D.E. Publicado em 26/10/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à remessa oficial e negar provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal Relatora
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0000731-09.2016.4.03.6113/SP
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta pelo INSS em face da r. sentença, submetida ao reexame necessário, que, em autos de mandado de segurança visando à concessão do benefício de aposentadoria por idade, acolheu, em parte, o pedido, para outorgar, ao vindicante, a benesse postulada, a partir do ajuizamento do writ, determinando sua implantação, com DIP provisória na data da sentença (fls. 62/65).
Postula, o INSS, preambularmente, a recepção do apelo no duplo efeito. No mérito, pretende que seja reformado o julgado, sustentando que não houve cumprimento do período de carência, visto que o tempo laborado pelo promovente nas lides rurais, anteriormente a 1991, não pode ser contado para fins de carência (fls. 72/77).
Com contrarrazões (fls. 81/85), os autos subiram a este E. Tribunal.
O Ministério Público Federal ofertou parecer opinando pelo desprovimento da apelação e do reexame necessário (fls. 87/88).
É o relatório.
VOTO
Inicialmente, conheço da remessa oficial, nos termos do artigo 14, § 1º, da Lei n. 12.016/2009, bem assim do recurso de apelação, a teor do disposto no artigo 1.011 do NCPC, uma vez cumpridos os requisitos de admissibilidade.
Do compulsar dos autos, verifica-se que a sentença monocrática esquadrinhou as premissas necessárias ao implante de aposentadoria por idade de trabalhador urbano, contudo, passo a aquilatar a factibilidade de aposentadoria por idade na modalidade mista, em razão da constatação do desenvolvimento, pela parte impetrante, de labor rural.
A modalidade de jubilamento consagrado no § 3º do artigo 48 da Lei nº 8.213/91, na dicção da Lei nº 11.718/2008, é, tradicionalmente, denominado híbrido ou misto, haja vista a permissão legislativa quanto à contagem de tempo desempenhado em mister rural, em consórcio a outros interstícios contributivos atinentes a categorias de segurado diversas, de sorte a adimplir, com referido somatório, o lapso de carência, delimitado a partir da aplicação da tabela progressiva constante do artigo 142 da Lei nº 8.213/91. Quanto ao quesito etário, remanesce assinalado em 65 anos (homem) e 60 anos (mulher).
Ao prever tal espécie de aposentação, teve o legislador ordinário por fito salvaguardar os interesses dos exercentes de ofício rural que, em sua jornada profissional, de forma transitória ou permanente, vieram a galgar ocupações distintas, notadamente de natureza urbana, circunstância que, eventualmente, empecer-lhes-ia a outorga de aposentadoria por idade de trabalhador rural, relegando-os a verdadeiro limbo jurídico, à constatação de que desempenharam labor urbano por expressivo lapso temporal ou bem teriam abandonado a atividade campestre antes do atingimento etário ou da vindicação da benesse. É-lhes propiciada, nessa medida, a contabilização do tempo laboral desenvolvido no campo, ainda que de forma descontínua, conjugando-o ao afazer urbano, na busca do atendimento à carência legal. Desimporta, aqui, investigar-se do predomínio de atividades rurais no histórico laboral do requerente do benefício; tampouco, apurar-se se, quando da dedução do requerimento, o solicitante ainda estava a labutar no campo.
Vale ponderar, ainda, que, ao contrário do que sucede na aposentadoria por idade de trabalhador rural, na modalidade híbrida encontra aplicabilidade o artigo 3º, § 1º, da Lei nº 10.666/2003, mercê do qual a perda da qualidade de segurado, anteriormente ao atingimento da idade exigida, não é de molde a obstar a outorga do benefício, contanto que seja alcançada a carência exigida. Precedente deste Tribunal nesse diapasão: AC 00038436520164039999, Relator DESEMBARGADOR FEDERAL TORU YAMAMOTO, TRF3, SÉTIMA TURMA, e-DJF3 Judicial 23/06/2016.
Quanto à demonstração do labor rural, há de se operar à luz dos contornos arraigados na jurisprudência, tais os seguintes:
- é suficiente à demonstração do labor rural início de prova material (v.g., documentos expedidos por órgãos públicos que contemplem a qualificação rurícola da parte autora, não sendo taxativo o rol de documentos previsto no art. 106 da Lei nº 8.213/91), corroborado por prova testemunhal coesa e harmônica, sendo inservível a tal finalidade prova exclusivamente testemunhal (Súmula STJ 149), inclusive para os chamados "boias-frias" (REsp nº 1.321.493/PR, apreciado na sistemática do art. 543-C do CPC);
- são extensíveis à mulher, a partir da celebração do matrimônio ou do limiar da união estável, os documentos em que os cônjuges, ou conviventes, aparecem qualificados como lavradores (v.g., STJ, AGARESP 201402280175, Relatora Min. Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJE 11/12/2014);
- possível o reconhecimento de tempo de serviço rural antecedente ou ulterior ao princípio de prova documental apresentado, desde que ratificado por testemunhos idôneos (STJ, REsp nº 1.348.633/SP, Relator Min. Arnaldo Esteves Lima, Primeira Seção, j. 28/08/2013, DJE 05/12/2014).
- indisputável a existência de início de prova material contemporâneo a, quando menos, quinhão do período rural por testificar-se (v. Súmula TNU 34; cf., também, RESP 201200891007, Relator Min. HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, DJE 19/12/2012, apreciado sob o rito do art. 543-C do CPC/1973, donde se colhe ser dispensável que o princípio de prova documental diga respeito a todo o interregno a comprovar, admitindo-se que aluda, apenas, à parcela deste);
- tratando-se de aposentadoria híbrida, despiciendo quer o recolhimento de contribuições previdenciárias relativamente ao tempo rural invocado pela autoria, à moda do que sucede em sede de aposentadoria por idade de trabalhador rural (RESP nº1497086/PR, 2ª T., Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 06/04/2015), quer a demonstração do exercício da labuta campesina ao tempo da oferta do requerimento administrativo do benefício (AgRg no RESP 1.497.086/PR, Rel. Min. Herman Benjamin, STJ - Segunda Turma, DJe 06/04/2015; RESP 201300429921, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, STJ - Segunda Turma, DJe 10/09/2014).
CASO DOS AUTOS
O impetrante, nascido em 30/3/1948 (fl. 15), adimpliu o requisito etário em 30/3/2013, incumbindo-lhe demonstrar o exercício de atividades rurícola e urbana por, no mínimo, 180 meses.
Dos extratos do CNIS coligidos a fls. 19/24, haure-se o registro de vínculos empregatícios rurais de 01/8/1974 a 07/6/1976 e 01/10/1983 a 12/1991, e registros de natureza urbana entre 01/11/1994 a 09/12/1994, 31/5/1995, 01/02/1996 a 09/3/1996, 05/5/1997 a 31/10/1997, 15/5/2000 a 09/5/2001, 01/6/2001 a 06/10/2004, 01/12/2005 a 02/4/2009 e 22/7/2010 a 22/6/2011.
Além disso, titularizou o benefício de auxílio-doença previdenciário entre 25/4/1999 a 08/5/2000, 27/4/2005 a 30/6/2005, 14/01/2011 a 28/02/2011, 13/4/2011 a 29/4/2011 e 22/3/2012 a 31/7/2012.
Averbe-se que, o derradeiro período de auxílio-doença (22/3/2012 a 31/7/2012) não pode ser contabilizado, uma vez que não intercalado com período contributivo (art. 55, inc. II, da Lei nº 8.213/91, c/c o art. 60, III, do Decreto nº 3.048/1999).
Frise-se, ainda, que, em se tratando de segurado-empregado, não há a necessidade da demonstração do recolhimento das contribuições previdenciárias relativas ao período que se pretende ver reconhecido, uma vez que tal recolhimento é reponsabilidade do empregador, conforme dispunha o artigo 79, inciso I, da Lei n.º 3.087/60 e legislação posterior - atualmente, artigo 30, inciso I, alínea "a", da Lei n.º 8.212/91.
A propósito:
Agregando-se os lapsos de labor rural aos demais interregnos de serviço urbano, que ecoam dos elementos carreados aos autos, ressai que o período total laborado, perfaz tempo superior a 180 contribuições, suficiente para a concessão da aposentadoria por idade.
De acordo com o artigo 49, II, da Lei nº 8.213/91 e com o entendimento esposado pela jurisprudência dominante, o termo inicial do benefício deve ser estabelecido, em regra, a partir do requerimento administrativo. Nesse sentido: Apelação Cível nº 0024180-75.2016.4.03.9999, Nona Turma, Relator Juiz Convocado Rodrigo Zacharias, e-DJF3 10/10/2016; Apelação Cível nº 0000299-69.2016.4.03.9999, Relator Desembargador Federal Gilberto Jordan, e-DJF3 13/6/2016. Muito embora se anteveja, dos autos, que houve precedente postulação da benesse, na via administrativa (fl. 25), o termo inicial há de ser mantido, no caso, a partir da data do ajuizamento do writ, à míngua de recurso autoral e em observância ao princípio da non reformatio in pejus.
Passo à análise dos consectários.
Cumpre esclarecer que, em 20 de setembro de 2017, o STF concluiu o julgamento do RE 870.947, definindo as seguintes teses de repercussão geral: "1) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009, na parte em que disciplina os juros moratórios aplicáveis a condenações da Fazenda Pública, é inconstitucional ao incidir sobre débitos oriundos de relação jurídico-tributária, aos quais devem ser aplicados os mesmos juros de mora pelos quais a Fazenda Pública remunera seu crédito tributário, em respeito ao princípio constitucional da isonomia (CRFB, art. 5º, caput); quanto às condenações oriundas de relação jurídica não-tributária, a fixação dos juros moratórios segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança é constitucional, permanecendo hígido, nesta extensão, o disposto no art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/09; e 2) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança, revela-se inconstitucional ao impor restrição desproporcional ao direito de propriedade (CRFB, art. 5º, XXII), uma vez que não se qualifica como medida adequada a capturar a variação de preços da economia, sendo inidônea a promover os fins a que se destina."
Assim, a questão relativa à aplicação da Lei n. 11.960/2009, no que se refere aos juros de mora e à correção monetária, não comporta mais discussão, cabendo apenas o cumprimento da decisão exarada pelo STF em sede de repercussão geral.
Nesse cenário, sobre os valores em atraso incidirão juros e correção monetária em conformidade com os critérios legais compendiados no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, observadas as teses fixadas no julgamento final do RE 870.947, de relatoria do Ministro Luiz Fux.
Por fim, tendo em vista o teor da presente decisão, resta prejudicado o pleito de efeito suspensivo formulado pelo INSS em suas razões recursais.
Ante o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO À REMESSA OFICIAL, para fixar os juros de mora nos termos da fundamentação supra, explicitando os critérios de incidência da correção monetária, E NEGO PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS.
É como voto.
ANA PEZARINI
Desembargadora Federal Relatora
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | ANA LUCIA JORDAO PEZARINI:10080 |
Nº de Série do Certificado: | 11DE180625583965 |
Data e Hora: | 11/10/2018 17:57:44 |