Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5014666-44.2018.4.03.6183
Relator(a)
Juiz Federal Convocado RODRIGO ZACHARIAS
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
26/07/2019
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 31/07/2019
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. ALEGAÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL NÃO
VERIFICADA. NÃO CARACTERIZAÇÃO DE ENTIDADE FAMILIAR. SUCUMBÊNCIA
RECURSAL. APELAÇÃO IMPROVIDA.
- Em atenção ao princípio tempus regit actum, aplica-se, no tocante à concessão de benefícios
previdenciários, a lei vigente à época do fato que o originou, na forma da súmula nº 340 do
Superior Tribunal de Justiça.
- Importantes alterações se deram com o advento da Medida Provisória 664, de 30/9/2014,
convertida na Lei nº 13.135/2015.
- Para a obtenção da pensão por morte, portanto, são necessários os seguintes requisitos:
condição de dependente e qualidade de segurado do falecido.
- A autora teve um relacionamento amoroso não eventual com o de cujus, mas jamais chegou a
formar uma entidade familiar, à luz do artigo 1723 do Código Civil..
- É mantida a condenação da parte autora a pagar custas processuais e honorários de advogado,
arbitrados em 12% (doze por cento) sobre o valor atualizado da causa, já majorados em razão da
fase recursal, conforme critérios do artigo 85, §§ 1º e 11, do Novo CPC. Porém, fica suspensa a
exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do referido código, por ser beneficiária da justiça
gratuita.
- Apelação não provida.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5014666-44.2018.4.03.6183
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: ROSELI BRAVI
Advogado do(a) APELANTE: ROBERTO REZETTI AMBROSIO - SP346793-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5014666-44.2018.4.03.6183
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: ROSELI BRAVI
Advogado do(a) APELANTE: ROBERTO REZETTI AMBROSIO - SP346793-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias:Trata-se de apelação interposta em face
da r. sentença que julgou improcedente o pedido de concessão de pensão por morte à parte
autora.
A parte autora visa à reforma integral, para que seja julgado procedente o pleito, ante a
comprovação da dependência econômica em relação ao de cujus, ainda que não residissem na
mesma residência. Alega que o relacionamento está comprovação em ação de reconhecimento e
dissolução de união estável. Frisa existência de cheques em seu favor, emitidos pelo falecido,
além de ressaltar o teor do depoimento da testemunha Alfonso.
Contrarrazões não apresentadas.
Os autos subiram a este Egrégio Tribunal.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5014666-44.2018.4.03.6183
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: ROSELI BRAVI
Advogado do(a) APELANTE: ROBERTO REZETTI AMBROSIO - SP346793-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias:Conheço da apelação porque presentes
os requisitos de admissibilidade.
Em atenção ao princípio tempus regit actum, aplica-se, no tocante à concessão de benefícios
previdenciários, a lei vigente à época do fato que o originou, na forma da súmula nº 340 do
Superior Tribunal de Justiça.
Importantes alterações se deram com o advento da Medida Provisória 664, de 30/9/2014,
convertida na Lei nº 13.135/2015.
Para a obtenção da pensão por morte, portanto, são necessários os seguintes requisitos:
condição de dependente e qualidade de segurado do falecido.
Desse modo, cumpre apreciar a demanda à luz do artigo 74 da Lei n. 8.213/91, com a redação
que lhe foi ofertada pela Medida Provisória n. 1.596-14, de 10/11/97, posteriormente convertida
na Lei n. 9.528, de 10/12/97, vigente na data do óbito (g. n.):
"Art. 74. A pensão por morte será devida ao conjunto dos dependentes do segurado que falecer,
aposentado ou não, a contar da data:
I - do óbito, quando requerida até trinta dias depois deste;
II - do requerimento, quando requerida após o prazo previsto no inciso anterior;
III - da decisão judicial, no caso de morte presumida."
Para a obtenção da pensão por morte, portanto, são necessários os seguintes requisitos:
condição de dependente e qualidade de segurado do falecido.
O de cujus Rubens Artur Muniz de Mendonça, consoante os termos da certidão de óbito
constante dos autos digitais em 05/3/2014.
Quanto à qualidade de segurado, oriunda da filiação da pessoa à Previdência, não é matéria
controvertida nestes autos, pois ele recebia benefício previdenciário de aposentadoria.
Por outro lado, com relação à condição de dependente do segurado, fixa o art. 16 da Lei n.
8.213/91, em sua redação então vigente (g. n.):
“Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes
do segurado:
I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e
um) anos ou inválido;
II - os pais;
(...)
§ 4º A dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I é presumida e a das demais
deve ser comprovada.”
Ocorre que, como bem observou o MMº Juízo, a autora não satisfaz a condição de dependente.
Segundo seu depoimento pessoal, começou a autora seu relacionamento com o de cujus em
1981, quando trabalhavam juntos na Eletropaulo. O de cujus era casado e a esposa ele faleceu
em 2012. Diz a autora que desde 2010 a autora e o falecido intensificaram o relacionamento, mas
nunca moraram juntos. Deixou claro que o conhecimento do relacionamento era restrito a
algumas pessoas e à família da autora. Frisa que o falecido contribuía constantemente com
auxílio financeiro, como para troca de aparelho eletrônico. Alega que a filha do falecido tinha
restrições ao relacionamento e isso influenciou na decisão do de cujus de não morar com ela.
Na certidão de óbito do de cujus constou que o falecido era viúvo de Maria de Mendonça, sua
esposa já falecida em 2012 (f. 257 do pdf).
Contudo, fica claro que não havia convivência marital pública e notória, mesmo depois do
falecimento da esposa do de cujus.
A palavra concubinato adulterino indica – sem que este relator expresse qualquer juízo de valor a
respeito do relacionamento – a condição de relacionamento mantido por um dos consortes fora
do casamento, sem haver se separado do cônjuge, de direito ou de fato.
Houve, efetivamente, uma relação amorosa paralela do de cujus com a autora, mas ao arrepio da
legislação previdenciária, à medida que não há previsão de pagamento de duas pensões neste
caso.
Há previsão legal e jurisprudencial de pagamento de pensão a um(a) companheiro(a) (relação
vigente na data do óbito) e também a ao ex-cônjuge, de quem o segurado haja se separado
judicialmente ou de fato ou mesmo se divorciado.
Eis a regra prevista no artigo 76, § 2º, da LBPS: “§ 2ºO cônjuge divorciado ou separado
judicialmente ou de fato que recebia pensão de alimentos concorrerá em igualdade de condições
com os dependentes referidos no inciso I do art. 16 desta Lei.”
O direito, desde a Constituição, protege a instituição da família, inclusive quando há união
estável, ou seja, sem celebração de casamento.
Neste aspecto, o Código Civil, em seu artigo 1.723, dispõe que é reconhecida como “entidade
familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e
duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família”.
Mas a situação da autora é diversa, pois o segurado era legalmente casado e nunca abandonou a
esposa, conquanto infringisse o dever de fidelidade.
Aplica-se ao caso o disposto no artigo 1727 do Código Civil, de modo que o relacionamento da
autora mantido com o segurado não pode ser considerado união estável, aos olhos do direito
positivo. Tal artigo tem a seguinte dicção: “As relações não eventuais entre o homem e a mulher,
impedidos de casar, constituem concubinato.”
É certo que o artigo 3º, IV, da Constituição Federal estabelece como objetivo da República
Federativa do Brasil promover o bem de todos, independentemente de cor, credo, condição
social, opção sexual, raça, origem etc. Mas tal norma principiológica não é capaz de ilidir, ou
tornar inválida por incompatibilidade, a regra prevista no artigo 1727 do Código Civil.
Reitere-se que a expressão concubinato adulterino está sendo utilizada neste processo sem
qualquer conotação negativa ou pejorativa, mesmo porque não é a formalização de um contrato
escrito quem vai ditar o certo e errado nas relações humanas, muito menos se faz qualquer
apologia à monogamia.
Utiliza-se a expressão em sentido puramente técnico, para o fim de considerar indevida a pensão
à parte autora, ante a existência de relacionamento mantido paralelamente ao casamento vigente
do segurado com a autora.
No sentido de ser indevida a pensão nestes casos:
“PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. CONCUBINATO ADULTERINO. INEXISTÊNCIA
DE UNIÃO ESTÁVEL. AGRAVO LEGAL (ART.557, § 1º, DO CPC). REDISCUSSÃO DA
MATÉRIA JÁ DECIDIDA. IMPOSSIBILIDADE. DECISÃO AGRAVADA MANTIDA. AUSÊNCIA DE
ILEGALIDADE OU ABUSO DE PODER. 1. O agravo previsto no art. 557, § 1º, do Código de
Processo Civil tem o propósito de submeter ao órgão colegiado o controle da extensão dos
poderes do relator, bem como a legalidade da decisão monocrática proferida, não se prestando à
rediscussão de matéria já decidida. 2. Inexiste ilegalidade ou abuso de poder na decisão
questionada, sendo que os seus fundamentos estão em consonância com a jurisprudência
pertinente à matéria. 3. A decisão recorrida apreciou o conjunto probatório dos autos, sopesando
as provas segundo o princípio do livre convencimento motivado, tendo concluído pela não
comprovação dos requisitos necessário à concessão do benefício de pensão por morte. 4.
Restado evidenciada a concomitância entre casamento e concubinato adulterino, não há como
reconhecer a existência de união estável. 5. Agravo legal desprovido (TRF/3ª Região AC
1659087, DÉCIMA TURMA, DJF3 Judicial 1 DATA:21/03/2012, Relatora LUCIA URSAIA).
PROCESSO CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO DECLARATÓRIA. RECONHECIMENTO DE
UNIÃO ESTÁVEL PARA FINS EXCLUSIVAMENTE PREVIDENCIÁRIOS. COMPETÊNCIA DA
JUSTIÇA FEDERAL. CONCUBINATO ADULTERINO. IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO
PEDIDO. ART. 267, VI, DO CPC. 1. É competente a Justiça Federal para o julgamento da ação
declaratória de reconhecimento de união estável, proposta exclusivamente para fins de obtenção
de pensão por morte, estando caracterizada a natureza previdenciária da pretensão. 2. O
relacionamento era, confessadamente, espúrio, impossibilitando o seu reconhecimento por se
revelar pretensão contrária ao ordenamento jurídico, que não admite a simultaneidade de mais de
um casamento e, por conseguinte, também não a permite em relação a casamento e união
estável. Impossibilidade jurídica do pedido reconhecida. 3. Apelação improvida (TRF/3ª Região,
AC 1059679, NONA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:28/04/2011, Relatora MARISA SANTOS).
O passar do tempo e a evolução dos costumes leva a construção de novas formas de viver em
sociedade, cabendo ao Poder Legislativo regulá-las a contento, sobretudo porque, em se tratando
de direito previdenciário, não há conflito entre hipossuficiente e um ente mais poderoso ou mais
forte, mas conflito entre hipossuficientes e a coletividade de hipossuficientes, descabendo a
extensão de benefícios a situações (ainda que de relevância social) não previstas sem lei (artigo
195, § 4º, da CF) por comprometer a capacidade financeira do sistema.
O depoimento da testemunha Alfonso Antônio Di Iório é elucidativo no sentido de que é inegável
que houve um relacionamento entre a autora e o de cujus, que durou muitos anos, mas Rubens
nunca a assumiu publicamente, mesmo depois do falecimento da esposa em 2012.
Ou seja, ainda que o casal tivesse intenção constituir família, o fato não chegou a concretizar-se
antes do falecimento do de cujus, que desde 2012 não tinha qualquer impedimento para tanto.
Ou seja, após o falecimento da esposa do de cujus, a autora e este tiveram um relacionamento
desimpedido e não eventual, mas nunca chegou ao ponto de transformar-se numa entidade
familiar, prevista no artigo 1723 do Código Civil.
A ação de reconhecimento e dissolução de sociedade conjugal (f. 141/145 do pdf), movida
posteriormente ao óbito e terminada em acordo, celebrado entre a autora e a família do de cujus,
não comprova o relacionamento de união estável.
Como bem observou o MMº Juiz Federal, a sentença mencionada, no entanto, decorre de
homologação de acordo entre as partes envolvidas e, nesse ponto, não analisou eventual litigio
relativo ao reconhecimento da união estável.
Ademais, à evidência, a relação jurídica previdenciária não se encontra vinculada às decisões
proferidas naqueles autos, mesmo porque o INSS não participou de tal processo, sendo
necessário analisar os requisitos da união estável e da dependência econômica para fins de
concessão do benefício pretendido, nos termos da legislação previdenciária.
A existência de cheques emitidos pelo de cujus em favor da autora, igualmente, não serve para
comprovar a união estável pretendida, já que as partes podem fazer liberalidades com seu
dinheiro em quaisquer tipos de relacionamento. Para além, no caso não se pode falar em
dependência econômica, já que a autora é aposentada e, em seu próprio depoimento, deixou
claro que o de cujus só arcava com despesas excepcionalmente.
Por isso, não há mínimas condições de se reconhecer esse relacionamento como união estável,
pois a autora jamais viveu com o de cujus como marido e mulher.
Assim, os fatos constitutivos do direito não foram, nem de longe, comprovados.
Em decorrência, concluo pelo não preenchimento dos requisitos exigidos para a concessão do
benefício de pensão por morte.
É mantida a condenação da parte autora a pagar custas processuais e honorários de advogado,
arbitrados em 12% (doze por cento) sobre o valor atualizado da causa, já majorados em razão da
fase recursal, conforme critérios do artigo 85, §§ 1º e 11, do Novo CPC. Porém, fica suspensa a
exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do referido código, por ser beneficiária da justiça
gratuita.
Ante o exposto, conheço da apelação e lhe nego provimento.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. ALEGAÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL NÃO
VERIFICADA. NÃO CARACTERIZAÇÃO DE ENTIDADE FAMILIAR. SUCUMBÊNCIA
RECURSAL. APELAÇÃO IMPROVIDA.
- Em atenção ao princípio tempus regit actum, aplica-se, no tocante à concessão de benefícios
previdenciários, a lei vigente à época do fato que o originou, na forma da súmula nº 340 do
Superior Tribunal de Justiça.
- Importantes alterações se deram com o advento da Medida Provisória 664, de 30/9/2014,
convertida na Lei nº 13.135/2015.
- Para a obtenção da pensão por morte, portanto, são necessários os seguintes requisitos:
condição de dependente e qualidade de segurado do falecido.
- A autora teve um relacionamento amoroso não eventual com o de cujus, mas jamais chegou a
formar uma entidade familiar, à luz do artigo 1723 do Código Civil..
- É mantida a condenação da parte autora a pagar custas processuais e honorários de advogado,
arbitrados em 12% (doze por cento) sobre o valor atualizado da causa, já majorados em razão da
fase recursal, conforme critérios do artigo 85, §§ 1º e 11, do Novo CPC. Porém, fica suspensa a
exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do referido código, por ser beneficiária da justiça
gratuita.
- Apelação não provida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu conhecer da apelação e lhe negar provimento, nos termos do relatório e
voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
