Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5002257-42.2019.4.03.6105
Relator(a)
Desembargador Federal GILBERTO RODRIGUES JORDAN
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
03/02/2022
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 09/02/2022
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. ÓBITO EM 2015, NA VIGÊNCIA DA LEI Nº
8.213/91. QUITAÇÃO ADMINISTRATIVA DE QUATRO PARCELAS. LEI 13.135/2015.
RESTABELECIMENTO DO BENEFÍCIO. QUALIDADE DE SEGURADO. UNIÃO ESTÁVEL
SEGUIDA DE CASAMENTO. PERÍODO MÍNIMO DE DOIS ANOS DE MATRIMÔNIO. INÍCIO DE
PROVA MATERIAL CORROBORADO POR TESTEMUNHAS. CRITÉRIOS DE INCIDÊNCIA DOS
JUROS DE MORA E DA CORREÇÃO MONETÁRIA. CUSTAS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
- O óbito de Francisco Lima da Costa, ocorrido em 23 de agosto de 2015, restou comprovado
pela respectiva certidão.
- No que se refere à qualidade de segurado, os extratos do CNIS reportam-se a vínculo
empregatício estabelecido no interregno compreendido entre 01 de fevereiro de 2011 e 23 de
agosto de 2015. Além disso, esteve em gozo de auxílio-doença (NB 31/6105236607), no período
compreendido entre 06 de maio de 2015 e 05 de agosto de 2015.
- Em decorrência do falecimento do segurado, o INSS instituiu administrativamente em favor da
parte autora o benefício de pensão por morte (NB 21/175.496.267-7), com início do pagamento a
contar da data do falecimento, porém, fê-lo cessar após a quitação de quatro parcelas.
- Conforme se infere da informação prestada pela agência do INSS, a cessação do benefício,
após a quitação de quatro parcelas, decorreu da ausência de comprovação de duração mínima
de dois anos do casamento da autora com o falecido segurado.
- Depreende-se da Certidão de Casamento que a parte autora e Francisco Lima da Costa uniram-
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
se em matrimônio em 29/12/2014. Entre referida data e o óbito (23/08/2015) transcorreram 7
(sete) meses e 25 (vinte e cinco) dias.
- A controvérsia cinge-se à comprovação da união estável vivenciada entre a parte autora e o
falecimento segurado, anteriormente à celebração do matrimônio. No Código Civil, a união
estável está disciplinada pelo artigo 1723, segundo o qual “é reconhecida a união estável entre o
homem e a mulher configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com
o objetivo de constituição de família”.
- Os autos foram instruídos com informe de rendimentos, emitido por instituição financeira, além
de notas fiscais de consumo de energia elétricas, os quais vinculam a autora e o falecido
segurado ao mesmo endereço, desde 2010.
- Em audiência realizada em 19 de fevereiro de 2020, foram inquiridas em juízo três testemunhas,
sob o crivo do contraditório, através de sistema audiovisual. As depoentes esclareceram conhecer
a parte autora há mais de quinze anos e terem vivenciado que, por volta de 2002/2003, ela e o
segurado passaram a morar no mesmo imóvel e se apresentar perante a sociedade local como
se fossem casados, condição que se estendeu até a data do falecimento. Ressaltaram que, por
volta de 2014, a autora e o segurado haviam viajado para o estado da Paraíba, onde se uniram
em matrimônio.
- Restou comprovado que o casamento sucedeu um período anterior de união estável, com
duração superior a dois anos, conforme preconizado pelo artigo 77, § 2º, V, b, da Lei nº 8.213/91,
com a redação incluída pela Lei nº 13.135/2015.
- A postulante faz jus ao restabelecimento da pensão por morte (NB 21/175496267-7), a contar da
data em que havia sido cessada administrativamente pelo INSS.
- Conforme disposição inserta no art. 219 do Código de Processo Civil 1973 (atual art. 240 Código
de Processo Civil - Lei nº 13.105/2015), os juros de mora são devidos a partir da citação na
ordem de 6% (seis por cento) ao ano, até a entrada em vigor da Lei nº 10.406/02, após, à razão
de 1% ao mês, consonante com o art. 406 do Código Civil e, a partir da vigência da Lei nº
11.960/2009 (art. 1º-F da Lei 9.494/1997), calculados nos termos deste diploma legal.
- A correção monetária deve ser aplicada em conformidade com a Lei n. 6.899/81 e legislação
superveniente (conforme o Manual de Cálculos da Justiça Federal), observados os termos da
decisão final no julgamento do RE n. 870.947, Rel. Min. Luiz Fux.
- Desde o mês de promulgação da Emenda Constitucional n. 113, de 8/12/2021, a apuração do
débito se dará unicamente pela Taxa SELIC, mensalmente e de forma simples, nos termos do
disposto em seu artigo 3º, ficando vedada a incidência da Taxa SELIC cumulada com juros e
correção monetária.
- Por se tratar de demanda aforada no Estado de São Paulo, o INSS é isento de custas e
despesas processuais, com respaldo na Lei Estadual nº 11.608/03.
- Os honorários advocatícios deverão ser fixados na liquidação do julgado, nos termos do inciso
II, do § 4º, c.c. §11, do artigo 85, do CPC/2015.
- Tutela antecipada mantida.
- Apelação do INSS provida parcialmente.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5002257-42.2019.4.03.6105
RELATOR:Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA GILVANEIDE ADEMAR DA SILVA
Advogados do(a) APELADO: LUCAS SEBBE MECATTI - SP236856-N, ANA SILVIA MICHELIN
CASTRO - SP408216-A
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5002257-42.2019.4.03.6105
RELATOR:Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA GILVANEIDE ADEMAR DA SILVA
Advogados do(a) APELADO: LUCAS SEBBE MECATTI - SP236856-N, ANA SILVIA MICHELIN
CASTRO - SP408216-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação interposta em ação ajuizada por MARIA GILVANEIDE ADEMAR DA
SILVA em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando o
restabelecimento da pensão por morte (NB 21/175496267-7), a qual houvera sido deferida
administrativamente e na sequência cessada, após a quitação de quatro parcelas, ante o não
cumprimento do requisito do período mínimo de casamento.
A r. sentença recorrida julgou procedente o pedido e condenou a Autarquia Previdenciária ao
restabelecimento do benefício, a contar da data da cessação (23/12/2015), com parcelas
acrescidas dos consectários legais. Por fim, deferiu a tutela de urgência e determinou o
restabelecimento do benefício (id 203788506 – p. 1/7).
Em suas razões recursais, o INSS pleiteia, inicialmente, a suspensão da tutela antecipada. No
mérito, pugna pela reforma da sentença, com o decreto de improcedência do pleito, ao
argumento de não ter logrado a parte autora comprovar o período mínimo de casamento. Argui
não ter sido demonstrado que o casal já convivesse anteriormente em união estável,
ressaltando a ausência de prova material a respeito. Sustenta que a suspensão administrativa
da pensão, após a quitação de quatro parcelas, obedeceu ao disposto no art. 77, §2º, V, “b”, da
Lei nº 8.213/91, com a redação incluída pela Lei nº 13.135/2015. Subsidiariamente, insurge-se
quanto aos critérios referentes aos consectários legais. Suscita, por fim, o prequestionamento
legal para efeito de interposição de recursos (id. 203788515 – p. 1/8).
Contrarrazões (id 203788517 – p. 1/5).
Devidamente processado o recurso, subiram os autos a esta instância para decisão.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5002257-42.2019.4.03.6105
RELATOR:Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARIA GILVANEIDE ADEMAR DA SILVA
Advogados do(a) APELADO: LUCAS SEBBE MECATTI - SP236856-N, ANA SILVIA MICHELIN
CASTRO - SP408216-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Tempestivo o recurso e respeitados os demais pressupostos de admissibilidade recursais,
passo ao exame da matéria objeto de devolução.
DO PEDIDO DE SUSPENSÃO DA TUTELA ANTECIPADA
No tocante à concessão da tutela antecipada, não merecem prosperar as alegações do Instituto
Autárquico. Os requisitos necessários à sua concessão estão previstos no artigo 300 do Código
de Processo Civil, in verbis:
“Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a
probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo”.
No presente caso, ao contrário do aduzido pelo INSS em suas razões de apelação, as provas
documentais apresentadas foram corroboradas pelos depoimentos das testemunhas, ao passo
que o fundado receio de dano irreparável exsurge pela própria natureza do benefício pleiteado.
Com efeito, eventual demora na prestação jurisdicional comprometeria a própria subsistência da
postulante, tendo em vista o caráter nitidamente alimentar das prestações.
No mesmo sentido a lição de Paulo Afonso Brum Vaz:
“Patenteia-se o requisito em comento diante da concreta possibilidade de a parte autora
experimentar prejuízo irreparável ou de difícil reparação, caracterizadora de uma situação de
perigo, se tiver de aguardar o tempo necessário para a decisão definitiva da lide. Resguarda-se,
dessarte, o litigante dos maléficos efeitos do tempo, isto porque situações existem, e não são
raras, em que a parte autora, ameaçada por uma situação perigosa, não pode aguardar a
tramitação do processo sem prejuízo moral ou material insuscetível de reparação ou dificilmente
reparável (...)”
(Tutela Antecipada na Seguridade Social. 1ª ed., São Paulo: Ed. LTr, 2003, p. 47).
Passo à apreciação do meritum causae.
DA PENSÃO POR MORTE
O primeiro diploma legal brasileiro a prever um benefício contra as consequências da morte foi
a Constituição Federal de 1946, em seu art. 157, XVI. Após, sobreveio a Lei n.º 3.807, de 26 de
agosto de 1960 (Lei Orgânica da Previdência Social), que estabelecia como requisito para a
concessão da pensão o recolhimento de pelo menos 12 (doze) contribuições mensais e fixava o
valor a ser recebido em uma parcela familiar de 50% (cinquenta por cento) do valor da
aposentadoria que o segurado percebia ou daquela a que teria direito, e tantas parcelas iguais,
cada uma, a 10% (dez por cento) por segurados, até o máximo de 5 (cinco).
A Constituição Federal de 1967 e sua Emenda Constitucional n.º 1/69, também disciplinaram o
benefício de pensão por morte, sem alterar, no entanto, a sua essência.
A atual Carta Magna estabeleceu em seu art. 201, V, que:
"A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de
filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e
atenderá, nos termos da lei a:
V - pensão por morte do segurado, homem ou mulher, ao cônjuge ou companheiro e
dependentes, observado o disposto no § 2º."
A Lei n.º 8.213, de 24 de julho de 1991 e seu Decreto Regulamentar n.º 3048, de 06 de maio de
1999, disciplinaram em seus arts. 74 a 79 e 105 a 115, respectivamente, o benefício de pensão
por morte, que é aquele concedido aos dependentes do segurado, em atividade ou aposentado,
em decorrência de seu falecimento ou da declaração judicial de sua morte presumida.
Depreende-se do conceito acima mencionado que para a concessão da pensão por morte é
necessário o preenchimento de dois requisitos: ostentar o falecido a qualidade de segurado da
Previdência Social, na data do óbito e possuir dependentes incluídos no rol do art. 16 da
supracitada lei.
A qualidade de segurado, segundo Wladimir Novaes Martinez, é a:
"denominação legal indicativa da condição jurídica de filiado, inscrito ou genericamente
atendido pela previdência social. Quer dizer o estado do assegurado, cujos riscos estão
previdenciariamente cobertos." (Curso de Direito Previdenciário. Tomo II - Previdência Social.
São Paulo: LTr, 1998, p. 594).
Mantém a qualidade de segurado aquele que, mesmo sem recolher as contribuições, conserve
todos os direitos perante a Previdência Social, durante um período variável, a que a doutrina
denominou "período de graça", conforme o tipo de segurado e a sua situação, nos termos do
art. 15 da Lei de Benefícios, a saber:
"Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício;
II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer
atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem
remuneração;
III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de
segregação compulsória;
IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso;
V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para
prestar serviço militar;
VI - até (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo."
É de se observar, ainda, que o § 1º do supracitado artigo prorroga por 24 (vinte e quatro) meses
tal período de graça aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses.
Em ambas as situações, restando comprovado o desemprego do segurado perante o órgão do
Ministério do Trabalho ou da Previdência Social, os períodos serão acrescidos de mais 12
(doze) meses. A comprovação do desemprego pode se dar por qualquer forma, até mesmo
oral, ou pela percepção de seguro-desemprego.
Convém esclarecer que, conforme disposição inserta no § 4º do art. 15 da Lei nº 8.213/91, c.c.
o art. 14 do Decreto Regulamentar nº 3.048/99, com a nova redação dada pelo Decreto nº
4.032/01, a perda da qualidade de segurado ocorrerá no 16º dia do segundo mês seguinte ao
término do prazo fixado no art. 30, II, da Lei nº 8.212/91 para recolhimento da contribuição,
acarretando, consequentemente, a caducidade de todos os direitos previdenciários.
Conforme já referido, a condição de dependentes é verificada com amparo no rol estabelecido
pelo art. 16 da Lei de Benefícios, segundo o qual possuem dependência econômica presumida
o cônjuge, o(a) companheiro(a) e o filho menor de 21 (vinte e um) anos, não emancipado ou
inválido. Também ostentam a condição de dependente do segurado, desde que comprovada a
dependência econômica, os pais, e o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de
21 (vinte e um) anos ou inválido.
De acordo com o § 2º do supramencionado artigo, o enteado e o menor tutelado são
equiparados aos filhos mediante declaração do segurado e desde que comprovem a
dependência econômica.
DO CASO DOS AUTOS
O óbito de Francisco Lima da Costa, ocorrido em 23 de agosto de 2015, restou comprovado
pela respectiva certidão (id 203788380 – p. 2).
No que se refere à qualidade de segurado, os extratos do CNIS reportam-se a vínculo
empregatício estabelecido no interregno compreendido entre 01 de fevereiro de 2011 e 23 de
agosto de 2015. Além disso, esteve em gozo de auxílio-doença (NB 31/6105236607), no
período compreendido entre 06 de maio de 2015 e 05 de agosto de 2015 (id. 203788380 – p.
10).
Em decorrência do falecimento do segurado, o INSS instituiu administrativamente em favor da
parte autora o benefício de pensão por morte (NB 21/175.496.267-7), com início do pagamento
a contar da data do falecimento, no entanto, fê-lo cessar após a quitação de quatro parcelas.
Conforme se depreende da informação prestada pela agência do INSS, a cessação do
benefício, após a quitação de quatro parcelas, decorreu da ausência de comprovação de
duração mínima de 2 (dois) anos do casamento da autora com o falecido segurado (id.
203788486 – p. 1/2).
A este respeito, destaco que, consagração do princípio do tempus regit actum, a matéria foi
sumulada pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça:
"A lei aplicável à concessão de pensão previdenciária por morte é aquela vigente na data do
óbito do segurado" (Súmula 340).
Por ocasião do falecimento do segurado instituidor (23/08/2015), já estava em vigor a Lei nº
13.135/2015, a qual alterou a redação do artigo 77 da Lei de Benefícios, estabelecendo também
como causa de cessação da cota individual da pensão, em relação ao cônjuge, após o
pagamento de quatro prestações do benefício, na hipótese de o casamento ter sido iniciado em
menos de dois anos anteriormente ao óbito do segurado (artigo 77, § 2º, V, b, da Lei nº
8.213/91, com a redação incluída pela Lei nº 13.135/2015).
O preceito legal em comento tem a seguinte redação, in verbis:
"Art. 77. A pensão por morte, havendo mais de um pensionista, será rateada entre todos em
parte iguais.
§ 1º Reverterá em favor dos demais a parte daquele cujo direito à pensão cessar.
§ 2º O direito à percepção de cada cota individual cessará:
(...)
V - para cônjuge ou companheiro:
a) se inválido ou com deficiência, pela cessação da invalidez ou pelo afastamento da
deficiência, respeitados os períodos mínimos decorrentes da aplicação das alíneas "b" e "c";
b) em 4 (quatro) meses, se o óbito ocorrer sem que o segurado tenha vertido 18 (dezoito)
contribuições mensais ou se o casamento ou a união estável tiverem sido iniciados em menos
de 2 (dois) anos antes do óbito do segurado;
(...)" (grifei).
Depreende-se da Certidão de Casamento que a parte autora e Francisco Lima da Costa
uniram-se em matrimônio em 29/12/2014. Entre referida data e o óbito (23/08/2015)
transcorreram 7 (sete) meses e 25 (vinte e cinco) dias.
A controvérsia cinge-se à comprovação da união estável vivenciada entre a parte autora e o
falecimento segurado, anteriormente à celebração do matrimônio. No Código Civil, a união
estável está disciplinada pelo artigo 1723, segundo o qual “é reconhecida a união estável entre
o homem e a mulher configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida
com o objetivo de constituição de família”.
No mesmo sentido, é o artigo 1º da Lei 9.278/96, estabelecendo que “é reconhecida como
entidade familiar a convivência duradoura, pública e contínua, de um homem e uma mulher,
estabelecida com objetivo de constituição de família”.
Os autos foram instruídos com início de prova material a indicar que a parte autora e o
segurado já conviviam maritalmente, cabendo destacar os documentos que vinculam ambos ao
endereço comum: Avenida São José dos Campos, nº 634, no Jardim Nova Europa, em
Campinas – SP.
Neste sentido, cabe destacar o informe de rendimentos emitido pelo Banco Itaú, em nome do
correntista Francisco Lima da Costa, referente ao ano-calendário 2011, o qual se reporta ao
endereço situado na Avenida São José dos Campos, nº 634, no Jardim Nova Europa, em
Campinas – SP, ao passo que as contas de consumo de energia elétrica, emitidas pela
empresa CPFL, em nome da parte autora, referentes aos meses de janeiro de 2010, outubro de
2011 e junho de 2012, a vinculam ao mesmo endereço (id. 203788518 – p. 5/17).
Em audiência realizada em 19 de fevereiro de 2020, foram inquiridas três testemunhas, sob o
crivo do contraditório, através do sistema audiovisual, que asseveraram terem vivenciado que a
parte autora e o falecido segurado conviveram maritalmente por mais de dez anos
anteriormente à celebração do matrimônio.
A testemunha Angela Maria de Castro Silva afirmou ter sido vizinha da parte autora por cerca
de dezoito anos, razão por que pudera vivenciar que ela efetivamente conviveu maritalmente
com Francisco Lima da Costa, já que eles residiam no mesmo imóvel. Acresceu que eles foram
padrinhos de batismo de sua neta, quando ela era recém nascida, sendo que já se passaram
dezesseis anos. Acrescentou que ficou sabendo que eles decidiram formalizar o vínculo marital,
mas que, antes disso, eles sempre foram tidos pela sociedade local como se fossem casados,
condição que se prorrogou até a data do falecimento.
A depoente Sandra Regina Pacheco Marquez afirmou que a parte autora foi sua babá, entre
1994 e 2015, salientando, inclusive, que presenciou quando ela e Francisco se conheceram e
decidiram morar juntos como se fossem casados, por volta de 2002/2003. Esclareceu que
Francisco atuava como segurança da rua onde morava, quando ele conheceu a autora, que
trabalhava em sua casa. Desde então, pode vivenciar que eles moravam na mesma casa e se
apresentavam publicamente como se fossem casados. No ano de 2014, viajou com o casal
para o estado da Paraíba, onde foi realizado o casamento.
A testemunha Vitória Marquez Giudice afirmou que a parte autora laborou na residência de sua
genitora, razão por que a conhece desde sua infância. Esclareceu que ela trabalhou por cerca
de vinte anos e saiu tão somente em 2015. Asseverou que a autora conviveu maritalmente com
Francisco, recordando-se que contava com cerca de dez anos de idade, quando eles passaram
a morar juntos. Desde então, pode vivenciar que eles eram tidos pela sociedade local como se
fossem casados. Esclareceu que eles moravam no mesmo bairro onde está situada a casa de
sua genitora. Acrescentou ter viajado com o casal até o estado da Paraíba, onde foi celebrado o
matrimônio.
À vista do exposto, restou comprovado que o casamento sucedeu um período anterior de união
estável, com duração superior a dois anos, conforme preconizado pelo artigo 77, § 2º, V, b, da
Lei nº 8.213/91, com a redação incluída pela Lei nº 13.135/2015.
Desnecessária a demonstração da dependência econômica, pois, segundo o art. 16, I, § 4º, da
Lei de Benefícios, a mesma é presumida em relação ao cônjuge.
Em face de todo o explanado, a postulante faz jus ao restabelecimento da pensão por morte
(NB 21/175496267-7), a contar da data em que havia sido cessada administrativamente pelo
INSS (23/12/2015).
Tendo em vista a duração do vínculo marital e a idade da autora, ao tempo do falecimento do
cônjuge, o benefício terá caráter vitalício, conforme preconizado pelo art. 77 da Lei de
Benefícios, com a redação introduzida pela Lei nº 13.135/2015.
Por ocasião da liquidação da sentença, deverá ser compensado o valor das parcelas já
auferidas por força da antecipação da tutela.
CONSECTÁRIOS
JUROS DE MORA
Conforme disposição inserta no art. 219 do Código de Processo Civil 1973 (atual art. 240
Código de Processo Civil - Lei nº 13.105/2015), os juros de mora são devidos a partir da citação
na ordem de 6% (seis por cento) ao ano, até a entrada em vigor da Lei nº 10.406/02, após, à
razão de 1% ao mês, consonante com o art. 406 do Código Civil e, a partir da vigência da Lei nº
11.960/2009 (art. 1º-F da Lei 9.494/1997), calculados nos termos deste diploma legal.
CORREÇÃO MONETÁRIA
A correção monetária deve ser aplicada em conformidade com a Lei n. 6.899/81 e legislação
superveniente (conforme o Manual de Cálculos da Justiça Federal), observados os termos da
decisão final no julgamento do RE n. 870.947, Rel. Min. Luiz Fux.
DA APLICAÇÃO ÚNICA DA SELIC A PARTIR DA EC 113, DE 08/12/21
Desde o mês de promulgação da Emenda Constitucional n. 113, de 8/12/2021, a apuração do
débito se dará unicamente pela Taxa SELIC, mensalmente e de forma simples, nos termos do
disposto em seu artigo 3º, ficando vedada a incidência da Taxa SELIC cumulada com juros e
correção monetária.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Com o advento do novo Código de Processo Civil, foram introduzidas profundas mudanças no
princípio da sucumbência, e em razão destas mudanças e sendo o caso de sentença ilíquida, a
fixação do percentual da verba honorária deverá ser definida somente na liquidação do julgado,
com observância ao disposto no inciso II, do § 4º c.c. § 11, ambos do artigo 85, do CPC/2015,
bem como o artigo 86, do mesmo diploma legal.
Os honorários advocatícios a teor da Súmula 111 do E. STJ incidem sobre as parcelas vencidas
até a sentença de procedência.
CUSTAS
Conquanto a Lei Federal nº 9.289/96 disponha no art. 4º, I, que as Autarquias são isentas do
pagamento de custas na Justiça Federal, seu art. 1º, §1º, delega à legislação estadual
normatizar sobre a respectiva cobrança nas causas ajuizadas perante a Justiça Estadual no
exercício da competência delegada. Note-se que, em se tratando das demandas aforadas no
Estado de São Paulo, tal isenção encontra respaldo na Lei Estadual nº 11.608/03 (art. 6º).
A isenção referida não abrange as despesas processuais que houver efetuado, bem como,
aquelas devidas a título de reembolso à parte contrária, por força da sucumbência.
PREQUESTIONAMENTO
Cumpre salientar, diante de todo o explanado, que a r. sentença monocrática não ofendeu
qualquer dispositivo legal, não havendo razão ao prequestionamento suscitado pelo Instituto
Autárquico.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação do INSS, a fim de ajustar a sentença
recorrida quanto aos critérios de incidência dos juros de mora e da correção monetária, além de
isentá-lo das custas e despesas processuais. Os honorários advocatícios serão fixados por
ocasião da liquidação do julgado, nos termos da fundamentação. Mantenho a tutela concedida.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. ÓBITO EM 2015, NA VIGÊNCIA DA LEI Nº
8.213/91. QUITAÇÃO ADMINISTRATIVA DE QUATRO PARCELAS. LEI 13.135/2015.
RESTABELECIMENTO DO BENEFÍCIO. QUALIDADE DE SEGURADO. UNIÃO ESTÁVEL
SEGUIDA DE CASAMENTO. PERÍODO MÍNIMO DE DOIS ANOS DE MATRIMÔNIO. INÍCIO
DE PROVA MATERIAL CORROBORADO POR TESTEMUNHAS. CRITÉRIOS DE
INCIDÊNCIA DOS JUROS DE MORA E DA CORREÇÃO MONETÁRIA. CUSTAS.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
- O óbito de Francisco Lima da Costa, ocorrido em 23 de agosto de 2015, restou comprovado
pela respectiva certidão.
- No que se refere à qualidade de segurado, os extratos do CNIS reportam-se a vínculo
empregatício estabelecido no interregno compreendido entre 01 de fevereiro de 2011 e 23 de
agosto de 2015. Além disso, esteve em gozo de auxílio-doença (NB 31/6105236607), no
período compreendido entre 06 de maio de 2015 e 05 de agosto de 2015.
- Em decorrência do falecimento do segurado, o INSS instituiu administrativamente em favor da
parte autora o benefício de pensão por morte (NB 21/175.496.267-7), com início do pagamento
a contar da data do falecimento, porém, fê-lo cessar após a quitação de quatro parcelas.
- Conforme se infere da informação prestada pela agência do INSS, a cessação do benefício,
após a quitação de quatro parcelas, decorreu da ausência de comprovação de duração mínima
de dois anos do casamento da autora com o falecido segurado.
- Depreende-se da Certidão de Casamento que a parte autora e Francisco Lima da Costa
uniram-se em matrimônio em 29/12/2014. Entre referida data e o óbito (23/08/2015)
transcorreram 7 (sete) meses e 25 (vinte e cinco) dias.
- A controvérsia cinge-se à comprovação da união estável vivenciada entre a parte autora e o
falecimento segurado, anteriormente à celebração do matrimônio. No Código Civil, a união
estável está disciplinada pelo artigo 1723, segundo o qual “é reconhecida a união estável entre
o homem e a mulher configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida
com o objetivo de constituição de família”.
- Os autos foram instruídos com informe de rendimentos, emitido por instituição financeira, além
de notas fiscais de consumo de energia elétricas, os quais vinculam a autora e o falecido
segurado ao mesmo endereço, desde 2010.
- Em audiência realizada em 19 de fevereiro de 2020, foram inquiridas em juízo três
testemunhas, sob o crivo do contraditório, através de sistema audiovisual. As depoentes
esclareceram conhecer a parte autora há mais de quinze anos e terem vivenciado que, por volta
de 2002/2003, ela e o segurado passaram a morar no mesmo imóvel e se apresentar perante a
sociedade local como se fossem casados, condição que se estendeu até a data do falecimento.
Ressaltaram que, por volta de 2014, a autora e o segurado haviam viajado para o estado da
Paraíba, onde se uniram em matrimônio.
- Restou comprovado que o casamento sucedeu um período anterior de união estável, com
duração superior a dois anos, conforme preconizado pelo artigo 77, § 2º, V, b, da Lei nº
8.213/91, com a redação incluída pela Lei nº 13.135/2015.
- A postulante faz jus ao restabelecimento da pensão por morte (NB 21/175496267-7), a contar
da data em que havia sido cessada administrativamente pelo INSS.
- Conforme disposição inserta no art. 219 do Código de Processo Civil 1973 (atual art. 240
Código de Processo Civil - Lei nº 13.105/2015), os juros de mora são devidos a partir da citação
na ordem de 6% (seis por cento) ao ano, até a entrada em vigor da Lei nº 10.406/02, após, à
razão de 1% ao mês, consonante com o art. 406 do Código Civil e, a partir da vigência da Lei nº
11.960/2009 (art. 1º-F da Lei 9.494/1997), calculados nos termos deste diploma legal.
- A correção monetária deve ser aplicada em conformidade com a Lei n. 6.899/81 e legislação
superveniente (conforme o Manual de Cálculos da Justiça Federal), observados os termos da
decisão final no julgamento do RE n. 870.947, Rel. Min. Luiz Fux.
- Desde o mês de promulgação da Emenda Constitucional n. 113, de 8/12/2021, a apuração do
débito se dará unicamente pela Taxa SELIC, mensalmente e de forma simples, nos termos do
disposto em seu artigo 3º, ficando vedada a incidência da Taxa SELIC cumulada com juros e
correção monetária.
- Por se tratar de demanda aforada no Estado de São Paulo, o INSS é isento de custas e
despesas processuais, com respaldo na Lei Estadual nº 11.608/03.
- Os honorários advocatícios deverão ser fixados na liquidação do julgado, nos termos do inciso
II, do § 4º, c.c. §11, do artigo 85, do CPC/2015.
- Tutela antecipada mantida.
- Apelação do INSS provida parcialmente.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu dar parcial provimento à apelação do INSS, a fim de ajustar a sentença
recorrida quanto aos critérios de incidência dos juros de mora e da correção monetária, além de
isentá-lo das custas e despesas processuais, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo
parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
