Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5052181-09.2021.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal THEREZINHA ASTOLPHI CAZERTA
Órgão Julgador
8ª Turma
Data do Julgamento
12/08/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 17/08/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. ART. 203, INCISO V, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. BENEFÍCIO DE
PRESTAÇÃO CONTINUADA. PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA. EXIGÊNCIA DE
COMPROVAÇÃO DE IMPEDIMENTO DE LONGO PRAZO. IMPOSSIBILIDADE DE
CONCESSÃO DO AMPARO ASSISTENCIAL.
- O benefício de prestação continuada exige, para a sua concessão, que a parte comprove ter
idade igual ou superior a 65 anos ou deter impedimento de longo prazo de natureza física,
mental, intelectual ou sensorial (art. 20, caput e § 2.º, da Lei n.º 8.742/1993).
- A prova pericial produzida é insuficiente para demonstrar a existência de impedimento de longo
prazo, apta a ensejar a concessão do benefício pleiteado.
- Reconhecimento da improcedência do pedido formulado.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5052181-09.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: DELVANI GOMES FEITOSA
Advogado do(a) APELADO: JOSE ARTUR BENTO - SP196740-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5052181-09.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: DELVANI GOMES FEITOSA
Advogado do(a) APELADO: JOSE ARTUR BENTO - SP196740-N
OUTROS PARTICIPANTES:
-R E L A T Ó R I O
Trata-se de demanda objetivando a concessão de benefício assistencial, previsto no art. 203,
inciso V, da Constituição da República.
O juízo a quo julgou procedente o pedido formulado, reconhecendo à parte autora o direito ao
amparo pretendido.
O INSS apela, pleiteando a reforma da sentença, sustentando, em síntese, o não cumprimento
dos requisitos legais à concessão em questão. Se vencido, insurge-se com relação ao termo
inicial do benefício, bem como requer o reconhecimento da prescrição quinquenal. Ao final,
prequestiona a matéria.
Com contrarrazões, subiram os autos.
É o relatório.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5052181-09.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: DELVANI GOMES FEITOSA
Advogado do(a) APELADO: JOSE ARTUR BENTO - SP196740-N
OUTROS PARTICIPANTES:
-V O T O
Tempestivo o recurso e presentes os demais requisitos de admissibilidade, passa-se ao exame
da insurgência propriamente dita, considerando-se a matéria objeto de devolução.
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL (PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA)
O benefício de prestação continuada é “a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à
pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à
própria manutenção ou de tê-la provida por sua família”, conforme disposto no art. 203, inciso V,
da Constituição Federal, e regulamentado pelos arts. 20 a 21-A, da Lei n.º 8.742/1993.
A legislação exige a presença cumulativa de dois requisitos para a concessão do benefício.
Primeiro, o requerente deve, alternativamente, ter idade igual ou superior a 65 anos (art. 20,
caput, da Lei n.º 8.742/1993) ou ser deficiente, isto é, deter “impedimento de longo prazo de
natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais
barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de
condições com as demais pessoas (art. 20, § 2.º).
Segundo, o beneficiário deve comprovar situação de miserabilidade, caracterizada pela
inexistência de condições econômicas para prover o próprio sustento ou tê-lo provido por
alguém da família, consoante art. 20, § 3.º., da Lei n.º 8.742/1993 – dispositivo objeto de
declaração parcial de inconstitucionalidade, pela qual firmou o Supremo Tribunal Federal que
“sob o ângulo da regra geral, deve prevalecer o critério fixado pelo legislador no artigo 20, § 3º,
da Lei nº 8.742/93”, mas “ante razões excepcionais devidamente comprovadas, é dado ao
intérprete do Direito constatar que a aplicação da lei à situação concreta conduz à
inconstitucionalidade, presente o parâmetro material da Carta da República, qual seja, a
miserabilidade, assim frustrando os princípios observáveis – solidariedade, dignidade,
erradicação da pobreza, assistência aos desemparados” sendo que “em tais casos, pode o
Juízo superar a norma legal sem declará-la inconstitucional, tornando prevalecentes os ditames
constitucionais” (STF, Plenário, RE n.º 567.985, Rel. p/ Acórdão Min. Gilmar Mendes,
2.10.2013).
De se ressaltar, a esse respeito, que a redação original do art. 20, 3.º, da Lei n.º 8.742/1993,
dispunha que “considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou
idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo”.
O dispositivo em questão foi, entretanto, objeto de recentíssimas modificações.
Primeiro, a Lei n.º 13.981, de 24 de março de 2020, alterou o limite da renda mensal per capita
para “1/2 (meio) salário mínimo)”.
Depois, a Lei n.º 13.982, de 2 de abril de 2020, tencionou incluir dois incisos no dispositivo em
epígrafe, fixando o limite anterior de 1/4 do salário mínimo até 31 de dezembro de 2020,
incidindo, a partir de 1.º de janeiro de 2021, o novo teto, de 1/2 salário mínimo – aspecto este
que restou, porém, vetado.
Dessa forma, permanecem, no momento, hígidos tanto o critério da redação original do art. 20,
3.º. da Lei n.º 8.742/1993, quanto a interpretação jurisdicional no sentido de flexibilizá-lo nas
estritas hipóteses em que a miserabilidade possa ser aferida a partir de outros elementos
comprovados nos autos.
DO CASO DOS AUTOS
O laudo médico pericial de 29.06.2019 informa que a parte autora é portadora de “Síndrome da
Imunodeficiência Adquirida”.
Do que consta do laudo pericial anexado aos autos, a parte autora não está incapacitada para o
exercício de suas atividades laborativas, muito embora seja portadora de HIV diagnosticado há
20 anos (1999).
Consta, no documento, que se trata de patologia passível de acompanhamento e tratamento,
“O autor refere diagnóstico há 20 anos, mas que iniciou acompanhamento médico em 2013 e
desde 2014 faz uso de coquetel antirretroviral após ter apresentado pneumonia. Apresentou
relatório médico com data de 14.05/18 informando esta doença. O exame físico não mostrou
sinais de infecções oportunistas e os exames laboratoriais informados indicam bom controle
com o tratamento que vem realizando. Há necessidade de acompanhamento médico de rotina e
manutenção das medicações. Há limitações para realizar atividades laborativas que possam
causar aumento do risco de infecções para si ou para terceiros, mas não há incapacidade para
realizar suas atividades laborativas habituais ou para realizar as atividades do cotidiano”.
Conforme jurisprudência desta Corte quando do julgamento de caso semelhante, em que o
segurado também era portador de HIV, “o estigma social não é bastante à caracterização da
deficiência, à medida que a autora não se encontra incapacitada, nem abandonada pelo Estado
porquanto faz jus a medicação adequada do SUS” (9.ª Turma: Apelação Cível 5082590-
36.2019.4.03.9999, Rel. Juiz Federal Convocado RODRIGO ZACHARIAS, julgado em
23/05/2019, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 28/05/2019). Conclusão contrária redundaria na
concessão do benefício a quaisquer portadores de HIV, o que não se afigura razoável.
Nem cabe argumentar que o juiz não se encontra vinculado ao laudo pericial, uma vez que não
foram trazidos aos autos elementos hábeis a abalar as conclusões nele contidas.
No mais, depreende-se dos autos que o requerente já exerceu atividade laborativa, ausentes
indicativos de que não pode retomá-la ou mesmo se adequar a outro tipo de ocupação
profissional.
O quadro apresentado, portanto, não se ajusta ao de impedimento de longo prazo de natureza
física, mental, intelectual ou sensorial exigido pelo diploma legal a que se fez menção acima.
Considerando-se, por fim, que os requisitos para a concessão do benefício são cumulativos,
fica prejudicada a análise quanto à hipossuficiência econômica.
De rigor, portanto, o indeferimento do benefício, porquanto não comprovado um dos requisitos
indispensáveis à sua concessão.
Condeno a parte autora a pagar custas processuais e honorários de advogado, arbitrados em
10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, suspensa, porém, a exigibilidade, na
forma do art. 98, § 3.º, do CPC, por se tratar de beneficiária de gratuidade da justiça.
Posto isso, dou provimento à apelação, para reformar a sentença e julgar improcedente o
pedido formulado.
É o voto.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. ART. 203, INCISO V, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. BENEFÍCIO
DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA. EXIGÊNCIA DE
COMPROVAÇÃO DE IMPEDIMENTO DE LONGO PRAZO. IMPOSSIBILIDADE DE
CONCESSÃO DO AMPARO ASSISTENCIAL.
- O benefício de prestação continuada exige, para a sua concessão, que a parte comprove ter
idade igual ou superior a 65 anos ou deter impedimento de longo prazo de natureza física,
mental, intelectual ou sensorial (art. 20, caput e § 2.º, da Lei n.º 8.742/1993).
- A prova pericial produzida é insuficiente para demonstrar a existência de impedimento de
longo prazo, apta a ensejar a concessão do benefício pleiteado.
- Reconhecimento da improcedência do pedido formulado.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu dar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
