Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5318588-47.2020.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal INES VIRGINIA PRADO SOARES
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
16/11/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 30/11/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. COMPROVAÇÃO DE CONDIÇÃO DE SEGURADO.
IMPOSSIBILIDADE DE JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. CERCEAMENTO DE DEFESA.
SENTENÇA DESCONSTITUÍDA.
1 . Por ter sido a sentença proferida sob a égide do Código de Processo Civil de 2015 e, em
razão de sua regularidade formal, conforme certificado nos autos, a apelação interposta deve ser
recebida e apreciada em conformidade com as normas ali inscritas.
2. O benefício de pensão por morte independe de carência, devendo ser comprovados, para a
sua obtenção, (i) o óbito ou a morte presumida, (ii) a condição de segurado do falecido e (iii) a
condição de dependente do requerente.
3. E o artigo 16 da Lei nº 8.213/91 prevê três classes de dependentes (incisos I a III) - a primeira,
cuja dependência econômica é presumida; outras duas, cuja dependência depende de
comprovação (parágrafo 4º) -, estabelecendo, entre elas, uma hierarquia, segundo a qual a
existência de dependente de uma classe exclui, do direito às prestações, os das classes
seguintes (parágrafo 1º).
4. No caso dos autos, o apelante é companheiro da "de cujus", e pleiteia a concessão de pensão
por morte, pugnando pela produção de prova testemunhal para a comprovação do exercício de
atividade rural pela "de cujus" à época do falecimento, comprovando a sua qualidade de
segurada.
5. O julgamento da lide, sem a oitiva de testemunhas requerida pela parte autora de forma
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
expressa e justificada, consubstanciou-se em evidente cerceamento do direito constitucional à
ampla defesa (art. 5º, LV, da CF/88). Precedente desta E. Corte: Ap 00346494920174039999,
Rel. Des. Fed. NEWTON DE LUCCA, 8ª Turma, e-DJF3 Judicial 22/01/2018
6. Apelo provido. Sentença desconstituída.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5318588-47.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: JAIME JOAQUIM DA SILVA
Advogado do(a) APELANTE: JULIANA DE ALMEIDA SALVADOR - SP274992-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5318588-47.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: JAIME JOAQUIM DA SILVA
Advogado do(a) APELANTE: JULIANA DE ALMEIDA SALVADOR - SP274992-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação ordinária proposta por JAIME JOAQUIM DA SILVA em face do Instituto
Nacional do Seguro Social - INSS, para concessão do benefício de pensão por morte instituída
por sua companheira SANTINA RODRIGUES ARANTES.
A r. sentença extinguiu o feito sem resolução de mérito, nos termos do artigo 485, IV, do CPC,
tendo em vista a ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, condenando o autor
ao pagamento de custas e honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da causa,
observando-se a Justiça Gratuita que lhe foi concedida.
A parte autora apelou, alegando cerceamento de defesa, e pugnando pela anulação da sentença,
para que possa produzir prova testemunhal, a comprovar o exercício de atividade laboral rural
quando do falecimento da de cujus.
Sem contrarrazões, os autos subiram a esta Corte Regional.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5318588-47.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: JAIME JOAQUIM DA SILVA
Advogado do(a) APELANTE: JULIANA DE ALMEIDA SALVADOR - SP274992-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
V O T O
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA:Por primeiro, recebo a apelação
interposta sob a égide do Código de Processo Civil/2015, e, em razão de sua regularidade formal,
possível sua apreciação, nos termos do artigo 1.011 do Codex processual.
O benefício de pensão por morte destina-se aos dependentes do segurado que falece, seja ele
aposentado ou não, devendo a sua concessão observar, por força do princípio tempus regit
actum, a legislação vigente à época do óbito.
Nos termos da Lei nº 8.213/91, em seus artigos 74 a 79, que regulam atualmente a pensão por
morte, esta independe de carência, devendo ser comprovados, para a sua obtenção, (i) o óbito ou
a morte presumida, (ii) a condição de segurado do falecido e (iii) a condição de dependente do
requerente.
O artigo 16 da Lei nº 8.213/91 prevê três classes de dependentes (incisos I a III) - a primeira, cuja
dependência econômica é presumida; outras duas, cuja dependência depende de comprovação
(parágrafo 4º) -, estabelecendo, entre elas, uma hierarquia, segundo a qual a existência de
dependente de uma classe exclui, do direito às prestações, os das classes seguintes (parágrafo
1º).
No caso dos autos, o óbito ocorreu em 17/05/2019 (ID 141586456).
Alega o autor que sua companheira, seguradora instituidora, mesmo após o último registro, em
(08/12/2017), continuou trabalhando sem registro em CTPS em lavoura de cana, possuindo,
assim, a qualidade de segurada à época do óbito (17/05/2019),
Consoante se infere da petição inicial, a parte autora requereu a produção de prova testemunhal.
Na contestação, a autarquia federal pugnou pela improcedência do pedido, tendo em vista a
perda da qualidade de segurada da "de cujus".
Em resposta à contestação, novamente a parte autora postulou pela produção da prova oral.
Na sequência, foi proferida a r. sentença (id 141586486), nos seguintes termos:
“ É o caso de julgar o feito no estado em que se encontra, pois inviável a prova testemunhal para
a demonstração da qualidade de segurada mantida por Santina RodriguesArantes.Com efeito,
não obstante o argumento do autor, quem refere que sua companheira laborou em atividade
campesina até pouco antes do seu falecimento, a parte não juntou aos autos elementos materiais
mínimos que indicam o labor rural no período mencionado,de sorte que não cabe a ouvida de
testemunhas.O C. Superior Tribunal de Justiça, ao julgar recurso especial representativo da
controvérsia (Tema 554), firmou entendimento de que a prova exclusivamente testemunhal não
basta à comprovação da atividade rurícola, para efeitos da obtenção de benefício previdenciário,
sendo imprescindível a apresentação de início de prova material. Vide REsp 1655408/PR, Rel.
Ministro HERMAN BENJAMIN,SEGUNDA TURMA, julgado em 05/09/2017, DJe 09/10/2017;
AgInt no REsp 1579587/SC, Rel.Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, julgado em
08/08/2017, DJe 21/09/2017;AgInt no AREsp 1040272/ AC, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL
MARQUES, SEGUNDATURMA, julgado em 18/05/2017, DJe 23/05/2017; AgInt no AREsp
913819/PR, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em
09/05/2017, DJe17/05/2017; AR 4060/SP, Rel. Ministro ANTONIO SALDANHA PALHEIRO, Rev.
MinistroJOEL ILAN PACIORNIK, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 28/09/2016, DJe 04/10/2016;
AgRgno REsp 1148294/SP, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado
em16/02/2016, DJe 25/02/2016. (VIDE RECURSO REPETITIVO - TEMA 554) (VIDE
INFORMATIVO DE JURISPRUDÊNCIA N. 506) (VIDE SÚMULA N. 149/STJ)
Na hipótese, ausente início de prova material do trabalho campesino realizado pela falecida, a
prova testemunhal seria incapaz de sozinha apoiar a pretensão deduzida,sendo de rigor o
desacolhimento da pretensão.
Anote-se que Santina Rodrigues Arantes ostentou a qualidade de segurada até 16/02/2019, já
contado o período de carência, e, tendo ocorrido o seu óbito após este marco, em 17/05/2019,
não houve o preenchimento de requisito legal para a concessão do benefício postulado pelo
autor.
não havendo ainda notícia a respeito da percepção de algum benefício previdenciário pela
falecida ao tempo de seu óbito, o que poderia indicar a manutenção da qualidade de segurada,
não há como aceitar a mera alegação do trabalho rural desenvolvido no período subsequente ao
fim dos recolhimentos.
Portanto, perdida a qualidade de segurada pela pessoa, quem o autorafirma ser instituidora do
benefício previdenciário, a improcedência seria a medida de rigor. Entretanto, considerando o
atual entendimento do C. Superior Tribunal de Justiça (tema repetitivo 629), outra solução há de
ser atribuída, seguindo-se:"A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial,
conformedetermina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e
desenvolvimento válido do processo, impondo sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267,
IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do
CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa. "Ante o exposto,EXTINGO o
processo EM JULGAMENTO DO MÉRITO,nos termos do artigo 485, inciso IV, do Código de
Processo Civil.Sucumbente, condeno o autor a arcar com o pagamento das custas processuais e
dos honorários advocatícios, que fixo em 10% do valor da causa, observada a gratuidade .”
Desta feita, observo que D. Juízo sentenciou o feito, promovendo a análise apenas do extrato
CNIS e CTPS, deixando de proporcionar à parte autora a oportunidade para a produção de prova
oral, quando seriam colhidos depoimentos de testemunhas e os procuradores das partes
poderiam realizar perguntas para melhor comprovar os fatos alegados na inicial.
Suprime a r. decisão recorrida, ao julgar antecipadamente a lide, a oportunidade de ser revista,
pelo Tribunal, o conjunto probatório que as partes se propuseram a produzir em audiência, de tal
sorte que existe nos autos um início razoável de prova documental acerca do labor rural do autor.
Consta dos autos CTPS com diversos vínculos de labor rural, desde o ano 1979 até 12/2017,
último vínculo empregatício (ID 141586476, p. 18/27 ), devidamente anotados no Extrato CNIS
(141586476, p. 70).
Assevero que nos casos de trabalhadores informais, a dificuldade de obtenção de documentos
permite maior abrangência na admissão do requisito legal de início de prova material, valendo
como tal documentos não contemporâneos ou mesmo em nome terceiros (integrantes do grupo
familiar, proprietários de terras, arrendatários, etc.), que juntamente com a prova oral, possibilite
um juízo de valor seguro acerca dos fatos que se pretende comprovar.
Dentro desse contexto, o exercício de labor rural deve ser demonstrado mediante a apresentação
de início de prova material, trazida aos autos e complementada por prova testemunhal idônea,
quando necessária ao preenchimento de lacunas - não sendo esta admitida, exclusivamente, nos
termos do art. 55, §3º, da Lei nº 8.213/91, bem como da Súmula nº 149 do STJ e do REsp nº
1.321.493/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, 1ª Seção, j. 10/10/2012, DJe 19/12/2012 (recurso
representativo da controvérsia).
Logo, a ausência de produção de prova testemunhal oportunamente requerida é que poderia
corroborar as provas documentais produzidas e demonstrar o exercício da atividade rural
desenvolvida no intervalo requerido.
Entendo, assim, que foi cerceado o direito de produção de provas da parte autora, sendo de rigor
a anulação da sentença, para que os autos retornem à origem e o Juízo"a quo"realize a prova
oral requerida, proferindo novo julgamento.
A propósito:
"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. ATIVIDADE URBANA SEM
REGISTRO EM CTPS. OITIVA DE TESTEMUNHAS. AUSÊNCIA. CERCEAMENTODEDEFESA .
CONFIGURAÇÃO. PRELIMINAR ACOLHIDA. MÉRITO DA APELAÇÃO DA AUTORA
PREJUDICADO. SENTENÇA ANULADA.1. Não foi produzida prova testemunhal para corroborar
a comprovação do alegado exercício em atividade urbana conforme exigido em lei.2. A solução
para o litígio depende de dilação probatória, pois a controvérsia exige oitiva de testemunha e,
ainda que tenha juntado aos autos início de prova material - cópia de livro de ponto, referentes
aos meses de abril, maio e junho de 1988, é nítido e indevido o prejuízo imposto à parte autora
pelo Juízo de 1º grau, por não ter promovido a realização de prova essencial ao deslinde da
controvérsia aqui posta.3. A jurisprudência entende que a prova material do labor rural e urbano
poderá ser comprovada mediante produção de prova material ainda que inicial, complementada
por prova testemunhal idônea - quando necessária ao preenchimento de eventuais lacunas.4.
Cabe ao Magistrado permitir que as partes, em igualdade de condições, possam apresentar as
suas defesas, com as provas de que dispõem, em prol do direito de que se julgam titulares.5.
Preliminar acolhida. sentença anulada. Mérito da apelação prejudicado.(TRF 3ª Região, 7ª
Turma, Rel. Des. Fed. Toru Yamamoto, v.u, DJU 12/03/2018)."
Ademais, a ausência de oitiva de testemunhas que corroborem o início de prova material,
tornando impossível aferição de eventual direito ao benefício vindicado constitui nulidade que não
pode ser superada.
Desta forma, impõe-se a desconstituição da r. sentença, a fim de restabelecer a ordem
processual e assegurar os direitos/garantias constitucionalmente previstos, devendo os autos
retornarem ao Juízo de origem para regular processamento, oportunizando-se a produção da
prova oral.
Ante o exposto, dou provimento à Apelação da parte autora, para desconstituir a r. sentença,
determinando o retorno dos autos ao Juízo de origem, para realização da prova oral requerida,
para apreciação do exercício de atividade laboral quando do óbito, bem como da alegada união
estável existente entre o autor e a falecida.
É COMO VOTO.
/gabiv/ifbarbos
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. COMPROVAÇÃO DE CONDIÇÃO DE SEGURADO.
IMPOSSIBILIDADE DE JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. CERCEAMENTO DE DEFESA.
SENTENÇA DESCONSTITUÍDA.
1 . Por ter sido a sentença proferida sob a égide do Código de Processo Civil de 2015 e, em
razão de sua regularidade formal, conforme certificado nos autos, a apelação interposta deve ser
recebida e apreciada em conformidade com as normas ali inscritas.
2. O benefício de pensão por morte independe de carência, devendo ser comprovados, para a
sua obtenção, (i) o óbito ou a morte presumida, (ii) a condição de segurado do falecido e (iii) a
condição de dependente do requerente.
3. E o artigo 16 da Lei nº 8.213/91 prevê três classes de dependentes (incisos I a III) - a primeira,
cuja dependência econômica é presumida; outras duas, cuja dependência depende de
comprovação (parágrafo 4º) -, estabelecendo, entre elas, uma hierarquia, segundo a qual a
existência de dependente de uma classe exclui, do direito às prestações, os das classes
seguintes (parágrafo 1º).
4. No caso dos autos, o apelante é companheiro da "de cujus", e pleiteia a concessão de pensão
por morte, pugnando pela produção de prova testemunhal para a comprovação do exercício de
atividade rural pela "de cujus" à época do falecimento, comprovando a sua qualidade de
segurada.
5. O julgamento da lide, sem a oitiva de testemunhas requerida pela parte autora de forma
expressa e justificada, consubstanciou-se em evidente cerceamento do direito constitucional à
ampla defesa (art. 5º, LV, da CF/88). Precedente desta E. Corte: Ap 00346494920174039999,
Rel. Des. Fed. NEWTON DE LUCCA, 8ª Turma, e-DJF3 Judicial 22/01/2018
6. Apelo provido. Sentença desconstituída.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma decidiu,
por unanimidade, dar provimento à apelação da parte autora, para desconstituir a sentença, com
remessa dos autos à Vara de origem para a oitiva de testemunhas, nos termos do relatório e voto
que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
