Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5381315-42.2020.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal THEREZINHA ASTOLPHI CAZERTA
Órgão Julgador
8ª Turma
Data do Julgamento
04/02/2022
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 08/02/2022
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. ART. 203, INCISO V, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. BENEFÍCIO DE
PRESTAÇÃO CONTINUADA. PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA. EXIGÊNCIA DE
COMPROVAÇÃO DE IMPEDIMENTO DE LONGO PRAZO. IMPOSSIBILIDADE DE
CONCESSÃO DO AMPARO ASSISTENCIAL.
- Não se conhece da apelação, no tocante à tutela antecipada por falta de interesse de agir.
- O benefício de prestação continuada exige, para a sua concessão, que a parte comprove ter
idade igual ou superior a 65 anos ou deter impedimento de longo prazo de natureza física,
mental, intelectual ou sensorial (art. 20, caput e § 2.º, da Lei n.º 8.742/1993).
- A prova pericial produzida é insuficiente para demonstrar a existência de impedimento de longo
prazo, apta a ensejar a concessão do benefício pleiteado.
- Reconhecimento da improcedência do pedido formulado.
- Apelação, conhecida em parte, a que se dá provimento.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5381315-42.2020.4.03.9999
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: G. D. P. D. S.
REPRESENTANTE: ANDREIA DANTAS PRADO SOUZA E SILVA
Advogados do(a) APELADO: PAMELLA SALGADO DA SILVA - SP407383, RAFAELA
BARBOSA DE LIMA - SP445159, WELLINGTON BARBOSA DOS SANTOS - SP322603-N,
LEANDRO FERNANDES DE AVILA - SP287876-N,
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5381315-42.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: G. D. P. D. S.
REPRESENTANTE: ANDREIA DANTAS PRADO SOUZA E SILVA
Advogados do(a) APELADO: PAMELLA SALGADO DA SILVA - SP407383, RAFAELA
BARBOSA DE LIMA - SP445159, WELLINGTON BARBOSA DOS SANTOS - SP322603-N,
LEANDRO FERNANDES DE AVILA - SP287876-N,
OUTROS PARTICIPANTES:
-R E L A T Ó R I O
Trata-se de demanda objetivando a concessão de benefício assistencial, previsto no art. 203,
inciso V, da Constituição da República.
O juízo a quo julgou procedente o pedido formulado, reconhecendo à parte autora o direito ao
amparo pretendido.
O INSS apela, alegando, preliminarmente, que a antecipação da tutela ocasiona a
irreversibilidade do provimento, motivo pelo qual requer o recebimento do recurso em seu duplo
efeito. No mérito, pleiteia a reforma da sentença, sustentando, em síntese, o não cumprimento
dos requisitos legais necessários à concessão em questão. Se vencido, insurge-se com relação
ao termo inicial, despesas processuais e honorários advocatícios, bem como requer o
reconhecimento da prescrição quinquenal das parcelas vencidas anteriores ao ajuizamento da
ação. Ao final, prequestiona a matéria.
Com contrarrazões, subiram os autos.
Parecer do Ministério Público Federal pelo desprovimento do recurso.
Em 19.05.2021, a parte autora peticionou informando que “seu genitor está cumprindo aviso
prévio, devendo cessar suas atividades laborais em 11/06/2021 conforme documento anexo,
ficando após essa data desempregado, portanto sem qualquer remuneração financeira”.
É o relatório.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5381315-42.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: G. D. P. D. S.
REPRESENTANTE: ANDREIA DANTAS PRADO SOUZA E SILVA
Advogados do(a) APELADO: PAMELLA SALGADO DA SILVA - SP407383, RAFAELA
BARBOSA DE LIMA - SP445159, WELLINGTON BARBOSA DOS SANTOS - SP322603-N,
LEANDRO FERNANDES DE AVILA - SP287876-N,
OUTROS PARTICIPANTES:
-V O T O
Tempestivo o recurso e presentes os demais requisitos de admissibilidade, passa-se ao exame
da insurgência propriamente dita, considerando-se a matéria objeto de devolução.
Inicialmente, ressalte-se que a apelação do Instituto Nacional do Seguro Social será
parcialmente conhecida, ante a falta de interesse em recorrer com relação a tutela antecipada,
uma vez que não houve condenação a respeito.
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL (PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA)
O benefício de prestação continuada é “a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à
pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à
própria manutenção ou de tê-la provida por sua família”, conforme disposto no art. 203, inciso V,
da Constituição Federal, e regulamentado pelos arts. 20 a 21-A, da Lei n.º 8.742/1993.
A legislação exige a presença cumulativa de dois requisitos para a concessão do benefício.
Primeiro, o requerente deve, alternativamente, ter idade igual ou superior a 65 anos (art. 20,
caput, da Lei n.º 8.742/1993) ou ser deficiente, isto é, deter “impedimento de longo prazo de
natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais
barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de
condições com as demais pessoas (art. 20, § 2.º).
Segundo, o beneficiário deve comprovar situação de miserabilidade, caracterizada pela
inexistência de condições econômicas para prover o próprio sustento ou tê-lo provido por
alguém da família, consoante art. 20, § 3.º., da Lei n.º 8.742/1993 – dispositivo objeto de
declaração parcial de inconstitucionalidade, pela qual firmou o Supremo Tribunal Federal que
“sob o ângulo da regra geral, deve prevalecer o critério fixado pelo legislador no artigo 20, § 3º,
da Lei nº 8.742/93”, mas “ante razões excepcionais devidamente comprovadas, é dado ao
intérprete do Direito constatar que a aplicação da lei à situação concreta conduz à
inconstitucionalidade, presente o parâmetro material da Carta da República, qual seja, a
miserabilidade, assim frustrando os princípios observáveis – solidariedade, dignidade,
erradicação da pobreza, assistência aos desemparados” sendo que “em tais casos, pode o
Juízo superar a norma legal sem declará-la inconstitucional, tornando prevalecentes os ditames
constitucionais” (STF, Plenário, RE n.º 567.985, Rel. p/ Acórdão Min. Gilmar Mendes,
2.10.2013).
De se ressaltar, a esse respeito, que a redação original do art. 20, 3.º, da Lei n.º 8.742/1993,
dispunha que “considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou
idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo”.
O dispositivo em questão foi, entretanto, objeto de recentíssimas modificações.
Primeiro, a Lei n.º 13.981, de 24 de março de 2020, alterou o limite da renda mensal per capita
para “1/2 (meio) salário mínimo)”.
Depois, a Lei n.º 13.982, de 2 de abril de 2020, tencionou incluir dois incisos no dispositivo em
epígrafe, fixando o limite anterior de 1/4 do salário mínimo até 31 de dezembro de 2020,
incidindo, a partir de 1.º de janeiro de 2021, o novo teto, de 1/2 salário mínimo – aspecto este
que restou, porém, vetado.
Dessa forma, permanecem, no momento, hígidos tanto o critério da redação original do art. 20,
3.º. da Lei n.º 8.742/1993, quanto a interpretação jurisdicional no sentido de flexibilizá-lo nas
estritas hipóteses em que a miserabilidade possa ser aferida a partir de outros elementos
comprovados nos autos.
DO CASO DOS AUTOS
O laudo médico pericial de 29.11.2019 informa que a parte autora “possui espectro de autismo
(Síndrome de Asperger)”.
Concluiu o médico perito o demandante “possui capacidade de aprendizado satisfatório na
escola, mas possui dificuldade de interação social, possui crises de agitação/humor
ocasionalmente, principalmente quando surpreendido por algo, possui agitação em ambiente
cheio, fatos confirmados por laudo médico, psicológico, da terapia ocupacional, do pedagogo.
Faz acompanhamento multidisciplinar para melhorar sua evolução. Considerando os dados
apresentados e o exame físico, concluo trata-se de criança com necessidades especiais de
acompanhamento multidisciplinar e monitoramento regular da família para suas terapias”.
Consta, no documento, que se trata de patologia passível de acompanhamento e tratamento.
Do que consta do laudo pericial anexado aos autos, verifica-se que o requerente “Necessita de
suporte na escola para evoluir com seu aprendizado, faz tratamento multidisciplinar para seu
mal”, bem como “No momento possui dificuldade de interação social, mas faz tratamento na
busca de ser um adulto com vida social/profissional”.
Em resposta ao quesito do juízo indagando se o autor está “totalmente ou parcialmente
incapacitado para o trabalho”, respondeu o médico perito: “Parcialmente” e, ainda, indagado“Em
caso positivo, a incapacidade é permanente ou temporária?” asseverou: “Criança com
possibilidade de vir a ser um adulto ativo socialmente” e perguntado “É possível algum
tratamento para curar o autor?” informou que “Não há cura completa, mas pode vir a ser um
adulto com vida independente e há possibilidade de vir a constituir família e profissão”.
O quadro apresentado, portanto, não se ajusta ao de impedimento de longo prazo de natureza
física, mental, intelectual ou sensorial exigido pelo diploma legal a que se fez menção acima.
Considerando-se, por fim, que os requisitos para a concessão do benefício são cumulativos,
fica prejudicada a análise quanto à hipossuficiência econômica.
De rigor, portanto, o indeferimento do benefício, porquanto não comprovado um dos requisitos
indispensáveis à sua concessão.
Condeno a parte autora a pagar custas processuais e honorários de advogado, arbitrados em
10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, suspensa, porém, a exigibilidade, na
forma do art. 98, § 3.º, do CPC, por se tratar de beneficiária de gratuidade da justiça.
Posto isso, conheço em parte do recurso de apelação e, na parte conhecida dou-lhe
provimento, para reformar a sentença e julgar improcedente o pedido formulado.
É o voto.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. ART. 203, INCISO V, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. BENEFÍCIO
DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA. EXIGÊNCIA DE
COMPROVAÇÃO DE IMPEDIMENTO DE LONGO PRAZO. IMPOSSIBILIDADE DE
CONCESSÃO DO AMPARO ASSISTENCIAL.
- Não se conhece da apelação, no tocante à tutela antecipada por falta de interesse de agir.
- O benefício de prestação continuada exige, para a sua concessão, que a parte comprove ter
idade igual ou superior a 65 anos ou deter impedimento de longo prazo de natureza física,
mental, intelectual ou sensorial (art. 20, caput e § 2.º, da Lei n.º 8.742/1993).
- A prova pericial produzida é insuficiente para demonstrar a existência de impedimento de
longo prazo, apta a ensejar a concessão do benefício pleiteado.
- Reconhecimento da improcedência do pedido formulado.
- Apelação, conhecida em parte, a que se dá provimento.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu conhecer em parte do recurso de apelação e, na parte conhecida, dar-lhe
provimento, para reformar a sentença e julgar improcedente o pedido formulado, nos termos do
relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
