
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5052255-92.2023.4.03.9999
RELATOR: Gab. 32 - JUIZ CONVOCADO DENILSON BRANCO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ANGELA MARIA DOS SANTOS MATIAS
Advogado do(a) APELADO: JULLIANA ALEXANDRINO NOGUEIRA - RJ113213-N
OUTROS PARTICIPANTES:
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5052255-92.2023.4.03.9999
RELATOR: Gab. 32 - JUIZ CONVOCADO DENILSON BRANCO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ANGELA MARIA DOS SANTOS MATIAS
Advogado do(a) APELADO: JULLIANA ALEXANDRINO NOGUEIRA - SP303911-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O Senhor Juiz Federal Convocado DENILSON BRANCO (Relator): Trata-se de recurso de apelação do INSS em face da r. sentença que julgou parcialmente procedente o pedido (ID 269226606 - Págs. 1/6), nos seguintes termos:
“Diante do exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a pretensão veiculada na petição inicial e extinto o feito com resolução de mérito, nos termos do artigo 487, I, do CPC, para o fim de: a) reconhecer o direito da autora à reabilitação profissional; b) CONDENAR o INSS a CONCEDER à autora o benefício AUXÍLIO-DOENÇA, desde a data da cessação administrativa indevida (12/02/2020 f. 67); c) CONDENÁ-LO ao pagamento das verbas vencidas, com juros e correção monetária segundo a Emenda Constitucional nº 113, de 08 de dezembro de 2021. Em consequência, julgo extinto o processo, com resolução de mérito, nos termos do art. 487, I, do Código de Processo Civil. Oficie-se, com brevidade. Sucumbente o réu, arcará com o pagamento de honorários advocatícios, que arbitro em 10% sobre o valor da condenação, considerando-se a soma das prestações vencidas até a data desta sentença (Súmula 111, do STJ). Consigne-se que eventuais proventos percebidos pela autora a partir da data de concessão deverão ser abatidos do montante dos valores atrasados a serem percebidos pela requerente, vedando-se o pagamento em duplicidade e, consequentemente, seu enriquecimento ilícito. Pontuo que o benefício de auxílio doença concedido somente poderá ser cessado mediante "a realização de perícia médica administrativa, que comprove uma das causas a seguir: a) a recuperação do quadro clínico apresentado pela parte autora, para o retorno a sua atividade laborativa habitual; b) ou, ainda, sua eventual readaptação para o exercício de outra atividade profissional, a cargo do INSS, compatível com seu quadro clínico e sociocultural, diante da impossibilidade de recuperação, para o retorno a sua atividade habitual; c) ou, por fim, a conversão do benefício concedido em aposentadoria por invalidez, dada a irrecuperabilidade da parte autora ou verificada a impossibilidade de exercer outra atividade profissional, que lhe garanta o sustento. Sendo assim, as causas legais que poderão dar ensejo ao término do benefício de auxílio doença, apontadas acima, deverão ser devidamente observadas pela autarquia e constam da Lei de Benefícios" (TRF3 - 7ª Turma, Rel. Des. Fed. Fausto De Sanctis, AC nº 0002907-16.2012.4.03.6140/SP, j. de 07/12/201). Em outras palavras, "Com relação ao termo final, (...) o benefício é devido enquanto estiver a parte autora incapacitada para o trabalho, devendo ser observado o disposto nos arts. 101, da Lei nº 8.213/91 e 71, da Lei nº 8.212/91" (TRF3 - 7ª Turma, Rel. Des. Fed. Tânia Marangoni, AC nº 0002600-91.2014.4.03.6140/SP, j. de 17/10/2016, grifei). Em adição, aplica-se o disposto no artigos 60, §§ 8º, 9º, 10 e 11, e 62, ambos da Leinº 8.213/91, bem como no art. 2º, I, da Recomendação CNJ nº 01/2015, fixando-se o prazo estimado para a duração do benefício (DCB data da cessação do benefício) em 120 (cento e vinte dias corridos), contados da data de implantação, EXCETO se o segurado requerer a sua prorrogação junto ao INSS, na forma do regulamento, observado o disposto no art. 62, bem como a perícia apontar pela incapacidade. Melhor dizendo, a aplicação do art. 62, caput, se faz, obviamente, em conjunto com o art. 60, § 9º, da Lei nº 8.213/91, tendo a parte a incumbência de antes requerer a prorrogação junto ao INSS, na forma do regulamento, bem como a de comparecer à perícia para reavaliação. Sem isso, sequer há de se cogitar a hipótese do art. 62, parágrafo único (reabilitação). Ou seja, sem o requerimento de sua prorrogação dentro dos 120 dias ou sem o comparecimento à perícia, o benefício pode ser encerrado. Porém, se constatada a persistência da incapacidade, necessária a reabilitação, prorrogando-se novamente o benefício (caso o próprio instituto não entenda ser o caso de aposentadoria). Caso a autora abandone seu tratamento ou se recuse a se submeter àquele disponibilizado por órgãos públicos, poderá ter seu benefício cancelado, bem como no caso de o INSS constatar, em procedimento instaurado, que realiza alguma atividade laborativa (art. 60, § 6º, lei 8.213/91). Também deve se submeter a eventual programa de reabilitação profissional para o qual for convocado, sob pena de suspensão do benefício (art. 101 da Lei n.º8.213/1991). Por fim, saliento a inviabilidade de se postergar os efeitos da tutela, considerando o caráter alimentar do benefício postulado. Sob essa ótica, o TRF4 firmou entendimento no sentido de que, nas causas similares a esta, deve-se determinar a imediata implementação do benefício previdenciário, valendo-se da tutela específica da obrigação de fazer prevista no art. 461, § 3º, do CPC (atual 497, do NCPC), independentemente de requerimento expresso (TRF4, QUOAC 2002.71.00.050349-7, rel. /Acórdão Celso Kipper, D.E. 01/10/2007). Em razão disso, o INSS deverá implementar o benefício concedido no prazo de 60 (sessenta) dias, em consonância com os art. 536 e ss, do NCPC. Requisite-se a providência. Publique-se. Intimem-se. Cumpra-se."
Em suas razões recursais, o ente previdenciário alega, preliminarmente, julgamento ultra petita e requer a anulação da sentença. No mérito, pede a reforma da sentença, em razão da ausência do preenchimento dos requisitos necessários à concessão do benefício.
Com contrarrazões (Págs. ¼).
É o relatório.
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5052255-92.2023.4.03.9999
RELATOR: Gab. 32 - JUIZ CONVOCADO DENILSON BRANCO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ANGELA MARIA DOS SANTOS MATIAS
Advogado do(a) APELADO: JULLIANA ALEXANDRINO NOGUEIRA - SP303911-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O Senhor Juiz Federal Convocado DENILSON LOPES (Relator): Recebo o recurso de apelação do INSS, haja vista que tempestivo, nos termos do artigo 1.010 do novo Código de Processo Civil, ressalvando que a apelação tem efeito suspensivo, salvo no tocante à concessão da tutela provisória (art. 1012, caput e § 1º, inciso V, do referido código).
Não há que se falar em julgamento ultra petita a ensejar a anulação da sentença, pois ainda que fixado o termo inicial em 12/02/2020, tendo sido requerido o restabelecimento do benefício, na inicial, desde 31/12/2020, evidencia-se que trata-se de erro material, pois não há nos autos notícia de cessação do benefício na data apontada pelo autor, mas apenas em 12/02/2020.
Ressalto, ainda, que a concessão de benefício diverso do requerido na petição inicial não configura julgamento extra ou ultra petita, uma vez que o Superior Tribunal de Justiça, em diversos precedentes, assentou que compete ao magistrado quando evidenciado o preenchimento dos requisitos legais necessários ao seu deferimento, promover a devida adequação do pedido, prestigiando os fins sociais das normas previdenciárias e a condição de hipossuficiente do segurado. (Precedentes: REsp 1320249/RJ, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJe 17/5/2013; AREsp 239301/RS, Rel. Min. Benedito Gonçalves, DJe 20/11/2012; REsp 1227530/PR, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, DJe 8/8/2012; AgRg no REsp 1305049/RJ, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 8/5/2012).
Superada tal questão, passo à análise do mérito.
De acordo com os artigos 59 e 62 da Lei n.º 8.213/91, o benefício de auxílio por incapacidade temporária é devido ao segurado que fica incapacitado temporariamente para o exercício de suas atividades profissionais habituais, bem como àquele cuja incapacidade, embora permanente, não seja total, isto é, haja a possibilidade de reabilitação para outra atividade que garanta o seu sustento.
A qualidade de segurado da parte autora e o cumprimento da carência prevista no inciso I do artigo 25 da Lei nº 8.213/91 restaram comprovadas, tendo em vista o recebimento do benefício de auxílio por incapacidade temporária até 12/02/2020 (ID 269226584 – Pág. 2). Ainda que a presente ação tenha sido ajuizada posteriormente ao período de graça disposto no artigo 15, II, da Lei nº 8.213/91, não há falar em perda da condição de segurado, uma vez que se verifica do conjunto probatório carreado aos autos, especialmente do laudo pericial (ID 269226597 – Págs. 1/9), que a parte autora encontra-se doente há muito tempo, com data de início da incapacidade em fevereiro de 2020. Logo, em decorrência do agravamento de seus males, a parte autora deixou de trabalhar, tendo sido a sua incapacidade devidamente apurada em Juízo. Note-se que a perda da qualidade de segurado somente se verifica quando o desligamento da Previdência Social é voluntário, não determinado por motivos alheios à vontade do segurado, consoante iterativa jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.
Em situações tais, a jurisprudência flexibilizou o rigor legal, no sentido de que não há falar em perda da qualidade de segurado se a ausência de recolhimento das contribuições decorreu da impossibilidade de trabalho de pessoa acometida de doença. Nesse sentido, julgados do E. Superior Tribunal de Justiça:
"(..)
I- A aposentadoria por invalidez é devida ao segurado que, após cumprida a carência e conservando a qualidade de segurado, for considerado incapaz para o trabalho e insuscetível de reabilitação em atividade que lhe garanta subsistência.
II- A jurisprudência desta Corte Superior de Justiça é firme no sentido de que o segurado que deixa de contribuir para a Previdência Social, por estar incapacitado para o labor, não perde a qualidade de segurado.
III- (...)
IV- (...)
V- Agravo interno desprovido." (AgRg no REsp 1245217/SP, Rel. Ministro GILSON DIPP, QUINTA TURMA, julgado em 12/06/2012, DJe 20/06/2012);
"AGRAVO INTERNO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. REQUISITOS NÃO CUMPRIDOS. CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. SUSPENSÃO. NÃO COMPROVAÇÃO DA OCORRÊNCIA MOLÉSTIA INCAPACITANTE. PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADO. 1. Não comprovado que a suspensão das contribuições previdenciárias se deu por acometimento de moléstia incapacitante, não há que falar em manutenção da condição de segurado. 2. Não comprovados os requisitos para aposentadoria por invalidez, indevido o benefício. 3. Agravo ao qual se nega provimento." (AgRg no REsp 943.963/SP, Rel. Ministro CELSO LIMONGI (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP), SEXTA TURMA, julgado em 18/05/2010, DJe 07/06/2010);
“PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC NÃO CARACTERIZADA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADO NÃO CONFIGURADA. 1. Os Embargos de Declaração somente devem ser acolhidos se presentes os requisitos indicados no art. 535 do CPC (omissão, contradição ou obscuridade), não sendo admitidos para a rediscussão da questão controvertida. 2. O Trabalhador não perde a qualidade de segurado por deixar de contribuir por período igual ou superior a 12 meses, se em decorrência de incapacidade juridicamente comprovada. Precedentes do STJ. 3. Recurso Especial parcialmente provido, mas para retornar o feito à origem e ali ser decidido como de justiça." (REsp 956.673/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, QUINTA TURMA, julgado em 30/08/2007, DJ 17/09/2007, p. 354);
"PREVIDENCIÁRIO. PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADO. NÃO OCORRÊNCIA. REQUISITOS COMPROVADOS. CONCESSÃO DO AUXÍLIO-DOENÇA. 1. Não perde a qualidade de segurado aquele que, em razão de incapacidade juridicamente comprovada, deixa de contribuir por período igual ou superior a doze meses. 2. Comprovados nos autos a incapacidade para a atividade habitual e o nexo causal entre a moléstia sofrida e o labor, é de se conceder o benefício. 3. Recurso não provido." (REsp 409.400/SC, Rel. Ministro EDSON VIDIGAL, QUINTA TURMA, julgado em 02/04/2002, DJ 29/04/2002 p. 320);
“PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADOR URBANO. PREENCHIMENTO SIMULTÂNEO DOS REQUISITOS. IRRELEVÂNCIA. PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADO. NÃO OCORRÊNCIA. BENEFÍCIO MANTIDO. PRECEDENTES. RECURSO PROVIDO. 1. A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça uniformizou seu entendimento no sentido de ser desnecessário o implemento simultâneo das condições para a aposentadoria por idade, visto que não exigida esta característica no art. 102, § 1º, da Lei 8.213/91. Assim, não há óbice à concessão do benefício previdenciário, mesmo que, quando do implemento da idade, já se tenha perdido a qualidade de segurado. 2. "Não perde a qualidade de segurado aquele que deixa de contribuir para a Previdência Social em razão de incapacidade legalmente comprovada" (REsp 418.373/SP, Sexta Turma, Rel. Min. FERNANDO GONÇALVES, DJ 1º/7/02). 3. Recurso especial provido." (REsp 800.860/SP, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, QUINTA TURMA, julgado em 16/04/2009, DJe 18/05/2009).
Por outro lado, para a solução da lide, ainda, é de substancial importância a prova técnica produzida. Neste passo, a incapacidade para o exercício de trabalho que garanta a subsistência foi atestada pelo laudo pericial (ID 269226584 – Pág. 2). Segundo referido laudo, a parte autora, nascida em 10/06/1973, diarista e faxineira, portadora de lesões localizadas em sua coluna lombar e fibromialgia (CID 10 – M79, M51 e M54.3), apresenta incapacidade parcial e temporária para as atividades laborativas, desde fevereiro de 2020.
Assim, preenchidos os requisitos legais, é devida a concessão do benefício de auxílio por incapacidade temporária à parte autora.
Incabível, nesse momento, a determinação de inclusão da parte autora em processo de reabilitação profissional, pois a incapacidade é parcial e temporária.
Em razão da parcial sucumbência recursal, mantenho a condenação da parte ré nos termos da r. sentença, e deixo de majorar os honorários advocatícios, a teor do decidido no Tema 1.059 do STJ, observadas as normas do artigo 85, §§ 3º, 4º, III, 5º, 11, do CPC/2015.
Diante do exposto, REJEITO A MATÉRIA PRELIMINAR E DOU PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS, para isentar a autarquia previdenciária de incluir a parte autora em processo de reabilitação profissional, nos termos da fundamentação.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. JULGAMENTO ULTRA PETITA. INOCORRÊNCIA. AUXÍLIO POR INCAPACIDADE TEMPORÁRIA. ARTIGOS 59 E 62 DA LEI Nº 8.213/91. QUALIDADE DE SEGURADO. CARÊNCIA. INCAPACIDADE PARCIAL E TEMPORÁRIA. REQUISITOS PRESENTES. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE TEMPORÁRIA DEVIDO.
- Não há que se falar em julgamento ultra petita a ensejar a anulação da sentença, pois ainda que fixado o termo inicial em 12/02/2020, tendo sido requerido o restabelecimento do benefício, na inicial, desde 31/12/2020, evidencia-se que trata-se de erro material, pois não há nos autos notícia de cessação do benefício na data apontada pelo autor, mas apenas em 12/02/2020.
- A concessão de benefício diverso do requerido na petição inicial não configura julgamento extra ou ultra petita, uma vez que o Superior Tribunal de Justiça, em diversos precedentes, assentou que compete ao magistrado quando evidenciado o preenchimento dos requisitos legais necessários ao seu deferimento, promover a devida adequação do pedido, prestigiando os fins sociais das normas previdenciárias e a condição de hipossuficiente do segurado. Comprovada a incapacidade parcial e temporária para o trabalho, bem como presentes os demais requisitos previstos nos artigos 59 e 62 da Lei n.º 8.213/91, é devida a concessão do benefício de auxílio por incapacidade temporária.
- Incabível, nesse momento, a determinação de inclusão da parte autora em processo de reabilitação profissional, pois a incapacidade é parcial e temporária.
- Matéria preliminar rejeitada. Apelação do INSS parcialmente provida.
