
| D.E. Publicado em 23/11/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS, dar parcial provimento à apelação da parte autora e fixar, de ofício, os consectários legais, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0020975-67.2018.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Trata-se de ação previdenciária ajuizada por CLEUSA DE FÁTIMA DAS DORES CONCEIÇÃO em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL (INSS), objetivando o reconhecimento da natureza especial de atividades exercidas, a conversão do período especial reconhecido em comum para fim de aumento da contagem do prazo de carência e a consequente concessão do benefício de aposentadoria por idade.
Juntou procuração e documentos (fls. 11/36).
Deferido os benefícios da gratuidade da justiça e indeferido pedido de tutela antecipada (fl. 37).
Contestação do INSS às fls. 40/52, na qual sustenta, em síntese, (a) o não enquadramento das atividades exercidas pela parte autora como sendo de natureza especial e (b) a impossibilidade de se computar, para fins de carência, acréscimo de tempo de serviço, pela eventual conversão de período especial em período comum, requerendo, ao final, a improcedência total do pedido.
Réplica da parte autora às fls. 55/62.
Sentença às fls. 73/83, pela parcial procedência do pedido, para reconhecer os períodos de 12.08.1971 a 18.02.1978 e 02.04.1979 a 18.07.1980 como sendo de natureza especial, fixando a sucumbência e dispensando a remessa necessária.
Apelação do INSS às fls. 86/89, pelo não acolhimento do pedido formulado na exordial.
Apelação da parte autora às fls. 118/121, pelo acolhimento do pedido formulado na exordial.
Sem contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Pretende a parte autora, nascida em 15.09.1956, o reconhecimento do exercício de atividades especiais nos períodos de 12.08.1971 a 18.02.1978 e 02.04.1979 a 18.07.1980, a conversão do tempo especial reconhecido em tempo comum, para fins de aumentar o período de carência e a consequente concessão do benefício de aposentadoria por idade, a partir do requerimento administrativo (D.E.R. 28.03.2017).
Da atividade especial.
No que se refere à atividade especial, a jurisprudência pacificou-se no sentido de que a legislação aplicável para sua caracterização é a vigente no período em que a atividade a ser avaliada foi efetivamente exercida, devendo, portanto, no caso em tela, ser levada em consideração a disciplina estabelecida pelos Decretos nº 53.831/64 e nº 83.080/79, até 05.03.1997 e, após, pelo Decreto nº 2.172/97, sendo irrelevante que o segurado não tenha completado o tempo mínimo de contribuição para se aposentar à época em que foi editada a Lei nº 9.032/95, como a seguir se verifica.
O art. 58 da Lei nº 8.213/91 dispunha, em sua redação original que "(...) A relação de atividades profissionais prejudiciais à saúde ou à integridade física será objeto de lei específica (...)". Com a edição da Medida Provisória nº 1.523/96, tal dispositivo legal teve sua redação alterada, com a inclusão dos parágrafos 1º, 2º, 3º e 4º, na forma que segue:
Verifica-se, pois, que tanto na redação original do art. 58 da Lei nº 8.213/91 como na estabelecida pela Medida Provisória nº 1.523/96 (reeditada até a MP nº 1.523-13 de 23.10.97 - republicado na MP nº 1.596-14, de 10.11.97 e convertida na Lei nº 9.528, de 10.12.97), não foram relacionados os agentes prejudiciais à saúde, sendo que tal relação foi definida apenas com a edição do Decreto nº 2.172, de 05.03.1997 (art. 66 e Anexo IV). Ocorre que, em se tratando de matéria reservada à lei, tal disposição somente teve eficácia a partir da edição da Lei nº 9.528, de 10.12.1997, razão pela qual a apresentação de laudo técnico só pode ser exigida a partir dessa ultima data. Nesse sentido é o entendimento majoritário do E. STJ:
Assim, em tese, pode ser considerada especial a atividade desenvolvida até 10.12.1997, mesmo sem a apresentação de laudo técnico, pois, em razão da legislação de regência a ser considerada até então, era suficiente para a caracterização da denominada atividade especial a apresentação dos informativos SB-40 e DSS-8030 (exceto para o agente nocivo ruído, por depender de prova técnica).
Ressalto que os Decretos nº 53.831/64 e nº 83.080/79 vigeram de forma simultânea, não havendo revogação daquela legislação por esta, de forma que, verificando-se divergência entre as duas normas, deverá prevalecer aquela mais favorável ao segurado.
Saliento que não se encontra vedada a conversão de tempo especial em comum, exercida em período posterior a 28.05.1998, uma vez que ao ser editada a Lei nº 9.711/98, não foi mantida a redação do art. 28 da Medida Provisória nº 1.663-10, de 28.05.98, que revogava expressamente o parágrafo 5º, do art. 57, da Lei nº 8.213/91, devendo, portanto, prevalecer este último dispositivo legal, nos termos do art. 62 da Constituição da República.
Quanto ao agente nocivo ruído, o Decreto nº 2.172, de 05.03.1997, passou a considerar o nível de ruídos superior a 90 decibéis como prejudicial à saúde. Por tais razões, até ser editado o referido decreto, considerava-se a exposição a ruído superior a 80 decibéis como agente nocivo à saúde. Com o advento do Decreto nº 4.882, de 18.11.2003, houve nova redução do nível máximo de ruídos tolerável, uma vez que por tal decreto esse nível passou a ser de 85 decibéis (art. 2º, que deu nova redação aos itens 2.01, 3.01 e 4.00 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto nº 3.048/99).
Tendo em vista o dissenso jurisprudencial sobre a possibilidade de se aplicar retroativamente o disposto no Decreto nº 4.882/2003, para se considerar prejudicial, desde 05.03.1997, a exposição a ruídos de 85 decibéis, a questão foi levada ao C. Superior Tribunal de Justiça que, no julgamento do Recurso Especial 1398260/PR, em 14.05.2014, submetido ao rito do art.543-C do Código de Processo Civil (Recurso Especial Repetitivo), fixou entendimento pela impossibilidade de se aplicar de forma retroativa o Decreto nº 4.882/2003, que reduziu o patamar de ruído para 85 decibéis, na forma que segue:
Dessa forma, deve-se considerar prejudicial até 05.03.1997 a exposição ao nível de ruído superior a 80 decibéis, de 06.03.1997 a 18.11.2003, superior a 90 decibéis e, a partir de então, superior a 85 decibéis.
De outra parte, o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP, instituído pelo art. 58, §4º, da Lei nº 9.528/97, é documento que retrata as características do trabalho do segurado, e traz a identificação do engenheiro ou perito responsável pela avaliação das condições de trabalho, sendo apto para comprovar o exercício de atividades em condições especiais, fazendo às vezes do laudo técnico.
E não afasta a validade de suas conclusões o fato de ter sido o PPP ou laudo elaborado posteriormente à prestação do serviço, vez que tal requisito não está previsto em lei, mormente porque a responsabilidade por sua expedição é do empregador, não podendo o empregado arcar com o ônus de eventual desídia daquele e, ademais, a evolução tecnológica tende a propiciar condições ambientais menos agressivas à saúde do obreiro do que aquelas vivenciadas à época da execução dos serviços.
No julgamento do Recurso Extraordinário em Agravo (ARE) 664335, em 04.12.2014, com repercussão geral reconhecida, o E. STF fixou duas teses para a hipótese de reconhecimento de atividade especial com uso de Equipamento de Proteção Individual, sendo que a primeira refere-se à regra geral que deverá nortear a análise de atividade especial, e a segunda refere-se ao caso concreto em discussão no recurso extraordinário em que o segurado esteve exposto a ruído, que podem ser assim sintetizadas: i) tese 1 - regra geral: o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo a sua saúde, de modo que se o Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo à concessão constitucional de aposentadoria especial; e ii) tese 2 - agente nocivo ruído: na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para a aposentadoria especial, tendo em vista que no cenário atual não existe equipamento individual capaz de neutralizar os malefícios do ruído, pois que atinge não só a parte auditiva, mas também óssea e outros órgãos.
NO CASO DOS AUTOS, a controvérsia colocada nos autos engloba o reconhecimento da natureza especial das atividades exercidas nos períodos de 12.08.1971 a 18.02.1978 e 02.04.1979 a 18.07.1980.
Ocorre que, nos períodos controvertidos, a parte autora, nas atividades de aprendiz de fiandeira, auxiliar de fiandeira e fiandeira, esteve exposta a ruídos acima dos limites legalmente admitidos (fls. 30/33), devendo ser reconhecida a natureza especial das atividades exercidas nesses períodos, conforme código 1.1.6 do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.5 do Decreto nº 83.080/79, código 2.0.1 do Decreto nº 2.172/97 e código 2.0.1 do Decreto nº 3.048/99, neste ponto observado, ainda, o Decreto nº 4.882/03.
Destarte, a parte autora faz jus à averbação como especial dos períodos de 12.08.1971 a 18.02.1978 e 02.04.1979 a 18.07.1980.
Da aposentadoria por idade urbana.
A análise da aposentadoria por idade urbana passa, necessariamente, pela consideração de dois requisitos: a) idade mínima, de 65 anos, se homem, ou 60 anos, se mulher; e b) período de carência, a teor do disposto no art. 48, caput, da Lei nº 8.213/91:
Sobre o requisito etário, verifica-se que a autora, nascida em 15.09.1956 (cédula de identidade - fl. 12), completou a idade mínima para pleitear o benefício em 15.09.2016. Por sua vez, o requerimento administrativo foi apresentado em 28.03.2017 (fl. 35), momento no qual o requerente já contava com mais de 60 (sessenta) anos.
Com relação à carência, nos termos do art. 25, II, da Lei nº 8.213/91, são exigidas 180 (cento e oitenta) contribuições mensais.
Os cálculos apresentados pelo INSS deram conta de que a parte autora teria 179 (cento e setenta e nove) contribuições para fins de carência (fls. 36 e 111). A parte autora, por sua vez, pretende a aplicação do multiplicador 1,2 (um inteiro e dois décimos) sobre o período de atividade reconhecido como de natureza especial, de forma que teria comprovado 16 (dezesseis) anos, 05 (cinco) meses e 16 (dezesseis) dias de tempo de contribuição, ou seja, 197 (cento e noventa e sete) meses e 16 (dezesseis) dias (fls. 29 e 120). Por fim, calculando o número de dias trabalhados, o d. Juízo concluiu ter a parte autora comprovado 178 (cento e setenta e oito) meses e 21 (vinte e um) dias de período de contribuição (fl. 82).
Não pode prevalecer a tese da parte autora. A conversibilidade de tempo especial em comum prevista na legislação previdenciária direciona-se ao cálculo do tempo de trabalho, mas não ao cálculo do número de contribuições exigido para fim de carência, sendo inaplicáveis os multiplicadores. Nesse sentido:
Igualmente, a contagem pelo número de dias trabalhos não tem base legal. O número de contribuições mensais deve ser calculado pelo regime de competência, nos termos do disposto no art. 24, caput, da Lei nº 8.213/91:
Desta forma, se um dado segurado esteve vinculado ao regime geral de previdência social de 31.01.2000 a 01.02.2000, são devidas 2 (duas) contribuições ao INSS e devem ser contadas 2 (duas) contribuições mensais para fins de carência, apesar de o vínculo previdenciário ser de apenas 2 (dois) dias.
Compulsado os autos, verifico que o INSS reconheceu, acertadamente, 95 (noventa e cinco) meses de contribuição nos períodos de 12.08.1971 a 18.02.1978 e 02.04.1979 a 18.07.1980.
Contudo, no período incontroverso de 01.02.2007 a 28.02.2014, considerou, por erro, haver apenas 84 (oitenta e quatro) meses de contribuição, em vez de 85 (oitenta e cinco) devidos: 11 (onze) meses em 2007, 12 (doze) meses em 2008, 12 (doze) meses em 2009, 12 (doze) meses em 2010, 12 (doze) meses em 2011, 12 (doze) meses em 2012, 12 (doze) meses em 2013 e 02 (dois) meses em 2014 (fl. 111), conforme extrato que ora determino a juntada.
Constata-se, assim, o cumprimento da carência exigida.
Conclui-se, portanto, pelo preenchimento de todos os requisitos ensejadores da aposentadoria por idade, de modo que a parte autora faz jus ao benefício, sendo de rigor a reforma da r. sentença.
Observo que a correção monetária deverá incidir sobre as prestações em atraso desde as respectivas competências e os juros de mora desde a citação, observada eventual prescrição quinquenal, nos termos do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, aprovado pela Resolução nº 267/2013, do Conselho da Justiça Federal (ou aquele que estiver em vigor na fase de liquidação de sentença). Os juros de mora deverão incidir até a data da expedição do PRECATÓRIO/RPV, conforme entendimento consolidado pela colenda 3ª Seção desta Corte. Após a expedição, deverá ser observada a Súmula Vinculante 17.
Com relação aos honorários advocatícios, tratando-se de sentença ilíquida, o percentual da verba honorária deverá ser fixado somente na liquidação do julgado, na forma do disposto no art. 85, § 3º, § 4º, II, e § 11, e no art. 86, todos do CPC/2015, e incidirá sobre as parcelas vencidas até a data da decisão que reconheceu o direito ao benefício (Súmula 111 do STJ).
Embora o INSS seja isento do pagamento de custas processuais, deverá reembolsar as despesas judiciais feitas pela parte vencedora e que estejam devidamente comprovadas nos autos (Lei nº 9.289/96, artigo 4º, inciso I e parágrafo único).
Caso a parte autora já esteja recebendo benefício previdenciário concedido administrativamente, deverá optar, à época da liquidação de sentença, pelo beneficio que entenda ser mais vantajoso. Se a opção recair no benefício judicial, deverão ser compensadas as parcelas já recebidas em sede administrativa, face à vedação da cumulação de benefícios.
As verbas acessórias e as prestações em atraso também deverão ser calculadas na forma acima estabelecida, em fase de liquidação de sentença.
Diante do exposto, nego provimento à apelação do INSS e dou parcial provimento à apelação da parte autora, para, fixando, de oficio, os consectários legais, julgar parcialmente procedente o pedido e condenar o réu a conceder-lhe o benefício de aposentadoria por idade, a partir do requerimento administrativo (D.E.R. 28.03.2017), observada eventual prescrição quinquenal, tudo na forma acima explicitada.
Determino que, independentemente do trânsito em julgado, expeça-se e-mail ao INSS, instruído com os devidos documentos da parte autora CLEUSA DE FÁTIMA DAS DORES CONCEIÇÃO, a fim de serem adotadas as providências cabíveis para que seja implantado de imediato o benefício de APOSENTADORIA POR IDADE, com D.I.B. em 28.03.2017 e R.M.I. a ser calculada pelo INSS, nos termos da presente decisão, tendo em vista os arts. 497 e seguintes do novo Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/15).
É como voto.
NELSON PORFIRIO
Desembargador Federal
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