Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / MS
5003131-48.2020.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal THEREZINHA ASTOLPHI CAZERTA
Órgão Julgador
8ª Turma
Data do Julgamento
14/12/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 17/12/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. ART. 203, INCISO V, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. BENEFÍCIO DE
PRESTAÇÃO CONTINUADA. PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA. EXIGÊNCIA DE
COMPROVAÇÃO CUMULATIVA DE IMPEDIMENTO DE LONGO PRAZO E DE
HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA. AUSÊNCIA DE MISERABILIDADE. IMPOSSIBILIDADE DE
CONCESSÃO DO AMPARO ASSISTENCIAL.
- O benefício de prestação continuada exige para a sua concessão que a parte comprove,
alternativamente, ter idade igual ou superior a 65 anos ou deter impedimento de longo prazo de
natureza física, mental, intelectual ou sensorial e, cumulativamente, não possuir meios de prover
à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família (art. 20, caput e § 2.º, da Lei n.º
8.742/1993).
- Os elementos que constam nos autos são insuficientes para demonstrar a existência de
miserabilidade apta a ensejar a concessão do benefício pleiteado.
- Reconhecimento da improcedência do pedido formulado.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
8ª Turma
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5003131-48.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: J. C. D. S. F.
REPRESENTANTE: GEOVANA DA SILVA
Advogado do(a) APELANTE: TAINAN PEREIRA ZIBIANI CRESPILHO - SP323143-N
Advogado do(a) REPRESENTANTE: TAINAN PEREIRA ZIBIANI CRESPILHO - SP323143-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5003131-48.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: J. C. D. S. F.
REPRESENTANTE: GEOVANA DA SILVA
Advogado do(a) APELANTE: TAINAN PEREIRA ZIBIANI CRESPILHO - SP323143-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
-R E L A T Ó R I O
Trata-se de demanda objetivando a concessão de benefício assistencial, previsto no art. 203,
inciso V, da Constituição da República.
Em 06.09.2018, foi deferida a tutela de urgência.
O juízo a quo julgou improcedente o pedido formulado. Revogou a tutela provisória de urgência
anteriormente concedida.
A parte autora apela, pleiteando a reforma da sentença, sustentando, em síntese, o
cumprimento dos requisitos legais ao amparo pretendido. Se vencida, prequestiona a matéria.
Sem contrarrazões, subiram os autos.
Parecer do Ministério Público Federal pelo provimento do recurso.
É o relatório.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5003131-48.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: J. C. D. S. F.
REPRESENTANTE: GEOVANA DA SILVA
Advogado do(a) APELANTE: TAINAN PEREIRA ZIBIANI CRESPILHO - SP323143-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
-V O T O
Tempestivo o recurso e presentes os demais requisitos de admissibilidade, passa-se ao exame
da insurgência propriamente dita, considerando-se a matéria objeto de devolução.
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL (PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA)
O benefício de prestação continuada é “a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à
pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à
própria manutenção ou de tê-la provida por sua família”, conforme disposto no art. 203, inciso V,
da Constituição Federal, e regulamentado pelos arts. 20 a 21-A, da Lei n.º 8.742/1993.
A legislação exige a presença cumulativa de dois requisitos para a concessão do benefício.
Primeiro, o requerente deve, alternativamente, ter idade igual ou superior a 65 anos (art. 20,
caput, da Lei n.º 8.742/1993) ou ser deficiente, isto é, deter “impedimento de longo prazo de
natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais
barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de
condições com as demais pessoas (art. 20, § 2.º).
Segundo, o beneficiário deve comprovar situação de miserabilidade, caracterizada pela
inexistência de condições econômicas para prover o próprio sustento ou tê-lo provido por
alguém da família, consoante art. 20, § 3.º. da Lei n.º 8.742/1993 – dispositivo objeto de
declaração parcial de inconstitucionalidade, pela qual firmou o Supremo Tribunal Federal que
“sob o ângulo da regra geral, deve prevalecer o critério fixado pelo legislador no artigo 20, § 3º,
da Lei nº 8.742/93”, mas “Ante razões excepcionais devidamente comprovadas, é dado ao
intérprete do Direito constatar que a aplicação da lei à situação concreta conduz à
inconstitucionalidade, presente o parâmetro material da Carta da República, qual seja, a
miserabilidade, assim frustrando os princípios observáveis – solidariedade, dignidade,
erradicação da pobreza, assistência aos desemparados” sendo que “Em tais casos, pode o
Juízo superar a norma legal sem declará-la inconstitucional, tornando prevalecentes os ditames
constitucionais” (STF, Plenário, RE n.º 567.985, Rel. p/ Acórdão Min. Gilmar Mendes,
2.10.2013).
De se ressaltar, a esse respeito, que a redação original do art. 20, 3.º, da Lei n.º 8.742/1993,
dispunha que “considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou
idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo”.
O dispositivo em questão foi, entretanto, objeto de recentíssimas modificações.
Primeiro, a Lei n.º 13.981, de 24 de março de 2020, alterou o limite da renda mensal per capita
para “1/2 (meio) salário mínimo)”.
Depois, a Lei n.º 13.982, de 2 de abril de 2020, tencionou incluir dois incisos no dispositivo em
epígrafe, fixando o limite anterior de 1/4 do salário mínimo até 31 de dezembro de 2020,
incidindo, a partir de 1.º de janeiro de 2021, o novo teto, de 1/2 salário mínimo – aspecto este
que restou, porém, vetado.
Dessa forma, permanecem, no momento, hígidos tanto o critério da redação original do art. 20,
3.º. da Lei n.º 8.742/1993, quanto a interpretação jurisdicional no sentido de flexibilizá-lo nas
estritas hipóteses em que a miserabilidade possa ser aferida a partir de outros elementos
comprovados nos autos.
DO CASO DOS AUTOS
O laudo médico pericial de 09.11.2018 informa que o autor, que tem 09 anos de idade, é
portador de “TEA, com diagnostico inicial de F84.0 - Autismo infantil, e F81.0 - Transtorno
específico de leitura. Continua a frequentar a escola, acompanhado por uma monitora, mas com
pouco desenvolvimento da leitura. A linguagem verbal está presente, mas ainda persiste a
dificuldade. Apesenta sintomas de isolamento social, não conseguindo se relacionar com
adultos e crianças, tendo o apoio principal na mãe, e na escola pela monitora”. Concluiu a
médica perita que “Necessita do acompanhamento direto da mãe, ou de outro adulto que a
criança confie, até que consiga realizar as habilidades acima descritas. Não é possível prever
se haverá desenvolvimento, ou quando este ocorrerá e será satisfatório”.
Considerando-se a patologia comprovada via laudo pericial, conclui-se que o quadro
apresentado se ajusta ao de impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual
ou sensorial exigido pela legislação, restando presente, portanto, o requisito do art. 20, § 2., da
Lei n.º 8.742/1993.
Quanto ao requisito da miserabilidade, de acordo com o estudo social de 09.11.2018, a parte
autora reside em imóvel financiado (COHAB) há aproximadamente 10 meses, composta por
dois quartos, cozinha, banheiro e sala conjugada.
Relatou a assistente social que “A construção é modesta, seu acabamento interno é básico e
satisfatório, porém necessita de concluir externamente a construção como: muro, portão entre
outros a Sra. Geovana afirma ainda que não possui condições materiais e econômicas que
possibilitem a sua manutenção, pois no momento sobrevivem com muitas dificuldades”.
As despesas do núcleo familiar, segundo relatado, totalizam aproximadamente 1.100,00 reais.
Quanto à renda familiar, consta nos autos que a genitora do autor percebe, mensalmente,
1.046,00 reais, pelo exercício de atividades como segurança noturna na escola municipal Cel.
João Alves Lara.
A esse respeito, depreende-se dos autos que o genitor do requerente auxilia com pensão de
alimentos no valor de 350,00 reais.
Do exposto, constata-se que a parte autora reside com sua genitora em imóvel próprio
financiado, denotando-se que o sustento do núcleo familiar é provido por seus genitores.
Ademais, as despesas mencionadas não comprometem a totalidade do orçamento doméstico, e
que, a despeito da condição simples de vida, não há desamparo nem abandono da parte
autora.
Ressalte-se, a esse respeito, que o objetivo do benefício assistencial não é complementar a
renda, mas fornecer o mínimo àqueles que vivem em situação verdadeiramente indigna, cuja
precariedade coloca em risco a própria sobrevivência, exigindo-se, para tanto, a constatação de
extrema vulnerabilidade – o que não é o caso dos autos.
O quadro apresentado, dessa forma, não se ajusta ao de miserabilidade exigido pelo diploma
legal a que se fez menção acima.
De rigor, portanto, o indeferimento do benefício, porquanto não comprovado um dos requisitos
indispensáveis à sua concessão.
Quanto ao prequestionamento suscitado, inexiste contrariedade alguma à legislação federal ou
a dispostos constitucionais.
Posto isso, nego provimento à apelação.
É o voto.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. ART. 203, INCISO V, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. BENEFÍCIO
DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA. EXIGÊNCIA DE
COMPROVAÇÃO CUMULATIVA DE IMPEDIMENTO DE LONGO PRAZO E DE
HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA. AUSÊNCIA DE MISERABILIDADE. IMPOSSIBILIDADE
DE CONCESSÃO DO AMPARO ASSISTENCIAL.
- O benefício de prestação continuada exige para a sua concessão que a parte comprove,
alternativamente, ter idade igual ou superior a 65 anos ou deter impedimento de longo prazo de
natureza física, mental, intelectual ou sensorial e, cumulativamente, não possuir meios de
prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família (art. 20, caput e § 2.º, da Lei n.º
8.742/1993).
- Os elementos que constam nos autos são insuficientes para demonstrar a existência de
miserabilidade apta a ensejar a concessão do benefício pleiteado.
- Reconhecimento da improcedência do pedido formulado.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
