
| D.E. Publicado em 10/11/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, anular a r. sentença, julgar procedente o pedido da parte autora e prejudicada a apelação do INSS e o recurso adesivo da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0027328-60.2017.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
Trata-se de ação previdenciária, com vistas à concessão de aposentadoria por idade rural.
A r. sentença, prolatada em 06.10.2015 (fls. 142-145), declarada às fls. 187 julgou procedente o pedido para reconhecer o período de trabalho rural desde o ano de 1973 (fls. 18), determinou ao réu que acresça os tempos reconhecidos nesta decisão aos demais eventualmente já reconhecidos em sede administrativa e judicial conforme os dados constantes dos autos administrativos, e caso a averbação de tais períodos convertidos seja suficiente para a aposentadoria por idade, promova a concessão do benefício, a partir da data da citação, a ser calculado nos termos da Lei nº 8.213/91. Determinou que as parcelas vencidas, respeitada a prescrição quinquenal, sejam corrigidas monetariamente de acordo com as Súmulas nº 08 do E.TRF/3ª Região e nº 148 do C. STJ e com incidência de juros de mora, inclusive sobre o abono anual. Condenou o réu ao pagamento das custas e despesas processuais (Súmula 178 do STJ). Condenou a autarquia federal ainda ao dos honorários advocatícios fixados em 15% (quinze por cento) do valor da condenação, envolvendo apenas o valor das parcelas vencidas até a data da sentença, nos termos da Súmula nº 111 do STJ. Antecipou os efeitos da tutela jurisdicional. Determinou a expedição de ofício ao réu para informar se houve ou não a concessão do benefício e, de qualquer forma, o total do tempo de contribuição acumulado em consequência da averbação ora assegurada.
O INSS apelou aduzindo, preliminarmente, a necessidade do reexame necessário. No mérito, pleiteia, em síntese, a reforma da sentença em virtude da ausência de comprovação do labor rural pelo tempo exigido. Subsidiariamente, requer a redução dos honorários advocatícios e a alteração dos critérios de cálculo dos juros de mora e da correção monetária (fls. 152-161)
Contrarrazões da parte autora (fls. 172-180).
Recurso adesivo da parte autora aduzindo que, por erro material, julgou procedente o pedido determinando aposentadoria por tempo de contribuição, quando o pedido pleiteado na inicial é de aposentadoria por idade rural e o recebimento do recurso somente no efeito devolutivo (fls. 181-184)
Consoante os ofícios de fls. 164-167 e 191-195, o INSS deu cumprimento à determinação nos limites da sentença proferida, averbando o tempo de serviço rural reconhecido, deixando de analisar o implemento dos requisitos para a concessão do benefício de aposentadoria por idade (fls. 213).
Subiram os autos a este Egrégio Tribunal.
É o relatório.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0027328-60.2017.4.03.9999/SP
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:
A controvérsia havida no presente feito cinge-se a possibilidade de reconhecimento de períodos de atividade rural exercidos pelo demandante, a fim de viabilizar a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural.
Da sentença condicional.
Verifico que o magistrado a quo, após reconhecer os períodos de labor rural pretendidos na inicial, condicionou a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural ao preenchimento dos demais requisitos legais a serem verificados na via administrativa. Dessa forma, forçoso reconhecer a nulidade desta parte do julgado, porquanto, nos termos do art. 492 p. único, do CPC, "a sentença deve ser certa, ainda quando decida relação jurídica condicional".
Na hipótese enfocada, a prolação de sentença nula não impede a apreciação do pedido por esta Corte. Trata-se de questão exclusivamente de direito, portanto, em condições de imediato julgamento, cujo conhecimento atende aos princípios da celeridade e da economia processual, bem como encontra respaldo na Constituição Federal (art. 5º, LXXVIII, com a redação dada pela EC 45/04) e na legislação adjetiva (art. 1013, § 3º, inciso II, do CPC).
Desta forma, passo à análise do pedido inicial.
Do mérito.
Busca a parte autora, nascida em 10.04.1953; a concessão do benefício aposentadoria por idade rural.
A Lei nº 8.213/91, em seus artigos 39, inciso I, 48, 142 e 143, estabelece os requisitos necessários para a concessão de aposentadoria por idade a rurícola.
Além do requisito etário, o trabalhador rural deve comprovar o exercício de atividade rural, mesmo que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do benefício.
O dispositivo legal citado deve ser analisado em consonância com o artigo 142, que assim dispõe:
Não se exige do trabalhador rural o cumprimento de carência, como dever de verter contribuição por determinado número de meses, senão a comprovação do exercício laboral durante o período respectivo.
No que se refere à comprovação do labor campesino, algumas considerações se fazem necessárias, uma vez que balizam o entendimento deste Relator no que diz com a valoração das provas comumente apresentadas.
Declarações de Sindicato de Trabalhadores Rurais fazem prova do quanto nelas alegado, desde que devidamente homologadas pelo Ministério Público ou pelo INSS, órgãos competentes para tanto, nos exatos termos do que dispõe o art. 106, III, da Lei nº 8.213/91, seja em sua redação original, seja com a alteração levada a efeito pela Lei nº 9.063/95.
Na mesma seara, declarações firmadas por supostos ex-empregadores ou subscritas por testemunhas, noticiando a prestação do trabalho na roça, não se prestam ao reconhecimento então pretendido, tendo em conta que equivalem a meros depoimentos reduzidos a termo, sem o crivo do contraditório, conforme entendimento já pacificado no âmbito desta Corte.
Igualmente não alcançam os fins pretendidos, a apresentação de documentos comprobatórios da posse da terra pelos mesmos ex-empregadores, visto que não trazem elementos indicativos da atividade exercida pela parte requerente.
Já a mera demonstração, por parte do autor, de propriedade rural, só se constituirá em elemento probatório válido desde que traga a respectiva qualificação como lavrador ou agricultor. No mesmo sentido, a simples filiação a sindicato rural só será considerada mediante a juntada dos respectivos comprovantes de pagamento das mensalidades.
Tem-se, por definição, como início razoável de prova material, documentos que tragam a qualificação da parte autora como lavrador, v.g., assentamentos civis ou documentos expedidos por órgãos públicos. Nesse sentido: STJ, 5ª Turma, REsp nº 346067, Rel. Min. Jorge Scartezzini, v.u., DJ de 15.04.2002, p. 248.
Da mesma forma, a qualificação de um dos cônjuges como lavrador se estende ao outro, a partir da celebração do matrimônio, consoante remansosa jurisprudência já consagrada pelos Tribunais.
Na atividade desempenhada em regime de economia familiar, toda a documentação comprobatória, como talonários fiscais e títulos de propriedade, é expedida, em regra, em nome daquele que faz frente aos negócios do grupo familiar. Ressalte-se, contudo, que nem sempre é possível comprovar o exercício da atividade em regime de economia familiar através de documentos. Muitas vezes o pequeno produtor cultiva apenas o suficiente para o consumo da família e, caso revenda o pouco do excedente, não emite a correspondente nota fiscal, cuja eventual responsabilidade não está sob análise nesta esfera. O homem simples, oriundo do meio rural, comumente efetua a simples troca de parte da sua colheita por outros produtos de sua necessidade que um sitiante vizinho eventualmente tenha colhido ou a entrega como forma de pagamento pela parceria na utilização do espaço de terra cedido para plantar.
De qualquer forma, é entendimento já consagrado pelo C. Superior Tribunal de Justiça (AG nº 463855, Ministro Paulo Gallotti, Sexta Turma, j. 09/09/03) que documentos apresentados em nome dos pais, ou outros membros da família, que os qualifiquem como lavradores, constituem início de prova do trabalho de natureza rurícola dos filhos.
O trabalho urbano de membro da família não descaracteriza, por si só, o exercício de trabalho rural em regime de economia familiar de outro. Para ocorrer essa descaracterização, é necessária a comprovação de que a renda obtida com a atividade urbana é suficiente à subsistência da família.
O art. 106 da Lei nº 8.213/91 apresenta um rol de documentos que não configura numerus clausus, já que o "sistema processual brasileiro adotou o princípio do livre convencimento motivado" (AC nº 94.03.025723-7/SP, TRF 3ª Região, Rel. Juiz Souza Pires, 2º Turma, DJ 23.11.94, p. 67691), cabendo ao Juízo, portanto, a prerrogativa de decidir sobre a sua validade e a sua aceitação.
No que se refere ao recolhimento das contribuições previdenciárias, destaco que o dever legal de promover seu recolhimento junto ao INSS e descontar da remuneração do empregado a seu serviço compete exclusivamente ao empregador, por ser este o responsável pelo seu repasse aos cofres da Previdência, a quem cabe a sua fiscalização, possuindo, inclusive, ação própria para haver o seu crédito, podendo exigir do devedor o cumprimento da legislação. No caso da prestação de trabalho em regime de economia familiar, é certo que o segurado é dispensado do período de carência, nos termos do disposto no art. 26, III, da Lei de Benefícios e, na condição de segurado especial, assim enquadrado pelo art. 11, VII, da legislação em comento, caberia o dever de recolher as contribuições tão-somente se houvesse comercializado a produção no exterior, no varejo, isto é, para o consumidor final, a empregador rural pessoa física ou a outro segurado especial (art. 30, X, da Lei de Custeio).
Por fim, outra questão que suscita debates é a referente ao trabalho urbano eventualmente exercido pelo segurado ou por seu cônjuge, cuja qualificação como lavrador lhe é extensiva. Perfilho do entendimento no sentido de que o desempenho de atividade urbana, de per si, não constitui óbice ao reconhecimento do direito aqui pleiteado, desde que o mesmo tenha sido exercido por curtos períodos, especialmente em época de entressafra, quando o humilde campesino se vale de trabalhos esporádicos em busca da sobrevivência.
Da mesma forma, o ingresso no mercado de trabalho urbano não impede a concessão da aposentadoria rural, na hipótese de já restar ultimada, em tempo anterior, a carência exigida legalmente, considerando não só as datas do início de prova mais remoto e da existência do vínculo empregatício fora da área rural, como também que a prova testemunhal, segura e coerente, enseje a formação da convicção deste julgador acerca do trabalho campesino exercido no período.
Ao caso dos autos.
A parte autora completou a idade mínima em 10.04.2013 (fls. 12), devendo comprovar o exercício de atividade rural por 180 meses.
Nos termos da Súmula de nº 149 do Superior Tribunal de Justiça, é necessário que a prova testemunhal venha acompanhada de, pelo menos, um início razoável de prova documental, in verbis:
No caso em questão, para comprovar a sua atividade como trabalhador rural, o requerente apresentou cópia dos seguintes documentos: sua CTPS na qual constam registros de empregos de natureza rural nos períodos de 05.06.1973 a 21.12.1974, de 21.04.1978 a 30.09.1985, de 04.09.1985 a 02.04.1991, de 01.09.1991 a 30.04.1992, de 01.02.1993 a 03.01.1994 e de 02.05.2013 a 31.05.2013 (fls. 16-20), sua certidão de casamento realizado em 28.11.1974, na qual consta a sua qualificação como tratorista (fls. 21) e recolhimentos previdenciários como contribuinte individual (tratorista agrícola) de 03/2005 a 04/2003 (fls. 58-69).
A CTPS do autor, com anotação de trabalho no meio rural constitui prova plena do labor rural do período anotado e início de prova material dos períodos que pretende comprovar.
Outrossim, tais registros gozam de presunção juris tantum de veracidade (Enunciado 12 do TST).
Nesse sentido, o julgado:
A corroborar a prova documental, os depoimentos colhidos em audiência e gravados em mídia digital (fls. 148); harmônicos e consistentes que confirmaram o labor rural do autor pelo período exigido em lei. Destarte, as testemunhas afirmaram conhecer o autor há mais de 20 (vinte), que ele sempre foi trabalhador rural; que trabalharam juntos e que ele continua trabalhando na mesma atividade.
Nesse sentido, esta Corte vem decidindo:
Dessa forma, ante o início de prova material corroborado por prova testemunhal, impõe-se reconhecer que a parte autora comprovou o exercício de atividade rural por período superior ao legalmente exigido, ou seja, lapso temporal suficiente para a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural pleiteado na inicial.
O benefício será calculado nos termos dos artigos 29, I, 33 e 50 da Lei nº 8.213/91.
O termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo, qual seja; 28.07.2014 (fl. 13), ocasião em que a autarquia federal foi cientificada da pretensão do demandante.
É devida a gratificação natalina, nos termos preconizados no artigo 7º, inciso VIII, da Carta Magna.
A correção monetária e os juros moratórios incidirão nos termos do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal em vigor por ocasião da execução do julgado.
Com relação aos honorários de advogado, fixo-os em 10% sobre o valor da condenação, consoante o disposto no art. 85, §§ 2º e 8º, do Código de Processo Civil, considerando as parcelas vencidas até a data desse decisum, nos termos da Súmula 111 do Superior Tribunal de Justiça.
Indevidas custas e despesas processuais, ante a isenção de que goza a autarquia (art. 4º, inciso I, da Lei 9.289/96) e da justiça gratuita deferida.
Isso posto, ANULO A R. SENTENÇA e, nos termos dos artigos 1013, § 3º, inciso II do Código de Processo Civil, JULGO PROCEDENTE O PEDIDO, para condenar a autarquia a conceder à parte autora o benefício de aposentadoria por idade rural, desde a data do requerimento administrativo, em 28.07.2014 (fls. 13). Juros de mora, correção monetária e verbas sucumbenciais, na forma acima fundamentada. Prejudicados os recursos de apelação do INSS e recurso adesivo da parte autora.
É como voto.
DAVID DANTAS
Desembargador Federal
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | DAVID DINIZ DANTAS:10074 |
| Nº de Série do Certificado: | 11A217051057D849 |
| Data e Hora: | 23/10/2017 18:21:39 |
