade dos documentos técnicos que comprovam o exercício de labor especial” (8ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5008647-15.2021.4.03.6119, Rel. Desembargador Federal DAVID DINIZ DANTAS, julgado em 09/08/2022, DJEN DATA: 12/08/2022).
Uso de equipamento de proteção individual - EPI, como fator de descaracterização do tempo de serviço especial
A questão foi decidida pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do ARE nº 664335, da relatoria do E. Ministro Luiz Fux, com reconhecimento de repercussão geral, na data de 04.12.2014, em que restou decidido que o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo constitucional ao reconhecimento das atividades especiais.
O fato de a empresa fornecer equipamento de proteção individual - EPI para neutralização dos agentes agressivos não afasta, por si só, a contagem do tempo especial, pois cada caso deve ser examinado em suas peculiaridades, comprovando-se a real efetividade do aparelho e o uso permanente pelo empregado durante a jornada de trabalho. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça (AgInt no AREsp n. 1.889.768/MG, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 22/11/2021, DJe de 10/12/2021; REsp n. 1.800.908/RS, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 11/4/2019, DJe de 22/5/2019; REsp 1428183/RS, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 25/02/2014, DJe 06/03/2014).
Conversão do tempo de serviço especial em comum
Deve ser afastada qualquer tese de limitação temporal de conversão de tempo de serviço especial em comum, seja em períodos anteriores à vigência da Lei nº 6.887, de 10/12/1980, ou posteriores a Lei nº 9.711, de 20/11/1998, permanecendo, assim, a possibilidade legal de conversão, inclusive para períodos posteriores a maio de 1998, uma vez que a norma prevista no artigo 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91 permanece em vigor, tendo em vista que a revogação pretendida pela 15ª reedição da MP 1663 não foi mantida quando da conversão na Lei nº 9.711/98. Nesse sentido decidiu a Terceira Seção do STJ no Resp 1.151.363/MG, Relator Ministro Jorge Mussi, data do julgamento: 23/03/2011.
O Decreto nº 83.080/79 foi renovado pelo Decreto nº 3.048/99 e este, por sua vez, prevê expressamente em seu art. 70 e seguintes (na redação dada pelo Decreto nº 4.827/03), que os fatores de conversão (multiplicadores) nele especificados aplicam-se na conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade comum ao trabalho prestado em qualquer período.
Fonte de custeio
Quanto à alegação de necessidade de prévio custeio, cumpre ressaltar inexistir vinculação do ato de reconhecimento de tempo de atividade perigosa/nociva ao eventual pagamento de encargos tributários com alíquotas diferenciadas, eis que os artigos 57 e 58 da Lei nº 8.213/91 não demandam tal exigência, que constituiria encargo para o empregador, não podendo o empregado ser por isso prejudicado. Assim já definiu o C. STF, ao apreciar o tema em repercussão geral ARE nº 664.335/SC, Rel. Ministro Luiz Fux, Tribunal Pleno, j. 09/12/2014, DJE 27/03/2015.
Caso concreto - elementos probatórios
Atividade especial
Para comprovar a especialidade dos períodos de 01/09/88 a 22/02/90, 09/10/90 a 04/12/90 e 01/04/91 a 26/08/91, o autor apresentou:
- cópia da sua CTPS, na qual consta que exerceu atividade como auxiliar de pintura, de 01/09/88 a 22/02/90; “pintor em fiber-glas”, de 09/10/90 a 04/12/90, e ½ oficial pintor de 01/04/91 a 26/08/91 (ID 289109701 - Pág. 3/4);
- PPP, relativo aos períodos de 01/09/88 a 30/07/89 e de 01/07/89 a 22/02/90, no qual consta que exerceu as atividades de auxiliar de pintura e de ½ oficial pintor, respectivamente.
No entanto, para comprovar a especialidade da atividade de pintor há necessidade de comprovação de utilização de pistola a revólver, nos termos do código 2.5.4 do Decreto nº 53.831/54, o que não restou demonstrado pelos mencionados documentos .
Ante a não comprovação da utilização de tal instrumento de trabalho, inviável o reconhecimento da especialidade dos períodos citados.
Em relação ao período de 01/10/2013 a 31/05/2016, o autor apresentou o PPP de ID 289109705 - Pág. 1/3, no qual consta que exerceu função de ‘supervisão’, com risco à ‘integridade física’, e não especificamente de vigia, como alegado na inicial, o que demonstra a prevalência de atribuições de natureza administrativa/gerencial. Assim, inviável o reconhecimento da especialidade de tal período.
Como bem ressaltou o juiz a quo, em ID 289110063 - Pág. 9, em relação à questão do Tema 1209 do STJ: “não havendo reconhecimento da especialidade do período objeto do Tema Repetitivo, não há óbice ao regular prosseguimento do feito, pois, nos exatos termos do v. acórdão, ‘cumpre afastar, pois, a suspensão determinada pelo Magistrado a quo, prosseguindo-se com a regular instrução do feito até a análise do pedido subsidiário, sendo cabível o sobrestamento apenas na hipótese de enfrentamento do pedido principal de concessão de aposentadoria especial, com reconhecimento da especialidade de vigilante [grifo deste Juízo]’.”
Considerando que a soma dos períodos comuns não perfaz o tempo necessário à concessão do benefício de aposentadoria por tempo de serviço, deve ser mantida a sentença de improcedência.
Tendo em vista o não provimento do recurso, de rigor a aplicação da regra do §11 do artigo 85 do CPC/2015, pelo que determino, a título de sucumbência recursal, a majoração dos honorários de advogado arbitrados na sentença em 2% (dois por cento), cuja exigibilidade, nos casos de beneficiário da assistência judiciária gratuita, fica suspensa e condicionada à hipótese prevista no §3º do artigo 98 da Lei Processual em vigor.
Ante o exposto, de ofício, julgo extinto o feito, sem resolução do mérito, pela ilegitimidade passiva ad causam do INSS, relativamente ao reconhecimento da atividade exercida no Regime Próprio de Previdência (14/01/92 a 14/02/2013), nego provimento à apelação da parte autora e, com fulcro no §11 do art. 85 do CPC, majoro os honorários de advogado em 2% sobre o valor arbitrado, nos termos da fundamentação, mantida, no mais, a sentença recorrida.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSUM. INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA. REGIME PRÓPRIO DE PREVIDÊNCIA. APELAÇÃO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. NÃO COMPROVAÇÃO DAS CONDIÇÕES ESPECIAIS. NÃO IMPLEMENTAÇÃO DOS REQUISITOS. SUCUMBÊNCIA RECURSAL. HONORÁRIOS DE ADVOGADO MAJORADOS.
1. Extinção do feito, de ofício, sem resolução do mérito, pela ilegitimidade passiva ad causam do INSS relativamente ao reconhecimento da atividade exercida no Regime Próprio de Previdência ().
2. Regime próprio de previdência - para o reconhecimento das atividades do servidor, a ação deve ser proposta contra o ente público que arcará com o benefício de aposentadoria ou, em casos como o presente, em que se pleiteia a contagem recíproca, que arcará com a indenização ao órgão concessor, inclusive do tempo ficto.
3. São requisitos para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, de acordo com os arts. 52 e 142 da Lei 8.213/91, a carência e o recolhimento de contribuições, ressaltando-se que o tempo de serviço prestado anteriormente à Emenda Constitucional 20/98 equivale a tempo de contribuição, a teor do seu art. 4º.
4. Deve ser observada a legislação vigente à época da prestação do trabalho para o reconhecimento da natureza da atividade exercida pelo segurado e os meios de sua demonstração.
5. A especialidade do tempo de trabalho é reconhecida por mero enquadramento legal da atividade profissional (até 28/04/95), por meio da confecção de informativos ou formulários (no período de 29/04/95 a 10/12/97) e via laudo técnico ou Perfil Profissiográfico Previdenciário (a partir de 11/12/97).
6. Inviabilidade de reconhecimento da especialidade dos períodos de atividade exercidos na função de pintor (sem pistola a revólver) e de supervisor operacional.
7. A parte autora não implementou os requisitos necessários à concessão do benefício.
8. Sucumbência recursal. Honorários de advogado majorados em 2% do valor arbitrado na sentença. Artigo 85, §11, Código de Processo Civil/2015. Exigibilidade condicionada à hipótese prevista no §3º do artigo 98 da Lei Processual em vigor.
9. De ofício, extinção do feito sem resolução do mérito em relação ao reconhecimento da atividade exercida no Regime Próprio de Previdência. Apelação da parte autora não provida.
ACÓRDÃO
DESEMBARGADOR FEDERAL
