Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5036743-40.2021.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal THEREZINHA ASTOLPHI CAZERTA
Órgão Julgador
8ª Turma
Data do Julgamento
27/07/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 28/07/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. ART. 203, INCISO V, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. BENEFÍCIO DE
PRESTAÇÃO CONTINUADA. PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA. PRESENÇA DOS
REQUISITOS LEGAIS. CONCESSÃO DO AMPARO ASSISTENCIAL.
- O benefício de prestação continuada exige para a sua concessão que a parte comprove,
alternativamente, ter idade igual ou superior a 65 anos ou deter impedimento de longo prazo de
natureza física, mental, intelectual ou sensorial e, cumulativamente, não possuir meios de prover
à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família (art. 20, caput e § 2.º, da Lei n.º
8.742/1993).
- Impedimento de longo prazo e miserabilidade comprovados nos autos.
- Reconhecimento da procedência do pedido formulado.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5036743-40.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOSE MODESTO DE OLIVEIRA FILHO
REPRESENTANTE: SILVANA MODESTO DE OLIVEIRA
Advogados do(a) APELADO: ADRIANA ACCESSOR COSTA FERNANDEZ - SP199498-A,
RODRIGO VICENTE FERNANDEZ - SP186603-A,
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5036743-40.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOSE MODESTO DE OLIVEIRA FILHO
REPRESENTANTE: SILVANA MODESTO DE OLIVEIRA
Advogados do(a) APELADO: ADRIANA ACCESSOR COSTA FERNANDEZ - SP199498-A,
RODRIGO VICENTE FERNANDEZ - SP186603-A,
OUTROS PARTICIPANTES:
-R E L A T Ó R I O
Trata-se de demanda objetivando a concessão de benefício assistencial, previsto no art. 203,
inciso V, da Constituição da República, desde 01.10.2018.
O juízo a quo julgou procedente o pedido formulado, determinando que “o INSS restabeleça em
favor do autor o amparo social (NB- 541.593.392-8), com DIB no dia seguinte a cessação do
benefício anterior (01.10.2018, p. 66)”.
O INSS apela, pleiteando a reforma da sentença, sustentando, em síntese, o não cumprimento
dos requisitos legais à concessão em questão. Se vencido, insurge-se com relação à correção
monetária.
Com contrarrazões, subiram os autos.
Parecer do Ministério Público Federal pelo desprovimento do recurso.
É o relatório.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5036743-40.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOSE MODESTO DE OLIVEIRA FILHO
REPRESENTANTE: SILVANA MODESTO DE OLIVEIRA
Advogados do(a) APELADO: ADRIANA ACCESSOR COSTA FERNANDEZ - SP199498-A,
RODRIGO VICENTE FERNANDEZ - SP186603-A,
OUTROS PARTICIPANTES:
-V O T O
Tempestivo o recurso e presentes os demais requisitos de admissibilidade, passa-se ao exame
da insurgência propriamente dita, considerando-se a matéria objeto de devolução.
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL (PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA)
O benefício de prestação continuada consiste na “garantia de um salário mínimo de benefício
mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de
prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família”, conforme disposto no art. 203,
inciso V, da Constituição Federal, e regulamentado pelos arts. 20 a 21-A, da Lei n.º 8.742/1993.
A legislação exige a presença cumulativa de dois requisitos para a concessão do benefício.
Primeiro, o requerente deve, alternativamente, ter idade igual ou superior a 65 anos (art. 20,
caput, da Lei n.º 8.742/1993) ou ser deficiente, isto é, deter “impedimento de longo prazo de
natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais
barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de
condições com as demais pessoas (art. 20, § 2.º).
Segundo, o beneficiário deve comprovar situação de miserabilidade, caracterizada pela
inexistência de condições econômicas para prover o próprio sustento ou tê-lo provido por
alguém da família, consoante art. 20, § 3.º., da Lei n.º 8.742/1993 – dispositivo objeto de
declaração parcial de inconstitucionalidade, pela qual firmou o Supremo Tribunal Federal que
“sob o ângulo da regra geral, deve prevalecer o critério fixado pelo legislador no artigo 20, § 3º,
da Lei nº 8.742/93”, mas “ante razões excepcionais devidamente comprovadas, é dado ao
intérprete do Direito constatar que a aplicação da lei à situação concreta conduz à
inconstitucionalidade, presente o parâmetro material da Carta da República, qual seja, a
miserabilidade, assim frustrando os princípios observáveis – solidariedade, dignidade,
erradicação da pobreza, assistência aos desemparados” sendo que “em tais casos, pode o
Juízo superar a norma legal sem declará-la inconstitucional, tornando prevalecentes os ditames
constitucionais” (STF, Plenário, RE n.º 567.985, Rel. p/ Acórdão Min. Gilmar Mendes,
2.10.2013).
De se ressaltar, a esse respeito, que a redação original do art. 20, 3.º, da Lei n.º 8.742/1993,
dispunha que “considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou
idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo”.
O dispositivo em questão foi, entretanto, objeto de recentíssimas modificações.
Primeiro, a Lei n.º 13.981, de 24 de março de 2020, alterou o limite da renda mensal per capita
para “1/2 (meio) salário mínimo)”.
Depois, a Lei n.º 13.982, de 2 de abril de 2020, tencionou incluir dois incisos no dispositivo em
epígrafe, fixando o limite anterior de 1/4 do salário mínimo até 31 de dezembro de 2020,
incidindo, a partir de 1.º de janeiro de 2021, o novo teto, de 1/2 salário mínimo – aspecto este
que restou, porém, vetado.
Dessa forma, permanecem, no momento, hígidos tanto o critério da redação original do art. 20,
3.º. da Lei n.º 8.742/1993, quanto a interpretação jurisdicional no sentido de flexibilizá-lo nas
estritas hipóteses em que a miserabilidade possa ser aferida a partir de outros elementos
comprovados nos autos.
DO CASO DOS AUTOS
Esclareça-se que a Portaria Interministerial SDH/MPS/MF/MOG/AGU n.º 01 de 27.01.2014, que
estabeleceu “o instrumento destinado à avaliação do segurado da Previdência Social e à
identificação dos graus de deficiência, bem como define impedimento de longo prazo, para os
efeitos do Decreto nº 3.048, de 6 de maio de 1999”, estabelece a necessidade de avaliação
médica e funcional, sendo esta baseada na “Classificação Internacional de Funcionalidade,
Incapacidade e Saúde - CIF, da Organização Mundial de Saúde, e mediante a aplicação do
Índice de Funcionalidade Brasileiro Aplicado para Fins de Aposentadoria – IFBrA” (art. 2º, §1º)
O autor foi submetido à perícia judicial com profissional da área médica, realizada em
observância à Portaria Interministerial SDH/ MPS/ MPOG/ AGU nº 01, de 27 de janeiro de 2014.
O laudo médico pericial datado de 08.10.2019 informa que a parte autora é portadora de
“Retardo mental. F 72.9”, apresentando incapacidade total e permanente para o exercício de
atividade laborativa.
Considerando-se a patologia comprovada via laudo pericial e a ausência de qualificação
profissional, conclui-se que o quadro apresentado se ajusta ao de impedimento de longo prazo
de natureza física, mental, intelectual ou sensorial exigido pela legislação, restando presente,
portanto, o requisito do art. 20, § 2., da Lei n.º 8.742/1993.
Quanto ao requisito da miserabilidade, de acordo com o estudo social realizado em 25.09.2019,
a parte autora reside em imóvel próprio, com as irmãs Silvana (40 anos), Patrícia (44 anos); e
com a mãe Sra. Margarida (68 anos)”.
Relatou a assistente social que “Quanto a situação sócio econômica as irmãs relatam que o
requerente recebeu por 03 anos o BPC e que a 01 ano este pagamento foi suspenso, sem
saber o porque e que a única renda da família neste momento é a Pensão que a mãe recebe no
valor de R$ 998,00 e que são destinados as seguintes despesas: alimentação R$ 400,00; água
R$ 50,00; luz R$ 70,00; gás R$ 68,00; remédios que não tem na rede R$ 100,00. A Silvana
salientou que recebe ajuda de amigos com doações”.
Aduziu, ainda, que “O requerente José Modesto é portador de Retardo Mental Grave, patologia
está irreversível e que o impossibilita de ter uma vida útil e independente, pois necessita de
auxílio em tarefas cotidianas como: alimentação, higiene pessoal entre outas atividades. As
irmãs não podem trabalhar fora, pois revezam nos cuidados com o mesmo e com a mãe que
sofre de Esquizofrenia e também necessita de cuidados 24 horas”.
Quanto à renda familiar, consta nos autos que a genitora da parte autora percebe,
mensalmente, 998,00 reais, em decorrência do benefício de pensão por morte.
Ademais, residem com a parte autora as duas irmãs, nenhuma das quais percebe quaisquer
rendimentos.
Cabe considerar, a esse respeito, que os valores percebidos pela genitora do autor devem ser
desconsiderados para o cômputo da renda familiar até o limite de um salário mínimo, uma vez
que, tratando-se de benefício previdenciário, incide a aplicação analógica do art. 34, parágrafo
único, da Lei n.º 10.741/2003, nos termos fixados pelo Superior Tribunal de Justiça, sob a
sistemática dos recursos repetitivos, no REsp n.º 1.355.052/SP (STJ, Primeira Seção, Rel. Min.
Benedito Gonçalves, 5.11.2015).
Referido entendimento, ressalte-se, foi positivado pela alteração realizada pela Lei n.º
13.982/2020, que incluiu, na Lei n.º8.742/93, § 14 no art. 20, segundo o qual “O benefício de
prestação continuada ou o benefício previdenciário no valor de até 1 (um) salário-mínimo
concedido a idoso acima de 65 (sessenta e cinco) anos de idade ou pessoa com deficiência não
será computado, para fins de concessão do benefício de prestação continuada a outro idoso ou
pessoa com deficiência da mesma família, no cálculo da renda a que se refere o § 3º deste
artigo”.
Do exposto, constata-se que a autora reside em moradia simples, está acometida de patologia
que a impede de trabalhar e depende do auxílio de terceiros para sobreviver, razão pela qual
está presente o requisito da miserabilidade, nos termos em que disposto no art. 20, § 3.º, da Lei
n.º 8.742/93, interpretado à luz do RE n.º 567.985.
De rigor, portanto, o deferimento do benefício, porquanto comprovados os requisitos
indispensáveis à sua concessão.
Quer seja em relação aos juros moratórios, devidos a partir da citação, momento em que
constituído o réu em mora; quer seja no tocante à correção monetária, incidente desde a data
do vencimento de cada prestação, há que prevalecer tanto o decidido, sob a sistemática da
repercussão geral, no Recurso Extraordinário n.º 870.947, de 20/9/2017, sob relatoria do
Ministro Luiz Fux, quanto o estabelecido no Manual de Orientação de Procedimentos para
Cálculos na Justiça Federal, em vigor por ocasião da execução do julgado, observada a
rejeição dos embargos de declaração no âmbito do julgamento em epígrafe, em 03/10/2019.
Posto isso, nego provimento à apelação.
É o voto.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. ART. 203, INCISO V, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. BENEFÍCIO
DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA. PRESENÇA
DOS REQUISITOS LEGAIS. CONCESSÃO DO AMPARO ASSISTENCIAL.
- O benefício de prestação continuada exige para a sua concessão que a parte comprove,
alternativamente, ter idade igual ou superior a 65 anos ou deter impedimento de longo prazo de
natureza física, mental, intelectual ou sensorial e, cumulativamente, não possuir meios de
prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família (art. 20, caput e § 2.º, da Lei n.º
8.742/1993).
- Impedimento de longo prazo e miserabilidade comprovados nos autos.
- Reconhecimento da procedência do pedido formulado.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
