
| D.E. Publicado em 14/12/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação autárquica, à remessa oficial e à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. A Desembargadora Federal Ana Pezarini acompanhou o relator pela conclusão.
Juiz Federal Convocado
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0003824-36.2009.4.03.6109/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Trata-se de ação de conhecimento proposta em face do INSS, na qual a parte autora busca o enquadramento e conversão de atividade especial, com vistas ao restabelecimento de sua aposentadoria por tempo de contribuição (DIB: 20/6/2002) aos termos deferidos antes do procedimento administrativo de auditagem que resultou em alterações no benefício que lhe foram desfavoráveis, e ao pagamento e/ou devolução das diferenças apuradas.
Pleiteia, ainda, seja reconhecida: (i) a decadência do direito de o INSS constituir débito em seu desfavor pelo inadimplemento de contribuições previdenciárias devidas no intervalo de 11/1998 a 03/2002; e (ii) a ilegalidade da cobrança das contribuições previdenciárias das competências 04/2002 a 02/2005.
A r. sentença julgou procedente o pedido, para: (i) enquadrar como especial o lapso de 2/5/1981 a 30/3/1989; (ii) reconhecer a inexigibilidade da cobrança das contribuições previdenciárias relativas as competências 11/1998, 04/1999 a 12/1999, 03/2000 a 08/2000, 10/2000, 12/2000 a 01/2001 e 03/2001 a 02/2005; (iii) restabelecer a aposentadoria por tempo de contribuição desde a data do requerimento administrativo (20/6/2002), com o pagamento das parcelas vencidas, observada a prescrição quinquenal, com correção monetária e acrescidas de juros de mora e honorários advocatícios. Antecipou-se a tutela jurisdicional.
Decisão submetida ao reexame necessário.
Pela decisão de f. 174 foram acolhidos os embargos de declaração da parte autora para dispor, em suma, sobre parcelas atrasadas e compensação de valores entre o benefício ora restabelecido e o benefício a ser cessado que vinha sendo pago.
Inconformada, a autarquia interpôs apelação, na qual alega, em síntese, não ser possível o enquadramento efetuado e serem devidas as contribuições previdenciárias do autor como contribuinte individual. Insurge-se, ainda, contra consectários. Por fim, faz prequestionamento para efeitos recursais.
A parte autora também apela. Requer seja afastada a prescrição quinquenal.
Com contrarrazões, os autos subiram a esta E. Corte.
Intimadas a manifestarem-se sobre competência da Terceira Seção desta Corte e legitimidade da autarquia previdenciária no tocante ao inadimplemento de contribuições previdenciárias, a qual, em tese, trata-se de matéria tributária, a autarquia manteve-se inerte e a parte autora afirmou a natureza previdenciária da questão e a legitimidade do INSS, por se tratar de cobrança a ser procedida com fulcro no artigo 115, I, da Lei n. 8.213/91.
É o relatório.
VOTO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Conheço dos recursos, porque presentes os requisitos de admissibilidade.
Inicio a análise pelos pedidos relativos à decadência do direito de o INSS constituir débito em desfavor do autor pelo inadimplemento de contribuições previdenciárias devidas no intervalo de 11/1998 a 03/2002; e à ilegalidade da cobrança das contribuições previdenciárias das competências 04/2002 a 02/2005.
Sobre essas questões, anoto ser o INSS parte ilegítima, pois, com a criação da Receita Federal do Brasil, pela Lei n. 11.457/2007, a competência para responder passivamente por tal pedido passou a ser da União (capacidade ativa tributária).
Ademais, não há notícia de que esses débitos foram formalmente constituídos, muito menos de que eles tenham sido descontados do valor do benefício nos termos do art. 115, I, da Lei n. 8.213/91.
Com efeito, durante a tramitação do procedimento administrativo de auditagem, a questão relativa ao inadimplemento das contribuições previdenciárias como empresário (CI) foi realmente constatada (f. 75 e 78/80), mas a providência respectiva da autarquia restringiu-se a indicar ao segurado as competências pendentes e orientá-lo, caso quisesse quitar o débito, a acessar o site da previdência para apurar o montante devido (f. 91/92), além de encaminhar memorando interno a Secretaria da Receita Federal (f. 78) - essa sim, competente para eventual cobrança tributária.
Note-se que o desconto mensal consignado no benefício é decorrente exclusivamente do débito apurado pelo pagamento supostamente indevido da aposentadoria que ora se discute, em observância ao disposto no inciso II do art. 115 da Lei n. 8.213/91, consoante evidenciam, sem margem a dúvidas, os documentos de f. 78/80 e 87/92. Sobre essa cobrança, aliás, o segurado apôs expressamente sua nota de ciência (f. 81/82).
Assim, a extinção desses pedidos, sem resolução de mérito, é medida que se impõe. Nesse sentido, cito decisão da Nona Turma desta Corte: AC n. 2009.61.83.001977-0, rel. Des. Fed. Marisa Santos, em 29/8/11.
No mais, discute-se o restabelecimento do benefício às condições incialmente deferidas pela autarquia (DIB em 20/6/2002) - antes do procedimento de auditagem que culminou em reafirmação da DER para 20/02/2005 e diminuição da renda mensal inicial.
A controvérsia, na hipótese, restringe-se ao enquadramento especial reconhecido na r. sentença de 2/5/1981 a 30/3/1989.
Quanto ao demais lapsos que haviam sido objeto da auditagem, estes já foram administrativamente validados (f. 87/88 e 106).
Do enquadramento de período especial
Editado em 3 de setembro de 2003, o Decreto n. 4.827 alterou o artigo 70 do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048, de 6 de maio de 1999, o qual passou a ter a seguinte redação:
Por conseguinte, o tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os trabalhadores assim enquadrados poderão fazer a conversão dos anos trabalhados a "qualquer tempo", independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da aposentadoria.
Ademais, em razão do novo regramento, encontram-se superadas a limitação temporal, prevista no artigo 28 da Lei n. 9.711/98, e qualquer alegação quanto à impossibilidade de enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/80.
Nesse sentido, reporto-me à jurisprudência firmada pelo Colendo STJ:
Cumpre observar que antes da entrada em vigor do Decreto n. 2.172, de 5 de março de 1997, regulamentador da Lei n. 9.032/95, de 28 de abril de 1995, não se exigia (exceto em algumas hipóteses) a apresentação de laudo técnico para a comprovação do tempo de serviço especial, pois bastava o formulário preenchido pelo empregador (SB-40 ou DSS-8030), para atestar a existência das condições prejudiciais.
Contudo, tem-se que, para a demonstração do exercício de atividade especial cujo agente agressivo seja o ruído, sempre houve necessidade da apresentação de laudo pericial, independentemente da época de prestação do serviço.
Nesse contexto, a exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do Decreto n. 2.172/97, que majorou o nível para 90 decibéis. Isso porque os Decretos n. 83.080/79 e n. 53.831/64 vigoraram concomitantemente até o advento do Decreto n. 2.172/97.
Com a edição do Decreto n. 4.882, de 18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido para 85 decibéis (art. 2º do Decreto n. 4.882/2003, que deu nova redação aos itens 2.0.1, 3.0.1 e 4.0.0 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048/99).
Quanto a esse ponto, à míngua de expressa previsão legal, não há como conferir efeito retroativo à norma regulamentadora que reduziu o limite de exposição para 85 dB(A) a partir de novembro de 2003.
Sobre essa questão, o STJ, ao apreciar o Recurso Especial n. 1.398.260, sob o regime do art. 543-C do CPC, consolidou entendimento acerca da inviabilidade da aplicação retroativa do decreto que reduziu o limite de ruído no ambiente de trabalho (de 90 para 85 dB) para configuração do tempo de serviço especial (julgamento em 14/05/2014).
Com a edição da Medida Provisória n. 1.729/98 (convertida na Lei n. 9.732/98), foi inserida na legislação previdenciária a exigência de informação, no laudo técnico de condições ambientais do trabalho, quanto à utilização do Equipamento de Proteção Individual (EPI).
Desde então, com base na informação sobre a eficácia do EPI, a autarquia deixou de promover o enquadramento especial das atividades desenvolvidas posteriormente a 3/12/1998.
Sobre a questão, entretanto, o C. Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o ARE n. 664.335, em regime de repercussão geral, decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo ao enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto, divergência ou dúvida sobre a real eficácia do EPI para descaracterizar completamente a nocividade, deve-se optar pelo reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade do agente.
Quanto a esses aspectos, sublinhe-se o fato de que o campo "EPI Eficaz (S/N)" constante no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) é preenchido pelo empregador considerando-se, tão somente, se houve ou não atenuação dos fatores de risco, consoante determinam as respectivas instruções de preenchimento previstas nas normas regulamentares. Vale dizer: essa informação não se refere a real eficácia do EPI para descaracterizar a nocividade do agente.
In casu, no período discutido (2/5/1981 a 30/3/1989), a parte autora mantinha vínculo empregatício com a empresa MIORI S/A - Indústria e Comércio, a qual atuava no ramo de engarrafamento de aguardente.
Para comprovar a especialidade da atividade foi apresentado formulário preenchido pelo empregador, acompanhado do respectivo laudo técnico individual, no qual consta que, no período de atividade compreendido entre 2/5/1981 a 28/2/1989, o autor, na função de serviços gerais, exercia suas atividades no setor de engarrafamento, sujeito a ruído contínuo médio de 95 dB - acima, portanto, do limite de tolerância previsto no código 1.1.5 do Decreto n. 83.080/79.
Quanto a esse aspecto, sublinhe-se o fato de que, no ano de 2004, a irregularidade inicialmente observada na auditagem sobre esse período referia-se a ausência de indicação de quem havia contratado o profissional (engenheiro) legalmente habilitado responsável pela elaboração do laudo técnico individual, se a empresa ou o segurado (f. 67).
Entretanto, quaisquer dúvidas a esse respeito foram absolutamente dirimidas com a apresentação da respectiva declaração do ex-empregador (f. 101), na qual consta que o engenheiro foi contratado pela própria empresa.
Há de se destacar, ainda, que durante a tramitação da auditagem a administração consignou informação sobre a existência de laudo geral da empresa arquivado no Instituto (f. 68), sugerindo novo encaminhamento à análise técnica para retificar ou ratificar o enquadramento efetuado, o que ensejou novo pronunciamento administrativo favorável ao enquadramento, datado de 2007 (f. 70/71). Somente numa terceira avaliação técnica da autarquia, datada de 2008, é que não houve o enquadramento pretendido (f. 86).
Por outro lado, em novo relatório da auditagem (f. 72/75), elaborado no ano de 2007, foi verificada inconsistência entre a função indicada no formulário para enquadramento de atividades especiais e aquelas constantes na folha de registro de empregados - FRE da empresa (f. 26/28).
Essa inconsistência de fato existe, pois, segundo a FRE, a função de serviços gerais que consta no formulário até 28/2/1989, só teria sido exercida até 31/12/1987, quando o autor passou a exercer a função de motorista, o que perdurou até 28/2/1989, ocasião em que passou a ser mensageiro.
Não obstante, esse fato não prejudicaria o reconhecimento da especialidade até 28/2/1989, pois a função de motorista também autoriza o enquadramento pela categoria profissional, nos termos do código 2.4.2 do Decreto n. 83.080/79, consoante, aliás, já havia sinalizado o agente administrativo no referido relatório de f. 72/75. Além disso, em período pretérito (dezembro de 1974 a abril de 1979) o autor já havia exercido essa mesma função (motorista), nessa mesma empresa (Miori S/A) e houve o devido enquadramento administrativo da atividade (f. 87).
Quanto ao lapso remanescente reconhecido na r. sentença de 29/2/1989 a 30/3/1989, não é possível o enquadramento especial, haja vista que: (i) a categoria profissional de mensageiro não está abarcada na legislação de regência; (ii) não há formulário ou laudo que indique a sujeição a agentes nocivos nessa atividade e (iii) o próprio autor afirmou (embora se reporte a data equivocada) que na função de mensageiro não estava exposto a agentes agressivos (f. 95).
Dessa forma, o lapso de 2/5/1981 a 28/2/1989 deve ser considerado como atividade especial, convertido em comum e somado aos lapsos incontroversos.
Por conseguinte, o restabelecimento da aposentadoria por tempo de contribuição do autor, nos exatos termos inicialmente deferidos administrativamente por ocasião do requerimento efetivado em 20/6/2002 (f. 38/39), é medida que se impõe.
O termo inicial do benefício é a data do requerimento na via administrativa (20/6/2002), com o pagamento de todas as parcelas devidas e não pagas desde então.
Na hipótese, não há de se falar em fixação do termo inicial na data da citação, pois toda documentação relativa ao período discutido nestes autos foi submetida à apreciação autárquica durante a tramitação administrativa do processo de concessão / confirmação do benefício. Ressalte-se que o benefício requerido em 20/6/2002 foi deferido em 8/10/2003 (DDB) e, imediatamente iniciada a auditagem - 11/11/2003 (f. 44/46), esta perdurou pelo menos até 14/11/2008.
Da mesma forma, não se verifica a ocorrência da prescrição quinquenal, isso porque entre o término do procedimento administrativo, cujo último andamento noticiado data de 14/11/2008 (f. 107) e o ajuizamento desta ação - 24/4/2009 - não decorreu prazo superior a cinco anos.
Quanto à correção monetária, esta deve ser aplicada nos termos da Lei n. 6.899/81 e da legislação superveniente, bem como do Manual de Orientação de Procedimentos para os cálculos na Justiça Federal, observado o disposto na Lei n. 11.960/2009, consoante Repercussão Geral no RE n. 870.947, em 16/4/2015, Rel. Min. Luiz Fux e Informativo 833 do Supremo Tribunal Federal.
Com relação aos juros moratórios, estes são fixados em 0,5% (meio por cento) ao mês, contados da citação, por força dos artigos 1.062 do antigo CC e 219 do CPC/73, até a vigência do novo CC (11/1/2003), quando esse percentual foi elevado a 1% (um por cento) ao mês, nos termos dos artigos 406 do novo CC e 161, § 1º, do CTN, devendo, a partir de julho de 2009, serem mantidos no percentual de 0,5% ao mês, observadas as alterações introduzidas no art. 1-F da Lei n. 9.494/97 pelo art. 5º da Lei n. 11.960/09, pela MP n. 567, de 03 de maio de 2012, convertida na Lei n. 12.703, de 07 de agosto de 2012, e por legislação superveniente.
Em relação às parcelas vencidas antes da citação, os juros são devidos desde então de forma global e, para as vencidas depois da citação, a partir dos respectivos vencimentos, de forma decrescente.
Os honorários advocatícios ficam mantidos em 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas vencidas até a data da prolação da sentença, consoante § 3º do artigo 20 do CPC/1973, orientação desta Turma e nova redação da Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça.
Considerando que a sentença foi publicada na vigência do CPC/1973, não incide ao presente caso a regra de seu artigo 85, §§ 1º e 11, que determina a majoração dos honorários de advogado em instância recursal.
Possíveis valores não cumulativos recebidos na esfera administrativa deverão ser compensados por ocasião da liquidação do julgado.
Diante do exposto, dou parcial provimento à apelação autárquica, à remessa oficial e à apelação da parte autora, para, nos termos da fundamentação: (i) extinguir o feito, sem resolução de mérito, com fulcro no art. 485, VI, do CPC/2015, no tocante aos pedidos relativos à inexigibilidade de cobrança das contribuições previdenciárias; (ii) enquadrar como atividade especial o intervalo de 2/5/1981 a 28/2/1989; (iii) afastar a incidência da prescrição quinquenal; e (iv) fixar critérios de incidência dos consectários. Mantida, no mais, a r. sentença impugnada.
É o voto.
Juiz Federal Convocado
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