
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0006035-41.2014.4.03.6183
RELATOR: Gab. 26 - DES. FED. HERBERT DE BRUYN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ALZIRA BATISTA DE F CARVALHO
Advogado do(a) APELADO: ANTONIO SOUZA DOS SANTOS - SP303467-A
OUTROS PARTICIPANTES:
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0006035-41.2014.4.03.6183
RELATOR: Gab. 26 - DES. FED. HERBERT DE BRUYN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ALZIRA BATISTA DE F CARVALHO
Advogado do(a) APELADO: ANTONIO SOUZA DOS SANTOS - SP303467-A
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R E L A T Ó R I O
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL HERBERT DE BRUYN (RELATOR): Trata-se de ação ajuizada em 11/7/14 em face do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, visando ao restabelecimento da pensão por morte em decorrência do falecimento de companheiro, ocorrido em 22/7/05, suspensa, por entender indevida a concessão em revisão administrativa efetuada. Pleiteia, seja fixado o termo inicial desde o primeiro requerimento administrativo, apresentado em 13/12/05, ou desde o segundo, em 18/4/06, bem como, ainda, a concessão de tutela, para obstar a cobrança e futura execução de valores em atraso, relacionados ao benefício cancelado, até decisão final do Juízo.
Foram deferidos à parte autora os benefícios da assistência judiciária gratuita, e a antecipação dos efeitos da tutela.
O Juízo a quo, em 30/6/17, julgou parcialmente procedente o pedido, condenando o INSS a restabelecer em favor da autora a pensão por morte, NB 154.602.476-7, desde a data da cessação administrativa, em 31/1/12, devendo as parcelas vencidas ser pagas após o trânsito em julgado, acrescidas de correção monetária nos exatos termos do Manual de Orientação de Procedimentos para o Cálculos na Justiça Federal, com as alterações introduzidas pela Resolução n. 267/13 do CJF. Isenção de custas. Em face da sucumbência recíproca, condenou o Instituto-réu, ainda, "ao pagamento de 5% sobre o valor da condenação, com base no §3°, I, do artigo 85 do Código de Processo Civil de 2015. Ressalto o entendimento de que os percentuais enumerados em referido artigo somente se referem à sucumbência total (e não parcial) da Fazenda Pública. Isso porque interpretar que o limite mínimo serviria para fins de sucumbência parcial poderia gerar a equivalência entre a sucumbência parcial e total ou impor condenações indevidamente elevadas mesmo em casos de considerável sucumbência da parte autora. Saliento que não se trata de compensação de honorários — o que é vedado pelo §14° do mesmo dispositivo —, uma vez que haverá pagamento de verba honorária e não simples compensação dos valores. De fato, não fosse a parte autora beneficiária de justiça gratuita, igualmente seria condenada em 5% sobre a condenação. Caso houvesse compensação, cada uma das partes iria arcar com os valores dos respectivos advogados" (fls. 392 – ID. 196390452, pág. 28). Deferiu a tutela de urgência.
Inconformada, apelou a autarquia, sustentando, em síntese:
- a ausência de comprovação da união estável entre o segurado falecido e a autora, após a revisão realizada pelo INSS, ressaltando que as testemunhas ouvidas em Juízo sequer lembraram o nome do companheiro, motivo pelo qual requer a reforma da R. sentença, para julgar improcedente o pedido.
- Caso não seja acolhida a alegação acima mencionada, pleiteia no tocante à correção monetária e juros relativos às verbas anteriores à data da requisição do precatório, a incidência da TR (Taxa Referencial) e, após essa data e o efetivo pagamento, a aplicação do IPCA-E, bem como a condenação da autora ao pagamento de honorários advocatícios, ante o reconhecimento da sucumbência recíproca.
Com contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte.
Em 11/12/17, o presente feito foi suspenso, considerando a matéria referente à devolução de valores recebidos de boa-fé em razão de erro da Administração. Tendo em vista o julgamento proferido em 10/3/21 pelo C. STJ, no Recurso Especial nº 1.381.734/RN (Tema 979), foi determinado o levantamento do sobrestamento.
O processo físico foi virtualizado, com a inserção das peças processuais por digitalização.
Informações no sentido de que o arquivo digital em que foram gravados os depoimentos pessoal e testemunhal colhidos não pode ser adicionado à compilação selecionada pelo usuário, podendo, todavia, seu conteúdo, ser acessado nos "Autos Digitais" e no menu "Documentos".
É o breve relatório.
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0006035-41.2014.4.03.6183
RELATOR: Gab. 26 - DES. FED. HERBERT DE BRUYN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ALZIRA BATISTA DE F CARVALHO
Advogado do(a) APELADO: ANTONIO SOUZA DOS SANTOS - SP303467-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL HERBERT DE BRUYN (RELATOR): Ao regular o benefício previdenciário de pensão por morte, previsto no art. 201, V, da Constituição Federal de 1988, dispôs o artigo 74 da Lei n. 8.213/91, na redação que lhe foi dada pela Lei n. 9.528/97, vigente na data do óbito, ocorrido em 22/7/05:
"Art. 74. A pensão por morte será devida ao conjunto dos dependentes do segurado que falecer, aposentado ou não, a contar da data:
I - do óbito, quando requerida em até 30 (trinta) dias depois deste;
II - do requerimento, quando requerida após o prazo previsto no inciso anterior;
III - da decisão judicial, no caso de morte presumida".
Para obtenção da pensão por morte, portanto, são necessários os seguintes requisitos: condição de dependente e qualidade de segurado do falecido.
Nos termos do art. 16, I, da Lei n. 8.213/91, são dependentes do segurado: o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido, ou que tenha deficiência intelectual ou mental ou deficiência grave. Por outro lado, em consonância com o § 4º deste dispositivo, "a dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I é presumida e a das demais deve ser comprovada".
Por outro lado, relativamente ao requisito pertinente à qualidade de segurado do falecido, cumpre analisá-lo à luz dos arts. 11, 13 e 15 da Lei n. 8.213/1991.
Há que se registrar que o óbito do pretenso instituidor deu-se antes da vigência da Lei n. 13.135/2015 e da Lei n. 13.846/2019.
No caso em apreço, com relação à qualidade de segurado do instituidor, verifica-se da cópia do extrato do sistema Plenus de fls. 265 (id. ID. 196390456, págs. 262), que recebia auxílio doença previdenciário NB 31/ 502.415.966-3, desde 17/2/05, com DCB em 22/7/05.
A questão controvertida cinge-se à comprovação da união estável, e consequente dependência econômica da requerente, objeto de impugnação específica da autarquia em seu recurso.
No caso em apreço, a questão controvertida cinge-se à comprovação da união estável, e consequente dependência econômica da requerente, objeto de impugnação específica da autarquia em seu recurso.
In casu, encontram-se acostadas aos autos as cópias dos seguintes documentos:
1. Requisição de talonário de cheque em banco, referente à conta corrente da autora, constando autorização de retirada ao falecido (fls. 137 - ID. 196390456, pág. 134);
2. Notas Fiscais de aquisição de produtos em nome da requerente, com endereço de residência na Rua Frederico Alvarenga n. 260, apto. 42, Centro, São Paulo/SP (fls. 138/140 - ID. 196390456, págs. 135/137);
3. Nota Fiscal / Fatura de aquisição de automóvel usado, emitida em nome da autora em 31/3/97, com endereço de residência na Rua Frederico Alvarenga n. 260, apto. 42, Centro, São Paulo/SP (fls. 138/140 - ID. 196390456, págs. 135/137);
4. Instrumento Particular de Promessa de Cessão de Direito e Obrigações de Uso de Serviço Público Concessionado, assinado em 17/10/03, constando o falecido como cessionário de direito de uso da linha telefônica 6704-2723, com endereço de residência no Parque Dom Pedro II, n. 1.092, apto. 83, Centro, São Paulo/SP (fls. 143/144 - ID. 196390456, págs. 140/141);
5. Boleto de cobrança em nome do falecido, com vencimento em 21/11/05, referente a débito de serviços de telefonia, com endereço no Parque Dom Pedro II, n. 1.092, apto. 83, Centro, São Paulo/SP Carvalho (fls. 145/146 - ID. 196390456, págs. 142/143);
6. Boleto de cobrança em nome do falecido, com vencimento em 10/7/06, referente ao ISS 2006 – Profissionais Autônomos – 2º trimestre, com endereço no Parque Dom Pedro II, n. 1.092, apto. 83, Centro, São Paulo/SP Carvalho (fls. 147/148 - ID. 196390456, págs. 144/145);
7. Comprovante de Rendimentos Pagos e Retenção de Imposto de Renda na Fonte – Ano Base 2005, em nome do falecido, constando como fonte pagadora o INSS, encaminhado para o endereço no Parque Dom Pedro II, n. 1.092, apto. 83, Centro, São Paulo/SP (fls. 150/151 - ID. 196390456, págs. 147/148);
8. Certidão PIS/PASEP/FGTS emitida em 18/3/11 pelo INSS, certificando a concessão de pensão por morte requerida em 17/2/11, constando a autora como companheira / dependente, e instituidor o falecido (fls. 152/153 - ID. 196390456, págs. 149/150);
9. Extrato semestral do benefício NB 31/ 129.884.834-2, em nome do falecido, com início em 11/8/03, encaminhado para o endereço no Parque Dom Pedro II, n. 1.092, apto. 83, Centro, São Paulo/SP (fls. 154/155 - ID. 196390456, págs. 151/152);
10. Boletos de cobrança em nome da autora, com vencimentos em 20/1/03, 20/3/03 e 20/2/02, referentes ao pagamento de frequência em disciplina no curso de Ciências Biológica em Universidade, com endereço no Parque Dom Pedro II, n. 1.092, apto. 83, Centro, São Paulo/SP Carvalho (fls. 156/158 - ID. 196390456, págs. 153/155);
11. Declarações da Secretaria de Registros Acadêmicos de Universidade, datadas de 20/3/02 e 18/6/04, atestando ser a autora aluna regularmente matriculada no Curso de Bacharelado e Licenciatura em Ciências Biológicas, assumindo suas atividades acadêmicas em 18/2/02, com duração de sete semestres letivos (6 semestres para Licenciatura e 7 para Bacharelado), com início em 18/2/02 e término previsto para junho/05 (fls. 159/160 - ID. 196390456, págs. 156/157);
12. Requerimento administrativo de auxílio doença apresentado pelo falecido em 3/11/04, com comunicação de decisão do INSS em 22/1/05, indeferindo o benefício por ausência de constatação de incapacidade, constando o endereço no Parque Dom Pedro II, n. 1.092, apto. 83, Centro, São Paulo/SP (fls. 162/163 - ID. 196390456, págs. 159/160);
13. Certificado de Registro e Licenciamento de Veículo do exercício de 2005, em nome da autora, com endereço no Parque Dom Pedro II, n. 1.092, apto. 83, Centro, São Paulo/SP (fls. 164 - ID. 196390456, pág. 161);
14. Certidão de Óbito de Paulo Batista Xavier, ocorrido em 22/7/05, aos 54 anos de idade, divorciado de Sebastiana Raimunda da Silva e motorista, com residência no Parque Dom Pedro II, n. 1.092, apto. 83, Centro, São Paulo/SP, tendo sido declarante o filho Marcos Antonio da Silva Xavier, constando do campo observações que deixou os outros filhos maiores Luiz Carlos e Paulo Henrique (fls. 231 - ID. 196390456, pág. 228);
15. Recibo de pagamento de sócio efetivo do Touring Club do Brasil em nome do falecido, datado de 10/2/03, com endereço residencial no Parque Dom Pedro II, n. 1.092, apto. 83, Centro, São Paulo/SP, constando a autora como cônjuge (fls. 234 - ID. 196390456, pág. 231);
16. Declaração do Gerente Geral do Touring Club do Brasil datada de 4/4/06, de que o falecido era sócio efetivo do mencionado clube, com matrícula do título n. 5-6-4071-K, adquirido em 1º/2/03, tendo sido declarado como cônjuge a Sra. Alzira Batista de Fátima Carvalho (fls. 235 - ID. 196390456, pág. 232);
17. Carta do Serviço Central de Proteção ao Crédito, datada de 22/7/05, encaminhada para o falecido, com endereço no Parque Dom Pedro II, n. 1.092, apto. 83, Centro, São Paulo/SP Carvalho (fls. 237 - ID. 196390456, pág. 234);
18. Requerimento administrativo de pensão por morte apresentado pela requerente em 18/4/06, com comunicação de decisão do INSS em 28/8/06, indeferindo o benefício por falta da qualidade de dependente, constando o endereço no Parque Dom Pedro II, n. 1.092, apto. 83, Centro, São Paulo/SP Carvalho (fls. 243 - ID. 196390456, pág. 240);
19. Requerimento administrativo de pensão por morte apresentado pela demandante em 13/12/05, com comunicação de decisão do INSS em 26/12/05, de que não foi reconhecido o benefício por falta da qualidade de dependente, constando o endereço no Parque Dom Pedro II, n. 1.092, apto. 83, Centro, São Paulo/SP Carvalho (fls. 249 - ID. 196390456, pág. 246);
20. Declaração do Diretor da JOFISA Promotora de Vendas e Serviços Ltda., datada de 30/11/05, declarando ser a Sra. Alzira Batista de Fátima Carvalho cliente desde 27/11/00 até a presente data, constando como dependentes o falecido, e os Srs. Eduardo César de Carvalho e Vera Lúcia Cândido (fls. 259 - ID. 196390456, pág. 256) e
21. Conta de energia elétrica em nome da demandante, referente ao mês de março/05, com endereço no Parque Dom Pedro II, n. 1.092, apto. 83, Centro, São Paulo/SP Carvalho (fls. 261 - ID. 196390456, pág. 258).
Os documentos acima mencionados, somados aos depoimentos testemunhais colhidos na audiência de instrução realizada em 1º/9/16, registrados pelo sistema de gravação digital audiovisual, formam um conjunto harmônico, apto a formar a convicção deste magistrado no sentido de que a parte autora foi companheira do falecido até a data do óbito.
Como bem asseverou o MM. Juiz Federal da 9ª Vara Federal Previdenciária a quo, a fls. 389/391 (ID. 196390452, págs. 25/27), "Analisando os documentos juntados nestes autos, verifico que há expressiva documentação que comprova que a autora e o falecido residiam no mesmo endereço, tais como contas de consumo, correspondências oficiais e boletos diversos (fls. 28/32, 80/89 e 139/142, abrangendo o período de 2003 a 2006. Também da certidão de óbito e das correspondências emitidas pelo réu quando da concessão de auxílio-doença consta que o falecido residia nesse endereço. Colhida a prova oral nestes autos, a autora em seu depoimento declarou que viveu maritalmente com o falecido nos doze anos anteriores ao óbito, sendo que ela era viúva e ele divorciado quando começaram o relacionamento. Só no último endereço viveram cerca de dez anos (Rua Parque Dom Pedro II, n° 1092, ap. 83, onde a autora mora até hoje). Dividiam as despesas do lar, sendo que ele era motorista e ela trabalhadora da área da saúde. Informa que requereu a pensão logo após o óbito, porém só foi concedida depois de muitos anos. Recebeu a pensão por um ano e depois o INSS suspendeu o pagamento e começou a pedir documentação. A testemunha Jesuíta Alves Valerio declarou que é vizinha da autora, e que quando se mudou em 1997 a autora já morava no prédio. Conheceu o casal, mas não se recorda do nome do falecido. Recorda-se de que os dois trabalhavam. Viveram juntos até o falecimento do companheiro da autora. A testemunha Rejane dos Santos Lira declarou que conhece a autora há uns vinte anos, já morava no prédio quando a autora se mudou para lá. Lembra que ela vivia com um companheiro, não se recorda o nome dele, que faleceu há mais de dez anos. Nunca soube de alguma separação entre o casal. Verifico que as testemunhas reproduziram as mesmas declarações já prestadas na Justificação Administrativa (fls. 99 e verso). É certo que não se recordaram do nome do falecido, o que porém não é suficiente para retirar a credibilidade dos depoimentos tendo em vista o decurso de mais de onze anos entre o óbito e a audiência. Desse modo, verifica-se que, apesar de eventual conduta ímproba do servidor que concedeu o benefício com base em provas inconsistentes, já na revisão administrativa foi constatado que a autora provou a residência em comum e a condição de companheira. No final, a negativa do réu baseou-se na falta de comprovação da dependência econômica, conforme se verifica às fls. 102 verso. Contudo, demonstrada a contento a união estável entre a autora e o de cujus, a dependência econômica é presumida. Ademais, não há elementos que indiquem má-fé da autora, que requereu o benefício por três vezes, a primeira em data próxima ao óbito, sempre representada e orientada por procuradores, que não anexaram aos requerimentos provas consistentes de uma situação que de fato existia. Quanto ao pedido de retroação do benefício à data do primeiro ou do segundo requerimento administrativo, forçoso concluir que o direito da autora só restou de fato comprovado por ocasião das diligências e Justificação Administrativa determinadas em sede de recurso administrativo. Assim sendo, o benefício é devido somente a partir do requerimento administrativo formulado em 17/02/2011" (grifos meus).
No que tange à carência, dispõe o art. 26 da Lei nº 8.213/91:
"Art. 26. Independe de carência a concessão das seguintes prestações:
I – pensão por morte, auxílio-reclusão, salário-família, salário-maternidade e auxílio-acidente;"
Independe, portanto, a demonstração do período de carência para a concessão da pensão por morte.
Dessa forma, deve ser mantida a pensão por morte concedida em sentença.
Relativamente à atualização do débito e compensação da mora, o procedimento a adotar será o seguinte:
1) Até o mês anterior à promulgação da Emenda Constitucional n. 113, de 8/12/2021:
(i) a correção monetária deve ser aplicada nos termos da Lei n. 6.899/1981 e da legislação superveniente, bem como do Manual de Orientação de Procedimentos para os cálculos na Justiça Federal;
(ii) os juros moratórios devem ser contados da citação, à razão de 0,5% (meio por cento) ao mês, até a vigência do CC/2002 (11/1/2003), quando esse percentual foi elevado a 1% (um por cento) ao mês, utilizando-se, a partir de julho de 2009, a taxa de juros aplicável à remuneração da caderneta de poupança (Repercussão Geral no RE n. 870.947/SE; Tema 810; DJE 216, de 22/9/2017), observada, quanto ao termo final de sua incidência, a tese firmada em Repercussão Geral no RE n. 579.431.
2) A partir do mês de promulgação da Emenda Constitucional n. 113, de 8/12/2021, a apuração do débito dar-se-á unicamente pela Taxa SELIC, mensalmente e de forma simples, nos termos do disposto em seu artigo 3º, ficando vedada a incidência dessa Taxa com qualquer outro critério de juros e correção monetária.
Considerando que ambas as partes foram simultaneamente vencedores e vencidos, nos termos do art. 86 do CPC, condeno a autora ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em 5% (cinco por cento) sobre o valor atualizado da causa, observando-se, ainda, o art. 98, §3º, do CPC, por ser beneficiária da justiça gratuita.
Passo a analisar a questão referente à devolução de valores recebidos de boa-fé.
A Administração Pública goza de prerrogativas, dentre as quais o controle administrativo, sendo-lhe dado rever os atos de seus próprios órgãos, anulando aqueles eivados de ilegalidade (art. 37 da Constituição Federal/1988), bem como revogando os atos cuja conveniência e oportunidade não mais subsistam.
Trata-se do poder de autotutela administrativo, enunciado nas Súmulas n. 346 e 473 do STF, tendo como fundamento os princípios constitucionais da legalidade, da moralidade administrativa e da supremacia do interesse público, desde que obedecidos os regramentos constitucionais do contraditório e da ampla defesa (artigo 5º, LIV e LV, da CF), além da Lei n. 9.784/1999, aplicável à espécie:
"A Administração Pública pode declarar a nulidade dos seus próprios atos."
"A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornem ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência e oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos a apreciação judicial."
Por sua vez, à luz do Código Civil (art. 876), percebe pagamento indevido todo "aquele que recebeu o que não era devido" e, por consequência, "fica obrigado a restituir".
O fundamento dessa regra é o princípio geral do direito que veda o enriquecimento ilícito ou sem causa.
É o que textualmente estabelece o artigo 884 do Código Civil:
"Art. 884. Aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários.
Parágrafo único. Se o enriquecimento tiver por objeto coisa determinada, quem a recebeu é obrigado a restituí-la, e, se a coisa não mais subsistir, a restituição se fará pelo valor do bem na época em que foi exigido."
Na seara do direito previdenciário, a possibilidade de cobrança imediata dos valores pagos indevidamente, mediante descontos no valor do benefício, está prevista no artigo 115, II, da Lei n. 8.213/1991.
Assim, ao estabelecer hipóteses de desconto sobre o valor do benefício, o próprio legislador reconheceu que as prestações previdenciárias, embora tenham a natureza de verbas alimentares, são repetíveis em quaisquer circunstâncias.
Nesse sentido: TRF 3ª Região, NONA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1028622 - 0021597-06.2005.4.03.9999, Rel. DESEMBARGADORA FEDERAL MARISA SANTOS, julgado em 24/05/2010, e-DJF3 Judicial 1 DATA:08/07/2010 PÁGINA: 1303; TRF 3ª Região, SÉTIMA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1627788 - 0016651-78.2011.4.03.9999, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS, julgado em 02/10/2017, e-DJF3 Judicial 1 DATA:16/10/2017.
A propósito, especificamente sobre devolução de valores recebidos de boa-fé em razão de erro da Administração, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), em sede de recurso repetitivo (Tema 979), assim deliberou sobre a matéria:
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. TEMA 979. ARTIGO 1.036 DO CPC/2015. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. ARTIGOS 884 E 885 DO CÓDIGO CIVIL/2002. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211 DO STJ. ART. 115, II, DA LEI N. 8.213/1991. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS POR FORÇA DE INTERPRETAÇÃO ERRÔNEA E MÁ APLICAÇÃO DA LEI. NÃO DEVOLUÇÃO. ERRO MATERIAL DA ADMINISTRAÇÃO. POSSIBILIDADE DE DEVOLUÇÃO SOMENTE NA HIPÓTESE DE ERRO EM QUE OS ELEMENTOS DO CASO CONCRETO NÃO PERMITAM CONCLUIR PELA INEQUÍVOCA PRESENÇA DA BOA-FÉ OBJETIVA.
1. Da admissão do recurso especial: Não se conhece do recurso especial quanto à alegada ofensa aos artigos 884 e 885 do Código Civil, pois não foram prequestionados. Aplica-se à hipótese o disposto no enunciado da Súmula 211 do STJ. O apelo especial que trata do dissídio também não comporta conhecimento, pois não indicou as circunstâncias que identifiquem ou assemelhem os precedentes colacionados e também por ausência de cotejo analítico e similitude entre as hipóteses apresentadas. Contudo, merece conhecimento o recurso quanto à suposta ofensa ao art. 115, II, da lei n. 8.213/1991.
2. Da limitação da tese proposta: A afetação do recurso em abstrato diz respeito à seguinte tese: Devolução ou não de valores recebidos de boa-fé, a título de benefício previdenciário, por força de interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da Administração da Previdência Social.
3. Irrepetibilidade de valores pagos pelo INSS em razão da errônea interpretação e/ou má aplicação da lei: O beneficiário não pode ser penalizado pela interpretação errônea ou má aplicação da lei previdenciária ao receber valor além do devido. Diz-se desse modo porque também é dever-poder da Administração bem interpretar a legislação que deve por ela ser aplicada no pagamento dos benefícios. Dentro dessa perspectiva, esta Corte Superior evoluiu a sua jurisprudência passando a adotar o entendimento no sentido de que, para a não devolução dos valores recebidos indevidamente pelo beneficiário da Previdência Social, é imprescindível que, além do caráter alimentar da verba e do princípio da irrepetibilidade do benefício, a presença da boa-fé objetiva daquele que recebe parcelas tidas por indevidas pela administração. Essas situações não refletem qualquer condição para que o cidadão comum compreenda de forma inequívoca que recebeu a maior o que não lhe era devido.
4. Repetição de valores pagos pelo INSS em razão de erro material da Administração previdenciária: No erro material, é necessário que se averigue em cada caso se os elementos objetivos levam à conclusão de que houve boa-fé do segurado no recebimento da verba. Vale dizer que em situações em que o homem médio consegue constatar a existência de erro, necessário se faz a devolução dos valores ao erário.
5. Do limite mensal para desconto a ser efetuado no benefício: O artigo 154, § 3º, do Decreto n. 3.048/1999 autoriza a Administração Previdenciária a proceder o desconto daquilo que pagou indevidamente; todavia, a dedução no benefício só deverá ocorrer quando se estiver diante de erro da administração. Nesse caso, caberá à Administração Previdenciária, ao instaurar o devido processo administrativo, observar as peculiaridades de cada caso concreto, com desconto no benefício no percentual de até 30% (trinta por cento).
6. Tese a ser submetida ao Colegiado: Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados decorrentes de erro administrativo (material ou operacional), não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela Administração, são repetíveis os valores, sendo legítimo o seu desconto no percentual de até 30% (trinta por cento) do valor do benefício mensal, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido.
7. Modulação dos efeitos: Tem-se de rigor a modulação dos efeitos definidos neste representativo da controvérsia, em respeito à segurança jurídica e considerando o inafastável interesse social que permeia a questão sub examine, e a repercussão do tema que se amolda a centenas de processos sobrestados no Judiciário. Desse modo somente deve atingir os processos que tenham sido distribuídos, na primeira instância, a partir da publicação deste acórdão.
8. No caso concreto: Há previsão expressa quanto ao momento em que deverá ocorrer a cessação do benefício, não havendo margem para ilações quanto à impossibilidade de se estender o benefício para além da maioridade da beneficiária. Tratou-se, em verdade, de simples erro da administração na continuidade do pagamento da pensão, o que resulta na exigibilidade de tais valores, sob forma de ressarcimento ao erário, com descontos nos benefícios, tendo em vista o princípio da indisponibilidade do patrimônio público e em razão da vedação ao princípio do enriquecimento sem causa. Entretanto, em razão da modulação dos efeitos aqui definidos, deixa-se de efetuar os descontos dos valores recebidos indevidamente pelo segurado.
9. Dispositivo: Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, não provido.
Acórdão sujeito ao regime previsto no artigo 1.036 e seguintes do CPC/2015." (REsp 1.381.734/RN, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 10/03/2021, DJe 23/04/2021)
Desse julgamento é possível extrair as seguintes conclusões:
(i) o pagamento indevido decorrente de interpretação errônea ou má aplicação da lei pela Administração Previdenciária não é suscetível de repetição;
(ii) o pagamento indevido decorrente de erro material ou operacional da Administração Previdenciária é repetível, salvo se o segurado demonstrar que não lhe era possível constatar o erro (boa-fé objetiva);
(iii) a hipótese de repetição em razão de erro da Administração Previdenciária atinge somente os processos distribuídos desde 23/4/2021 (modulação dos efeitos);
(iv) admitida a repetição, é permitido o desconto do percentual de até 30% do valor mensal do benefício do segurado.
Sobre a boa-fé objetiva, nos dizeres da Ministra Nancy Andrighi, "esta se apresenta como uma exigência de lealdade, modelo objetivo de conduta, arquétipo social pelo qual impõe o poder-dever de que cada pessoa ajuste a própria conduta a esse arquétipo, agindo como agiria uma pessoa honesta, escorreita e leal" (STJ, REsp n. 803.481/GO, Terceira Turma, julgado em 28/06/2007).
Por sua vez, a boa-fé subjetiva está relacionada a intenção do agente, contrapondo-se à má-fé (pressuposto do ilícito civil), a qual não se presume e deve ser demonstrada.
Efetivamente, somente cabe cogitar de aplicação do Tema n. 979 se afastada a discussão sobre a má-fé do agente.
No caso em apreço, a autora pretende que não seja impelida a devolver os valores recebidos, a título de pensão por morte (NB 21/ 154.602.476-7), no período entre a concessão e a suspensão administrativa.
Pois bem, em razão de revisão administrativa foi verificada a irregularidade na qualidade de dependente. Porém, instada a apresentar documentação complementar, somente após o terceiro requerimento administrativo, foi possível reconhecer indubitavelmente a condição de companheira da autora.
Por outro lado, sem dúvida não houve má-fé da companheira.
Assim, de acordo com as provas colacionadas aos autos, resulta claro que o benefício foi concedido e cancelado por erro administrativo.
Diante desse erro, em tese, remanesceria a obrigação da beneficiária devolver os valores, nos termos delineados no Tema n. 979 do STJ. Não obstante, ajuizada esta ação antes de 23/4/2021 e presente a boa-fé da parte autora deixa-se de determinar a devolução dos valores em razão da modulação dos efeitos definida pelo STJ no julgamento desse tema.
Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação do INSS somente para fixar a condenação da autora em honorários advocatícios, em razão da sucumbência recíproca, na forma acima indicada.
É o meu voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. FALECIMENTO DE COMPANHEIRO APÓS A LEI N. 9.528/97. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS. QUALIDADE DE DEPENDENTE COMPROVADA. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. CONDENAÇÃO DA PARTE AUTORA EM HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS DE BOA-FÉ. INDEVIDA.
I- Para obtenção da pensão por morte, portanto, são necessários os seguintes requisitos: condição de dependente e qualidade de segurado do falecido.
II- Nos termos do art. 16, I, da Lei n. 8.213/91, são dependentes do segurado: o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido, ou que tenha deficiência intelectual ou mental ou deficiência grave. Por outro lado, em consonância com o § 4º deste dispositivo, "a dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I é presumida e a das demais deve ser comprovada".
III- Há que se registrar que o óbito do pretenso instituidor deu-se antes da vigência da Lei n. 13.135/2015 e da Lei n. 13.846/2019.
IV- A questão controvertida cinge-se à comprovação da união estável, e consequente dependência econômica da requerente, objeto de impugnação específica da autarquia em seu recurso.
V- Os documentos acostados aos autos somados aos depoimentos testemunhais colhidos na audiência de instrução, formam um conjunto harmônico, apto a formar a convicção deste magistrado no sentido de que a parte autora foi companheira do falecido, por mais de dez anos, e até a data do óbito.
VI- Considerando que ambas as partes foram simultaneamente vencedores e vencidos, nos termos do art. 86 do CPC, condeno a autora ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em 5% (cinco por cento) sobre o valor atualizado da causa, observando-se, ainda, o art. 98, §3º, do CPC, por ser beneficiária da justiça gratuita.
VII- No tocante à devolução de valores recebidos, a título de pensão por morte (NB 21/ 154.602.476-7), no período entre a concessão e a suspensão administrativa, verifica-se que não houve má-fé da companheira. Assim, de acordo com as provas colacionadas aos autos, resulta claro que o benefício foi concedido e cancelado por erro administrativo. Diante desse erro, em tese, remanesceria a obrigação da beneficiária devolver os valores, nos termos delineados no Tema n. 979 do STJ. Não obstante, ajuizada esta ação antes de 23/4/2021 e presente a boa-fé da parte autora deixa-se de determinar tal devolução em razão da modulação dos efeitos definida pelo STJ no julgamento desse tema.
VIII- Apelação do INSS parcialmente provida.
