
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5080359-60.2024.4.03.9999
RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: FERNANDA APARECIDA DE SOUZA GOMES
Advogado do(a) APELADO: CLAUDIO MARCIO DE ARAUJO - SP262598-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5080359-60.2024.4.03.9999
RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: FERNANDA APARECIDA DE SOUZA GOMES
Advogado do(a) APELADO: CLAUDIO MARCIO DE ARAUJO - SP262598-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de demanda objetivando a concessão de benefício assistencial, previsto no art. 203, inciso V, da Constituição da República.
O juízo a quo julgou procedente o pedido formulado, reconhecendo à parte autora o direito ao amparo pretendido. E concedida a antecipação da tutela.
O INSS apela, pleiteando a atribuição do efeito suspensivo, e reforma da sentença, sustentando, em síntese, que o valor da renda per capita é superior ao mínimo. Alega ainda que, não há informação quanto a gastos com remédios não disponibilizados pelo SUS, tratamento de saúde, fraldas ou alimentos especiais.
Sem contrarrazões, subiram os autos.
Parecer do Ministério Público Federal pelo desprovimento do recurso.
É o relatório.
VANESSA MELLO
Juíza Federal Convocada
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5080359-60.2024.4.03.9999
RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: FERNANDA APARECIDA DE SOUZA GOMES
Advogado do(a) APELADO: CLAUDIO MARCIO DE ARAUJO - SP262598-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Tempestivo o recurso e presentes os demais requisitos de admissibilidade, passa-se ao exame da insurgência propriamente dita, considerando-se a matéria objeto de devolução.
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL (PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA)
O benefício de prestação continuada é “a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família”, conforme disposto no art. 203, inciso V, da Constituição Federal, e regulamentado pelos arts. 20 a 21-A, da Lei n.º 8.742/1993.
A legislação exige a presença cumulativa de dois requisitos para a concessão do benefício.
Primeiro, o requerente deve, alternativamente, ter idade igual ou superior a 65 anos (art. 20, caput, da Lei n.º 8.742/1993) ou ser deficiente, isto é, deter “impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas (art. 20, § 2.º).
Segundo, o beneficiário deve comprovar situação de miserabilidade, caracterizada pela inexistência de condições econômicas para prover o próprio sustento ou tê-lo provido por alguém da família, consoante art. 20, § 3.º. da Lei n.º 8.742/1993 – dispositivo objeto de declaração parcial de inconstitucionalidade, pela qual firmou o Supremo Tribunal Federal que “sob o ângulo da regra geral, deve prevalecer o critério fixado pelo legislador no artigo 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93”, mas “Ante razões excepcionais devidamente comprovadas, é dado ao intérprete do Direito constatar que a aplicação da lei à situação concreta conduz à inconstitucionalidade, presente o parâmetro material da Carta da República, qual seja, a miserabilidade, assim frustrando os princípios observáveis – solidariedade, dignidade, erradicação da pobreza, assistência aos desemparados” sendo que “Em tais casos, pode o Juízo superar a norma legal sem declará-la inconstitucional, tornando prevalecentes os ditames constitucionais” (STF, Plenário, RE n.º 567.985, Rel. p/ Acórdão Min. Gilmar Mendes, 2.10.2013).
De se ressaltar, a esse respeito, que a redação original do art. 20, 3.º, da Lei n.º 8.742/1993, dispunha que “considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo”.
O dispositivo em questão foi, entretanto, objeto de recentíssimas modificações.
Primeiro, a Lei n.º 13.981, de 24 de março de 2020, alterou o limite da renda mensal per capita para “1/2 (meio) salário mínimo)”.
Depois, a Lei n.º 13.982, de 2 de abril de 2020, tencionou incluir dois incisos no dispositivo em epígrafe, fixando o limite anterior de 1/4 do salário mínimo até 31 de dezembro de 2020, incidindo, a partir de 1.º de janeiro de 2021, o novo teto, de 1/2 salário mínimo – aspecto este que restou, porém, vetado.
Dessa forma, permanecem, no momento, hígidos tanto o critério da redação original do art. 20, 3.º. da Lei n.º 8.742/1993, quanto a interpretação jurisdicional no sentido de flexibilizá-lo nas estritas hipóteses em que a miserabilidade possa ser aferida a partir de outros elementos comprovados nos autos.
DO CASO DOS AUTOS
O laudo médico pericial (Id. 294137516) informa que a parte autora, que tem 39 anos de idade, não alfabetizada, é portadora de CID 10: F32 (Episódio depressivo), F41 (Transtorno de ansiedade), F79 (Retardo mental não especificado), apresentando incapacidade total e permanente para o exercício de atividade laborativa.
Considerando-se a patologia comprovada via laudo pericial, a idade da parte e a ausência de qualificação profissional, conclui-se que o quadro apresentado se ajusta ao de impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial exigido pela legislação, restando presente, portanto, o requisito do art. 20, § 2.º, da Lei n.º 8.742/1993.
Quanto ao requisito da miserabilidade, de acordo com o estudo social de (Id. 294137515), a parte autora reside em imóvel próprio, em estado regular de conservação. A Sra. Assistente Social descreve:
“A casa em que moram possui dois quartos, uma sala, uma cozinha, dois banheiros, uma garagem, uma varanda com lavanderia e dispensa. Imóvel construído em alvenaria, em bom estado de conservação, com laje, telhas e piso cerâmico. Composto dos móveis a seguir: uma geladeira, um fogão, um armário em aço, um balcão de pia, um jogo de mesa com cadeiras, um rack, um sofá, uma poltrona, uma televisão, uma cama de casal, uma guarda-roupas, uma sapateira, três camas de solteiro, um guarda-roupas, mesa de cabeceira e uma máquina de lavar. Os moveis são de baixo padrão e em regular estado de conservação. O imóvel conta com energia elétrica, chuveiro elétrico, água encanada. A residência fica em área urbana, na periferia da cidade, dispõe de serviços de saúde, educação, assistência social, mercados, padarias, etc. Possuem um veículo Monza ano 1994, porém não está em nome de nenhum membro da família.”
As despesas do núcleo familiar, segundo relatado, totalizam 2.444 reais. Nega gastos habituais com medicamentos e consultas médicas.
Quanto à renda familiar, consta nos autos que o genitor da parte autora percebe, mensalmente, R$2.739,51 reais, pelo exercício de atividades como motorista na Empresa Kin-Guin Turismo e Transporte (CNPJ 67.431.650/0001-62).
Em consulta ao CNIS verifica-se a renda variável do genitor, calcula-se o valor de R$3.487,50, equivalente à média dos salários desde o requerimento administrativo (14/04/2023) até junho/2024.
Ademais, o estudo social informa que residem com a parte autora a genitora, e dois sobrinhos menores da parte autora, nenhum dos quais percebe quaisquer rendimentos.
Menor sob guarda
No tocante à condição de dependente, a Lei n. 9.528/97 alterou a redação original do art. 16, §2º, da Lei n. 8.213/91, ao dispor que "o enteado e o menor tutelado equiparam-se a filho mediante declaração do segurado e desde que comprovada a dependência econômica na forma estabelecida no Regulamento".
Por sua vez, o C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do Recurso Especial Representativo de Controvérsia nº 1.411.258/RS (Tema 732), firmou o entendimento no sentido de que, não obstante a Lei nº 9.528/97 tenha excluído o menor sob guarda do rol de beneficiários de dependentes previdenciários naturais ou legais do segurado, sua dependência econômica deve ser comprovada nos termos do art. 33, § 3º, do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/90), considerada lei protetiva especial em relação à legislação previdenciária, conforme acórdão abaixo transcrito:
"DIREITO PREVIDENCIÁRIO E HUMANITÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. PROCESSAMENTO NOS TERMOS DO ART. 543-C DO CPC E DA RESOLUÇÃO 08/STJ. DIREITO DO MENOR SOB GUARDA À PENSÃO POR MORTE DO SEU MANTENEDOR. EMBORA A LEI 9.528/97 O TENHA EXCLUÍDO DO ROL DOS DEPENDENTES PREVIDENCIÁRIOS NATURAIS OU LEGAIS DOS SEGURADOS DO INSS. PROIBIÇÃO DE RETROCESSO. DIRETRIZES CONSTITUCIONAIS DE ISONOMIA, PRIORIDADE ABSOLUTA E PROTEÇÃO INTEGRAL À CRIANÇA E AO ADOLESCENTE (ART. 227 DA CF). APLICAÇÃO PRIORITÁRIA OU PREFERENCIAL DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE (LEI 8.069/90), POR SER ESPECÍFICA, PARA ASSEGURAR A MÁXIMA EFETIVIDADE DO PRECEITO CONSTITUCIONAL DE PROTEÇÃO. PARECER DO MPF PELO NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO, A TEOR DA SÚMULA 126/STJ. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO, PORÉM DESPROVIDO.
1. A não interposição de Recurso Extraordinário somente tem a força de impedir o conhecimento de Recurso Especial quando (e se) a matéria decidida no acórdão recorrido apresenta dupla fundamentação, devendo a de nível constitucional referir imediata e diretamente infringência à preceito constitucional explícito; em tema de concessão de pensão por morte a menor sob guarda, tal infringência não se verifica, tanto que o colendo STF já decidiu que, nestas hipóteses, a violação à Constituição Federal, nesses casos, é meramente reflexa. A propósito, os seguintes julgados, dentre outros: ARE 804.434/PI, Rel. Min. DIAS TOFFOLI, DJe 19.3.2015; ARE 718.191/BA, Rel. Min. LUIZ FUX, DJe 17.9.2014; RE 634.487/MG, Rel. Min. ROSA WEBER, DJe 1.8.2014; ARE 763.778/RS, Rel. Min. CARMEN LÚCIA, DJe 24.10.2013; não se apresenta razoável afrontar essa orientação do STF, porquanto se trata, neste caso, de questão claramente infraconstitucional.
2. Dessa forma, apesar da manifestação ministerial em sentido contrário, entende-se possível, em princípio, conhecer-se do mérito do pedido recursal do INSS, afastando-se a incidência da Súmula 126/STJ, porquanto, no presente caso, o recurso deve ser analisado e julgado, uma vez que se trata de matéria de inquestionável relevância jurídica, capaz de produzir precedente da mais destacada importância, apesar de não interposto o Recurso Extraordinário.
3. Quanto ao mérito, verifica-se que, nos termos do art. 227 da CF, foi imposto não só à família, mas também à sociedade e ao Estado o dever de, solidariamente, assegurar à criança e ao adolescente os direitos fundamentais com absoluta prioridade. Além disso, foi imposto ao legislador ordinário a obrigação de garantir ao menor os direitos previdenciários e trabalhistas, bem como o estímulo do Poder Público ao acolhimento, sob a forma de guarda, de criança ou adolescente órfão ou abandonado.
4. A alteração do art. 16, § 2o. da Lei 8.213/91, pela Lei 9.528/97, ao retirar o menor sob guarda da condição de dependente previdenciário natural ou legal do Segurado do INSS, não elimina o substrato fático da dependência econômica do menor e representa, do ponto de vista ideológico, um retrocesso normativo incompatível com as diretrizes constitucionais de isonomia e de ampla e prioritária proteção à criança e ao adolescente.
5. Nesse cenário, a jurisprudência desta Corte Superior tem avançado na matéria, passando a reconhecer ao menor sob guarda a condição de dependente do seu mantenedor, para fins previdenciários. Precedentes: MS 20.589/DF, Rel. Min. RAUL ARAÚJO, Corte Especial, DJe 2.2.2016; AgRg no AREsp. 59.461/MG, Rel. Min. OLINDO MENEZES, DJe 20.11.2015; AgRg no REsp. 1.548.012/PE, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 20.11.2015; AgRg no REsp. 1.550.168/SE, Rel. Min. MAURO CAMPBELL MARQUES, DJe 22.10.2015; REsp. 1.339.645/MT, Rel. Min. SÉRGIO KUKINA, DJe 4.5.2015.
6. Não se deve perder de vista o sentido finalístico do Direito Previdenciário e Social, cuja teleologia se traduz no esforço de integração dos excluídos nos benefícios da civilização e da cidadania, de forma a proteger as pessoas necessitadas e hipossuficientes, que se encontram em situações sociais adversas; se assim não for, a promessa constitucional de proteção a tais pessoas se esvai em palavras sonoras que não chegam a produzir qualquer alteração no panorama jurídico.
7. Deve-se proteger, com absoluta prioridade, os destinatários da pensão por morte de Segurado do INSS, no momento do infortúnio decorrente do seu falecimento, justamente quando se vêem desamparados, expostos a riscos que fazem periclitar a sua vida, a sua saúde, a sua alimentação, a sua educação, o seu lazer, a sua profissionalização, a sua cultura, a sua dignidade, o seu respeito individual, a sua liberdade e a sua convivência familiar e comunitária, combatendo-se, com pertinácia, qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão (art. 227, caput da Carta Magna).
8. Considerando que os direitos fundamentais devem ter, na máxima medida possível, eficácia direta e imediata, impõe-se priorizar a solução ao caso concreto de forma que se dê a maior concretude ao direito. In casu, diante da Lei Geral da Previdência Social que apenas se tornou silente ao tratar do menor sob guarda e diante de norma específica que lhe estende a pensão por morte (Lei 8.069/90, Estatuto da Criança e do Adolescente, art. 33, § 3o.), cumpre reconhecer a eficácia protetiva desta última lei, inclusive por estar em perfeita consonância com os preceitos constitucionais e a sua interpretação inclusiva.
9. Em consequência, fixa-se a seguinte tese, nos termos do art. 543-C do CPC/1973: O MENOR SOB GUARDA TEM DIREITO À CONCESSÃO DO BENEFÍCIO DE PENSÃO POR MORTE DO SEU MANTENEDOR, COMPROVADA A SUA DEPENDÊNCIA ECONÔMICA, NOS TERMOS DO ART. 33, § 3o. DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE, AINDA QUE O ÓBITO DO INSTITUIDOR DA PENSÃO SEJA POSTERIOR À VIGÊNCIA DA MEDIDA PROVISÓRIA 1.523/96, REEDITADA E CONVERTIDA NA LEI 9.528/97. FUNDA-SE ESSA CONCLUSÃO NA QUALIDADE DE LEI ESPECIAL DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE (8.069/90), FRENTE À LEGISLAÇÃO PREVIDENCIÁRIA.
10. Recurso Especial do INSS desprovido."
(STJ, Resp nº. 1.411.258/RS, Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, j. 11/10/17, v.u., DJe 21/2/18, grifos meus).
Assim, torna-se necessária a avaliação criteriosa da existência de dependência econômica do "menor sob guarda" em relação ao pretenso segurado guardião, considerando que os pais são os detentores do pátrio poder sobre o menor, recaindo sobre eles o dever legal de prover o sustento dos filhos.
No caso em apreço, não foi apresentado nenhum documento a comprovar a alegada dependência econômica dos menores em relação aos genitores da requerente, como termo de guarda, mensalidades escolares, recibos de pagamentos de cursos frequentados, atendimentos médicos e realização de exames, eventual plano de saúde, devidamente pagos pelos genitores da requerente. A parte autora juntou apenas os documentos de identidade dos sobrinhos da parte autora E. G. G. e J. G. G.
A esse respeito, saliente-se que, nos termos do art. 373, I, do Código de Processo Civil/15, pertence à parte autora o ônus de carrear prova documental descritiva da situação que alega haver ocorrido.
Em que pese todo o alegado, cumpre registrar que os genitores dos sobrinhos da parte autora, segundo o estudo social, estão vivos, com informação que acreditam que o pai esteja São Paulo, e a mãe na cidade de Jandira/SP.
Nos termos do art. 229 da Constituição Federal/88, aos pais incumbe o dever de sustento, guarda, convivência, assistência material e moral e educação dos filhos menores. Nesse sentido, transcrevo os acórdãos abaixo:
"PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. NETO SOB GUARDA DO AVÔ. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA NÃO COMPROVADA. INDEVIDO O BENEFÍCIO.
- Em atenção ao princípio tempus regit actum, aplica-se, no tocante à concessão da pensão por morte, a lei vigente à época do fato que o originou, qual seja, a da data do óbito.
- São requisitos para a obtenção de pensão por morte: a condição de dependente e a qualidade de segurado do falecido (artigos 74 a 79 da Lei n. 8.213/1991).
- O menor sob guarda tem direito à concessão do benefício de pensão por morte pelo seu mantenedor, desde que comprovada a sua dependência econômica. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça.
- Ausente a comprovação da dependência econômica do autor em relação ao avô (guardião) falecido, é indevido o benefício.
- Mantida a condenação da parte autora a pagar custas processuais e honorários de advogado, arbitrados em 12% (doze por cento) sobre o valor atualizado da causa, já majorados em razão da fase recursal, conforme critérios do artigo 85, §§ 1º e 11, do Código de Processo Civil, suspensa, porém, a exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do mesmo diploma processual, por tratar-se de beneficiária da justiça gratuita.
- Apelação não provida."
(TRF 3ª Região, ApCiv n. 5177533-74.2021.4.03.9999, 9ª Turma, Relatora Desembargador Federal Daldice Santana, j. 20/6/22, v.u., DJEN 24/6/22, grifos meus)
"PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. MENOR SOB GUARDA. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA NÃO COMPROVADA. REQUISITOS LEGAIS NÃO PREENCHIDOS. IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.
- Nos termos do artigo 74 da Lei n.º 8.213/91, dois são os requisitos para a concessão do benefício de pensão por morte, quais sejam: a qualidade de segurado do falecido e a dependência econômica do beneficiário postulante.
- Dispensada a demonstração do período de carência, consoante regra expressa no artigo 26, I, da Lei n.° 8.213/91.
- No presente caso, a qualidade de segurado do instituidor do benefício vindicado é incontroversa, tendo em vista que o extrato do Sistema CNIS da Previdência Social comprova o recebimento de aposentadoria por invalidez desde 16/09/2003.
- O cerne da presente controvérsia é a comprovação da qualidade de dependente da autora, que estava sob a guarda do falecido, conforme termo de entrega sob guarda e responsabilidade adunado aos autos (ID n.º 105430939 – fls. 12).
- A Lei nº 9.528/97 alterou a redação original do art. 16, § 2.º da Lei de Benefícios para excluir o “menor sob guarda” do rol de beneficiários de dependentes previdenciários naturais ou legais do segurado, ao dispor que apenas "o enteado e o menor tutelado equiparam-se a filho mediante declaração do segurado e desde que comprovada a dependência econômica na forma estabelecida no Regulamento".
- Ocorre que o Colendo Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp n.º 1.411.258/RS, de relatoria do Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, julgado sob a sistemática dos recursos especiais repetitivos (art. 543-C, do CPC), firmou entendimento no sentido de que “o menor sob guarda tem direito à concessão do benefício de pensão por morte do seu mantenedor, comprovada a sua dependência econômica, nos termos do art. 33, § 3.º, de Estatuto da Criança e do Adolescente, ainda que o óbito do instituidor da pensão seja posterior à vigência da Medida Provisória 1.523/96, reeditada e convertida na Lei 9.528/97. Funda-se essa conclusão na qualidade de Lei Especial do Estatuto do Estatuto da Criança e do Adolescente (8.069/90), frente à legislação previdenciária.
- Portanto, ainda que o menor sob guarda possa ser inscrito como dependente, é necessária a comprovação da dependência econômica em relação ao segurado guardião, nas relações estabelecidas sob a égide da Medida Provisória n.º 1.523 de 11/10/1996 e suas posteriores reedições, que culminaram na Lei n.º 9.528/97. Precedentes desta Corte.
- A prova produzida nos autos é insuficiente para ensejar a concessão do benefício vindicado, eis que ausente a comprovação da dependência econômica da autora em relação ao falecido, não bastando apenas a demonstração de que estava sob a sua guarda.
- Improcedência do pedido formulado.
- Apelação desprovida."
(TRF 3ª Região, ApCiv n. 6178701-65.2019.4.03.9999, 8ª Turma, Relatora Desembargadora Federal Therezinha Cazerta, j. 11/5/22, v.u., intimação via sistema 13/5/22, grifos meus)
Nada obstante, e parafraseando o entendimento consignado pela Excelentíssima Senhora Desembargadora Federal Daldice no âmbito da Apelação Cível de registro n.º 6078022-57.2019.4.03.9999, trazida a julgamento em 18/3/2020, “a despeito do teor do RE n. 580.963 (STF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe n. 225, 14/11/2013 – repercussão geral), não há que se falar em hipossuficiência no caso”, como consignado até mesmo pelo magistrado sentenciante, notadamente quando os elementos de prova estão a indicar a ausência de penúria, revelando, ao contrário, que a parte autora tem acesso aos mínimos sociais, inclusive casa própria.
Ademais, “se o critério da baixa renda não é ‘taxativo’, pode ser levado em conta tanto para a concessão quanto para o indeferimento do pleito”.
Por isso que “a regra contida no § 3º do artigo 20 da LOAS não pode ser reduzida ao critério matemático, cabendo a aferição individual da situação socioeconômica”.
Veja-se, quanto ao mais, do voto proferido por Sua Excelência no feito acima mencionado:
“(...) diante do entendimento consagrado por ocasião do julgamento do RE n. 580963, abriu-se a possibilidade de exclusão, do cálculo da renda familiar, dos benefícios assistenciais recebidos por idosos e por deficientes e também dos benefícios previdenciários concedidos ao idoso, no valor de até um salário mínimo.
A decisão concluiu, ainda, que a mera interpretação gramatical do preceito, por si só, pode resultar no indeferimento da prestação assistencial em casos nos quais, embora o limite legal de renda per capita seja ultrapassado, evidencia-se um quadro de notória hipossuficiência econômica.
Essa insuficiência da regra decorre não apenas das modificações fáticas (políticas, econômicas e sociais), mas principalmente das alterações legislativas que ocorreram no País desde a edição da Lei Orgânica da Assistência Social, em 1993.
A legislação federal recente, por exemplo, reiterada pela adoção de vários programas assistenciais destinados a famílias carentes, considera pobres aqueles que possuem renda mensal per capita de até meio salário mínimo (nesse sentido, a Lei n. 9.533, de 10/12/1997, regulamentada pelos Decretos n. 2.609/1998 e 2.728/1999, as Portarias n. 458 e 879, de 03/12/2001, da Secretaria da Assistência Social, o Decreto n. 4.102/2002, a Lei n. 10.689/2003, criadora do Programa Nacional de Acesso à Alimentação).
Assim, não há como considerar o critério previsto no artigo 20, § 3º, da Lei n. 8.742/1993 como absoluto e único para aferição da situação de miserabilidade, até porque o próprio Estado Brasileiro elegeu outros parâmetros, como os defluentes da legislação acima citada.
Deve-se verificar, na questão in concreto, a ocorrência de situação de pobreza – entendida como a falta de recursos e de acesso ao mínimo existencial –, para se concluir se é devida ou não a prestação pecuniária da assistência social constitucionalmente prevista.
Assim, ao menos desde 14/11/2013 (RE n. 580963), o critério da miserabilidade contido no § 3º do artigo 20 da Lei n. 8.742/1993 não impede o julgador de levar em conta outros dados, a fim de identificar a situação de vida do idoso ou do deficiente, principalmente quando estiverem presentes peculiaridades, a exemplo de necessidades especiais com medicamentos ou com educação.
Nesse diapasão, podem-se estabelecer alguns parâmetros norteadores da análise individual de cada caso, como, por exemplo: (i) todos os que recebem renda familiar per capita inferior a ¼ do salário mínimo são miseráveis; (ii) nem todos os que percebem renda familiar per capita superior a ¼ do salário mínimo e inferior a ½ salário mínimo são miseráveis; (iii) nem todos os que percebem renda familiar per capita superior a ½ salário mínimo deixam de ser miseráveis; (iv) todos os que perceberem renda mensal familiar superior a um salário mínimo (artigo 7º, IV, da Constituição Federal) não são miseráveis.
Dessa forma, em todos os casos, outras circunstâncias devem ser levadas em conta, mormente se o patrimônio do requerente também se subsome à noção de hipossuficiência, devendo ser apurado se vive em casa própria, com ou sem ar condicionado, se possui veículo, telefones celulares, auxílio permanente de parentes ou de terceiros etc.
Cumpre salientar que o benefício de prestação continuada foi previsto, na impossibilidade de atender a um público maior, para socorrer aos desamparados (artigo 6º, caput, da CF), ou seja, àquelas pessoas que nem sequer teriam possibilidade de equacionar um orçamento doméstico, pelo fato de não terem renda ou de ser essa insignificante.”
Do exposto, constata-se que a parte autora reside com familiares em imóvel próprio, não havendo gasto com aluguel, denotando-se que o sustento do núcleo familiar é provido pelo genitor. Ademais, as despesas mencionadas não comprometem a totalidade do orçamento doméstico, e que, a despeito da condição simples de vida, não há desamparo nem abandono da parte autora.
Ressalte-se, a esse respeito, que o objetivo do benefício assistencial não é complementar a renda, mas fornecer o mínimo àqueles que vivem em situação verdadeiramente indigna, cuja precariedade coloca em risco a própria sobrevivência, exigindo-se, para tanto, a constatação de extrema vulnerabilidade – o que não é o caso dos autos.
O quadro apresentado, dessa forma, não se ajusta ao de miserabilidade exigido pelo diploma legal a que se fez menção acima.
De rigor, portanto, o indeferimento do benefício, porquanto não comprovado um dos requisitos indispensáveis à sua concessão.
Condeno a parte autora a pagar custas processuais e honorários de advogado, arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, suspensa, porém, a exigibilidade, na forma do art. 98, § 3.º, do CPC, por se tratar de beneficiária de gratuidade da justiça.
Posto isso, dou provimento à apelação do INSS, para reformar a sentença e julgar improcedente o pedido formulado. Cassando a tutela antecipada.
É o voto.
VANESSA MELLO
Juíza Federal Convocada
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. ART. 203, INCISO V, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA. EXIGÊNCIA DE COMPROVAÇÃO CUMULATIVA DE IMPEDIMENTO DE LONGO PRAZO E DE HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA. AUSÊNCIA DE MISERABILIDADE. IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DO AMPARO ASSISTENCIAL.
- O benefício de prestação continuada exige para a sua concessão que a parte comprove, alternativamente, ter idade igual ou superior a 65 anos ou deter impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial e, cumulativamente, não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família (art. 20, caput e § 2.º, da Lei n.º 8.742/1993).
- No tocante à condição de dependente, a Lei n. 9.528/97 alterou a redação original do art. 16, §2º, da Lei n. 8.213/91, ao dispor que "o enteado e o menor tutelado equiparam-se a filho mediante declaração do segurado e desde que comprovada a dependência econômica na forma estabelecida no Regulamento".
- Os elementos que constam nos autos são insuficientes para demonstrar a existência de miserabilidade apta a ensejar a concessão do benefício pleiteado.
- Reconhecimento da improcedência do pedido formulado.
ACÓRDÃO
JUÍZA FEDERAL CONVOCADA
