Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0005231-62.2018.4.03.6303
Relator(a)
Juiz Federal ALEXANDRE CASSETTARI
Órgão Julgador
2ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
12/07/2022
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 24/07/2022
Ementa
E M E N T A
Previdenciário. Processual civil. Não é condicional a sentença que determina ao INSS a
implantação do benefício segundo os parâmetros estipulados em seu dispositivo. Aposentadoria
por tempo de contribuição. Tempo de serviço rural. Início de prova material. Recurso do INSS
desprovido.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
2ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0005231-62.2018.4.03.6303
RELATOR:6º Juiz Federal da 2ª TR SP
RECORRENTE: JOSE NONATO CIRQUEIRA
PROCURADOR: DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0005231-62.2018.4.03.6303
RELATOR:6º Juiz Federal da 2ª TR SP
RECORRENTE: JOSE NONATO CIRQUEIRA
PROCURADOR: DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Recorre o INSS contra sentença que julgou parcialmente procedente o pedido de aposentadoria
por tempo de contribuição mediante reconhecimento de serviço rural.
É o relatório. Passo a decidir.
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0005231-62.2018.4.03.6303
RELATOR:6º Juiz Federal da 2ª TR SP
RECORRENTE: JOSE NONATO CIRQUEIRA
PROCURADOR: DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Preliminarmente, afasto a arguição de nulidade da sentença. Assevero que a sentença analisou
o pedido e entregou a prestação jurisdicional dentro dos parâmetros delimitados pela inicial. A
sentença se afigura líquida, eis que delimita todos os termos de sua abrangência e identifica
expressamente os períodos de trabalho a integrarem a contagem de tempo de serviço da parte
autora. A simples determinação de implantação do benefício a cargo do INSS não torna a
prestação jurisdicional condicionada, eis que não pode o INSS inovar em relação à condenação
imposta. No mais, a própria inicial traz a contagem de tempo de serviço realizada pelo INSS,
não sendo de difícil apreciação o tempo necessário à satisfação desse requisito. Saliento, por
fim, que por força da antecipação de tutela determinada pelo juízo, já houve, inclusive,
cumprimento do réu quanto à implantação do benefício, sem qualquer prejuízo ao autor, que,
ademais, não recorreu para alegar qualquer prejuízo em relação à sua pretensão.
Passo ao mérito.
No que tange à concessão da aposentadoria por tempo de serviço, ressalto que o benefício tem
previsão nos artigos 52 e seguintes da Lei federal nº 8.213/1991, com as alterações
implementadas pela Emenda Constitucional nº 20, de 15 de dezembro de 1998.
Esta norma constitucional, em seu artigo 9º, fixou as regras de transição entre o sistema
anterior e o que passaria a ser implementado a partir de então. Portanto, aqueles que já
estivessem filiados ao Regime Geral de Previdência Social (RGPS) antes da promulgação da
referida emenda constitucional, mas não reunissem ainda os requisitos necessários para a
aposentadoria, teriam assegurado o direito correlato, conquanto fossem observadas todas as
condições impostas.
O requisito essencial deste benefício, como o próprio nome já indica, é o tempo de contribuição
(ou tempo de serviço até a EC nº 20/1998). Tanto na chamada aposentadoria proporcional,
existente até então, quanto na integral, o segurado deve atender a este requisito,
cumulativamente com os demais, para fazer jus à aposentação.
Destarte, nos termos do artigo 9º, inciso II, alínea “a”, da Emenda Constitucional nº 20/1998, o
segurado, se homem, deve ter a idade mínima de 53 (cinqüenta e três) anos, contar com tempo
mínimo de 35 (trinta e cinco) anos de contribuição e cumprir o denominado pedágio instituído na
alínea “b” do mesmo dispositivo, no patamar de 20% (vinte por cento) do lapso que restaria
para completar a carência ínfima exigida, objetivando à aposentadoria integral.
Outrossim, nos termos do artigo 9º § 1º e inciso I, da mesma Emenda Constitucional, se o
segurado visar à aposentadoria proporcional, também deve ter a idade mínima de 53 (cinqüenta
e três) anos, contar com tempo mínimo de 30 (trinta) anos de contribuição e cumprir o pedágio
instituído na alínea “b” do referido inciso I, no patamar de 40% (quarenta por cento) do lapso
que restaria para completar a carência ínfima exigida.
Por fim, foi ressalvado o direito adquirido daqueles que já contavam com 30 (trinta) anos ou
mais de serviço/contribuição até a promulgação da EC nº 20/1998 (artigo 3º, caput).
Passo a tecer considerações a respeito da atividade rural.
Quanto ao reconhecimento do período laborado como trabalhador rural, de acordo com o art.
55, § 2º, da Lei nº 8.213/91, o tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data
de início de vigência desta Lei, será computado independentemente do recolhimento das
contribuições a ele correspondentes, exceto para efeito de carência, conforme dispuser o
Regulamento.
Por tal razão, é necessário delimitar exatamente a quem se refere a Lei 8.213/1991 ao tratar do
trabalhador rural, a fim de saber se seu intuito seria isentar de contribuição somente o
trabalhador rural empregado ou também o trabalhador rural empregador. Para tanto, devemos
nos socorrer da legislação específica da época.
Nesse sentido, o Estatuto do Trabalhador Rural, Lei 4.214/1963, dispunha:
Art. 2º Trabalhador rural para os efeitos desta é toda pessoa física que presta serviços a
empregador rural, em propriedade rural ou prédio rústico, mediante salário pago em dinheiro ou
in natura, ou parte in natura e parte em dinheiro.
Art. 3º - Considera-se empregador rural, para os efeitos desta lei, a pessoa física ou jurídica,
proprietário ou não, que explore atividades agrícolas, pastoris ou na indústria rural, em caráter
temporário ou permanente, diretamente ou através de prepostos.
A Lei 4.214/1963 foi expressamente revogada pelo artigo 21 da Lei 5.889/1973, que por sua vez
assim define:
Art. 2º Empregado rural é toda pessoa física que, em propriedade rural ou prédio rústico, presta
serviços de natureza não eventual a empregador rural, sob a dependência deste e mediante
salário.
Art. 3º - Considera-se empregador rural, para os efeitos desta Lei, a pessoa física ou jurídica,
proprietário ou não, que explore atividade agro-econômica, em caráter permanente ou
temporário, diretamente ou através de prepostos e com auxílio de empregados.
A conclusão a que se chega é que já existia no ordenamento jurídico um conceito bem
delimitado de trabalhador rural como sendo especificamente o empregado rural, em oposição
ao empregador rural. Aquele aufere renda do fruto de seu trabalho; este aufere renda do fruto
da terra.
Ainda em consonância com essa interpretação, vale lembrar da Lei 6.260/1975, que criou o
FUNRURAL e instituiu, em favor dos empregadores rurais e seus dependentes os benefícios de
previdência e assistência social (artigo 1º da referida lei), estabelecendo em seguida as
espécies de benefício e a forma de custeio obrigatório, a cargo do empregador rural.
Nesse sentido, é possível afirmar que o empregador rural não foi contemplado no artigo 55, §
2º, da Lei 8213/1991, cumprindo a ele, em qualquer tempo, o recolhimento de contribuições.
E ora voltando a atenção para o empregador rural, vemos que seu conceito encontra-se
também bem delimitado pela legislação, como o que explora a atividade rural (aufere lucros)
“diretamente ou através de prepostos”, segundo a Lei 4.214/1963, ao que a Lei 5.889/1973 veio
acrescentar “e com auxílio de empregados”.
Tornando à Lei 8213/91, observamos que também neste ponto ela se harmoniza com o sistema
prévio, incluindo o empregador rural na condição de contribuinte individual previsto no artigo 11,
V, a, e destacando expressamente a figura do segurado especial no artigo 11, VII, a fim de que
não fosse ele confundido com a figura do empregador rural:
Art. 11 (...)
V - como contribuinte individual:
a) a pessoa física, proprietária ou não, que explora atividade agropecuária ou pesqueira, em
caráter permanente ou temporário, diretamente ou por intermédio de prepostos e com auxílio de
empregados, utilizados a qualquer título, ainda que de forma não contínua;
...
VII - como segurado especial: o produtor, o parceiro, o meeiro e o arrendatário rurais, o
garimpeiro, o pescador artesanal e o assemelhado, que exerçam suas atividades,
individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de
terceiros, bem como seus respectivos cônjuges ou companheiros e filhos maiores de 14
(quatorze) anos ou a eles equiparados, desde que trabalhem, comprovadamente, com o grupo
familiar respectivo.
§ 1º Entende-se como regime de economia familiar a atividade em que o trabalho dos membros
da família é indispensável à própria subsistência e é exercido em condições de mútua
dependência e colaboração, sem a utilização de empregados.” (grifei)
Ora, o artigo 11 da Lei 8.213/1991 inclui o produtor rural e assemelhados, em economia
familiar, como segurado obrigatório, sendo ele dispensado de contribuir para o sistema até a
vigência da Lei 8.213/1991, numa interpretação sistemática com o artigo 55, § 2º já visto. Afinal,
em relação ao trabalhador rural não é possível exigir recolhimento em qualquer período, mesmo
quando passou a ser segurado da Previdência Social com a edição da Lei Complementar
11/71, eis que cabe à Autarquia Previdenciária diligenciar para verificação de regulares
recolhimentos por parte do empregador. Sendo assim, o artigo 55, § 2º, da Lei 8.213/1991 não
teria nenhum sentido de existir a não ser equiparar o segurado especial ao trabalhador rural
(empregado rural) para efeito de dispensa de contribuições.
As razões aqui expostas encontram abrigo na jurisprudência, como se vê do julgado a seguir:
PREVIDENCIÁRIO. RURÍCOLA. RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO. REGIME DE
ECONOMIA FAMILIAR. DESCARACTERIZAÇÃO. EMPREGADOR RURAL. CONTRIBUIÇÃO
PREVIDENCIÁRIA. NECESSIDADE. APELAÇÃO DO INSS PROVIDA.
I - Em obediência ao artigo 202, II, da Constituição Federal, editou-se a Lei nº 8.213, de 24 de
julho de 1991, cujos artigos 52 e seguintes forneceram o regramento legal sobre o benefício
previdenciário aqui pleiteado, e segundo os quais restou afirmado ser devido ao segurado da
Previdência Social que completar 25 (vinte e cinco) anos de serviço, se mulher, ou 30 (trinta)
anos, se homem, evoluindo o valor do benefício de um patamar inicial de 70% do salário-de-
benefício para o máximo de 100%, caso completados 30 (trinta) anos de serviço, se do sexo
feminino, ou 35 (trinta e cinco) anos, se do sexo masculino.
II - A tais requisitos, some-se o cumprimento da carência, acerca da qual previu o artigo 25, II,
da Lei nº 8.213/91 ser de 180 (cento e oitenta) contribuições mensais no caso de aposentadoria
por tempo de serviço.
III - Ao segurado trabalhador rural, foi assegurado o cômputo do tempo de serviço anterior à
data de início de vigência da Lei 8.213/91, independentemente do recolhimento das
contribuições a ele correspondentes, exceto para efeito de carência, conforme previsto no § 2º
do artigo 55.
IV - Para o reconhecimento do tempo de serviço do trabalhador não registrado, é exigido pelo
menos um início de prova documental razoável, não sendo admitida prova exclusivamente
testemunhal, nos termos do § 3º do artigo 55 da Lei acima citada.
V - Não foi comprovado o regime de economia familiar, no qual o trabalho é exercido pelos
membros da família, em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de
empregados, tido como indispensável à própria subsistência, nos termos do artigo 11, § 1º, da
Lei nº 8.213/91, sendo tal conceito já esboçado no artigo 160 do Estatuto do Trabalhador Rural
(Lei nº 4.214/63).
VI - Perante a Previdência Social, o apelado ostentava a condição de empregador rural, e não
de lavrador em regime de economia familiar, como quer fazer crer. Por isso, deve receber o
tratamento outorgado pela Lei nº 4.214/63, artigos 3º e 161. Posteriormente, pela Lei nº
6.260/975, até ser equiparado a trabalhador autônomo, nos termos do artigo 11, V, "a", da Lei
nº 8.213/91, em sua redação original.
VII - No caso presente, para fins de aposentadoria por tempo de serviço, somente é possível o
cômputo do período laborado em atividade rural com o recolhimento das contribuições
correspondentes à Previdência Social, como prevê o artigo 55, § 1º, da Lei nº 8.213/91, em sua
redação original, o que o apelado não demonstrou ter feito.
VIII - Restou demonstrado, e reconhecido pelo INSS, que o apelado desenvolveu atividade
urbana por 8 (oito) anos, 3 (três) meses e 11 (onze) dias.
IX - Não comprovado o tempo de serviço necessário, não faz jus à concessão do benefício
pleiteado
X - Apelação do INSS provida.
(TRF 3, AC 00148952519974039999, 9ª Turma, Des. Fed. Marisa Santos, DJU:23/10/2003)
Por fim, ao englobar a todos no sistema previdenciário, a Lei 8.213/1991 passou a exigir dos
trabalhadores rurais a respectiva contribuição, ainda que mediante substituição tributária. O
parágrafo 2º do artigo 55 da Lei 8.213/1991 deixa claro que o período anterior à mesma lei,
época em que não era exigível a contribuição previdenciária para o trabalhador rural, pode ser
utilizado para fim de contagem de tempo de serviço, ressalvado para efeito de carência, do que
se conclui que a partir de então o recolhimento tornou-se obrigatório.
No caso em tela, insurge-se o réu quanto ao período rural reconhecido por sentença de
18.08.1968 a 31.12.1976, o que não prospera. A fim de demonstrar o trabalho em questão, o
autor juntou início de prova material consistente de declaração de atividade rural de terceiro no
sentido de que o autor exerceu atividade rural em regime de economia familiar na propriedade
do declarante no período de 1966 a 1979; certidões e comprovantes de ITR relativos a
propriedade rural em nome do pai do autor, documentos escolares do autor para fins de
comprovação de domicílio rural de 1972 a 1975, certificado de dispensa de incorporação militar
de 1976 e outros detalhados na sentença. Os documentos emprestados do pai do autor podem
ser aproveitados ao caso e indicam a existência de trabalho do autor em economia familiar em
conjunto com seu pai. O início de prova material é razoável e foi complementado por prova oral
colhida por via de precatória, a qual, não obstante inúmeros pedidos, não foi anexada aos
autos, conforme narrado pela sentença. Neste ponto, considero que o autor não deve ser
penalizado pela morosidade ou equívoco que impediu a anexação da precatória, sendo
razoável considerar, como fez o juízo, o tempo declarado por sentença, o qual toma por ponto
inicial a data em que o autor completou 12 anos, nos termos da Súmula 5 da TNU, e tem termo
final no ano de emissão da carteira de trabalho do autor.
Ante o exposto, nego provimento ao recurso.
Condeno a autarquia previdenciária ao pagamento de honorários advocatícios, que fixo em 10%
(dez por cento) sobre valor da condenação, apurados até a data da sentença, limitada tal verba
ao valor de alçada dos Juizados Especiais Federais, correspondente a 60 (sessenta) salários
mínimos, vigente na data da execução.
Sem custas para o INSS, nos termos do art. 8º § 1º da Lei nº 8.620/93.
É o voto.
E M E N T A
Previdenciário. Processual civil. Não é condicional a sentença que determina ao INSS a
implantação do benefício segundo os parâmetros estipulados em seu dispositivo. Aposentadoria
por tempo de contribuição. Tempo de serviço rural. Início de prova material. Recurso do INSS
desprovido. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Segunda Turma
Recursal do Juizado Especial Federal da Terceira Região - Seção Judiciária de São Paulo, por
unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo
parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
