
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000449-20.2023.4.03.6183
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: FRANCISCO VALDERI GONCALVES
Advogado do(a) APELANTE: VANDERLEI BRITO - SP103781-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000449-20.2023.4.03.6183
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
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Advogado do(a) APELANTE: VANDERLEI BRITO - SP103781-A
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R E L A T Ó R I O
Trata-se de mandado de segurança impetrado contra ato praticado pelo GERENTE EXECUTIVO DO INSS DE ITAQUERA, objetivando que a autoridade coatora reconheça o tempo especial e conceda o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição.
No primeiro julgamento, houve o indeferimento da inicial, sendo que em grau recursal, a apelação do impetrante foi provida, para anular a r. sentença de primeiro grau e determinar o retorno dos autos à Vara de origem para regular prosseguimento do feito (ID n. 278558240).
Foi proferida nova decisão, cujo dispositivo passo a transcrever:
“(...)
Em face do expendido, CONCEDO PARCIALMENTE A SEGURANÇA, extinguindo o processo com resolução de mérito (art. 487, I, do CPC), para determinar ao INSS que compute como tempo especial os períodos de 20.08.1990 a 23.04.1996 e de 01.04.1998 a 31.03.1999.
O impetrante é beneficiário da AJG.
Sem condenação em honorários, na forma do artigo 25 da Lei n. 12.016/2009.
Sentença não sujeita ao reexame necessário, considerando que não houve deferimento do benefício (art. 496, § 3º, I, CPC).
(...).”. (ID n. 294321491)
O impetrante opôs embargos de declaração, os quais foram rejeitados.
Em suas razões recursais, o impetrante alega que faz jus ao benefício vindicado, uma vez que após o requerimento administrativo continuou trabalhando, o que possibilita a reafirmação da DER (ID n. 294321539).
Parecer do Ministério Público Federal opinando pelo prosseguimento do feito, sem a necessidade da sua intervenção. (ID n. 299769042)
É o relatório.
SM
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000449-20.2023.4.03.6183
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V O T O
1. DA APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/ CONTRIBUIÇÃO
O primeiro diploma legal brasileiro a dispor sobre a aposentadoria por tempo de serviço foi a Lei Eloy Chaves, Decreto nº 4.682, de 24 de janeiro de 1923. Referido benefício era concedido apenas aos ferroviários, possuindo como requisito a idade mínima de 50 (cinquenta) anos, tendo sido suspensa no ano de 1940.
Somente em 1948 tal aposentadoria foi restabelecida, tendo sido mantida pela Lei nº 3.807, de 26 de agosto de 1960 (Lei Orgânica da Previdência Social - LOPS), que preconizava como requisito para a concessão do benefício o limite de idade de 55 (cinquenta e cinco) anos, abolido, posteriormente, pela Lei nº 4.130, de 28 de agosto de 1962, passando a adotar apenas o requisito tempo de serviço.
A Constituição Federal de 1967 e sua Emenda Constitucional nº 1/69, também disciplinaram tal benefício com salário integral, sem alterar, no entanto, a sua essência.
A atual Carta Magna manteve o benefício, disciplinando-o em seu art. 202 (redação original) da seguinte forma:
"Art. 202. É assegurada aposentadoria, nos termos da lei, calculando-se o benefício sobre a média dos trinta e seis últimos salários-de-contribuição, corrigidos monetariamente mês a mês, e comprovada a regularidade dos reajustes dos salários-de-contribuição de modo a preservar seus valores reais e obedecidas as seguintes condições:
(...)
II - após trinta e cinco anos de trabalho, ao homem, e, após trinta, à mulher, ou em tempo inferior, se sujeitos a trabalho sob condições especiais, que prejudiquem a saúde ou a integridade física, definidas em lei:
(...)
§1º: É facultada aposentadoria proporcional, após trinta anos de trabalho, ao homem, e, após vinte e cinco, à mulher."
Antes da Emenda Constitucional n. 20/98, de 15 de dezembro de 1998, preceituava a Lei nº 8.213/91, nos arts. 52 e seguintes, que o benefício de aposentadoria por tempo de serviço era devido ao segurado que, após cumprir o período de carência constante da tabela progressiva estabelecida pelo art. 142 do referido texto legal, completar 30 anos de serviço, se homem, ou 25, se mulher, iniciando no percentual de 70% do salário-de-benefício até o máximo de 100% para o tempo integral aos que completarem 30 anos de trabalho se mulher, e 35 anos de trabalho se homem.
Na redação original do art. 29, caput, §1º, da Lei de Benefícios, o salário-de-benefício consiste na média aritmética simples de todos os últimos salários-de-contribuição dos meses imediatamente anteriores ao afastamento da atividade ou da data da entrada do requerimento, até o máximo de 36, apurados no período não superior a 48 meses. Ao segurado que contava com menos de 24 contribuições no período máximo estabelecido, o referido salário corresponde a 1/24 da soma dos salários-de-contribuição.
Com o advento da Emenda Constitucional nº 20/98, a aposentadoria por tempo de serviço foi convertida em aposentadoria por tempo de contribuição, tendo sido excluída do ordenamento jurídico a aposentadoria proporcional, passando a estabelecer, nos arts. 201 e 202 da Constituição Federal:
"Art. 201 A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei a:
(...)
§ 7º É assegurada aposentadoria no regime geral de previdência social, nos termos da lei, obedecidos as seguintes condições:
I - 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem, e 30 (trinta) anos de contribuição, se mulher;
Art. 202 O regime de previdência privada, de caráter complementar e organizado de forma autônoma em relação ao regime geral de previdência social, será facultativo, baseado na constituição de reservas que garantam o benefício contratado, e regulado por lei complementar.
(...)"
Entretanto, o art. 3º da referida Emenda garantiu o direito adquirido à concessão da aposentadoria por tempo de serviço a todos aqueles que até a data da sua publicação, em 16 de dezembro de 1998, tivessem cumprido todos os requisitos legais, com base nos critérios da legislação então vigente.
Foram contempladas, portanto, três hipóteses distintas à concessão da benesse: segurados que cumpriram os requisitos necessários à concessão do benefício até a data da publicação da EC n. 20/98 (16/12/1998); segurados que, embora filiados, não preencheram os requisitos até o mesmo prazo e, por fim, segurados filiados após a vigência daquelas novas disposições legais.
Além do que, a Emenda Constitucional n. 103 de 15 de novembro de 2019 trouxe inúmeras alterações ao sistema de Previdência Social, que passaram a vigorar na data da sua publicação em 13/11/2019.
DO CASO DOS AUTOS
Inicialmente, considerando-se que a r. sentença reconheceu como especial os períodos de 20/08/1990 a 23/04/1996 e de 01/04/1998 a 31/03/1999 e denegou o pedido de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, desnecessária a análise da atividade especial, tendo em vista a ausência de apelo autárquico.
Por sua vez, em observância ao princípio tantutum devolutum quantum appellatum, cumpre examinar o recurso do impetrante, no que tange à possibilidade de deferimento da aposentadoria por tempo de contribuição.
Do processo administrativo extrai-se, através do resumo de documentos para cálculo do tempo de contribuição (ID n. 276297094 – pág. 80), que o INSS indeferiu o benefício, uma vez que a parte autora perfez apenas 33 anos, 05 meses e 08 dias, sendo esse tempo de contribuição indiscutível.
Prosseguindo, refeitos os cálculos, com a somatória do tempo de serviço incontroverso e o labor especial ora reconhecido, devidamente convertido até 12/11/2019, data anterior a data de entrada em vigor da EC n. 103/2019, o impetrante totalizou 34 anos e 14 dias, o que não autoriza o deferimento da aposentadoria por tempo de contribuição, que necessita de, no mínimo, 35 anos de contribuição, nos moldes do artigo 201, §7º, da CF/88.
Por seu turno, é importante ressaltar que a Emenda Constitucional n. 103 de 15 de novembro de 2019 trouxe inúmeras alterações ao sistema de Previdência Social, que passaram a vigorar na data da sua publicação em 13/11/2019.
A regra de transição, constante no artigo 17 que estabelece ao segurado filiado ao Regime Geral de Previdência Social até a data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional e que na referida data contar com mais de 28 (vinte e oito) anos de contribuição, se mulher, e 33 (trinta e três) anos de contribuição, se homem, fica assegurado o direito à aposentadoria quando preencher, cumulativamente, os seguintes requisitos:
I - 30 (trinta) anos de contribuição, se mulher, e 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem; e
II - cumprimento de período adicional correspondente a 50% (cinquenta por cento) do tempo que, na data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional, faltaria para atingir 30 (trinta) anos de contribuição, se mulher, e 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem.
Desse modo, é possível a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição para os segurados que filiados ao RGPS até a data da publicação da EC 103/2019, em 13/11/2019, não haviam preenchidos os requisitos necessários para o seu deferimento:
Homem – no mínimo de 33 anos de contribuição até a data da publicação em 13/11/2019 e 50% (cinquenta por cento) do tempo faltante para atingir 35 anos de contribuição;
Mulher – no mínimo de 28 anos de contribuição até a data da publicação em 13/11/2019 e 50% (cinquenta por cento) do tempo faltante para atingir 30 anos de contribuição;
Com efeito, computando-se o tempo de contribuição até 06/12/2021, data do requerimento administrativo, o impetrante perfaz 36 anos, 01 mês e 08 dias, o que permite a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, de acordo com o artigo 17 da Emenda Constitucional n. 103/2019.
TERMO INICIAL
O termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo em 06/12/2021.
COBRANÇA DE VALORES
É de se esclarecer que, em mandado de segurança, as parcelas decorrentes do direito reconhecido que se vencerem a partir da impetração podem ser objeto de execução nos mesmos autos.
De outro lado, a cobrança das parcelas anteriormente vencidas entre a data do requerimento administrativo e a data da impetração do presente mandado de segurança devem ser reclamadas administrativamente ou pela via judicial própria, o se depreende do quanto disposto no enunciado da Súmula 271, do C. STF e precedentes da mesma Corte (MS 31690, Min. Rel. Celso de Mello, j. 11.2.14).
VERBA HONORÁRIA
Não cabe a condenação ao pagamento dos honorários advocatícios, nos termos do art. 25 da Lei n. 12.016/2009.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, dou provimento à apelação do impetrante, para conceder a aposentadoria por tempo de contribuição, a contar da data do requerimento administrativo, conforme acima explicitado.
É o voto.
E M E N T A
MANDADO DE SEGURANÇA. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL RECONHECIDA. REQUISITOS PARA APOSENTAÇÃO PREENCHIDOS. TERMO INICIAL. COBRANÇA DE VALORES. VERBA HONORÁRIA.
- Foram contempladas três hipóteses distintas à concessão da aposentadoria por tempo de contribuição: segurados que cumpriram os requisitos necessários à concessão do benefício até a data da publicação da EC n. 20/98 (16/12/1998); segurados que, embora filiados, não preencheram os requisitos até o mesmo prazo e, por fim, segurados filiados após a vigência daquelas novas disposições legais.
- A Emenda Constitucional n. 103/2019 estabeleceu regras de transição aplicáveis aos segurados que já se encontravam filiados ao RGPS na época da sua entrada em vigor.
- Tempo especial reconhecido na r. sentença de primeiro grau e, em virtude de ausência de recurso autárquico, resta incontroversa a matéria.
- O impetrante faz jus ao benefício vindicado, de acordo com o art. 17 da EC 103/2019, a partir da data do requerimento administrativo em 06/12/2021.
- Em mandado de segurança, as parcelas decorrentes do direito reconhecido que se vencerem a partir da impetração podem ser objeto de execução nos mesmos autos. No entanto, a cobrança das parcelas anteriormente vencidas entre a data do requerimento administrativo e a data da impetração do presente mandado de segurança devem ser reclamadas administrativamente ou pela via judicial própria, o se depreende do quanto disposto no enunciado da Súmula 271, do C. STF e precedentes da mesma Corte (MS 31690, Min. Rel. Celso de Mello, j. 11.2.14).
- Não cabe a condenação ao pagamento dos honorários advocatícios, nos termos do art. 25 da Lei n. 12.016/2009.
- Apelação do impetrante provida.
ACÓRDÃO
DESEMBARGADOR FEDERAL
