Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5072132-86.2021.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal THEREZINHA ASTOLPHI CAZERTA
Órgão Julgador
8ª Turma
Data do Julgamento
27/05/2021
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 01/06/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. ART. 203, INCISO V, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. BENEFÍCIO DE
PRESTAÇÃO CONTINUADA. PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA. PRESENÇA DOS
REQUISITOS LEGAIS. CONCESSÃO DO AMPARO ASSISTENCIAL. HONORÁRIOS. BASE DE
CÁLCULO.
- O benefício de prestação continuada exige para a sua concessão que a parte comprove,
alternativamente, ter idade igual ou superior a 65 anos ou deter impedimento de longo prazo de
natureza física, mental, intelectual ou sensorial e, cumulativamente, não possuir meios de prover
à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família (art. 20, caput e § 2.º, da Lei n.º
8.742/1993).
- Impedimento de longo prazo e miserabilidade comprovados nos autos.
- Reconhecimento da procedência do pedido formulado.
- Os honorários advocatícios incidem sobre as parcelas vencidas até a sentença de procedência
(STJ, Súmula 111).
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
8ª Turma
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5072132-86.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ROSICLEIA SILVA DE OLIVEIRA
Advogado do(a) APELADO: LUIZ ANTONIO BELUZZI - SP70069-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5072132-86.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ROSICLEIA SILVA DE OLIVEIRA
Advogado do(a) APELADO: LUIZ ANTONIO BELUZZI - SP70069-N
OUTROS PARTICIPANTES:
-R E L A T Ó R I O
Trata-se de demanda objetivando a concessão de benefício assistencial, previsto no art. 203,
inciso V, da Constituição da República.
O juízo a quo julgou procedente o pedido formulado, reconhecendo à parte autora o direito ao
amparo pretendido.Condenou o INSS ao pagamento dos honorários advocatícios, fixados em
10% sobre o valor da condenação.
O INSS apela, requerendo, preliminarmente, o recebimento do recurso no duplo efeito, “eis que
os valores pagos por tutela dificilmente serão passíveis de ressarcimento, em prejuízo ao
erário”. No mérito, pleiteia a reforma da sentença, sustentando, em síntese, o não cumprimento
dos requisitos legais à concessão em questão. Se vencido, insurge-se com relação à base de
cálculo da verba honorária. Ao final, prequestiona a matéria.
Com contrarrazões, subiram os autos.
É o relatório.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5072132-86.2021.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ROSICLEIA SILVA DE OLIVEIRA
Advogado do(a) APELADO: LUIZ ANTONIO BELUZZI - SP70069-N
OUTROS PARTICIPANTES:
-V O T O
Tempestivo o recurso e presentes os demais requisitos de admissibilidade, passa-se ao exame
da insurgência propriamente dita, considerando-se a matéria objeto de devolução.
Inicialmente, ressalte-se que a apelação do Instituto Nacional do Seguro Social será
parcialmente conhecida, ante a falta de interesse em recorrer com relação a tutela antecipada,
uma vez que não houve condenação a respeito.
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL (PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA)
O benefício de prestação continuada consiste na “garantia de um salário mínimo de benefício
mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de
prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família”, conforme disposto no art. 203,
inciso V, da Constituição Federal, e regulamentado pelos arts. 20 a 21-A, da Lei n.º 8.742/1993.
A legislação exige a presença cumulativa de dois requisitos para a concessão do benefício.
Primeiro, o requerente deve, alternativamente, ter idade igual ou superior a 65 anos (art. 20,
caput, da Lei n.º 8.742/1993) ou ser deficiente, isto é, deter “impedimento de longo prazo de
natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais
barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de
condições com as demais pessoas (art. 20, § 2.º).
Segundo, o beneficiário deve comprovar situação de miserabilidade, caracterizada pela
inexistência de condições econômicas para prover o próprio sustento ou tê-lo provido por
alguém da família, consoante art. 20, § 3.º., da Lei n.º 8.742/1993 – dispositivo objeto de
declaração parcial de inconstitucionalidade, pela qual firmou o Supremo Tribunal Federal que
“sob o ângulo da regra geral, deve prevalecer o critério fixado pelo legislador no artigo 20, § 3º,
da Lei nº 8.742/93”, mas “ante razões excepcionais devidamente comprovadas, é dado ao
intérprete do Direito constatar que a aplicação da lei à situação concreta conduz à
inconstitucionalidade, presente o parâmetro material da Carta da República, qual seja, a
miserabilidade, assim frustrando os princípios observáveis – solidariedade, dignidade,
erradicação da pobreza, assistência aos desemparados” sendo que “em tais casos, pode o
Juízo superar a norma legal sem declará-la inconstitucional, tornando prevalecentes os ditames
constitucionais” (STF, Plenário, RE n.º 567.985, Rel. p/ Acórdão Min. Gilmar Mendes,
2.10.2013).
De se ressaltar, a esse respeito, que a redação original do art. 20, 3.º, da Lei n.º 8.742/1993,
dispunha que “considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou
idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo”.
O dispositivo em questão foi, entretanto, objeto de recentíssimas modificações.
Primeiro, a Lei n.º 13.981, de 24 de março de 2020, alterou o limite da renda mensal per capita
para “1/2 (meio) salário mínimo)”.
Depois, a Lei n.º 13.982, de 2 de abril de 2020, tencionou incluir dois incisos no dispositivo em
epígrafe, fixando o limite anterior de 1/4 do salário mínimo até 31 de dezembro de 2020,
incidindo, a partir de 1.º de janeiro de 2021, o novo teto, de 1/2 salário mínimo – aspecto este
que restou, porém, vetado.
Dessa forma, permanecem, no momento, hígidos tanto o critério da redação original do art. 20,
3.º. da Lei n.º 8.742/1993, quanto a interpretação jurisdicional no sentido de flexibilizá-lo nas
estritas hipóteses em que a miserabilidade possa ser aferida a partir de outros elementos
comprovados nos autos.
DO CASO DOS AUTOS
O laudo médico pericial de 21.10.2019 informa que a parte autora, que tem 45 anos de idade, é
portadora de “HISTÓRICO DE CÂNCER DE MAMA ESQUERDA e HISTÓRICO DE
QUADRANTECTOMIA MAMA ESQUERDA E ESVAZIAMENTO AXILAR ESQUERDA EM
28/10/2016”, apresentando incapacidade parcial e permanente para o exercício de atividade
laborativa.
Concluiu que “Ao exame físico constatado cicatriz cirúrgica compatível com procedimento
proposto para tratamento do câncer de mama e diminuição de força (4/5) do membro superior
esquerdo que gera incapacidade laborativa parcial e permanente, sendo incapaz para exercer a
atividade habitual de faxineira da autora ou outras funções que exijam esforço físico com
membro superior esquerdo”.
Considerando-se a patologia comprovada via laudo pericial, a idade da parte e a ausência de
qualificação profissional, conclui-se que o quadro apresentado se ajusta ao de impedimento de
longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial exigido pela legislação, restando
presente, portanto, o requisito do art. 20, § 2., da Lei n.º 8.742/1993.
Quanto ao requisito da miserabilidade, de acordo com o estudo social de 31.10.2017, “A
requerente e a sua família, reside em casa de alvenaria, inacabada, sem reboco, com oitão de
madeira, sem forro e com telha de barro, uma parte da casa quando chove não da para ser
usada, piso queimado, com sete cômodos com repartições improvisadas e em condições
rassuáveis, a pouco tempo recebeu ajuda da comunidade para construção de um muro na
frente da casa para conter a enchente”.
As imagens acostadas ao estudo social corroboram a afirmação da assistente social,
verificando-se que o mobiliário e os eletrodomésticos que guarnecem a residência são básicos
e antigos.
As despesas do núcleo familiar com alimentação, água, energia elétrica e gás, segundo
relatado, totalizam 388,62 reais.
Relatou a assistente social que “A requerente e a sua família resideem um bairro situado há
dois quilômetros da cidade do município onde residem e vivem em situação de vulnerabilidade
ambiental, devido ao um córrego que passa na frente da sua casa com esgotos do bairro
depositado nele. A requerente faz tratamento para (CA de mama) no hospital Geral de
Guarulhos, onde recebe doação do medicamento que faz uso diário com, (Tamoxifeno 20mg
c/30 cp)”.
Quanto à renda familiar, consta nos autos que residem com a parte autora três filhos, nenhum
dos quais percebe quaisquer rendimentos e o marido da autora percebe, mensalmente, “R$
1.053,80, auferido pelo esposo da requerente através de uma firma de materiais de construção
(Constrular) com carteira assinada como ajudante geral, e com a ajuda dos integrantes da
Igreja onde a pericianda frequenta com cestas básicas todos os meses e com roupas, quando
tem na Igreja, e é desta renda e da ajuda que a família tira o seu sustento, o que inclui
alimentação, água, gás, conta de luz, entre outras despesas”.
Do exposto, constata-se que a autora reside em moradia simples, está acometida de patologia
que a impede de trabalhar e depende do auxílio de terceiros para sobreviver, razão pela qual
está presente o requisito da miserabilidade, nos termos em que disposto no art. 20, § 3.º, da Lei
n.º 8.742/93, interpretado à luz do RE n.º 567.985.
De rigor, portanto, o deferimento do benefício, porquanto comprovados os requisitos
indispensáveis à sua concessão.
Os honorários advocatícios incidem sobre as parcelas vencidas até a sentença de procedência
(STJ, Súmula 111).
Quanto ao prequestionamento suscitado, inexiste contrariedade alguma à legislação federal ou
a dispostos constitucionais.
Posto isso, conheço em parte do recurso de apelação e, na parte conhecida dou-lhe parcial
provimento, para fixar a base de cálculo dos honorários advocatícios, nos termos da
fundamentação, supra.
É o voto.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. ART. 203, INCISO V, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. BENEFÍCIO
DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA. PRESENÇA
DOS REQUISITOS LEGAIS. CONCESSÃO DO AMPARO ASSISTENCIAL. HONORÁRIOS.
BASE DE CÁLCULO.
- O benefício de prestação continuada exige para a sua concessão que a parte comprove,
alternativamente, ter idade igual ou superior a 65 anos ou deter impedimento de longo prazo de
natureza física, mental, intelectual ou sensorial e, cumulativamente, não possuir meios de
prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família (art. 20, caput e § 2.º, da Lei n.º
8.742/1993).
- Impedimento de longo prazo e miserabilidade comprovados nos autos.
- Reconhecimento da procedência do pedido formulado.
- Os honorários advocatícios incidem sobre as parcelas vencidas até a sentença de
procedência (STJ, Súmula 111).
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu conhecer em parte do recurso de apelação e, na parte conhecida dar-lhe
parcial provimento, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do
presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
