Processo
ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA / SP
5000376-32.2021.4.03.6114
Relator(a)
Desembargador Federal DALDICE MARIA SANTANA DE ALMEIDA
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
16/12/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 20/12/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. ENQUADRAMENTO DE ATIVIDADE
ESPECIAL. RUÍDO. PEDIDO DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO DO
PORTADOR DE DEFICIÊNCIA. NECESSIDADE DE PRODUÇÃO DE LAUDO PERICIAL.
- O tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a
legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado (art. 70 do Decreto n. 3.048/1999, com
a redação dada pelo Decreto n. 4.827/2003). Superadas, portanto, a limitação temporal prevista
no artigo 28 da Lei n. 9.711/1998 e qualquer alegação quanto à impossibilidade de
enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/1980.
- A jurisprudência majoritária, tanto nesta Corte quanto no STJ, assentou-se no sentido de que o
enquadramento apenas pela categoria profissional é possível tão-somente até 28/4/1995 (Lei n.
9.032/1995). Precedentes.
- A exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do Decreto
n. 2.172/97, que majorou o nível para 90 decibéis. Com a edição do Decreto n. 4.882, de
18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido para
85 decibéis, sem possibilidade de retroação ao regulamento de 1997 (REsp n. 1.398.260, sob o
regime do artigo 543-C do CPC).
- Sobre a questão da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), entretanto, o
Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE n. 664.335, em regime de repercussão geral,
decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo ao
enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto, divergência ou dúvida sobre a real
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
eficácia do EPI para descaracterizar completamente a nocividade, deve-se optar pelo
reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos
limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade do agente.
- A informação de "EPI Eficaz (S/N)" não se refere à real eficácia do EPI para fins de
descaracterizar a nocividade do agente.
- Demonstrada a especialidade em razão da exposição habitual e permanente a ruído superior
aos limites de tolerância previstos na norma de regência.
- A parte autora deverá ser submetida à perícia médica e funcional, nos termos da Lei
Complementar n. 142/2013, a qual possibilitará a análise e eventual concessão do benefício
requerido – aposentadoria por tempo de contribuição do segurado portador de deficiência.
- Quanto ao pedido de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição de pessoa
portadora de deficiência, o qual depende da produção de laudo pericial determinada nestes autos,
desponta a inadequação da via eleita.
- Remessa oficial e apelação do INSS parcialmente providas.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
9ª Turma
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº5000376-32.2021.4.03.6114
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, GERENTE EXECUTIVO
DO INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL (INSS) NO DISTRITO FEDERAL
APELADO: TARCISIO DA SILVA ROCHA
Advogado do(a) APELADO: FABIO FREDERICO DE FREITAS TERTULIANO - SP195284-A
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região9ª Turma
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº5000376-32.2021.4.03.6114
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, GERENTE EXECUTIVO
DO INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL (INSS) NO DISTRITO FEDERAL
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Advogado do(a) APELADO: FABIO FREDERICO DE FREITAS TERTULIANO - SP195284-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de mandado de segurança, com pedido liminar, impetrado contra ato omissivo de
agente do Instituto Nacional de Seguro Social, para obter provimento jurisdicional que lhe
assegure o enquadramento de atividade especial, realização de perícia médica nos moldes da
Lei Complementar n. 142/2013, com vistas à concessão de aposentadoria por tempo de
contribuição de pessoa portadora de deficiência.
A r. sentença concedeu a segurança para enquadrar como atividade especial os lapsos de
03/10/1988 a 02/04/1990, de 17/09/1990 a 30/04/1993, de 01/08/1993 a 05/03/1997, de
01/11/2005 a 30/09/2009 e de 01/04/2015 a 06/02/2019 como especial; determinar a realização
da perícia médica e funcional para avaliar o início da deficiência e seu grau; e a conceder o
benefício requerido caso preenchidos os requisitos.
Decisão submetida ao reexame necessário.
Inconformada, a autarquia apresenta apelação na qual assevera a inadequação da via eleita e
impossibilidade dos enquadramentos deferidos.
Com as contrarrazões, os autos subiram a esta Egrégia Corte.
O Ministério Público Federal manifestou-se pelo prosseguimento da demanda sem a
necessidade de intervenção Ministerial.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região9ª Turma
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº5000376-32.2021.4.03.6114
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, GERENTE EXECUTIVO
DO INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL (INSS) NO DISTRITO FEDERAL
APELADO: TARCISIO DA SILVA ROCHA
Advogado do(a) APELADO: FABIO FREDERICO DE FREITAS TERTULIANO - SP195284-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Os recursos atendem aos pressupostos de admissibilidade e merecem ser conhecidos.
Passo à análise das questões trazidas a julgamento.
Do enquadramento de período especial
Editado em 3 de setembro de 2003, o Decreto n. 4.827 alterou o artigo 70 do Regulamento da
Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048, de 6 de maio de 1999, o qual passou a ter
a seguinte redação:
"Art. 70. A conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade
comum dar-se-á de acordo com a seguinte tabela:
(...)
§ 1º A caracterização e a comprovação do tempo de atividade sob condições especiais
obedecerá ao disposto na legislação em vigor na época da prestação do serviço.
§ 2º As regras de conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de
atividade comum constantes deste artigo aplicam-se ao trabalho prestado em qualquer
período."
Por conseguinte, o tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em
comum, observada a legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os
trabalhadores assim enquadrados farão jus à conversão dos anos trabalhados a "qualquer
tempo", independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da
aposentadoria.
Ademais, em razão do novo regramento, encontram-se superadas a limitação temporal, prevista
no artigo 28 da Lei n. 9.711/1998, e qualquer alegação quanto à impossibilidade de
enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/1980.
Nesse sentido: STJ, REsp 1010028/RN, 5ª Turma, Rel. Ministra Laurita Vaz, julgado em
28/2/2008, DJe 7/4/2008.
Cumpre observar que antes da entrada em vigor do Decreto n. 2.172, de 5 de março de 1997,
regulamentador da Lei n. 9.032, de 28 de abril de 1995, não se exigia (exceto em algumas
hipóteses) a apresentação de laudo técnico para a comprovação do tempo de serviço especial,
pois bastava o formulário preenchido pelo empregador (SB40 ou DSS8030) para atestar a
existência das condições prejudiciais.
Nesse particular, a jurisprudência majoritária, tanto nesta Corte quanto no Egrégio STJ,
assentou-se no sentido de que o enquadramento apenas pela categoria profissional é possível
tão somente até 28/4/1995 (Lei n. 9.032/1995). Nesse sentido: STJ, AgInt no AREsp
894.266/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 06/10/2016,
DJe 17/10/2016.
Contudo, tem-se que, para a demonstração do exercício de atividade especial cujo agente
agressivo seja o ruído, sempre houve a necessidade da apresentação de laudo pericial,
independentemente da época de prestação do serviço.
Nesse contexto, a exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a
edição do Decreto n. 2.172/1997, que majorou o nível para 90 decibéis. Isso porque os
Decretos n. 83.080/1979 e 53.831/1964 vigoraram concomitantemente até o advento do
Decreto n. 2.172/1997.
Com a edição do Decreto n. 4.882, de 18 de novembro de 2003, o limite mínimo de ruído para
reconhecimento da atividade especial foi reduzido para 85 decibéis (art. 2º, que deu nova
redação aos itens 2.0.1, 3.0.1 e 4.0.0 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social,
aprovado pelo Decreto n. 3.048/1999).
Quanto a esse ponto, à míngua de expressa previsão legal, não há como conferir efeito
retroativo à norma regulamentadora que reduziu o limite de exposição para 85 dB(A) a partir de
novembro de 2003.
Sobre essa questão, o STJ, ao apreciar o Recurso Especial n. 1.398.260, sob o regime do art.
543-C do CPC, consolidou entendimento acerca da inviabilidade da aplicação retroativa do
decreto que reduziu o limite de ruído no ambiente de trabalho (de 90 para 85 dB) para
configuração do tempo de serviço especial (julgamento em 14/05/2014).
Com a edição da Medida Provisória n. 1.729/1998 (convertida na Lei n. 9.732/1998), foi inserida
na legislação previdenciária a exigência de informação, no laudo técnico, de condições
ambientais do trabalho quanto à utilização do Equipamento de Proteção Individual (EPI).
Desde então, com base na informação sobre a eficácia do EPI, a autarquia deixou de promover
o enquadramento especial das atividades desenvolvidas posteriormente a 3/12/1998.
Sobre a questão, entretanto, o Colendo Supremo Tribunal Federal (STF), ao apreciar o ARE n.
664.335, em regime de repercussão geral, decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de
neutralizar a nocividade, não haverá respaldo ao enquadramento especial; (ii) havendo, no caso
concreto, divergência ou dúvida sobre a real eficácia do EPI para descaracterizar
completamente a nocividade, deve-se optar pelo reconhecimento da especialidade; (iii) na
hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites de tolerância, a utilização do
EPI não afasta a nocividade do agente.
Quanto a esses aspectos, sublinhe-se o fato de que o campo "EPI Eficaz (S/N)" constante no
Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) é preenchido pelo empregador considerando-se, tão
somente, se houve ou não atenuação dos fatores de risco, consoante determinam as
respectivas instruções de preenchimento previstas nas normas regulamentares. Vale dizer:
essa informação não se refere à real eficácia do EPI para descaracterizar a nocividade do
agente.
No caso, no que concerne aos lapsos de 03/10/1988 a 02/04/1990, de 17/09/1990 a
30/04/1993, de 01/08/1993 a 05/03/1997, de 01/11/2005 a 30/09/2009 e de 01/04/2015 a
06/02/2019, constam Perfis Profissiográfico Previdenciário, os quais anotam a exposição
habitual e permanente a ruído superior aos limites de tolerância previstos nas normas
regulamentares – códigos 1.1.6 do anexo do Decreto n. 53.831/64, 1.1.5 do anexo do Decreto
n. 83.080/79 e 2.0.1 dos anexos dos Decretos n. 2.172/1997 e n. 3.048/1999.
Diante das circunstâncias da prestação laboral descritas, conclui-se que, na hipótese, o EPI não
é realmente capaz de neutralizar a nocividade dos agentes.
Desse modo, entendo que deve ser mantido o enquadramento deferido.
Por fim, a parte autora deverá ser submetida à perícia médica e funcional, nos termos da Lei
Complementar n. 142/2013, a qual possibilitará a análise e eventual concessão do benefício
requerido – aposentadoria por tempo de contribuição do segurado portador de deficiência.
Por fim, quanto ao pedido de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição de pessoa
portadora de deficiência, o qual depende da produção de laudo pericial determinada nestes
autos, desponta a inadequação da via eleita.
Com efeito, é certo que o manejo de mandado de segurança, com o escopo de assegurar
direito líquido e certo, exige prova pré-constituída, pois, como já exarado, o procedimento
especial estabelecido na Lei n. 12.016/09.
Ou seja, é requisito da impetração do mandamus a existência de prova pré-constituída do
direito líquido e certo, devendo o impetrante demonstrar desde logo, por meio da prova
documental, a existência de seu direito.
Diante do exposto, dou parcial provimento à remessa oficial e à apelação do INSS, nos termos
dos artigos 330, III, e 485, I, ambos do Código de Processo Civil, combinados com o artigo 10,
da Lei n. 12.016/2009, para julgar extinto o processo, sem resolução de mérito, quanto ao
pedido de aposentadoria por tempo de contribuição do portador de deficiência. Mantida, no
mais, a sentença.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. ENQUADRAMENTO DE ATIVIDADE
ESPECIAL. RUÍDO. PEDIDO DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO DO
PORTADOR DE DEFICIÊNCIA. NECESSIDADE DE PRODUÇÃO DE LAUDO PERICIAL.
- O tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a
legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado (art. 70 do Decreto n. 3.048/1999,
com a redação dada pelo Decreto n. 4.827/2003). Superadas, portanto, a limitação temporal
prevista no artigo 28 da Lei n. 9.711/1998 e qualquer alegação quanto à impossibilidade de
enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/1980.
- A jurisprudência majoritária, tanto nesta Corte quanto no STJ, assentou-se no sentido de que
o enquadramento apenas pela categoria profissional é possível tão-somente até 28/4/1995 (Lei
n. 9.032/1995). Precedentes.
- A exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do
Decreto n. 2.172/97, que majorou o nível para 90 decibéis. Com a edição do Decreto n. 4.882,
de 18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido
para 85 decibéis, sem possibilidade de retroação ao regulamento de 1997 (REsp n. 1.398.260,
sob o regime do artigo 543-C do CPC).
- Sobre a questão da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), entretanto, o
Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE n. 664.335, em regime de repercussão geral,
decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo
ao enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto, divergência ou dúvida sobre a real
eficácia do EPI para descaracterizar completamente a nocividade, deve-se optar pelo
reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima
dos limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade do agente.
- A informação de "EPI Eficaz (S/N)" não se refere à real eficácia do EPI para fins de
descaracterizar a nocividade do agente.
- Demonstrada a especialidade em razão da exposição habitual e permanente a ruído superior
aos limites de tolerância previstos na norma de regência.
- A parte autora deverá ser submetida à perícia médica e funcional, nos termos da Lei
Complementar n. 142/2013, a qual possibilitará a análise e eventual concessão do benefício
requerido – aposentadoria por tempo de contribuição do segurado portador de deficiência.
- Quanto ao pedido de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição de pessoa
portadora de deficiência, o qual depende da produção de laudo pericial determinada nestes
autos, desponta a inadequação da via eleita.
- Remessa oficial e apelação do INSS parcialmente providas. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu dar parcial provimento à remessa oficial e à apelação do INSS, nos
termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
