D.E. Publicado em 11/07/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, em sede de juízo de retratação, dar provimento ao agravo legal interposto pelo Ministério Público Federal, reformando o v. acórdão de fls. 114/118, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | DAVID DINIZ DANTAS:10074 |
Nº de Série do Certificado: | 11A217051057D849 |
Data e Hora: | 27/06/2017 16:50:04 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0020614-60.2012.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Trata-se de ação ajuizada por Aparecido da Silva Mello em face do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, com vistas à concessão de benefício assistencial, previsto no art. 203, inc. V, da Constituição Federal.
Na sessão de julgamento realizada aos 14.07.2014, esta E. Oitava Turma, à unanimidade, conheceu dos embargos de declaração opostos pelo Ministério Público Federal como agravo legal, aplicando o regramento estabelecido pelo princípio da fungibilidade recursal, porém, negou-lhe provimento (fls. 114/118).
Em face deste decisório, o Ministério Público Federal interpôs Recurso Extraordinário (fls. 121/126) e Recurso Especial (fls. 181/186).
Inicialmente, nenhum dos recursos foi admitido pela E. Vice-Presidência deste Tribunal (fls. 240/242 e fls. 243/245), o que ensejou, por parte do Ministério Público Federal, a interposição de recursos de agravo (fls. 247/252).
À fl. 262, o C. Superior Tribunal de Justiça determinou o retorno dos autos a esta E. Corte, para observância da sistemática dos recursos repetitivos, nos termos dos arts. 1.040, inc. II e 1.041, ambos do CPC.
Ciência do MPF (fl. 266).
Assim, mediante determinação do C. STJ, em novo juízo de admissibilidade, a E. Vice-Presidência desta Corte determinou o retorno dos autos a esta C. Turma, para os fins do artigo 543-C, §7º, inc. II, do CPC/1973 (atual art. 1.030, inc. II, do CPC/2015), à vista do julgamento do Recurso Especial nº 1.355.052/SP (fls. 272/273).
É o relatório.
Desembargador Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | DAVID DINIZ DANTAS:10074 |
Nº de Série do Certificado: | 11A217051057D849 |
Data e Hora: | 27/06/2017 16:50:01 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0020614-60.2012.4.03.9999/SP
VOTO
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
As Leis nºs 11.418/2006 e 11.672/2008 alteraram a sistemática dos recursos dirigidos às Cortes Superiores, introduzindo o pressuposto atinente a repercussão geral da matéria, além da disciplina para julgamento de recursos repetitivos.
Essas alterações abrem a via extraordinária apenas para as causas com relevância econômica, política, social ou jurídica, afastando os julgamentos com interesses meramente individuais, cingidos aos limites subjetivos da causa.
Ao mesmo tempo, a nova sistemática obsta a inútil movimentação judiciária, para deslinde de feitos meramente repetitivos, ao possibilitar a extensão do julgamento de mérito a recursos fundamentados na mesma controvérsia.
Nessa última hipótese, os recursos pendentes de admissibilidade nos Tribunais inferiores devem retornar às Turmas Julgadoras, para eventual retratação, nos termos do art. 543-B, § 3º e 543-C, § 7º, inc. II, do CPC/1973.
Na hipótese dos autos, foi invocado o Recurso Especial nº 1.355.052/SP como representativo da controvérsia.
A questão cinge-se à comprovação do requisito da miserabilidade para fins de concessão do benefício assistencial.
In casu, analisando a decisão recorrida, verifico ser hipótese de retratação, nos termos que seguem:
O benefício de assistência social foi instituído com o escopo de prestar amparo aos idosos e deficientes que, em razão da hipossuficiência em que se acham, não tenham meios de prover a própria subsistência ou de tê-la provida por suas respectivas famílias. Neste aspecto está o lastro social do dispositivo inserido no art. 203, inc. V, da Constituição Federal, que concretiza princípios fundamentais, tais como o de respeito à cidadania e à dignidade humana, ao preceituar o seguinte:
"Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social e tem por objetivos:
(...)
V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria subsistência ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei".
De outro giro, os arts. 20, § 3º, da Lei n.º 8.742/93, com redação dada pela Lei n.º 12.435, de 06 de julho de 2011, e o art. 34, da Lei n.º 10.741 (Estatuto do Idoso), de 1º de outubro de 2003 rezam, in verbis:
"Art. 20. O Benefício de prestação continuada é a garantia de um salário mínimo mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais e que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.
§ 3º - Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa a família cuja renda "per capita" seja inferior a ¼ do salário mínimo".
"Art. 34. Aos idosos, a partir de 65 (sessenta e cinco) anos, que não possuam meios para prover sua subsistência, nem de tê-la provida por sua família, é assegurado o benefício mensal de 1(um) salário-mínimo, nos termos da Lei da Assistência Social - Loas.
Parágrafo único. O benefício já concedido a qualquer membro da família nos termos do caput não será computado para os fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a Loas."
O apontado dispositivo legal, aplicável ao idoso, procedeu a uma forma de limitação do mandamento constitucional, eis que conceituou como pessoa necessitada, apenas, aquela cuja família tenha renda inferior à 1/4 (um quarto) do salário-mínimo, levando em consideração, para tal desiderato, cada um dos elementos participantes do núcleo familiar, exceto aquele que já recebe o benefício de prestação continuada, de acordo com o parágrafo único, do art. 34, da Lei n.º 10.741/2003.
De mais a mais, a interpretação deste dispositivo legal na jurisprudência tem sido extensiva, admitindo-se que a percepção de benefício assistencial, ou mesmo previdenciário com renda mensal equivalente ao salário mínimo, seja desconsiderada para fins de concessão do benefício assistencial previsto na Lei n.º 8.742/93.
Ressalte-se, por oportuno, que os diplomas legais acima citados foram regulamentados pelo Decreto n.º 6.214/07, o qual em nada alterou a interpretação das referidas normas, merecendo destacamento o art. 4º, inc. VI e o art. 19, caput e parágrafo único do referido decreto, in verbis:
"Art. 4º Para fins do reconhecimento do direito ao benefício, considera-se:
(...)
VI - renda mensal bruta familiar: a soma dos rendimentos brutos, auferidos mensalmente pelos membros da família composta por salários, proventos, pensões, pensões alimentícias, benefícios da previdência pública ou privada, comissões, pró-labore, outros rendimentos do trabalho não assalariado, rendimentos do mercado informal ou autônomo, rendimentos auferidos do patrimônio, Renda Mensal Vitalícia e Benefício de Prestação Continuada, ressalvado o disposto no parágrafo único do art. 19".
"Art 19. O Benefício de Prestação Continuada será devido a mais de um membro da mesma família enquanto atendidos os requisitos exigidos neste Regulamento.
Parágrafo único. O valor do Benefício de Prestação Continuada concedido a idoso não será computado no cálculo da renda mensal bruta familiar a que se refere o inciso VI do art. 4º, para fins de concessão do Benefício de Prestação Continuada a outro idoso da mesma família".
A inconstitucionalidade do parágrafo 3º do art. 20 da mencionada Lei n.º 8.742/93 foi arguida na ADIN n.º 1.232-1/DF que, pela maioria de votos, do Plenário do Supremo Tribunal Federal, foi julgada improcedente. Para além disso, nos autos do agravo regimental interposto na reclamação n.º 2303-6, do Rio Grande do Sul, interposta pelo INSS, publicada no DJ de 01.04.2005, p. 5-6, Rel. Min. Ellen Gracie, o acórdão do STF restou assim ementado:
"RECLAMAÇÃO. SALÁRIO MÍNIMO. PORTADOR DE DEFICIÊNCIA E IDOSO. ART. 203. CF.
- A sentença impugnada ao adotar a fundamentação defendida no voto vencido afronta o voto vencedor e assim a própria decisão final da ADI 1232.
- Reclamação procedente".
Evidencia-se que o critério fixado pelo § 3º do art. 20 da LOAS é o único apto a caracterizar o estado de necessidade indispensável à concessão da benesse em tela. Em outro falar, aludida situação de fato configuraria prova inconteste de necessidade do benefício constitucionalmente previsto, de modo a tornar dispensável elementos probatórios outros.
Assim, deflui dessa exegese o estabelecimento de presunção objetiva absoluta de estado de penúria ao idoso ou deficiente cuja partilha da renda familiar resulte para si montante inferior a 1/4 do salário mínimo.
Não se desconhece notícia constante do Portal do Supremo Tribunal Federal, de que aquela Corte, em recente deliberação, declarou a inconstitucionalidade dos dispositivos legais em voga (Plenário, na Reclamação n.º 4374, e Recursos Extraordinários - REs n.º 567985 e n.º 580963, estes com repercussão geral, em 17 e 18 de abril de 2013, reconhecendo-se superado o decidido na ADI n.º 1.232-DF), do que não mais se poderá aplicar o critério de renda per capita de ¼ do salário mínimo para fins de aferição da miserabilidade.
Em outras palavras: deverá sobrevir análise da situação de hipossuficiência porventura existente, consoante à renda informada, caso a caso.
In casu, a despeito do posicionamento adotado por esta E. Corte, forçoso considerar que ficou suficientemente comprovado que a parte autora não possuía condições de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família.
Observo que o estudo social acostado às fls. 59/60 realizado em meados de 2011, demonstra que o autor, na ocasião com 71 anos de idade, residia apenas com sua esposa, Sra. Maria Aparecida Silvério da Silva, de 68 anos de idade. Residiam em casa própria, composta por sala, cozinha, três dormitórios, banheiro e salão comercial, em bom estado de conservação e equipada com móveis simples e utensílios básicos.
Anote-se que, a despeito da menção à existência de um salão comercial no imóvel em questão, não há nos autos qualquer informação atinente a eventual locação do espaço ou à existência de contrapartida financeira em favor do demandante que permitisse concluir pelo acréscimo de seu rendimento mensal.
Assim, restou demonstrado que a renda familiar mensal atingia o montante de R$ 795,00 (setecentos e noventa e cinco reais), sendo composta pelo rendimento proveniente da aposentadoria da esposa do demandante, no valor de R$ 545,00 (quinhentos e quarenta e cinco reais), acrescido ao valor de R$ 250,00 (duzentos e cinquenta reais), oriundo da atividade de autônomo desenvolvida pelo próprio requerente. Frise-se que o referido estudo social foi elaborado em meados de 2011, ocasião em que o salário mínimo mensal estabelecido era de R$ 545,00 (quinhentos e quarenta e cinco reais).
Nesse contexto, excluindo-se do valor do benefício percebido pela esposa do autor, no valor de um salário mínimo, não restaria renda suficiente para a manutenção da família, haja vista a informação no sentido de que os gastos mensais alcançavam o valor de R$ 545,37 (quinhentos e quarenta e cinco reais e trinta e sete centavos).
No mais, considerando-se a idade avançada do casal, aliada à precariedade da saúde de ambos, temos que a hipossuficiência econômica, para fins de concessão do benefício assistencial, restou demonstrada.
Neste diapasão, comprovados pela parte autora todos os requisitos necessários, faz ela jus à concessão do benefício assistencial, devendo ser reformado o julgado na íntegra.
O termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo.
A correção monetária e os juros moratórios incidirão nos termos do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal em vigor, por ocasião da execução do julgado.
Fixo a verba honorária em 10% (dez por cento), considerados a natureza, o valor e as exigências da causa, sobre as parcelas vencidas até a data deste decisum, nos termos da Súmula n.º 111 do STJ.
Pelas razões expostas, em sede de juízo de retratação, nos termos do art. 543, § 7º, inc. II, do CPC/1973 (correspondente ao art. 1030, inc. II, do CPC/2015), dou provimento ao agravo legal interposto pelo Ministério Público Federal, reformando o decisum de fls. 114/118.
Retornem os autos à Vice Presidência.
É como voto.
Desembargador Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | DAVID DINIZ DANTAS:10074 |
Nº de Série do Certificado: | 11A217051057D849 |
Data e Hora: | 27/06/2017 16:50:08 |