
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000389-38.2011.4.03.6124
RELATOR: Gab. 26 - DES. FED. HERBERT DE BRUYN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: VERONILDA DE OLIVEIRA ELIAS - SP67384-A
APELADO: MARIA LUZIA PAVIM ONIBENI
Advogado do(a) APELADO: ELSON BERNARDINELLI - SP72136-A
OUTROS PARTICIPANTES:
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000389-38.2011.4.03.6124
RELATOR: Gab. 26 - DES. FED. HERBERT DE BRUYN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: VERONILDA DE OLIVEIRA ELIAS - SP67384-A
APELADO: MARIA LUZIA PAVIM ONIBENI
Advogado do(a) APELADO: ELSON BERNARDINELLI - SP72136-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL HERBERT DE BRUYN (RELATOR): Os autos retornaram da E. Vice-Presidência desta Corte para análise de juízo de retratação, tendo em vista o julgamento do Tema nº 692/STJ.
O acórdão recorrido negou provimento à apelação do INSS, mantendo a sentença de procedência no que tange ao pedido de declaração de nulidade da cobrança efetuada administrativamente pela autarquia, referente aos valores recebidos em decorrência de tutela antecipada posteriormente revogada (ID 260133163, págs. 174/180).
Houve a interposição de embargos de declaração, os quais não foram providos (ID 260133163, págs. 198/206), motivo pelo qual a autarquia interpôs recursos extraordinário e especial.
A E. Vice-Presidência deste Tribunal determinou a devolução dos autos a esta Turma Julgadora para reexame, nos termos do inc. II, do art. 1.040, do CPC (ID 263327305).
É o relatório.
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000389-38.2011.4.03.6124
RELATOR: Gab. 26 - DES. FED. HERBERT DE BRUYN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: VERONILDA DE OLIVEIRA ELIAS - SP67384-A
APELADO: MARIA LUZIA PAVIM ONIBENI
Advogado do(a) APELADO: ELSON BERNARDINELLI - SP72136-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL HERBERT DE BRUYN (RELATOR): Os autos retornaram da E. Vice-Presidência desta Corte para análise de eventual juízo de retratação, nos termos do inc. II, do art. 1.040, do CPC.
Trata-se de ação objetivando o restabelecimento de aposentadoria por idade de trabalhadora rural, bem como a declaração de nulidade da cobrança efetuada administrativamente pelo INSS, referente às parcelas recebidas pela parte autora, no período de 1º/7/02 a 30/9/10. Os valores foram auferidos em decorrência de tutela antecipada concedida nos autos da Ação Rescisória nº 98.03.104496-6, posteriormente revogada por ocasião do julgamento do mérito, em 27/10/09, cuja decisão transitou em julgado em 14/1/20 (ID 260133163, págs. 83/95).
Consta dos autos o “AVISO DE COBRANÇA”, emitido pelo Senhor Gerente da Agência da Previdência Social, datado de 5/1/2011, endereçado à autora, bem como o demonstrativo dos valores cobrados, com a respectiva Guia da Previdência Social para fins de pagamento (ID 260133163, págs. 25/32).
A MMª. Juíza a quo julgou extinto o processo sem resolução do mérito com relação ao pedido de restabelecimento da aposentadoria e procedente o pleito de declaração de nulidade da cobrança efetuada.
Houve interposição de apelação pelo INSS, a qual não foi provida, sob o fundamento de não serem devidas a devolução de parcelas recebidas de boa-fé, tendo em vista a natureza alimentar das prestações previdenciárias (ID 260133163, págs. 174/180), motivo pelo qual houve a interposição de recursos extraordinário e especial.
Inicialmente, observo não ser a hipótese de discussão sobre valores recebidos de boa-fé pela segurada, tendo em vista que a quantia recebida pela parte autora decorre de tutela antecipada posteriormente revogada.
Com efeito, em 11 de maio de 2022, o C. Superior Tribunal de Justiça revisou a tese anteriormente firmada no Tema nº 692 do sistema dos Recursos Repetitivos, confirmando a obrigação de devolução de valores em caso de reforma que antecipa os efeitos da tutela:
“A reforma da decisão que antecipa os efeitos da tutela final obriga o autor da ação a devolver os valores dos benefícios previdenciários ou assistenciais recebidos, o que pode ser feito por meio de desconto em valor que não exceda 30% (trinta por cento) da importância de eventual benefício que ainda lhe estiver sendo pago.”
No entanto, com relação à forma de cobrança dos valores a serem restituídos, dispõe o art. 302 do Código de Processo Civil:
“Independentemente da reparação por dano processual, a parte responde pelo prejuízo que a efetivação da tutela de urgência causar à parte adversa, se:
I - a sentença lhe for desfavorável;
II - obtida liminarmente a tutela em caráter antecedente, não fornecer os meios necessários para a citação do requerido no prazo de 5 (cinco) dias;
III - ocorrer a cessação da eficácia da medida em qualquer hipótese legal;
IV - o juiz acolher a alegação de decadência ou prescrição da pretensão do autor.
Parágrafo único. A indenização será liquidada nos autos em que a medida tiver sido concedida, sempre que possível.” (grifos meus)
Outrossim, observo que o C. Superior Tribunal de Justiça, ao apreciar o Recurso Especial nº 1.338.912/SE, afirmou: “O normativo contido no inciso II do artigo 115 da Lei n. 8.213/1991 não autoriza o INSS a descontar, na via administrativa, valores concedidos a título de tutela antecipada, posteriormente cassada com a improcedência do pedido. Nas demandas judicializadas, tem o INSS os meios inerentes ao controle dos atos judiciais que por ele devem ser manejados a tempo e modo” (STJ, 1ª Turma, Relator Ministro Benedito Gonçalves, j. em 23/5/17, pu., DJe de 29/5/17, grifos meus.)
Dessa forma, considerando que os valores exigidos pela autarquia decorrem de demanda judicializada, tal cobrança deve ser realizada na esfera judicial, com a devida análise e apuração da quantia efetivamente devida, não sendo possível a sua postulação na via administrativa, “sob pena de inobservância do princípio da segurança jurídica” (REsp. nº 1.338.912/SE, acima mencionado).
Ressalto não estar sendo declarada a inexigibilidade dos valores cobrados pelo INSS, mas apenas a inadequação da via eleita pela autarquia para reaver os valores decorrentes da decisão judicial que revogou a tutela antecipada deferida anteriormente.
Nesse sentido, transcrevo o precedente do C. Superior Tribunal de Justiça:
“RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. DESISTÊNCIA DA DEMANDA APÓS A CONCESSÃO DA TUTELA PROVISÓRIA. EXTINÇÃO DO FEITO, SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA FORMULADO PELA PARTE RÉ PLEITEANDO O RESSARCIMENTO DOS VALORES DESPENDIDOS EM RAZÃO DO DEFERIMENTO DA TUTELA PROVISÓRIA. CABIMENTO. DESNECESSIDADE DE PRONUNCIAMENTO JUDICIAL PRÉVIO NESSE SENTIDO. OBRIGAÇÃO EX LEGE. INDENIZAÇÃO QUE DEVERÁ SER LIQUIDADA NOS PRÓPRIOS AUTOS. ARTS. 302, CAPUT, INCISO III E PARÁGRAFO ÚNICO, E 309, INCISO III, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. REFORMA DO ACÓRDÃO RECORRIDO QUE SE IMPÕE. RECURSO PROVIDO.
1. A questão jurídica discutida consiste em definir se é possível proceder à execução, nos próprios autos, objetivando o ressarcimento de valores despendidos a título de tutela antecipada, posteriormente revogada em virtude de sentença que extingue o processo, sem resolução de mérito, por haver a autora desistido da ação.
2. O Código de Processo Civil de 2015, seguindo a mesma linha do CPC/1973, adotou a teoria do risco-proveito, ao estabelecer que o beneficiado com o deferimento da tutela provisória deverá arcar com os prejuízos causados à parte adversa, sempre que: i) a sentença lhe for desfavorável; ii) a parte requerente não fornecer meios para a citação do requerido no prazo de 5 (cinco) dias, caso a tutela seja deferida liminarmente; iii) ocorrer a cessação da eficácia da medida em qualquer hipótese legal; ou iv) o juiz acolher a decadência ou prescrição da pretensão do autor (CPC/2015, art. 302, caput e incisos I a IV).
3. Em relação à forma de se buscar o ressarcimento dos prejuízos advindos com o deferimento da tutela provisória, o parágrafo único do art. 302 do CPC/2015 é claro ao estabelecer que ‘a indenização será liquidada nos autos em que a medida tiver sido concedida, sempre que possível’, dispensando-se, assim, o ajuizamento de ação autônoma para esse fim.
4. Com efeito, a obrigação de indenizar a parte adversa dos prejuízos advindos com o deferimento da tutela provisória posteriormente revogada é decorrência ex lege da sentença de improcedência ou de extinção do feito sem resolução de mérito, como no caso, sendo dispensável, portanto, pronunciamento judicial a esse respeito, devendo o respectivo valor ser liquidado nos próprios autos em que a medida tiver sido concedida, em obediência, inclusive, aos princípios da celeridade e economia processual.
5. Recurso especial provido.”
(STJ, Recurso Especial nº 1.770.124/SP, 3ª Turma, Relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, j. em 21/5/2019, v.u., DJe 24/5/2019, grifos meus)
Transcrevo, adicionalmente, precedentes desta E. Corte Regional:
“PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA. PROCESSO DEVOLVIDO PELA VICE-PRESIDÊNCIA DESTA E. CORTE. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS A TÍTULO DE TUTELA ANTECIPADA POSTERIORMENTE REVOGADA. TEMA Nº 692/STJ. NECESSIDADE DA COBRANÇA SER REALIZADA NOS PRÓPRIOS AUTOS EM QUE CONCEDIDA A TUTELA ANTECIPADA. JUÍZO DE RETRATAÇÃO NEGATIVO. V. ACÓRDÃO RECORRIDO MANTIDO.
1 – Não obstante o quanto decidido pelo C. STJ no julgamento do Tema nº 692 do C. STJ, eventual pedido de devolução dos valores recebidos a título de tutela antecipada ou mesmo compensação com as parcelas devidas a título de benefício devem ser objeto de postulação da Autarquia nos próprios autos em que requerido o benefício, não sendo possível, de ofício, cobrá-los administrativamente do segurado.
2 - A repetibilidade dos valores recebidos pela parte segurada por força de tutela de urgência somente pode ser vindicada pelo INSS nos próprios autos da ação em que foi concedida, após regular liquidação, não sendo admissível a cobrança administrativa, a execução fiscal ou o ajuizamento de nova ação de conhecimento para tal finalidade. Precedentes desta E. Corte.
3 - Juízo de Retratação Negativo. V. Acórdão recorrido mantido.”
(Apelação Cível nº 0009429-12.2008.4.03.6104, 7ª Turma, Desembargador Federal Relator designado para o Acórdão Toru Yamamoto, j. em 8/12/22, pm., DJEN 16/12/22, grifos meus)
“PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO. REVOGAÇÃO DE TUTELA ANTECIPADA. AÇÃO DE COBRANÇA. INVIABILIDADE. ANÁLISE A SER EFETUADA NOS PRÓPRIOS AUTOS E NO MESMO JUÍZO EM QUE REVOGADA A DECISÃO JUDICIAL ANTERIOR. DEVOLUÇÃO DE VALORES. OBSERVÂNCIA AO DETERMINADO NO TÍTULO EXECUTIVO. COISA JULGADA.
- A dívida cobrada pelo INSS provém de título judicial que, em sede de tutela antecipada, concedeu à parte autora o direito à desaposentação.
- A repetibilidade dos valores recebidos pela parte autora por força de tutela de urgência somente pode ser vindicada pelo INSS nos próprios autos da ação em que foi concedida, após regular liquidação, não sendo admissível a cobrança administrativa, a execução fiscal ou o ajuizamento de nova ação de conhecimento para tal finalidade. É o que expressamente dispõem os artigos 297, parágrafo único combinado com o 302, I e parágrafo único e 520, I e II do CPC/15.
- Com efeito, não pode ser negada à parte autora o direito de impugnar a pretendida devolução, bem como os cálculos, nem o direito de debater o modo como deve ser efetuado o pagamento da restituição devida. Tal discussão deve se dar nos autos em que revogada a tutela antecipada, sob pena de ofensa ao Princípio do Juiz Natural, sendo vedada ao INSS a cobrança administrativa, bem como a inscrição do débito em dívida ativa ou a propositura de ação autônoma de cobrança.
- Manutenção da r. sentença, por fundamentação diversa.
(...)
- Apelação do INSS improvida. Recurso do autor provido.”
(Apelação Cível nº 5002332-91.2019.4.03.6134, 9ª Turma, Desembargador Federal Gilberto Jordan, j. em 1º/9/21, pu., DJEN de 6/9/21, grifos meus.)
Por derradeiro, ressalto que, no presente caso, não há que se falar em incidência do art. 115, da Lei nº 8.213/91, tendo em vista que a parte autora não recebe benefício previdenciário, não tendo havido, portanto, desconto em benefício mantido pela Previdência Social.
Ante o exposto, mantenho o acórdão recorrido, por fundamento diverso.
Retornem os autos à E. Vice-Presidência desta Corte.
É o meu voto.
Herbert de Bruyn
Desembargador Federal Relator
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. JUÍZO DE RETRATAÇÃO. ART. 1.040, INC. II, DO CPC. APELAÇÃO CÍVEL. TEMA Nº 692/STJ. DEVOLUÇÃO DE VALORES. TUTELA ANTECIPADA POSTERIORMENTE REVOGADA. COBRANÇA EFETUADA PELA AUTARQUIA NA VIA ADMINISTRATIVA. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA.
1. Em 11 de maio de 2022, o C. Superior Tribunal de Justiça revisou a tese anteriormente firmada no Tema nº 692 do sistema dos Recursos Repetitivos, confirmando a obrigação de devolução de valores em caso de reforma que antecipa os efeitos da tutela:“A reforma da decisão que antecipa os efeitos da tutela final obriga o autor da ação a devolver os valores dos benefícios previdenciários ou assistenciais recebidos, o que pode ser feito por meio de desconto em valor que não exceda 30% (trinta por cento) da importância de eventual benefício que ainda lhe estiver sendo pago.”
2. O C. Superior Tribunal de Justiça, ao apreciar o Recurso Especial nº 1.338.912/SE, afirmou: “O normativo contido no inciso II do artigo 115 da Lei n. 8.213/1991 não autoriza o INSS a descontar, na via administrativa, valores concedidos a título de tutela antecipada, posteriormente cassada com a improcedência do pedido. Nas demandas judicializadas, tem o INSS os meios inerentes ao controle dos atos judiciais que por ele devem ser manejados a tempo e modo.” (STJ, 1ª Turma, Relator Ministro Benedito Gonçalves, j. em 23/5/17, pu., DJe de 29/5/17)
3. Considerando que os valores exigidos pela autarquia decorrem de demanda judicializada, tal cobrança deve ser realizada na esfera judicial, com a devida análise e apuração da quantia efetivamente devida, não sendo possível a sua postulação na via administrativa.
4. Acórdão mantido, por fundamento diverso.
