Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5287367-46.2020.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal THEREZINHA ASTOLPHI CAZERTA
Órgão Julgador
8ª Turma
Data do Julgamento
27/05/2021
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 01/06/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. ART. 203, INCISO V, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. BENEFÍCIO DE
PRESTAÇÃO CONTINUADA. PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA. PRESENÇA DOS
REQUISITOS LEGAIS. CONCESSÃO DO AMPARO ASSISTENCIAL.
- O benefício de prestação continuada exige para a sua concessão que a parte comprove,
alternativamente, ter idade igual ou superior a 65 anos ou deter impedimento de longo prazo de
natureza física, mental, intelectual ou sensorial e, cumulativamente, não possuir meios de prover
à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família (art. 20, caput e § 2.º, da Lei n.º
8.742/1993).
- Impedimento de longo prazo e miserabilidade comprovados nos autos.
- Reconhecimento da procedência do pedido formulado.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5287367-46.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: NEUZA FARIA DOS SANTOS
Advogados do(a) APELADO: ANTONIO HENRIQUE TEIXEIRA RIBEIRO - SP213133-N,
LARISSA MARIA DE NEGREIROS - SP243514-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5287367-46.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: NEUZA FARIA DOS SANTOS
Advogados do(a) APELADO: ANTONIO HENRIQUE TEIXEIRA RIBEIRO - SP213133-N,
LARISSA MARIA DE NEGREIROS - SP243514-N
OUTROS PARTICIPANTES:
-R E L A T Ó R I O
Trata-se de demanda objetivando a concessão de benefício assistencial, previsto no art. 203,
inciso V, da Constituição da República.
O juízo a quo julgou procedente o pedido formulado, reconhecendo à parte autora o direito ao
amparo pretendido, “a partir da data do indeferimento administrativo (28/08/2018 fl. 92)”.
Concedeu a tutela antecipada.
O INSS apela, pleiteando, em preliminar, a suspensão dos efeitos da tutela antecipada e, no
mérito, sustentando, em síntese, o não cumprimento dos requisitos legais à concessão em
questão. Se vencido, insurge-se com relação ao termo inicial do benefício. Ao final,
prequestiona a matéria.
Com contrarrazões, subiram os autos.
É o relatório.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5287367-46.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: NEUZA FARIA DOS SANTOS
Advogados do(a) APELADO: ANTONIO HENRIQUE TEIXEIRA RIBEIRO - SP213133-N,
LARISSA MARIA DE NEGREIROS - SP243514-N
OUTROS PARTICIPANTES:
-V O T O
Tempestivo o recurso e presentes os demais requisitos de admissibilidade, passa-se ao exame
da insurgência propriamente dita, considerando-se a matéria objeto de devolução.
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL (PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA)
O benefício de prestação continuada consiste na “garantia de um salário mínimo de benefício
mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de
prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família”, conforme disposto no art. 203,
inciso V, da Constituição Federal, e regulamentado pelos arts. 20 a 21-A, da Lei n.º 8.742/1993.
A legislação exige a presença cumulativa de dois requisitos para a concessão do benefício.
Primeiro, o requerente deve, alternativamente, ter idade igual ou superior a 65 anos (art. 20,
caput, da Lei n.º 8.742/1993) ou ser deficiente, isto é, deter “impedimento de longo prazo de
natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais
barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de
condições com as demais pessoas (art. 20, § 2.º).
Segundo, o beneficiário deve comprovar situação de miserabilidade, caracterizada pela
inexistência de condições econômicas para prover o próprio sustento ou tê-lo provido por
alguém da família, consoante art. 20, § 3.º., da Lei n.º 8.742/1993 – dispositivo objeto de
declaração parcial de inconstitucionalidade, pela qual firmou o Supremo Tribunal Federal que
“sob o ângulo da regra geral, deve prevalecer o critério fixado pelo legislador no artigo 20, § 3º,
da Lei nº 8.742/93”, mas “ante razões excepcionais devidamente comprovadas, é dado ao
intérprete do Direito constatar que a aplicação da lei à situação concreta conduz à
inconstitucionalidade, presente o parâmetro material da Carta da República, qual seja, a
miserabilidade, assim frustrando os princípios observáveis – solidariedade, dignidade,
erradicação da pobreza, assistência aos desemparados” sendo que “em tais casos, pode o
Juízo superar a norma legal sem declará-la inconstitucional, tornando prevalecentes os ditames
constitucionais” (STF, Plenário, RE n.º 567.985, Rel. p/ Acórdão Min. Gilmar Mendes,
2.10.2013).
De se ressaltar, a esse respeito, que a redação original do art. 20, 3.º, da Lei n.º 8.742/1993,
dispunha que “considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou
idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo”.
O dispositivo em questão foi, entretanto, objeto de recentíssimas modificações.
Primeiro, a Lei n.º 13.981, de 24 de março de 2020, alterou o limite da renda mensal per capita
para “1/2 (meio) salário mínimo)”.
Depois, a Lei n.º 13.982, de 2 de abril de 2020, tencionou incluir dois incisos no dispositivo em
epígrafe, fixando o limite anterior de 1/4 do salário mínimo até 31 de dezembro de 2020,
incidindo, a partir de 1.º de janeiro de 2021, o novo teto, de 1/2 salário mínimo – aspecto este
que restou, porém, vetado.
Dessa forma, permanecem, no momento, hígidos tanto o critério da redação original do art. 20,
3.º. da Lei n.º 8.742/1993, quanto a interpretação jurisdicional no sentido de flexibilizá-lo nas
estritas hipóteses em que a miserabilidade possa ser aferida a partir de outros elementos
comprovados nos autos.
DO CASO DOS AUTOS
O laudo médico pericial de 04.11.2019 informa que a parte autora, que tem 51 anos de idade, é
portadora de “epilepsia grave em tratamento sem controle e transtorno depressivo/ansioso”,
apresentando incapacidade total e permanente para o exercício de atividade laborativa.
Considerando-se a patologia comprovada via laudo pericial, a idade da parte e a ausência de
qualificação profissional, conclui-se que o quadro apresentado se ajusta ao de impedimento de
longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial exigido pela legislação, restando
presente, portanto, o requisito do art. 20, § 2., da Lei n.º 8.742/1993.
Quanto ao requisito da miserabilidade, de acordo com o estudo social datado de 22.04.2019, a
parte autora reside em imóvel alugado, em estado ruim de conservação, que possui sala,
cozinha, dois banheiros e três quartos, com “móveis bem antigos e a maioria em mau estado”.
Relatou a assistente social, que “A autora não possui imóvel, não possui veículo como também
não há eletrodoméstico de valor”.
Afirmou, ainda, que “A autora reside com sua filha: Raquel Faria da Silva, nascida em
28/02/1987, filiação: José Pedro da Silva e Neusa Faria dos Santos, portadora do RG:
44.179.785-4 e CPF: 347.765.028-01, filha: Andreia dos Santos Machado, nascida em
18/01/2002, filiação: José Aparecido Machado e Neusa Faria dos Santos, neto: Gabriel Lucas
da Silva Pereira, nascido em 16/07/2016, filiação: Carlos Cesar Pereira Expedito e Raquel Faria
da Silva, portador do RG: 65.194.408-03 CPF: 517.461.458-03, neta: Nicolly Mayara Faria de
Jesus, nascida em 09/03/2009, filiação: Natalino de Jesus e Raquel Faria da Silva, portadora do
RG: 65.194.407-7 e CPF: 560.424.958-01”,
Quanto à renda familiar, depreende-se dos autos que os netos da autora recebem pensão
alimentícia mensal no valor de 240,00 reais, bem como a filha da requerente percebe,
mensalmente, 1.205,00 reais pelo exercício de atividade de doméstica.
Do exposto, constata-se que a autora reside em moradia simples, está acometida de patologia
que a impede de trabalhar e depende do auxílio de terceiros para sobreviver, razão pela qual
está presente o requisito da miserabilidade, nos termos em que disposto no art. 20, § 3.º, da Lei
n.º 8.742/93, interpretado à luz do RE n.º 567.985.
De rigor, portanto, o deferimento do benefício, porquanto comprovados os requisitos
indispensáveis à sua concessão.
O termo inicial do benefício assistencial deve retroagir à data do requerimento administrativo, de
acordo com a jurisprudência pacífica do C. STJ (REsp n.º 1.851.145, 2.ª Turma, j. em
18/2/2020, v.u., DJe 13/05/2020, Rel. Ministro Herman Benjamin). Na ausência de
demonstração do requerimento, o termo inicial deve retroagir à data da citação, ocasião em que
a autarquia tomou conhecimento da pretensão.
No caso, existe comprovação de requerimento (17.10.2017). Porém, o MM. Juízo a quo fixou a
DIB “a partir da data do indeferimento administrativo”.
Cumpre consignar que a parte autora não manifestou qualquer insurgência em relação ao termo
inicial do benefício.
Nesse contexto, embora a DIB devesse ter sido fixada em 17.10.2017, não restará assim
estabelecido, para não se incorrer em reformatio in pejus.
De rigor, por último, a manutenção da tutela antecipada, nos termos do art. 300 c.c art. 497 do
Código de Processo Civil, observando-se os efeitos do decidido no âmbito do Recurso Especial
n.° 1.734.685 – SP (2018/0082173-0), tendo em vista o caráter alimentar do benefício.
Quanto ao prequestionamento suscitado, inexiste contrariedade alguma à legislação federal ou
a dispostos constitucionais.
Posto isso, nego provimento à apelação.
É o voto.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. ART. 203, INCISO V, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. BENEFÍCIO
DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA. PRESENÇA
DOS REQUISITOS LEGAIS. CONCESSÃO DO AMPARO ASSISTENCIAL.
- O benefício de prestação continuada exige para a sua concessão que a parte comprove,
alternativamente, ter idade igual ou superior a 65 anos ou deter impedimento de longo prazo de
natureza física, mental, intelectual ou sensorial e, cumulativamente, não possuir meios de
prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família (art. 20, caput e § 2.º, da Lei n.º
8.742/1993).
- Impedimento de longo prazo e miserabilidade comprovados nos autos.
- Reconhecimento da procedência do pedido formulado.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
