
| D.E. Publicado em 28/06/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação para anular a sentença e, denegar a segurança, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Juiz Federal Convocado
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0000752-37.2014.4.03.6183/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Trata-se de apelação interposta pela impetrante, para obter a reforma da sentença que julgou extinto o feito, sem resolução do mérito, nos termos do artigo 267, inciso VI, do Código de Processo Civil/73.
Nas razões de apelação, a recorrente requer a reforma do julgado, sob a alegação de preencher os requisitos que afastam a carência da ação e, que o pedido de desaposentação é perfeitamente possível, diante do entendimento jurisprudencial, não havendo qualquer necessidade de dilação probatória, já que possui toda a prova pré-constituída do seu direito.
Sem contrarrazões do INSS, apesar de intimado.
O DD. Órgão do Ministério Público Federal protestou pelo prosseguimento do feito, deixando de se manifestar, por não vislumbrar na espécie a existência de interesse público.
Os autos subiram a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Conheço da apelação, porquanto presentes os requisitos de admissibilidade.
O mandado de segurança é remédio constitucional (art. 5º, LXIX, CF/88) destinado à proteção de direito líquido e certo contra ato ilegal ou abusivo perpetrado por autoridade pública.
No mandado de segurança deve o impetrante demonstrar direito líquido e certo. Ensina Hely Lopes Meirelles (Mandado de Segurança: ação popular, ação civil pública, mandado de injunção, "habeas data" - 13. ed. Atual. Pela Constituição de 1988 - São Paulo : Editora Revista dos Tribunais, 1989) que "Direito líquido e certo é o que se apresenta manifesto na sua existência, delimitado na sua extensão e apto a ser exercitado no momento da impetração. Por outras palavras, o direito invocado, para ser amparável por mandado de segurança, há de vir expresso em norma legal e trazer em si todos os requisitos e condições de sua aplicação ao impetrante: se sua existência for duvidosa; se sua extensão ainda não estiver delimitada; se o seu exercício depender de situações e fatos ainda indeterminados, não rende ensejo à segurança, embora possa ser defendido por outros meios judiciais" (pp. 13/14).
O direito líquido e certo, portanto, deve estar plenamente demonstrado por prova pré-constituída, pois a ausência desse requisito específico torna a via mandamental inadequada ao desiderato visado.
No caso, há, em tese, viabilidade do trâmite do pedido da impetrante na via estreita do mandado de segurança, em que pesem as ponderações do MMº Juízo a quo.
Não obstante, nos termos do inciso I do parágrafo 3º do artigo 1.013 do Novo Código de Processo Civil, aplicável ao caso, julgo desde logo a causa.
O que visa a impetrante é a desaposentação, com a devolução das prestações previdenciárias recebidas.
Registro que o Supremo Tribunal Federal, no RE 661256 RG / DF, relator o ministro Ayres de Brito, em 17/11/2011, reconheceu a repercussão geral nesta questão constitucional. Por ora, como não houve o julgamento da causa, não há efeito vinculante aos demais órgãos do Poder Judiciário.
Pois bem, o argumento favorável à pretensão da impetrante é o de que, tratando-se de direito patrimonial, a aposentadoria poderia ser renunciada pelo beneficiário, a seu critério, diante da inexistência de expressa vedação legal. Além disso, a norma que veda a desaposentação seria de natureza infralegal (Dec. 3.048/99), não podendo ser aplicada ao presente caso, haja vista que somente a lei em sentido estrito poderia restringir direitos.
Nessa ordem de ideias, a regra prevista no art. 181-B do Regulamento da Seguridade Social, incluída pelo Decreto n. 3.265/1999, incorreria em ilegalidade, por não encontrar suporte em lei em sentido formal. Tal artigo, que tacha a aposentadoria de irreversível e irrenunciável, constituiria regulamento autônomo por inovar na ordem jurídica ao arrepio do Poder Legislativo.
Noutro foco, o ato jurídico pretendido pela impetrante não constituiria renúncia stricto sensu, uma vez que o(a) impetrante(a) não pretende deixar de receber benefício previdenciário. Em realidade pretende trocar o que recebe por outro mais vantajoso.
De qualquer forma, a regra contida no artigo 18 da Lei n. 8.213/91 proibiu a concessão de qualquer outro benefício que não aqueles que expressamente relaciona. O § 2º proíbe a concessão de benefício ao aposentado que permanecer em atividade sujeita ao RGPS ou a ele retornar, exceto salário-família e reabilitação profissional, quando empregado.
Como se vê, a Lei n. 8.213/91 vedou a utilização do período contributivo posterior à aposentadoria para a concessão de outro benefício no mesmo regime previdenciário.
Para além, não se pode deslembrar que a questão da desaposentação, pela qual se concede uma nova aposentadoria por tempo de contribuição (aposentadoria, essa, prevista no ordenamento jurídico de um número restritíssimo de países não desenvolvidos, já que a maioria dos países desenvolvidos privilegia a concessão de aposentadoria por idade, devida quando o segurado já não mais tem condições adequadas de trabalho), transcende os interesses individuais do segurado aposentado.
É que assim dispõe o art. 195, "caput", da Constituição Federal: A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei (...).
Tem-se então, que o sistema previdenciário é de natureza solidária, ou seja, o segurado contribui para garantir a manutenção do sistema como um todo, não para juntar recursos em seu próprio benefício.
Não se trata de seguro privado, mas de seguro social, devendo ser observado o princípio constitucional da solidariedade legal (artigo 3º, I e 195, caput, da CF).
Sempre é necessário enfatizar que o sistema utilizado no custeio da seguridade social no Brasil é o da repartição, não da capitalização, razão por que as contribuições vertidas posteriormente pela segurado (que continua a trabalhar conquanto aposentado) não se destinam a custear apenas o seu benefício previdenciário.
Carlos Alberto Pereira de Castro e João Batista Lazzari assim lecionam: (...) O segurado, ao contribuir, não tem certeza se perceberá em retorno a totalidade do que contribuiu, porque os recursos vão todos para o caixa único do sistema, ao contrário dos sistemas de capitalização, em que cada contribuinte teria uma conta individualizada (como ocorre com o FGTS). (...) - CASTRO, Carlos Alberto Pereira de, e LAZZARI, João Batista, Manual de Direito Previdenciário, 5ª Ed., pg. 87.
Por tais razões, entendo que a desaposentação é medida não admitida pelo ordenamento jurídico.
Trago à colação trecho do abalizado voto da Desembargadora Federal Marisa Santos, inteiramente pertinente à controvérsia ora sub judice:
Releva observar, ainda, que a questão relativa às contribuições vertidas ao sistema após a aposentação já foi levada à apreciação do Supremo Tribunal Federal por ocasião do julgamento da ADI 3105-DF, em que se decidiu pela constitucionalidade da incidência de contribuição previdenciária sobre os proventos de aposentadoria e pensões dos servidores públicos de que tratou a EC 41/2003 (Tribunal Pleno, ADI 3105/DF, Relatora Min. ELLEN GRACIE, Relator p/ o acórdão Min. CEZAR PELUSO, julgamento 18/08/2004, DJ 18-02-2005)
Ademais, no julgamento do RE 437.640-7, a Suprema Corte, na esteira do entendimento firmado na ADI 3105-DF, consignou que o artigo 201, § 4º, (atual § 11), da Constituição Federal "remete à lei os casos em que a contribuição repercute nos benefícios". Confira-se:
Reconheço, enfim, que se trata de posicionamento minoritário, pois as duas Turmas do Egrégio Superior Tribunal de Justiça, com competência para decidir questões previdenciárias, Quinta e Sexta, são favoráveis à possibilidade de concessão da desaposentação.
Contudo, pelas razões apresentadas acima, de teor jurídico e também social, e por crer que o julgamento do Pretório Excelso no RE 661256 RG/DF trilhará o mesmo caminho, mantendo a coerência com o julgado na ADI 3105/DF, ratificarei aqui meu entendimento no sentido da impossibilidade de concessão da desaposentação.
Outros julgados também consideraram indevida a desaposentação, proferidos inclusive neste Egrégio Tribunal Regional Federal da 3ª Região:
Inviável, portanto, o acolhimento da pretensão recursal.
Diante do exposto, dou provimento à apelação, para, com fundamento no artigo 1.013, § 3º, I, do NCPC, anular a sentença recorrida e, em nova apreciação, denegar a segurança, com resolução do mérito, na forma do artigo 487, I, do NCPC, indevidas custas em razão da concessão da justiça gratuita, indevidos honorários de advogado por força do artigo 25 da Lei n. 12.016/2009.
É o voto.
Rodrigo Zacharias
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