
| D.E. Publicado em 17/04/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0007943-85.2014.4.03.6102/SP
RELATÓRIO
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Proposta ação de conhecimento, objetivando a declaração de inexigibilidade de débito c.c. restituição de valores, sobreveio sentença de procedência do pedido para condenar o INSS a cessar os descontos efetuados no benefício concedido à autora, bem como a restituir os valores descontados, além de honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor das atualizado da causa, nos termos da Resolução nº 267/2013, do CJF. Foi mantida a antecipação de tutela anteriormente concedida.
A r. sentença não foi submetida ao reexame necessário.
Inconformada, a autarquia previdenciária interpôs recurso de apelação, pugnando pela integral reforma da sentença, para que seja julgado improcedente o pedido, sustentando a possibilidade de cobrança dos valores indevidamente pagos pelo INSS. Subsidiariamente, requer a exclusão da condenação ao pagamento de honorários advocatícios.
Com as contrarrazões, os autos foram remetidos a este Tribunal.
É o relatório.
VOTO
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Inicialmente, recebo os recursos de apelação do INSS e da parte autora, haja vista que tempestivos, nos termos do artigo 1.010 do novo Código de Processo Civil.
Trata-se de ação de conhecimento objetivando a declaração de inexigibilidade de débito c.c. restituição de valores proposta pela parte autora em face da Autarquia.
Com base em seu poder de autotutela a Autarquia Previdenciária, pode a qualquer tempo rever os seus atos para cancelar ou suspender benefícios, quando eivados de vícios que os tornem ilegais, conforme Súmula 473 do C. STF: "A administração pode anular seus próprios atos quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revoga-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial".
Compulsando os autos, verifico que, por ocasião do requerimento do benefício de pensão por morte, em razão do óbito do marido, a autarquia previdenciária verificou que ele era aposentado e, portanto, a autora teria recebido indevidamente o amparo social.
O benefício assistencial, no valor de um salário mínimo, está previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição Federal, bem como na Lei nº 8.742/93.
Consoante regra do art. 203, inciso V, da CF, a assistência social será prestada à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem "não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família".
A Lei nº 8.742/93, que dispõe sobre a organização da Assistência Social, veio regulamentar o referido dispositivo constitucional, estabelecendo em seu art. 20 os requisitos para sua concessão, quais sejam, ser pessoa portadora de deficiência ou idosa, bem como ter renda familiar inferior a ¼ do salário mínimo.
Considera-se pessoa idosa, para fins de concessão do benefício de prestação continuada, aquela que possua 65 (sessenta e cinco) anos, nos termos do art. 20, caput, da supracitada lei.
No caso dos autos, quando da concessão do benefício, 2004, a parte autora era idosa, contando com 73 (setenta e três) anos de idade.
De outra parte, quanto à insuficiência de recursos para prover a própria subsistência ou de tê-la provida por sua família, ressalta-se que o objetivo da assistência social é prover o mínimo para a manutenção do idoso ou incapaz, de modo a assegurar-lhe uma qualidade de vida digna. Por isso, para sua concessão não há que se exigir uma situação de miserabilidade absoluta, bastando a caracterização de que o beneficiário não tem condições de prover a própria manutenção, nem de tê-la provida por sua família.
Não se tem dúvida de que o § 3º do art. 20 da Lei nº 8.742/93 é constitucional, tendo o Supremo Tribunal Federal decidido nesse sentido (ADIN nº 1.232/DF, Relator p/ acórdão Ministro Nelson Jobim, j. 27/08/1998DJ 01/06/2001).
Todavia, o disposto no § 3º do art. 20 da Lei nº 8.742/93 não é o único meio de comprovação da miserabilidade do deficiente ou do idoso, devendo a respectiva aferição ser feita, também, com base em elementos de prova colhidos ao longo do processo, observada as circunstâncias específicas relativas ao postulante do benefício. Lembra-se aqui precedente do Superior Tribunal de Justiça, que não restringe os meios de comprovação da condição de miserabilidade do deficiente ou idoso: "O preceito contido no art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93 não é o único critério válido para comprovar a condição de miserabilidade preceituada no artigo 203, V, da Constituição Federal. A renda familiar per capita inferior a 1/4 do salário-mínimo deve ser considerada como um limite mínimo, um quantum objetivamente considerado insuficiente à subsistência do portador de deficiência e do idoso, o que não impede que o julgador faça uso de outros fatores que tenham o condão de comprovar a condição de miserabilidade da família do autor." (REsp nº435871/SP, Relator Ministro Felix Fischer, j. 19/09/2002, DJ 21/10/2002, p. 391).
A jurisprudência passou, então, a admitir a possibilidade do exame de situações subjetivas tendentes a comprovar a condição de miserabilidade do requerente e de sua família, interpretação consolidada pelo Superior Tribunal de Justiça, em recurso especial julgado pela sistemática do artigo 543-C do CPC (REsp. 1.112.557-MG; Terceira Seção; Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho; j. 28/10/2009; DJ 20/11/2009).
A questão voltou à análise do Supremo Tribunal Federal, sendo que após o reconhecimento da existência de repercussão geral, no âmbito da Reclamação 4.374 - PE, julgada em 18/04/2013, prevaleceu o entendimento segundo o qual as significativas mudanças econômicas, bem como as legislações em matéria de benefícios previdenciários e assistenciais trouxeram outros critérios econômicos que aumentaram o valor padrão da renda familiar per capita, de maneira que, ao longo de vários anos, desde a sua promulgação, o §3º do art. 20 da LOAS, passou por um processo de inconstitucionalização, conforme ementa a seguir transcrita:
De outro lado, no julgamento dos Recursos Especiais Repetitivos nº 1.355.052/SP e nº 1.112.557/MG foi fixada orientação no sentido de que a norma em causa não se mostra como o único critério possível para a apuração da necessidade do recebimento do benefício.
Por sua vez, a Lei nº 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência) incluiu o § 11 ao art. 20 da LOAS, acolhendo outros elementos de prova com condição da miserabilidade e da situação de vulnerabilidade do núcleo familiar do requerente de benefício, além do critério objetivo de renda mensal "per capita" no valor inferior a ¼ do salário mínimo.
Assim, deverá sobrevir análise da situação de hipossuficiência porventura existente, consoante a renda informada, caso a caso.
No presente caso, o estudo social (fls. 163/171) revela que a autora e seu marido residiam em imóvel alugado, tinham altos gastos com remédios e viviam em condições de "insuficiência de renda".
Cabe ressaltar que o benefício recebido pelo cônjuge à época deveria ser excluído do cálculo da renda familiar da requerente, a teor do decidido pelo Supremo Tribunal Federal, em sessão de julgamento realizada em 18/04/2013, no Recurso Especial 580963/PR, Relator Ministro Gilmar Mendes, no qual foi declarada a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 34, parágrafo único, da Lei nº 10.741/2003, e que o benefício previdenciário no valor de um salário mínimo recebido por idoso integrante do grupo familiar não pode compor o cálculo da renda familiar "per capita" para a apuração da condição de hipossuficiente da parte requerente do benefício assistencial, uma vez que o ordenamento jurídico não admite discriminação dos portadores de deficiência em relação aos idosos, bem como dos idosos beneficiários da assistência social (LOAS) em relação aos idosos titulares de benefícios previdenciários no valor de um salário mínimo.
No mesmo sentido, julgado do Egrégio Superior Tribunal de Justiça:
Assim, os elementos de prova coligidos são suficientes para evidenciar que a autora fazia mesmo jus ao benefício assistencial que lhe foi concedido administrativamente (NB 133.547.319-7 - fl. 99), até o momento em que passou a receber a pensão por morte (NB 153.337.752-6 - fl. 103).
Dessa forma, não há se falar em restituição de valores.
Quanto aos honorários advocatícios, cabível o entendimento consolidado pela Corte Especial do C. Superior Tribunal de Justiça no julgamento do REsp 1199715/RJ, representativo da controvérsia, de que não são devidos honorários advocatícios à Defensoria Pública quando atua contra pessoa jurídica de direito público que integra a mesma Fazenda Pública, assim ementado:
Com efeito, in casu, não é cabível a condenação em honorários advocatícios em processo judicial em que a Defensoria Pública da União atua contra autarquia previdenciária federal, uma vez que o INSS integra a mesma Fazenda Pública.
Diante do exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS para excluir da condenação o pagamento de honorários advocatícios à Defensoria Pública da União, na forma da fundamentação.
É o voto.
LUCIA URSAIA
Desembargadora Federal
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| Data e Hora: | 04/04/2017 18:49:26 |
