Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5259485-12.2020.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal THEREZINHA ASTOLPHI CAZERTA
Órgão Julgador
8ª Turma
Data do Julgamento
04/02/2022
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 08/02/2022
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. ART. 203, INCISO V, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. BENEFÍCIO DE
PRESTAÇÃO CONTINUADA. PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA. PRESENÇA DOS
REQUISITOS LEGAIS. CONCESSÃO DO AMPARO ASSISTENCIAL.
- O benefício de prestação continuada exige para a sua concessão que a parte comprove,
alternativamente, ter idade igual ou superior a 65 anos ou deter impedimento de longo prazo de
natureza física, mental, intelectual ou sensorial e, cumulativamente, não possuir meios de prover
à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família (art. 20, caput e § 2.º, da Lei n.º
8.742/1993).
- Impedimento de longo prazo e miserabilidade comprovados nos autos.
- Reconhecimento da procedência do pedido formulado.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5259485-12.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: VERA LUCIA RODRIGUES DE ALMEIDA TABORDA
Advogados do(a) APELADO: BRUNO BORGES SCOTT - SP323996-N, MARCOS JASOM DA
SILVA PEREIRA - SP286251-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5259485-12.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: VERA LUCIA RODRIGUES DE ALMEIDA TABORDA
Advogados do(a) APELADO: BRUNO BORGES SCOTT - SP323996-N, MARCOS JASOM DA
SILVA PEREIRA - SP286251-N
OUTROS PARTICIPANTES:
-R E L A T Ó R I O
Trata-se de demanda objetivando a concessão de benefício assistencial, previsto no art. 203,
inciso V, da Constituição da República.
O juízo a quo julgou procedente o pedido formulado, reconhecendo à parte autora o direito ao
amparo pretendido “desde o pedido administrativo datado de 18/04/2017”. Concedeu a tutela
provisória.
O INSS apela, pleiteando a reforma da sentença, sustentando, em síntese, o não cumprimento
dos requisitos legais à concessão em questão. Se vencido, insurge-se com relação ao termo
inicial do benefício.
Sem contrarrazões, subiram os autos.
É o relatório.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5259485-12.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: VERA LUCIA RODRIGUES DE ALMEIDA TABORDA
Advogados do(a) APELADO: BRUNO BORGES SCOTT - SP323996-N, MARCOS JASOM DA
SILVA PEREIRA - SP286251-N
OUTROS PARTICIPANTES:
-V O T O
Tempestivo o recurso e presentes os demais requisitos de admissibilidade, passa-se ao exame
da insurgência propriamente dita, considerando-se a matéria objeto de devolução.
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL (PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA)
O benefício de prestação continuada consiste na “garantia de um salário mínimo de benefício
mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de
prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família”, conforme disposto no art. 203,
inciso V, da Constituição Federal, e regulamentado pelos arts. 20 a 21-A, da Lei n.º 8.742/1993.
A legislação exige a presença cumulativa de dois requisitos para a concessão do benefício.
Primeiro, o requerente deve, alternativamente, ter idade igual ou superior a 65 anos (art. 20,
caput, da Lei n.º 8.742/1993) ou ser deficiente, isto é, deter “impedimento de longo prazo de
natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais
barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de
condições com as demais pessoas (art. 20, § 2.º).
Segundo, o beneficiário deve comprovar situação de miserabilidade, caracterizada pela
inexistência de condições econômicas para prover o próprio sustento ou tê-lo provido por
alguém da família, consoante art. 20, § 3.º., da Lei n.º 8.742/1993 – dispositivo objeto de
declaração parcial de inconstitucionalidade, pela qual firmou o Supremo Tribunal Federal que
“sob o ângulo da regra geral, deve prevalecer o critério fixado pelo legislador no artigo 20, § 3º,
da Lei nº 8.742/93”, mas “ante razões excepcionais devidamente comprovadas, é dado ao
intérprete do Direito constatar que a aplicação da lei à situação concreta conduz à
inconstitucionalidade, presente o parâmetro material da Carta da República, qual seja, a
miserabilidade, assim frustrando os princípios observáveis – solidariedade, dignidade,
erradicação da pobreza, assistência aos desemparados” sendo que “em tais casos, pode o
Juízo superar a norma legal sem declará-la inconstitucional, tornando prevalecentes os ditames
constitucionais” (STF, Plenário, RE n.º 567.985, Rel. p/ Acórdão Min. Gilmar Mendes,
2.10.2013).
De se ressaltar, a esse respeito, que a redação original do art. 20, 3.º, da Lei n.º 8.742/1993,
dispunha que “considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou
idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo”.
O dispositivo em questão foi, entretanto, objeto de recentíssimas modificações.
Primeiro, a Lei n.º 13.981, de 24 de março de 2020, alterou o limite da renda mensal per capita
para “1/2 (meio) salário mínimo)”.
Depois, a Lei n.º 13.982, de 2 de abril de 2020, tencionou incluir dois incisos no dispositivo em
epígrafe, fixando o limite anterior de 1/4 do salário mínimo até 31 de dezembro de 2020,
incidindo, a partir de 1.º de janeiro de 2021, o novo teto, de 1/2 salário mínimo – aspecto este
que restou, porém, vetado.
Dessa forma, permanecem, no momento, hígidos tanto o critério da redação original do art. 20,
3.º. da Lei n.º 8.742/1993, quanto a interpretação jurisdicional no sentido de flexibilizá-lo nas
estritas hipóteses em que a miserabilidade possa ser aferida a partir de outros elementos
comprovados nos autos.
DO CASO DOS AUTOS
O laudo médico pericial datado de 18.04.2019 informa que a parte autora, é portadora de “CID
M 54.5 Lombalgia Crônica. CID M75.5 Bursite de ambos os ombros. CID M 47.2 Escoliose
Idiopática. Dorso Lombar destro côncava de 5 graus. CID F 43.2 Depressão Nervosa”,
apresentando incapacidade permanente para o exercício de atividade laborativa.
Informou o médico perito que “Estamos frente a uma periciada jovem, com 7 filhos deles 3
menores de idade, que vive da bolsa família faz mais de 20 anos, trabalhou na roça até não
conseguir mais devido as crise de lombalgia que agravou e dor nos ombros com inchaço e
dificuldade na movimentação. Tem exames que demostram a realidade da periciada e
bastantes receitas de medicações fortes para dor e depressão”, bem como que “A periciada só
estudou primeira serie, não tem instrução nem fez outro tipo de trabalho na sua vida, não está
em condições de realizar outro trabalho”.
Como ressaltado pelo Juízo a quo: “Conforme se observam nos quesitos respondidos, relatou o
expert que a incapacidade é total e permanente para o tipo de trabalho que realizava, não
estando apta para outras atividades por seu baixo nível educacional pela doença crônica que
lhe acomete”.
Considerando-se a patologia comprovada via laudo pericial e a ausência de qualificação
profissional, conclui-se que o quadro apresentado se ajusta ao de impedimento de longo prazo
de natureza física, mental, intelectual ou sensorial exigido pela legislação, restando presente,
portanto, o requisito do art. 20, § 2.º, da Lei n.º 8.742/1993.
Quanto ao requisito da miserabilidade, de acordo com o estudo social de 22.07.2019, a parte
autora reside em imóvel próprio.
Relatou que “a casa foi construída pela comunidade num terreno invadido. Disse que antes de
conseguir esta casa ela e sua família viviam de favor em casas. E por não terem condições de
adquirir uma casa, a comunidade se comoveu e fizeram um mutirão e construíram sua casa. A
casa é de alvenaria, sem acabamento. Possui 06 cômodos e um banheiro. O piso é rústico,
dentro da casa a maioria dos cômodos não tem portas” e, ainda, que “a casa nunca foi
terminada devido à falta de recursos financeiros da família”.
No que se refere ao mobiliário e os eletrodomésticos que guarnecem a residência, informou que
“foram doados por alguns amigos, e todos móveis e utensílios domésticos estão deteriorados
pelo tempo e uso”, as imagens acostadas aos autos corroboram a afirmação da assistente
social.
Asseverou a assistente social que “A requerente reside com o esposo e seus quatro filhos numa
casa que foi construída pela comunidade num terreno invadido. O esposo sofreu um infarto há
alguns meses e por isso a família não tem condições de suprir suas necessidades. Atualmente
a única renda da família é no valor de R$ 416,00 proveniente do Programa Bolsa Família. A
requerente relatou que a comunidade ajuda com alimentos esporadicamente”.
Esclareceu, ainda, que “É válido citar que no dia da visita observamos que a família não tinha
alimentos, e quando questionada a quem iria recorrer, alegou que sente muita vergonha em
pedir ajuda, tanto para seus vizinhos como para o CRAS – Centro de Referência da Assistência
Social, onde está cadastrada”.
Do exposto, constata-se que a autora reside em moradia simples, está acometida de patologia
que a impede de trabalhar e depende do auxílio de terceiros para sobreviver, razão pela qual
está presente o requisito da miserabilidade, nos termos em que disposto no art. 20, § 3.º, da Lei
n.º 8.742/93, interpretado à luz do RE n.º 567.985.
De rigor, portanto, o deferimento do benefício, porquanto comprovados os requisitos
indispensáveis à sua concessão.
O termo inicial do benefício assistencial deve retroagir à data do requerimento administrativo, de
acordo com a jurisprudência pacífica do C. STJ (REsp n.º 1.851.145, 2.ª Turma, j. em
18/2/2020, v.u., DJe 13/05/2020, Rel. Ministro Herman Benjamin). Na ausência de
demonstração do requerimento, o termo inicial deve retroagir à data da citação, ocasião em que
a autarquia tomou conhecimento da pretensão.
No caso, existe comprovação de requerimento, devendo o termo inicial ser nele fixado.
Posto isso, nego provimento à apelação.
É o voto.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. ART. 203, INCISO V, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. BENEFÍCIO
DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA. PRESENÇA
DOS REQUISITOS LEGAIS. CONCESSÃO DO AMPARO ASSISTENCIAL.
- O benefício de prestação continuada exige para a sua concessão que a parte comprove,
alternativamente, ter idade igual ou superior a 65 anos ou deter impedimento de longo prazo de
natureza física, mental, intelectual ou sensorial e, cumulativamente, não possuir meios de
prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família (art. 20, caput e § 2.º, da Lei n.º
8.742/1993).
- Impedimento de longo prazo e miserabilidade comprovados nos autos.
- Reconhecimento da procedência do pedido formulado.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
