
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5020776-59.2018.4.03.6183
RELATOR: Gab. 51 - DES. FED. FONSECA GONÇALVES
APELANTE: CARLOS ALEXANDRE DE ANDRADE SOARES
Advogado do(a) APELANTE: RICARDO AURELIO DE MORAES SALGADO JUNIOR - SP138058-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, F. R. O. A.
REPRESENTANTE: MICHELINE OLIVEIRA DE ARAUJO
Advogados do(a) APELADO: VANIA CATUNDA NUNES - SP110317-A,
OUTROS PARTICIPANTES:
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5020776-59.2018.4.03.6183
RELATOR: Gab. 51 - DES. FED. FONSECA GONÇALVES
APELANTE: CARLOS ALEXANDRE DE ANDRADE SOARES
Advogado do(a) APELANTE: RICARDO AURELIO DE MORAES SALGADO JUNIOR - SP138058-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, F. R. O. A.
REPRESENTANTE: MICHELINE OLIVEIRA DE ARAUJO
Advogados do(a) APELADO: VANIA CATUNDA NUNES - SP110317-A,
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R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação (dita recurso inominado) interposta pelo autor Carlos Alexandre de Andrade Soares em face da sentença proferida em 17/10/2022, que julgou procedente pedido de pensão por morte, para deferir-lhe o benefício pelo prazo de 15 anos, a ser rateado com o autor Felipe Ricardo Oliveira Alves.
Nas razões recursais, bate-se o requerente pela inconstitucionalidade do artigo 77 da Lei nº 8.213/91, alterado pela Medida Provisória nº 164/2014 e convertida na Lei nº 13.135/2015, que estabeleceu prazo de cessação do benefício de pensão por morte. Esteado nisso, pleiteia a reforma do decisum, para que o benefício seja deferido de forma vitalícia, nos moldes da lei anterior.
Sem apresentação de contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
Nesta instância, o MPF foi cientificado e ofereceu manifestação.
É o relatório.
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5020776-59.2018.4.03.6183
RELATOR: Gab. 51 - DES. FED. FONSECA GONÇALVES
APELANTE: CARLOS ALEXANDRE DE ANDRADE SOARES
Advogado do(a) APELANTE: RICARDO AURELIO DE MORAES SALGADO JUNIOR - SP138058-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, F. R. O. A.
REPRESENTANTE: MICHELINE OLIVEIRA DE ARAUJO
Advogados do(a) APELADO: VANIA CATUNDA NUNES - SP110317-A,
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O equívoco da parte em denominar a peça recursal – recurso inominado em vez de apelação – não impede a análise das razões que nela se hospedam, caso satisfeitos todos os pressupostos do recurso adequado (STJ, REsp nº 1.544.983/PR, Segunda Turma, Rel. Ministro Og Fernandes, j. 03/05/2018, DJe 18/05/2018).
Note-se que o recurso aforado, bem compreendido, veicula as razões de inconformidade do recorrente em face da sentença proferida. É o que basta para o conhecimento da irresignação.
Assim, porque preenche os pressupostos de admissibilidade, conhece-se do recurso interposto.
O autor pleiteia pensão em razão da morte do companheiro, Toni Ricardo Bento Alves.
Para a concessão do benefício de pensão por morte é necessário o preenchimento dos seguintes requisitos: (I) o fato do óbito; (II) qualidade de dependente de quem pleiteia o benefício e (III) comprovação da qualidade de segurado do “de cujus” ou, em caso de perda da qualidade de segurado, o adimplemento dos requisitos para a concessão de aposentadoria (artigos 15 e 102 da Lei nº 8.213/91, com a redação dada pela Lei nº 9.528/97 e Lei nº 10.666/03).
No tema, vigora o princípio tempus regit actum, aplicando-se a lei vigente à época do óbito, fato que desencadeia o direito ao benefício em questão (Súmula 340 do C. STJ).
A sentença apelada reconheceu o direito ao benefício postulado pelo prazo de 15 (quinze) anos.
Devolve-se à apreciação deste Tribunal o período de duração da pensão por morte deferida ao autor Carlos Alexandre, que este rechaça, pretendendo-o vitalício.
A morte do instituidor deu-se em 17/07/2018 (ID 279872107 - Pág. 22), na vigência da Lei nº 13.135/2015, que atribuiu ao artigo 77 da Lei nº 8.213/91 a seguinte redação:
“Art. 77. .....................................................................
§ 2º O direito à percepção de cada cota individual cessará:
...................................................................................
II - para filho, pessoa a ele equiparada ou irmão, de ambos os sexos, ao completar 21 (vinte e um) anos de idade, salvo se for inválido ou com deficiência;
III - para filho ou irmão inválido, pela cessação da invalidez;
IV - para filho ou irmão que tenha deficiência intelectual ou mental ou deficiência grave, pelo afastamento da deficiência, nos termos do regulamento; (Vigência)
V - para cônjuge ou companheiro:
a) se inválido ou com deficiência, pela cessação da invalidez ou pelo afastamento da deficiência, respeitados os períodos mínimos decorrentes da aplicação das alíneas “b” e “c”;
b) em 4 (quatro) meses, se o óbito ocorrer sem que o segurado tenha vertido 18 (dezoito) contribuições mensais ou se o casamento ou a união estável tiverem sido iniciados em menos de 2 (dois) anos antes do óbito do segurado;
c) transcorridos os seguintes períodos, estabelecidos de acordo com a idade do beneficiário na data de óbito do segurado, se o óbito ocorrer depois de vertidas 18 (dezoito) contribuições mensais e pelo menos 2 (dois) anos após o início do casamento ou da união estável:
1) 3 (três) anos, com menos de 21 (vinte e um) anos de idade;
2) 6 (seis) anos, entre 21 (vinte e um) e 26 (vinte e seis) anos de idade;
3) 10 (dez) anos, entre 27 (vinte e sete) e 29 (vinte e nove) anos de idade;
4) 15 (quinze) anos, entre 30 (trinta) e 40 (quarenta) anos de idade;
5) 20 (vinte) anos, entre 41 (quarenta e um) e 43 (quarenta e três) anos de idade;
6) vitalícia, com 44 (quarenta e quatro) ou mais anos de idade.
§ 2º -A. Serão aplicados, conforme o caso, a regra contida na alínea “a” ou os prazos previstos na alínea “c”, ambas do inciso V do § 2º, se o óbito do segurado decorrer de acidente de qualquer natureza ou de doença profissional ou do trabalho, independentemente do recolhimento de 18 (dezoito) contribuições mensais ou da comprovação de 2 (dois) anos de casamento ou de união estável.
§ 2º -B. Após o transcurso de pelo menos 3 (três) anos e desde que nesse período se verifique o incremento mínimo de um ano inteiro na média nacional única, para ambos os sexos, correspondente à expectativa de sobrevida da população brasileira ao nascer, poderão ser fixadas, em números inteiros, novas idades para os fins previstos na alínea “c” do inciso V do § 2º, em ato do Ministro de Estado da Previdência Social, limitado o acréscimo na comparação com as idades anteriores ao referido incremento.
...............................................................................
§ 4º (Revogado).
§ 5º O tempo de contribuição a Regime Próprio de Previdência Social (RPPS) será considerado na contagem das 18 (dezoito) contribuições mensais de que tratam as alíneas “b” e “c” do inciso V do § 2º .”
A Lei nº 13.135 foi precedida da Medida Provisória nº 664, de 30/12/2014 que, alterando o artigo 74 da Lei nº 8.213/91, vedava a concessão da pensão por morte a cônjuge ou companheiro(a), cujo casamento ou união estável tivesse ocorrido há menos de dois anos do óbito do instituidor. Modificou ainda o artigo 77 da mesma lei, para estabelecer tempo de duração do benefício de pensão por morte deferido a cônjuge ou companheiro(a), de acordo com os critérios nela enunciados (expetativa de vida do beneficiário).
A Lei nº 13.135/2015, todavia, não manteve a disposição do artigo 74 e alterou a redação dada ao artigo 77 por aquela medida provisória. Estabeleceu ainda, em seu artigo 5º, que os atos praticados com base em dispositivos da Medida Provisória nº 664, de 30 de dezembro de 2014, deveriam ser revistos e adaptados ao disposto no precitado diploma legal.
A jurisprudência do STF (v.g. AI 857.374 AgR/MG, Rel. o Min. Marco Aurélio, DJe de 17/12/2013) tem orientação consolidada no sentido de que a lei ordinária de conversão pode definir a disciplina das relações jurídicas que tiveram origem sob a vigência da medida provisória, cuja redação foi modificada ao longo de sua tramitação legislativa, como no caso. Por esse entendimento, autoriza-se ao Congresso Nacional, quando não tenha se utilizado de Decreto Legislativo, disciplinar, na própria lei de conversão, as relações jurídicas decorrentes de dispositivos suprimidos ou alterados da Medida Provisória parcialmente convertida em lei (TNU - Pedilef nº 5007655-68.2015.4.04.7208/SC).
Nesse sentido vem decidindo esta Corte: ApCiv 5009890-57.2022.4.03.6119, Rel. o Juiz Federal Convocado PAULO BUENO DE AZEVEDO, 8ª Turma, DJEN DATA: 02/05/2024; ApCiv/MS 5000237-60.2024.4.03.9999, Desembargador Federal MARCELO VIEIRA DE CAMPOS, 7ª Turma, Intimação via sistema DATA: 15/04/2024)
De outra parte, é certo que a Constituição Federal, ao tratar de seguridade social, limitou-se a estabelecer linhas gerais com base nas quais o sistema haveria de se constituir.
Exemplo disso é o artigo 201 daquela Lei Maior, que no seu inciso V prevê o direito à “pensão por morte do segurado, homem ou mulher, ao cônjuge ou companheiro e dependentes”, sem esmiuçar critérios ou condições para a concessão do benefício.
Nesse passo, ficou atribuída ao legislador infraconstitucional a elaboração de conceitos e de requisitos pertinentes a cada um dos benefícios previdenciários. Não se lobriga na Constituição Federal regra que impeça o estabelecimento de parâmetros, como faixa etária, tempo de contribuição ou limitação temporal, para o recebimento de benefícios previdenciários.
Dessa maneira, a fixação do período de duração da pensão por morte, por lei ordinária, não colide ou atrita com o trato constitucional dado à matéria (STF - ARE 136019, AgR, Rel. o Min. Edson Fachin, j. de 22/04/2022, DJe 03/05/2022; RE 130053, Rel. o Min. Nunes Marques, j. de 01/10/2021, publicação 07/10/2021; RE 1334154, Rel. o Min. Gilmar Mendes, j. de 10/02/2022, publicação de 15/02/2022).
Não se vislumbra, portanto, nenhuma inconstitucionalidade no artigo 77, § 2º, V, da Lei nº 8.213/91, na redação atribuída pela Lei nº 13.135/2015.
Nesse sentido, confira-se julgado desta Corte:
“PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. APLICAIBILIDADE DO ART. 77, § 2º, DA LEI 8.213/91. CONSECTÁRIOS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.
- Não há que se falar em inconstitucionalidade do art. 77, §2º, da Lei nº 8.213/91, com as novas disposições trazidas pela Lei n º 13.135/2015.
- Sobre os valores em atraso incidirão correção monetária e juros de mora em conformidade com os critérios legais compendiados no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, observadas as teses fixadas no julgamento final do RE 870.947, de relatoria do Ministro Luiz Fux.
- Honorários advocatícios fixados em percentual mínimo a ser definido na fase de liquidação, nos termos do inciso II do § 4º do artigo 85 do NCPC, observando-se o disposto nos §§ 3º e 5º desse mesmo dispositivo legal e considerando-se as parcelas vencidas até a data da decisão concessiva do benefício (Súmula n. 111 do STJ), devendo a verba honorária ser acrescida de 2%, diante da sucumbência recursal e da regra prevista no § 11 do art. 85 do NCPC.
- Apelo autárquico parcialmente provido.
(ApCiv nº 0006663-59.2016.4.03.6183, Rel. Des. Fed. JOÃO BATISTA GONÇALVES, TRF3, 9.ª Turma, julgado em 01/10/2020)
Também o E. TRF da 4ª Região, apreciando a matéria, considerou inexistir, no novo regramento, ofensa aos princípios da seletividade, da responsabilidade e do equilíbrio atuarial e financeiro. Repare-se na ementa a seguir transcrita:
“RECURSO INOMINADO. PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO- RECLUSÃO. LIMITAÇÃO TEMPORAL DO BENEFÍCIO INSTITUÍDA PELA MP 664/2014, CONVERTIDA NA LEI 13.135/2015. AUSÊNCIA DE INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL OU MATERIAL. RECURSO IMPROVIDO.
1. Não prospera a alegação de inconstitucionalidade da MP 664 de 2014 e da Lei 13.135/2015, que limitaram a duração da cota do benefício aos cônjuges e companheiros, conforme o tempo de casamento e união estável. Quanto à impugnação por vício formal fundada em ofensa ao art. 62 da CF, o SFT já assentou que o controle judicial dos pressupostos de urgência e relevância se reveste de caráter excepcional, e apenas se legitima quando patente o excesso no exercício da discricionariedade do Presidente da República. No caso, tal exorbitância não se verifica da leitura da exposição de motivos da MP 664. Ainda, não afronta o art. 246 da CF medida provisória que regulamente dispositivo constitucional meramente reposicionado por emenda posterior a 1995 (STF).
2. Em se tratando de direito fundamental, constatada redução de acesso à prestação previdenciária, cumpre verificar se a medida legal restritiva é condizente e proporcional aos objetivos perseguidos pelo legislador e se tais medidas visam a garantir continuidade do próprio direito social. O novo regramento encontra amparo nos princípios da seletividade, da responsabilidade e do equilíbrio atuarial e financeiro, que informam a organização da seguridade social (art. 194, parágrafo único, CF).
3. Inexiste violação ao princípio isonômico, visto que a diferença entre as situações e graus de dependência econômica, conforme a duração da união ou a colaboração histórica do instituidor no orçamento familiar, justifica o tratamento desigual, sem deixar o cônjuge ou companheiro a descoberto de proteção previdenciária.
4. Recurso não provido."
(RECURSO CÍVEL 5003527-78.2019.4.04.7203, Relator: ERIKA GIOVANINI REUPKE, TRF-4, Segunda Turma Recursal de SC, Data de Julgamento: 08/07/2020)
Importante salientar que nas ADI’s 5246 e 5230, que tinham por objeto a inconstitucionalidade da Medida Provisória nº 664/2014, o STF deu por prejudicado o julgamento daquelas ações sob o fundamento de que a referida medida provisória sofreu, no procedimento de sua conversão legislativa, alterações substanciais de seu texto original.
O mais é considerar que a sentença reconheceu a existência de união estável entre o autor Carlos Alexandre e o instituidor, por mais de dois anos, ponto a respeito do qual não se recorreu.
Isso considerado e achando-se o referido autor com 37 anos de idade na data do óbito, o período de duração do benefício ficou bem estabelecido em 15 anos, nos termos do artigo 77, § 2º, V, c, item 4, da Lei nº 8.213/91.
Diante do exposto, nego provimento à apelação do autor, na forma da fundamentação.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. COMPANHEIRO. ÓBITO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.135/2015. PRAZO DE DURAÇÃO DO BENEFÍCIO. CONSTITUCIONALIDADE.
- Para a concessão do benefício de pensão por morte é necessário o preenchimento dos seguintes requisitos: (i) fato do óbito; (ii) qualidade de dependente de quem requer o benefício e (ii) comprovação da qualidade de segurado do “de cujus” ou, em caso de perda da qualidade de segurado, o adimplemento dos requisitos para a concessão de aposentadoria (artigos 15 e 102 da Lei nº 8.213/91, com a redação dada pela Lei nº 9.528/97, e Lei nº 10.666/03).
- No tema, vigora o princípio tempus regit actum, aplicando-se a lei vigente à época do óbito, fato que desencadeia o direito ao benefício em questão (Súmula 340 do C. STJ).
- A morte do instituidor deu-se na vigência da Lei nº 13.135/2015, que modificando o artigo 77 da Lei nº 8.213/91, estabeleceu limitação temporal ao gozo do benefício de pensão por morte.
- A Constituição Federal, ao tratar de seguridade social, limitou-se a estabelecer linhas gerais com base nas quais o sistema haveria de se constituir. Ficou delegada, então, ao legislador infraconstitucional a elaboração de conceitos e de requisitos pertinentes a cada um dos benefícios previdenciários. Bem por isso, a fixação do período de duração da pensão por morte, por lei ordinária, não afronta nenhum dispositivo constitucional.
- A sentença reconheceu a existência de união estável entre o autor e o instituidor, por mais de dois anos, ponto a respeito do qual não se recorreu. Isso considerado e somando o autor 37 anos de idade na data do óbito, o período de duração do benefício ficou bem fixado em 15 anos, nos termos do artigo 77, § 2º, V, c, item 4, da Lei nº 8.213/91, dispositivo que não se avista inconstitucional.
- Apelo improvido.
