Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5002444-23.2019.4.03.6114
Relator(a)
Desembargador Federal GILBERTO RODRIGUES JORDAN
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
24/09/2020
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 29/09/2020
Ementa
E M E N T A
MANDADO DE SEGURANÇA. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA. LEI COMPLEMENTAR Nº 142/2013.
RECONHECIMENTO DE ATIVIDADE ESPECIAL. RUÍDO.
- A Lei Complementar Nº 142, de 08 de maio de 2013, regulamentou o § 1º do art. 201 da
Constituição Federal, no tocante à aposentadoria da pessoa com deficiência segurada do Regime
Geral de Previdência Social - RGPS. Segundo o art. 2º, que se considera pessoa com deficiência
aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial,
os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na
sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
- Tempo de atividade especial reconhecido.
- Apelação do INSS e remessa oficial tida por interposta improvidas.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5002444-23.2019.4.03.6114
RELATOR:Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
SUCESSOR: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
SUCESSOR: EDUARDO ANTONIO GALERA
Advogado do(a) SUCESSOR: FABIO ALCANTARA DE OLIVEIRA - SP197070-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5002444-23.2019.4.03.6114
RELATOR:Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
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Advogado do(a) SUCESSOR: FABIO ALCANTARA DE OLIVEIRA - SP197070-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação em mandado de segurança impetrado por EDUARDO ANTONIO GALERA
contra ato praticado pelo GERENTE EXECUTIVO DO INSS EM SÃO BERNARDO DO
CAMPO/SP.
A r. sentença de nº 107811732-01/06, declarada pela decisão de nº 135360321-01/02, julgou o
pedido nos seguintes termos:
“Posto isso, e considerando tudo o mais que dos autos consta, CONCEDO A SEGURANÇA, para
o fim de: a) Determinar ao INSS que proceda à averbação do tempo especial com multiplicador
1,32 nos períodos de 21/09/1987 a 30/04/1992 e 01/05/1992 a 30/09/1996. b) Determinar ao
INSS que proceda à analise do requerimento administrativo NB 42/189.941.525-1, com a
conversão do tempo especial ora reconhecido e, caso o Impetrante atinja o tempo de trabalho
necessário, conceda a aposentadoria por tempo de contribuição da pessoa com deficiência, com
DIB na DER. Concedo os benefícios da justiça gratuita requerida. Custas na forma da lei. Sem
honorários, a teor do art. 25 da Lei nº 12.016/2009. P.I.”
Em razões recursais (nº 107811741-01/12), inicialmente, pugna o INSS pela concessão de efeito
suspensivo ao recurso e submissão do decisum ao reexame obrigatório. No mais, requer a
reforma da sentença, ao fundamento de que não restou demonstrado o exercício de atividade em
condições especiais. Por fim, prequestiona a matéria para fins recursais.
Subiram os autos a esta instância para decisão.
Parecer do Ministério Público Federal (nº 107946352-01/02) opinando pelo prosseguimento do
feito.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5002444-23.2019.4.03.6114
RELATOR:Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
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OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Tempestivo o recurso e respeitados os demais pressupostos de admissibilidade recursais, passo
ao exame da matéria objeto de devolução.
Inicialmente, necessário se faz salientar que com o presente julgamento, fica prejudicado o
pedido de recebimento do apelo no duplo efeito.
Ainda antes de adentrar no mérito, tenho por submetida a sentença ao reexame necessário, ex vi
do art. 12, parágrafo único, da Lei nº 1.533/51 e do art. 14, § 1º, da atual Lei nº 12.016/09, os
quais prevalecem sobre as disposições gerais do art. 496 do Código de Processo Civil.
Precedentes: STJ, Corte Especial, ERESP nº 654837, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, j.
15/10/2008, DJE 13/11/2008.
No mais, o mandado de segurança é ação civil de rito sumário especial, destinado a proteger
direito líquido e certo da violação efetiva ou iminente, praticada com ilegalidade ou abuso de
poder por parte de autoridade pública (ou agente de pessoa jurídica no exercício das atribuições
do Poder Púbico), diretamente relacionada à coação, de vez que investida nas prerrogativas
necessárias a ordenar, praticar ou ainda retificar a irregularidade impugnada, a teor do disposto
no art. 5º, LXIX, da Constituição Federal, art. 1º da Lei nº 1.533/51 e art. 1º da atual Lei nº
12.016/09.
Acerca do direito material em si, cumpre uma breve digressão da legislação que rege a matéria.
Preceitua o art. 201, § 1º, da Constituição Federal, in verbis:
"Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter
contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e
atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a:
I - cobertura dos eventos de doença, invalidez, morte e idade avançada;
II - proteção à maternidade, especialmente à gestante;
III - proteção ao trabalhador em situação de desemprego involuntário;
IV - salário-família e auxílio-reclusão para os dependentes dos segurados de baixa renda;
V - pensão por morte do segurado, homem ou mulher, ao cônjuge ou companheiro e
dependentes, observado o disposto no § 2º.
§ 1º É vedada a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de
aposentadoria aos beneficiários do regime geral de previdência social, ressalvados os casos de
atividades exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física e
quando se tratar de segurados portadores de deficiência, nos termos definidos em lei
complementar. (...)" (grifo nosso)
Por seu turno, a Lei Complementar Nº 142, de 8 de maio de 2013, regulamentou o mencionado
dispositivo constitucional, no tocante à aposentadoria da pessoa com deficiência segurada do
Regime Geral de Previdência Social - RGPS.
Segundo seu art. 2º, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimentos de longo
prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas
barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de
condições com as demais pessoas.
Preceitua o artigo 3º da norma em comento que:
"Art. 3º É assegurada a concessão de aposentadoria pelo RGPS ao segurado com deficiência,
observadas as seguintes condições:
I - aos 25 (vinte e cinco) anos de tempo de contribuição, se homem, e 20 (vinte) anos, se mulher,
no caso de segurado com deficiência grave;
II - aos 29 (vinte e nove) anos de tempo de contribuição, se homem, e 24 (vinte e quatro) anos, se
mulher, no caso de segurado com deficiência moderada;
III - aos 33 (trinta e três) anos de tempo de contribuição, se homem, e 28 (vinte e oito) anos, se
mulher, no caso de segurado com deficiência leve; ou
IV - aos 60 (sessenta) anos de idade, se homem, e 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se
mulher, independentemente do grau de deficiência, desde que cumprido tempo mínimo de
contribuição de 15 (quinze) anos e comprovada a existência de deficiência durante igual período.
Parágrafo único. Regulamento do Poder Executivo definirá as deficiências grave, moderada e
leve para os fins desta Lei Complementar".
No que se refere à comprovação da deficiência, a Lei Complementar nº 142/2013 dispõe que sua
avaliação será médica e funcional, nos termos do regulamento, e que o grau de deficiência será
atestado por perícia própria do Instituto Nacional do Seguro Social, por meio de instrumentos
desenvolvidos para esse fim.
Para o reconhecimento da natureza especial da atividade exercida e a conversão desse intervalo
especial em comum, cabe ao segurado demonstrar o trabalho em exposição a agentes
agressivos, nos termos da lei vigente à época da prestação do trabalho, observando-se o
princípio tempus regit actum (Pet 9.194/PR, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Seção,
julgado em 28/05/2014, DJe 03/06/2014).
No período anterior à edição da Lei nº 9.032/95, o direito à aposentadoria especial e à conversão
do tempo trabalhado em atividades especiais é reconhecido em razão da categoria profissional
exercida pelo segurado ou pela sua exposição aos agentes nocivos descritos nos Anexos dos
Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79, a ser comprovada por meio da apresentação de SB 40, sem
a necessidade de apresentação de laudo técnico, exceção feita à exposição ao ruído.
A comprovação da atividade especial exercida após a edição da Lei nº 9.032, de 29 de abril de
1995 - que promoveu a alteração do art. 57 da Lei n. 8213/91 - se dá com a demonstração da
efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, mediante a
apresentação do formulário DSS-8030 (antigo SB 40), o qual se reveste da presunção de que as
circunstâncias de trabalho ali descritas se deram em condições especiais, não sendo, portanto,
imposto que tal documento se baseie em laudo pericial, com exceção ao limite de tolerância para
nível de pressão sonora (ruído).
Anote-se que a relação dos agentes nocivos constante do Anexo do Decreto nº 53.831, de 25 de
março de 1964, e dos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, em vigor até
o advento do Decreto Regulamentar nº 2.172/97, de 5 de março de 1997, fora substituído pelo
Decreto nº 3.048, de 06 de maio de 1999.
Relevante consignar que, a partir da Lei nº 9.032/95, não é mais possível o reconhecimento da
atividade especial, unicamente, com fulcro no mero enquadramento da categoria profissional.
Com a edição do Decreto nº 2.172, de 5 de março de 1997, que regulamentou a Medida
Provisória nº 1523/96, convertida na Lei nº 9.528/97, é indispensável a apresentação de laudo
técnico para a comprovação de atividade especial.
Cabe esclarecer que a circunstância de o laudo não ser contemporâneo à atividade avaliada não
lhe retira absolutamente a força probatória, em face de inexistência de previsão legal para tanto e
desde que não haja mudanças significativas no cenário laboral (AC 0022396-
76.2005.4.01.3800/MG, Rel. Desembargador Federal Candido Moraes, 2ª Turma, e-DJF1 p.198
de 18/11/2014). Súmula 68 TNU.
Além disso, é de se apontar que o rol de agentes insalubres, como também das atividades
penosas e perigosas não se esgotam no regulamento, tal como cristalizado no entendimento
jurisprudencial na Súmula/TFR n. 198:
"Atendidos os demais requisitos, é devida a aposentadoria especial, se perícia judicial constata
que a atividade exercida pelo segurado é perigosa, insalubre ou penosa, mesmo não inscrita em
Regulamento."
Nesse sentido, julgados do Colendo Superior Tribunal de Justiça: 6ª Turma, REsp nº 395988, Rel.
Min. Hamilton Carvalhido, j. 18.11.2003, DJ 19.12.2003, p. 630; 5ª Turma, REsp nº 651516, Rel.
Min. Laurita Vaz, j. 07.10.2004, DJ 08.11.2004, p. 291.
No tocante à utilização de Equipamentos de Proteção Individual - EPI, em recente decisão, com
repercussão geral, no ARE 664.335/SC, assentou a Suprema Corte que:
"o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo
à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá
respaldo constitucional à aposentadoria especial" (grifo nosso). No caso, porém, de dúvida em
relação à efetiva neutralização da nocividade, decidiu que "a premissa a nortear a Administração
e o Judiciário é pelo reconhecimento do direito ao benefício da aposentadoria especial. Isto
porque o uso de EPI, no caso concreto, pode não se afigurar suficiente para descaracterizar
completamente a relação nociva a que o empregado se submete".
No mais, especificamente quanto à eficácia do equipamento de proteção individual - EPI ao
agente agressivo ruído, o Pretório Excelso definiu que:
"na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a
declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido
da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço
especial para aposentadoria". Isso porque, "ainda que se pudesse aceitar que o problema
causado pela exposição ao ruído relacionasse apenas à perda das funções auditivas, o que
indubitavelmente não é o caso, é certo que não se pode garantir uma eficácia real na eliminação
dos efeitos do agente nocivo ruído com a simples utilização de EPI, pois são inúmeros os fatores
que influenciam na sua efetividade, dentro dos quais muitos são impassíveis de um controle
efetivo, tanto pelas empresas, quanto pelos trabalhadores".
Ao caso dos autos.
Pleiteia o impetrante o reconhecimento, como especial e sua respectiva conversão para tempo
comum, dos períodos em que teria trabalhado sujeito a agentes agressivos, tendo juntado a
documentação abaixo discriminada:
- 21/09/1987 a 30/09/1996: Perfil Profissiográfico Previdenciário (nº 107811668-05/08) -
exposição a ruído de 91 a 81 db: enquadramento com base no código 1.1.5 do Decreto nº
83.080/79.
O reconhecimento da insalubridade em decorrência da pressão sonora observa o regulamento
vigente na ocasião do exercício da atividade laboral.
Assim, a atividade é considerada insalubre caso constatada a sujeição do trabalhador ao nível de
pressão sonora da seguinte forma: até 05 de março de 1997, superior ou equivalente a 80
(oitenta) decibéis (Decreto nº 53.831/64); entre 06 de março de 1997 e 18 de novembro de 2003,
superior ou equivalente a 90 (noventa) decibéis (Decreto n. 2.172/97) e, a partir dessa data
(edição do Decreto nº 4.882/03), superior ou equivalente a 85 (oitenta e cinco) decibéis, não
havendo que se falar em aplicação retroativa deste último diploma legal, conforme entendimento
firmado pelo Superior Tribunal de Justiça (AgRg no REsp nº 1.146.243/RS - 6ª Turma, Rel. Min.
Maria Thereza de Assis Moura, DJE 12/03/2012).
Como se vê, restou comprovado o labor especial no interregno compreendido entre 21/09/1987 e
30/09/1996.
Assim, do conjunto probatório coligido aos autos, assiste direito líquido e certo ao impetrante, no
que se refere ao reconhecimento da atividade exercida sob condições especiais no lapso acima
referido
Desta feita, de rigor a manutenção da r. sentença de primeiro grau, a qual, nos limites do pedido
inicial, determinou ao INSS que reconheça a especialidade do labor e reanalise o requerimento
administrativo para, preenchidos os requisitos, conceda o benefício de aposentadoria por tempo
de contribuição da pessoa com deficiência na data de entrada do requerimento administrativo.
Por derradeiro, cumpre salientar que, diante de todo o explanado, a r. sentença de primeiro grau
não ofendeu qualquer dispositivo legal, não havendo razão ao prequestionamento apresentado
pelo Instituto Autárquico em seu apelo.
Ante o exposto, nego provimento à apelação do INSS e à remessa oficial tida por interposta,
mantendo a r. sentença de primeiro grau, na forma acima fundamentada.
É o voto.
E M E N T A
MANDADO DE SEGURANÇA. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA. LEI COMPLEMENTAR Nº 142/2013.
RECONHECIMENTO DE ATIVIDADE ESPECIAL. RUÍDO.
- A Lei Complementar Nº 142, de 08 de maio de 2013, regulamentou o § 1º do art. 201 da
Constituição Federal, no tocante à aposentadoria da pessoa com deficiência segurada do Regime
Geral de Previdência Social - RGPS. Segundo o art. 2º, que se considera pessoa com deficiência
aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial,
os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na
sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
- Tempo de atividade especial reconhecido.
- Apelação do INSS e remessa oficial tida por interposta improvidas.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento ao apelo do INSS e à remessa oficial tida por interposta,
nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA