Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5318407-46.2020.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal INES VIRGINIA PRADO SOARES
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
16/11/2020
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 19/11/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. COMPROVAÇÃO DE CONDIÇÃO DE SEGURADO.
IMPOSSIBILIDADE DE JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. CERCEAMENTO DE DEFESA.
SENTENÇA DESCONSTITUÍDA.
1 . Por ter sido a sentença proferida sob a égide do Código de Processo Civil de 2015 e, em
razão de sua regularidade formal, conforme certificado nos autos, a apelação interposta deve ser
recebida e apreciada em conformidade com as normas ali inscritas.
2. O benefício de pensão por morte independe de carência, devendo ser comprovados, para a
sua obtenção, (i) o óbito ou a morte presumida, (ii) a condição de segurado do falecido e (iii) a
condição de dependente do requerente.
3. E o artigo 16 da Lei nº 8.213/91 prevê três classes de dependentes (incisos I a III) - a primeira,
cuja dependência econômica é presumida; outras duas, cuja dependência depende de
comprovação (parágrafo 4º) -, estabelecendo, entre elas, uma hierarquia, segundo a qual a
existência de dependente de uma classe exclui, do direito às prestações, os das classes
seguintes (parágrafo 1º).
4. No caso dos autos, os apelantes são filhos do "de cujus", e pleiteiam a concessão de pensão
por morte, pugnando pela produção de prova testemunhal para a comprovação do exercício de
atividade rural pelo "de cujus" à época do falecimento, comprovando a sua qualidade de
segurado.
5. O julgamento da lide, sem a oitiva de testemunhas, requerida pelos autores de forma expressa
e justificada, consubstanciou-se em evidente cerceamento do direito constitucional à ampla
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
defesa (art. 5º, LV, da CF/88). Precedente desta E. Corte: Ap 00346494920174039999, Rel. Des.
Fed. NEWTON DE LUCCA, 8ª Turma, e-DJF3 Judicial 22/01/2018
6. Apelo provido. Sentença desconstituída.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5318407-46.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: VITOR GUIDO DE OLIVEIRA, R. G. D. O.
REPRESENTANTE: ELIANA APARECIDA BRESIO DE OLIVEIRA
Advogado do(a) APELANTE: MARCO ANTONIO DE MORAIS TURELLI - SP73062-N,
Advogado do(a) APELANTE: MARCO ANTONIO DE MORAIS TURELLI - SP73062-N,
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5318407-46.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: VITOR GUIDO DE OLIVEIRA, R. G. D. O.
REPRESENTANTE: ELIANA APARECIDA BRESIO DE OLIVEIRA
Advogado do(a) APELANTE: MARCO ANTONIO DE MORAIS TURELLI - SP73062-N,
Advogado do(a) APELANTE: MARCO ANTONIO DE MORAIS TURELLI - SP73062-N,
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação ordinária proposta por VITOR GUIDO DE OLIVEIRA e ROBSON GUIDO DE
OLIVEIRA, representados por sua genitora, em face do Instituto Nacional do Seguro Social -
INSS, objetivando a concessão do benefício de pensão por morte instituída por seu pai PAULO
PEREIRA DE OLIVEIRA.
A r. sentença extinguiu o feito com resolução de mérito, nos termos do artigo 485, I, do CPC, por
ter sido comprovada a qualidade de segurado do "de cujus", condenando os autores ao
pagamento de custas, despesas e honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da
causa, suspensa a execução, em razão da Justiça Gratuita que lhes foi concedida.
Apelam os autores, alegando cerceamento de defesa, e pugnando pela anulação da sentença,
para que se possa produzir prova testemunhal, a comprovar o exercício de atividade laboral rural
quando do falecimento do de cujus.
Sem contrarrazões, os autos subiram a esta Corte Regional.
Parecer do Ministério Público Federal, opinando pelo provimento do recurso (ID 142372800).
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5318407-46.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: VITOR GUIDO DE OLIVEIRA, R. G. D. O.
REPRESENTANTE: ELIANA APARECIDA BRESIO DE OLIVEIRA
Advogado do(a) APELANTE: MARCO ANTONIO DE MORAIS TURELLI - SP73062-N,
Advogado do(a) APELANTE: MARCO ANTONIO DE MORAIS TURELLI - SP73062-N,
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
V O T O
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA:Por primeiro, recebo a apelação
interposta sob a égide do Código de Processo Civil/2015, e, em razão de sua regularidade formal,
possível sua apreciação, nos termos do artigo 1.011 do Codex processual.
O benefício de pensão por morte destina-se aos dependentes do segurado que falece, seja ele
aposentado ou não, devendo a sua concessão observar, por força do princípio tempus regit
actum, a legislação vigente à época do óbito.
Nos termos da Lei nº 8.213/91, em seus artigos 74 a 79, que regulam atualmente a pensão por
morte, esta independe de carência, devendo ser comprovados, para a sua obtenção, (i) o óbito ou
a morte presumida, (ii) a condição de segurado do falecido e (iii) a condição de dependente do
requerente.
O artigo 16 da Lei nº 8.213/91 prevê três classes de dependentes (incisos I a III) - a primeira, cuja
dependência econômica é presumida; outras duas, cuja dependência depende de comprovação
(parágrafo 4º) -, estabelecendo, entre elas, uma hierarquia, segundo a qual a existência de
dependente de uma classe exclui, do direito às prestações, os das classes seguintes (parágrafo
1º).
No caso dos autos, o óbito ocorreu em 13/01/2015 (ID 141573536).
Alegam os autores que seu pai, segurado instituidor, mesmo após o último vínculo rural
rescindido em 23/07/2010, continuou trabalhando sem registro em CTPS no meio rural,
possuindo, assim, a qualidade de segurado à época do óbito.
Consoante se infere da petição inicial, os autores requereram a produção de prova testemunhal
para comprovação da condição de segurado do"de cujus".
Em resposta à contestação, novamente a parte autora postulou pela produção da prova oral.
Na sequência, foi proferida a r. sentença (id 141573611), nos seguintes termos:
“ (...)No caso dos autos, não restou demonstrada a qualidade de segurado do de cujus à época
do óbito, isso porque conforme se verifica tanto na CTPS quanto no CNIS juntados aos autos, o
último vínculo empregatício do falecido ocorreu no período de 01/06/2010 a 23/07/2010, enquanto
o óbito aconteceu em 13/01/2015 (fls. 17), tendo sido mantida a qualidade de segurado até
17/09/2012, conforme o indeferimento de fls. 65. Na inicial, os autores alegam que o de cujus era
segurado especial (trabalhador rural), mas mesmo intimados (fls. 108 e 120) não juntam aos
autos qualquer documento para comprovar o efetivo exercício de atividade campesina.Ressalte-
se que para a comprovação do exercício de atividade rural, o trabalhador deverá apresentar, além
de eventuais testemunhas, início de prova material contemporâneo ao período de carência do
benefício pretendido. Imperioso destacar ainda o enunciado da Súmula n.º 149, do Egrégio
Superior Tribunal de Justiça:“a prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da
atividade rurícola, para efeito de obtenção de benefício previdenciário
Assim, não havendo nos autos prova material a comprovar o exercício de atividade
rural,desnecessária a realização de prova oral.Quanto a alegação de que o falecido possuía
doença elencada no rol das doenças que não exigem carência, o que lhe dava o direito à
aposentadoria por invalidez, também não foi juntado qualquer documento médico para
comprovação de tal alegação.Também não prospera a alegação de que o de cujus possuía
tempo de contribuição suficiente para aposentar-se. Isso porque, de acordo com a certidão de
óbito (fls. 17), o falecido possuía 64 anos de idade na data do passamento, portanto, não fazia jus
a aposentadoria por idade.E ainda, somando todas as contribuições contidas no CNIS (fls. 83/85),
chega-se a um total de pouco mais de 25 anos, tempo insuficiente para a concessão da
aposentadoria por tempo de contribuição.Por derradeiro, saliento que o ônus da prova incumbe
ao autor quanto aos fatos constitutivos do seu direito, consoante preconiza o artigo 373, I, do
CPC.Destarte, havendo apenas apontamentos genéricos acerca da qualidade de segurado
especial do de cujus, desprovidos de qualquer conteúdo probatório, tem-se que as alegações não
passam de conjecturas, razão pela qual não podem ser aceitas como genuínas.Desse modo, não
restando comprovada a qualidade de segurado do falecido à época do passamento, de rigor a
improcedência da demanda. (...)””
Desta feita, observo que D. Juízo sentenciou o feito deixando de proporcionar à parte autora a
oportunidade para a produção de prova oral, quando seriam colhidos depoimentos de
testemunhas e os procuradores das partes poderiam realizar perguntas para melhor comprovar
os fatos alegados na inicial.
Suprime a r. decisão recorrida, ao julgar antecipadamente a lide, a oportunidade de ser revista,
pelo Tribunal, o conjunto probatório que as partes se propuseram a produzir em audiência, de tal
sorte que existe nos autos um início razoável de prova documental acerca do labor rural do autor.
Consta dos autos CTPS com diversos vínculos de labor rural, desde o ano 1979 até 2010, último
vínculo empregatício (ID 141573538, p. 3/25).
Assevero que nos casos de trabalhadores informais, a dificuldade de obtenção de documentos
permite maior abrangência na admissão do requisito legal de início de prova material, valendo
como tal documentos não contemporâneos ou mesmo em nome terceiros (integrantes do grupo
familiar, proprietários de terras, arrendatários, etc.), que juntamente com a prova oral, possibilite
um juízo de valor seguro acerca dos fatos que se pretende comprovar.
Dentro desse contexto, o exercício de labor rural deve ser demonstrado mediante a apresentação
de início de prova material, trazida aos autos e complementada por prova testemunhal idônea,
quando necessária ao preenchimento de lacunas - não sendo esta admitida, exclusivamente, nos
termos do art. 55, §3º, da Lei nº 8.213/91, bem como da Súmula nº 149 do STJ e do REsp nº
1.321.493/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, 1ª Seção, j. 10/10/2012, DJe 19/12/2012 (recurso
representativo da controvérsia).
Logo, a ausência de produção de prova testemunhal oportunamente requerida é que poderia
corroborar as provas documentais produzidas e demonstrar o exercício da atividade rural
desenvolvida no intervalo requerido.
Entendo, assim, que foi cerceado o direito de produção de provas da parte autora, sendo de rigor
a anulação da sentença, para que os autos retornem à origem e o Juízo"a quo"realize a prova
oral requerida, proferindo novo julgamento.
A propósito:
"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. ATIVIDADE URBANA SEM
REGISTRO EM CTPS. OITIVA DE TESTEMUNHAS. AUSÊNCIA. CERCEAMENTO DE DEFESA
. CONFIGURAÇÃO. PRELIMINAR ACOLHIDA. MÉRITO DA APELAÇÃO DA AUTORA
PREJUDICADO. SENTENÇA ANULADA.1. Não foi produzida prova testemunhal para corroborar
a comprovação do alegado exercício em atividade urbana conforme exigido em lei.2. A solução
para o litígio depende de dilação probatória, pois a controvérsia exige oitiva de testemunha e,
ainda que tenha juntado aos autos início de prova material - cópia de livro de ponto, referentes
aos meses de abril, maio e junho de 1988, é nítido e indevido o prejuízo imposto à parte autora
pelo Juízo de 1º grau, por não ter promovido a realização de prova essencial ao deslinde da
controvérsia aqui posta.3. A jurisprudência entende que a prova material do labor rural e urbano
poderá ser comprovada mediante produção de prova material ainda que inicial, complementada
por prova testemunhal idônea - quando necessária ao preenchimento de eventuais lacunas.4.
Cabe ao Magistrado permitir que as partes, em igualdade de condições, possam apresentar as
suas defesas, com as provas de que dispõem, em prol do direito de que se julgam titulares.5.
Preliminar acolhida. sentença anulada. Mérito da apelação prejudicado.(TRF 3ª Região, 7ª
Turma, Rel. Des. Fed. Toru Yamamoto, v.u, DJU 12/03/2018)."
Ademais, a ausência de oitiva de testemunhas que corroborem o início de prova material,
tornando impossível aferição de eventual direito ao benefício vindicado constitui nulidade que não
pode ser superada.
Desta forma, impõe-se a desconstituição da r. sentença, a fim de restabelecer a ordem
processual e assegurar os direitos/garantias constitucionalmente previstos, devendo os autos
retornarem ao Juízo de origem para regular processamento, oportunizando-se a produção da
prova oral.
Ante o exposto, dou provimento à Apelação dos autores, para desconstituir a r. Sentença,
determinando o retorno dos autos ao Juízo de origem, para realização da prova oral requerida e
apreciação do exercício de atividade laboral do segurado falecido quando do óbito.
É COMO VOTO.
/gabiv/ifbarbos
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. COMPROVAÇÃO DE CONDIÇÃO DE SEGURADO.
IMPOSSIBILIDADE DE JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. CERCEAMENTO DE DEFESA.
SENTENÇA DESCONSTITUÍDA.
1 . Por ter sido a sentença proferida sob a égide do Código de Processo Civil de 2015 e, em
razão de sua regularidade formal, conforme certificado nos autos, a apelação interposta deve ser
recebida e apreciada em conformidade com as normas ali inscritas.
2. O benefício de pensão por morte independe de carência, devendo ser comprovados, para a
sua obtenção, (i) o óbito ou a morte presumida, (ii) a condição de segurado do falecido e (iii) a
condição de dependente do requerente.
3. E o artigo 16 da Lei nº 8.213/91 prevê três classes de dependentes (incisos I a III) - a primeira,
cuja dependência econômica é presumida; outras duas, cuja dependência depende de
comprovação (parágrafo 4º) -, estabelecendo, entre elas, uma hierarquia, segundo a qual a
existência de dependente de uma classe exclui, do direito às prestações, os das classes
seguintes (parágrafo 1º).
4. No caso dos autos, os apelantes são filhos do "de cujus", e pleiteiam a concessão de pensão
por morte, pugnando pela produção de prova testemunhal para a comprovação do exercício de
atividade rural pelo "de cujus" à época do falecimento, comprovando a sua qualidade de
segurado.
5. O julgamento da lide, sem a oitiva de testemunhas, requerida pelos autores de forma expressa
e justificada, consubstanciou-se em evidente cerceamento do direito constitucional à ampla
defesa (art. 5º, LV, da CF/88). Precedente desta E. Corte: Ap 00346494920174039999, Rel. Des.
Fed. NEWTON DE LUCCA, 8ª Turma, e-DJF3 Judicial 22/01/2018
6. Apelo provido. Sentença desconstituída.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma decidiu,
por unanimidade, dar provimento ao recurso dos autores, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
