Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5006124-71.2017.4.03.6183
Relator(a)
Desembargador Federal GILBERTO RODRIGUES JORDAN
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
19/11/2020
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 23/11/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. FILHO INVÁLIDO. QUALIDADE DE SEGURADO. O
DE CUJUS ERA TITULAR DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. EX-
FERROVIÁRIO. COMPLEMENTAÇÃO DE BENEFÍCIO INSTITUÍDA PELA LEI 8.186/91.
DEPENDÊNCIA ECONÔMICA COMPROVADA. AUTOR SUBMETIDO A PROCESSO DE
INTERDIÇÃO. PERÍCIA MÉDICA. INCAPACIDADE TOTAL E PERMANENTE ADVINDA
ANTERIORMENTE AO ÓBITO DO GENITOR. CUMULAÇÃO DE BENEFÍCIOS.
POSSIBILIDADE. TERMO INICIAL.
- O óbito de Pedro Klemes Júnior, ocorrido em 22 de julho de 2014, foi comprovado pela
respectiva Certidão.
- Também restou superado o requisito da qualidade de segurada, uma vez que o falecido era
titular de aposentadoria por tempo de contribuição, no ramo de atividade ferroviário (NB
42/0013902032), desde 01 de dezembro de 1970, cuja cessação decorreu de seu falecimento,
conforme faz prova o extrato do Sistema Único de Benefícios – DATAPREV.
- A Certidão de Nascimento revela que o autor, nascido em 21 de março de 1995, é filho do
falecido segurado.
- Conforme precedentes desta Egrégia Corte, a dependência econômica do filho maior e inválido,
ainda que já titular de aposentadoria por invalidez, é relativa e pode ser suprimidaporprovas em
sentido contrário.
- Há copiosa prova documental nos autos a indicar que o autor, desde o início da invalidez,
coabitava com o genitor, que lhe ministrava os recursos necessários para prover o seu sustento.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
- A demanda foi instruída com a Certidão de Interdição, lavrada em 12 de agosto de 2016,
perante o Registro Civil de Pessoas Naturais de Franco da Rocha – SP, da qual se verifica ter
sido o autor interditado, em decorrência de sentença proferida em 18/01/2016, nos autos de
processo nº 00099792620138260197, os quais tramitaram pela 2ª Vara da Família e das
Sucessões da Comarca de Francisco Morato – SP.
- A incapacidade para exercer os atos da vida civil foi decretada com supedâneo no laudo pericial
realizado em 07/08/2014, pelo Instituto de Medicina Social e de Criminologia de São Paulo –
IMESC, o qual concluiu ser portador de síndrome demencial relacionada ao etilismo crônico –
CID-F 02-8, enfermidade degenerativa e de caráter progressivo.
- O postulante foi novamente submetido à exame pericial na presente demanda, conforme se
verifica do respectivo laudo, com data de 08 de fevereiro de 2017. Em resposta aos quesitos do
juízo, a expert confirmou que o autor se encontra incapacitado de forma total e permanente.
- A perícia reiterou ser o periciando portador de transtornos mentais e comportamentais, os quais
o incapacitava de forma permanente, impedindo-o de exercer atividade laborativa remunerada e
de exercer os atos da vida civil. Fixou a data do início da incapacidade em 24/10/1985 (quesito
11). A mesma resposta foi replicada com relação ao quesito formulado pelo INSS (nº 09).
- O autor já é titular de benefício previdenciário, instituído por Regime Próprio de Previdência –
SPPrev, no cargo de auxiliar de serviços gerais, desde 25/05/1988, consoante se infere da
declaração emitida pela Secretaria dos Negócios da Justiça do Governo de São Paulo,
juntamente com o demonstrativo de pagamento que a acompanha, pertinente à competência de
maio de 2014.
- Ressente-se a legislação previdenciária de vedação ao recebimento conjunto de pensão por
morte e aposentadoria. Precedente.
- É válido ressaltar que a lei não exige que a invalidez deva existir desde o nascimento ou que
tenha sido adquirida até aos 21 anos de idade para que o filho possa ser considerado beneficiário
do genitor. O que a norma considera para estabelecer a relação de dependência é a invalidez,
seja ela de nascença ou posteriormente adquirida. Precedente do Colendo Superior Tribunal de
Justiça.
- Termo inicial mantido na data do óbito, inclusive em relação à complementação devida pela
União Federal, tendo em vista a natureza prescricional do prazo estipulado no art. 74 e o disposto
no parágrafo único do art. 103, ambos da Lei nº 8.213/91, em sua redação primeva, e art. 198, I,
do Código Civil (Lei 10.406/2002), os quais vedam a incidência da prescrição contra o
absolutamente incapaz.
- Por ocasião da liquidação da sentença, deverá ser compensado o valor das parcelas auferidas
por força da antecipação da tutela.
- Os honorários advocatícios deverão ser fixados na liquidação do julgado, nos termos do inciso
II, do § 4º, c.c. §11, do artigo 85, do CPC/2015.
- Tutela antecipada mantida.
- Apelações do INSS e da União Federal desprovidas.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5006124-71.2017.4.03.6183
RELATOR:Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, UNIÃO FEDERAL
APELADO: WLADENIL KLEMES
REPRESENTANTE: DORALICE CLEMES
Advogado do(a) APELADO: BENJAMIM DO NASCIMENTO FILHO - SP114524-A
Advogado do(a) REPRESENTANTE: BENJAMIM DO NASCIMENTO FILHO - SP114524-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5006124-71.2017.4.03.6183
RELATOR:Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, UNIÃO FEDERAL
APELADO: WLADENIL KLEMES
REPRESENTANTE: DORALICE CLEMES
Advogado do(a) APELADO: BENJAMIM DO NASCIMENTO FILHO - SP114524-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se apelações interpostas em ação ajuizada por WLADENIL KLEMES (incapaz) em face do
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS e da UNIÃO FEDERAL, objetivando o
benefício de pensão por morte, em decorrência do falecimento de seu genitor, ocorrido em 22 de
julho de 2014, além da complementação de pensão, instituída pela Lei nº 8.186/91, devida aos
dependentes de ex-ferroviários da RFFSA.
Tutela antecipada deferida em 28 de setembro de 2017, a qual propiciou a implantação do
benefício de pensão por morte (NB 21/184.577.138-6), conforme se verifica dos respectivos
extratos do Sistema Único de Benefício – DATAPREV (id 134695070 – P. 2/3). A União Federal
comprovou nos autos a implantação da complementação do benefício (id 134695049/67).
A r. sentença recorrida julgou procedente o pedido e condenou a Autarquia Previdenciária à
concessão do benefício pleiteado, a contar da data do óbito, acrescido dos consectários legais, e
condenou a União Federal ao pagamento da complementação de pensão, instituída pela Lei nº
8.186/91. Por fim, confirmou a decisão que houvera deferido a antecipação da tutela (id
134695085 – p. 1/9).
Em suas razões recursais, pugna o INSS pela reforma do decisum e improcedência do pedido, ao
argumento de que o autor não logrou comprovar os requisitos autorizadores à concessão do
benefício. Aduz que a invalidez teve início após sua emancipação, o que implica na ausência de
dependência econômica em relação ao falecido segurado. Sustenta que o postulante já é titular
de aposentadoria por invalidez e que a concessão da pensão por morte incidiria na geração de
outro benefício com o mesmo fato gerador (id 134695088 – p. 1/9).
A União Federal, em suas razões recursais, pleiteia pela reforma da sentença e improcedência do
pedido. Argui que o autor se tornou inválido após ter atingido a maioridade previdenciária, o que
ilide a suposta dependência econômica em relação ao falecido segurado. Subsidiariamente,
requer que o termo inicial da complementação do benefício seja fixado a contar da data de sua
citação, ou, alternativamente, na data de seu requerimento administrativo (id 134695090 – p.
1/10).
Contrarrazões (id 134695091 – p. 1/6).
Devidamente processados os recursos, subiram os autos a esta instância para decisão.
Parecer do Ministério Público Federal, em que se manifesta pelo desprovimento dos recursos de
apelação do INSS e da União (id 135453025 – p. 1/6).
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5006124-71.2017.4.03.6183
RELATOR:Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, UNIÃO FEDERAL
APELADO: WLADENIL KLEMES
REPRESENTANTE: DORALICE CLEMES
Advogado do(a) APELADO: BENJAMIM DO NASCIMENTO FILHO - SP114524-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Tempestivo o recurso e respeitados os demais pressupostos de admissibilidade recursais, passo
ao exame da matéria objeto de devolução.
DA PENSÃO POR MORTE
O primeiro diploma legal brasileiro a prever um benefício contra as consequências da morte foi a
Constituição Federal de 1946, em seu art. 157, XVI. Após, sobreveio a Lei n.º 3.807, de 26 de
agosto de 1960 (Lei Orgânica da Previdência Social), que estabelecia como requisito para a
concessão da pensão o recolhimento de pelo menos 12 (doze) contribuições mensais e fixava o
valor a ser recebido em uma parcela familiar de 50% (cinquenta por cento) do valor da
aposentadoria que o segurado percebia ou daquela a que teria direito, e tantas parcelas iguais,
cada uma, a 10% (dez por cento) por segurados, até o máximo de 5 (cinco).
A Constituição Federal de 1967 e sua Emenda Constitucional n.º 1/69, também disciplinaram o
benefício de pensão por morte, sem alterar, no entanto, a sua essência.
A atual Carta Magna estabeleceu em seu art. 201, V, que:
"A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de
filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e
atenderá, nos termos da lei a:
V - pensão por morte do segurado, homem ou mulher, ao cônjuge ou companheiro e
dependentes, observado o disposto no § 2º."
A Lei n.º 8.213, de 24 de julho de 1991 e seu Decreto Regulamentar n.º 3048, de 06 de maio de
1999, disciplinaram em seus arts. 74 a 79 e 105 a 115, respectivamente, o benefício de pensão
por morte, que é aquele concedido aos dependentes do segurado, em atividade ou aposentado,
em decorrência de seu falecimento ou da declaração judicial de sua morte presumida.
Depreende-se do conceito acima mencionado que para a concessão da pensão por morte é
necessário o preenchimento de dois requisitos: ostentar o falecido a qualidade de segurado da
Previdência Social, na data do óbito e possuir dependentes incluídos no rol do art. 16 da
supracitada lei.
A qualidade de segurado, segundo Wladimir Novaes Martinez, é a:
"denominação legal indicativa da condição jurídica de filiado, inscrito ou genericamente atendido
pela previdência social. Quer dizer o estado do assegurado, cujos riscos estão
previdenciariamente cobertos."
(Curso de Direito Previdenciário. Tomo II - Previdência Social. São Paulo: LTr, 1998, p. 594).
Mantém a qualidade de segurado aquele que, mesmo sem recolher as contribuições, conserve
todos os direitos perante a Previdência Social, durante um período variável, a que a doutrina
denominou "período de graça", conforme o tipo de segurado e a sua situação, nos termos do art.
15 da Lei de Benefícios, a saber:
"Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício;
II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer
atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem
remuneração;
III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de
segregação compulsória;
IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso;
V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para
prestar serviço militar;
VI - até (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo."
É de se observar, ainda, que o § 1º do supracitado artigo prorroga por 24 (vinte e quatro) meses
tal período de graça aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses.
Em ambas as situações, restando comprovado o desemprego do segurado perante o órgão do
Ministério do Trabalho ou da Previdência Social, os períodos serão acrescidos de mais 12 (doze)
meses. A comprovação do desemprego pode se dar por qualquer forma, até mesmo oral, ou pela
percepção de seguro-desemprego.
Convém esclarecer que, conforme disposição inserta no § 4º do art. 15 da Lei nº 8.213/91, c.c. o
art. 14 do Decreto Regulamentar nº 3.048/99, com a nova redação dada pelo Decreto nº
4.032/01, a perda da qualidade de segurado ocorrerá no 16º dia do segundo mês seguinte ao
término do prazo fixado no art. 30, II, da Lei nº 8.212/91 para recolhimento da contribuição,
acarretando, consequentemente, a caducidade de todos os direitos previdenciários.
Conforme já referido, a condição de dependentes é verificada com amparo no rol estabelecido
pelo art. 16 da Lei de Benefícios, segundo o qual possuem dependência econômica presumida o
cônjuge, o(a) companheiro(a) e o filho menor de 21 (vinte e um) anos, não emancipado ou
inválido. Também ostentam a condição de dependente do segurado, desde que comprovada a
dependência econômica, os pais e o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21
(vinte e um) anos ou inválido.
De acordo com o § 2º do supramencionado artigo, o enteado e o menor tutelado são equiparados
aos filhos mediante declaração do segurado e desde que comprovem a dependência econômica.
DO CASO DOS AUTOS
O óbito de Pedro Klemes Júnior, ocorrido em 22 de julho de 2014, foi comprovado pela respectiva
Certidão (id 134694375 – p. 17).
Também restou superado o requisito da qualidade de segurada, uma vez que o falecido era titular
de aposentadoria por tempo de contribuição, no ramo de atividade ferroviário (NB
42/0013902032), desde 01 de dezembro de 1970, cuja cessação decorreu de seu falecimento,
conforme faz prova o extrato do Sistema Único de Benefícios – DATAPREV (id 134694377 – p.
4).
A Certidão de Nascimento revela que o autor, nascido em 21 de março de 1995, é filho do
falecido segurado (id 134694375 – p. 13). A controvérsia cinge-se, sobretudo, à comprovação da
dependência econômica do autor em relação ao falecido genitor.
Conforme precedentes desta Egrégia Corte, a seguir elencados, a dependência econômica do
filho maior e inválido, ainda que já titular de aposentadoria por invalidez, é relativa e pode ser
suprimidaporprovas em sentido contrário, confira-se:
“PREVIDENCIÁRIO.PENSÃO POR MORTE. FILHO MAIOR INVÁLIDO.INVALIDEZ
DEMONSTRADA À ÉPOCA DO ÓBITO. MOMENTO DA INCAPACIDADE.
IRRELEVÂNCIA.DEPENDÊNCIA ECONÔMICAPRESUMIDA.
PRESUNÇÃORELATIVA.AUSÊNCIA DE PROVAS EM SENTIDO CONTRÁRIO. APELAÇÃO
DESPROVIDA.
1. Nos termos do artigo 74 da Lei nº 8.213/91, dois são os requisitos para a concessão do
benefício depensão por morte,quais sejam: a qualidade de segurado do falecido e adependência
econômicado beneficiário postulante.
2. Dispensada está, portanto, a demonstração do período de carência, consoante regra expressa
no artigo 26, I, da Lei n° 8.213/91.
3. No presente caso, não há controvérsia acerca da qualidade de segurado do de cujus.
4. Em relação àdependência econômica,observa-se que a própria autarquia previdenciária
reconheceu administrativamente a invalidez do autor ao lhe conceder a aposentadoriaporinvalidez
desde 24.03.2011 (ID 85121880 - fls. 14), tornando incontroversa tal questão.
5. Ressalte-se que o E. Superior Tribunal de Justiça, no que tange à invalidez, firmou
entendimento no sentido de que "é irrelevante o fato de a invalidez ter sido após a maioridade do
postulante, porquanto, nos termos do art. 16, III c/c § 4º da Lei n. 8.213/91, apensão por morteé
devida aofilho inválido,não apresentando nenhum outro requisito quanto ao tempo em que essa
invalidez deva ser reconhecida, bastando apenas a comprovação de que a invalidez é anterior ao
óbito."
6. Verifica-se pelo conjunto probatório que o autor éinválidoe que essa invalidez já se encontrava
presente antes do óbito do segurado.
7. Sendo, portanto, beneficiário ofilho maior inválido,a suadependência econômicaé presumida,
nos termos do artigo 16, I e 4º, da LBPS.
8. Ressalte-se que o § 4º do art. 16 da Lei n. 8.213/1991 prescreve uma
presunçãorelativadedependência econômicadofilho maiorde 21 anosinválido,que, como tal, pode
ser suprimidaporprovas em sentido contrário.
9. Observa-se que não restou afastada a presunção dedependência econômica,sendo que o fato
do autor receber aposentadoriaporinvalidez (NB 548.383.513-8) não infirma a sua condição de
dependente econômico, uma vez que não se faz necessário que essadependênciaseja exclusiva,
podendo, de toda sorte, ser concorrente, além do que não há vedação legal quanto à cumulação
de aposentadoria epensão por morte,nos termos do artigo 124 da Lei n. 8.213/91. Precedentes.
10. Apelação desprovida.
(TRF – Terceira Região, 8ª Turma, AC 5925153-12.2019.4.03.9999, Relatora Desembargadora
Federal Diva Prestes Marcondes Malerbi, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 17/03/2020).
“PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. FILHO INVÁLIDO. INVALIDEZ SUPERVENIENTE
À EMANCIPAÇÃO. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA NÃO COMPROVADA. REQUISITO NÃO
PREENCHIDO. BENEFÍCIO INDEVIDO. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ NÃO CARACTERIZADA.
MULTA AFASTADA.
1. Nos termos dos artigos 74 e 26 da Lei 8.213/91, a pensão por morte é devida ao conjunto dos
dependentes do segurado que falecer, aposentado ou não, independentemente de carência.
2. O direito à pensão por morte, no caso do filho inválido, depende da comprovação dessa
condição e da manutenção de sua dependência econômica em relação ao genitor por ocasião do
falecimento deste, sendo irrelevante se a incapacidade surgiu antes ou depois da maioridade.
3. Apesar do art. 16, §4º, da Lei nº 8.213/91 prever que a dependência econômica das pessoas
indicadas no inciso I é presumida, deve-se salientar que tal presunção refere-se apenas àqueles
filhos que nunca deixaram de ser dependentes dos seus pais, de modo que, nas demais
hipóteses, como é o caso dos autos, a dependência deve ser comprovada.
4. Em que pese tenha sido comprovada a incapacidade, não restou demonstrada a dependência
econômica da parte autora em relação ao falecido, de modo que não preenchido o requisito da
qualidade de dependente.
5. Não satisfeitos todos os requisitos necessários à concessão do benefício, não faz jus a parte
autora ao recebimento da pensão por morte.
6. A litigância de má-fé apenas se caracteriza em casos nos quais ocorre o dano à parte contrária
e configuração de conduta dolosa, o que não houve no presente caso, uma vez que não se
verifica presente quaisquer das hipóteses previstas no art. 80 do CPC, sendo de rigor o
afastamento da multa aplicada.
7. Apelação da parte autora parcialmente provida”.
(TRF – Terceira Região, 10ª Turma, AC 001198-42.2018.4.03.6141, Relator Desembargador
Federal Nelson de Freitas Porfírio Júnior, data da publicação 12/03/2020).
Há copiosa prova documental a indicar que o autor, desde o início da invalidez, coabitava com o
genitor, que lhe ministrava os recursos necessários para prover o seu sustento.A presente
demanda foi instruída com a Certidão de Interdição, lavrada em 12 de agosto de 2016, perante o
Registro Civil de Pessoas Naturais de Franco da Rocha – SP, da qual se verifica ter sido o autor
interditado, em decorrência de sentença proferida em 18/01/2016, nos autos de processo nº
00099792620138260197, os quais tramitaram pela 2ª Vara da Família e das Sucessões da
Comarca de Francisco Morato – SP (id134694375 – p. 12).
A incapacidade para exercer os atos da vida civil foi decretada com supedâneo no laudo pericial
realizado em 07/08/2014, pelo Instituto de Medicina Social e de Criminologia de São Paulo –
IMESC, o qual concluiu ser portador de síndrome demencial relacionada ao etilismo crônico –
CID-F 02-8, enfermidade degenerativa e de caráter progressivo.
Em resposta ao quesito que indagava sobre a data da eclosão da enfermidade, o expert fixou-a
há cerca de trinta anos (quesito 4).
O postulante foi novamente submetido à exame pericial na presente demanda, conforme se
verifica do respectivo laudo, com data de 08 de fevereiro de 2017 (id. 134694380 – p. 27/30).
Transcrevo, na sequência, o item “discussão e conclusão”:
“Após anamnese psiquiátrica e exame dos autos, concluo que o autor encontra-se total e
permanentemente incapaz para o trabalho e a vida independente. O autor é portador de quadro
clínico compatível com o diagnóstico de transtornos mentais e comportamentais devidos ao uso
de álcool e síndrome demencial secundária ao consumo.
Iniciou o uso de álcool muito precocemente na vida, aos 7 anos de idade, estimulado pelos seus
pais, em um contexto familiar de uso frequente de bebidas alcoólicas. Sempre fez uso diário, até
há quase 5 anos atrás. Já teve múltiplos problemas de vida e saúde decorrentes do uso, já foi
internado, já teve convulsões e em 1985 apresentou uma convulsão, seguida de internação, em
que foi constatada atrofia cerebral importante, com atrofia cerebelar e múltiplos sintomas
decorrentes.
O autor não deambula, tem tremores de cabeça e membros superiores graves, comprometendo
significantemente a movimentação. Não se orienta em tempo ou espaço, não lida com dinheiro,
tem dificuldade para compreender o que lhe é dito e comprometimento importante da memória.
Foi interditado em 04/07/16 e sua irmã é sua curadora. Trata-se de síndrome crônica e
irreversível, secundária a alterações anatômicas. O autor é incapaz para os atos da vida civil e
necessita da assistência contínua de terceiros”.
Em resposta aos quesitos do juízo, a expert confirmou que o autor se encontra incapacitado de
forma total e permanente (quesito nº 7).Fixou a data do início da incapacidade em 24/10/1985
(quesito 11). A mesma resposta foi replicada com relação ao quesito formulado pelo INSS (nº 09).
Em síntese, a perícia reiterou ser o periciando portador de transtornos mentais e
comportamentais, os quais o incapacitava de forma permanente, impedindo-o de exercer
atividade laborativa remunerada e de exercer os atos da vida civil.
O autor já é titular de benefício previdenciário, instituído por Regime Próprio de Previdência –
SPPrev, no cargo de auxiliar de serviços gerais, desde 25/05/1988, consoante se infere da
declaração emitida pela Secretaria dos Negócios da Justiça do Governo de São Paulo,
juntamente com o demonstrativo de pagamento que a acompanha, pertinente à competência de
maio de 2014 (id 134694375 – p. 26/28).
Ressente-se a legislação previdenciária de vedação ao recebimento conjunto de pensão por
morte e aposentadoria. Nesse sentido, trago à colação o seguinte julgado, proferido pelo Colendo
Superior Tribunal de Justiça, confira-se:
"PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. FILHA APOSENTADA POR INVALIDEZ.
CUMULAÇÃO. POSSIBILIDADE. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA RECONHECIDA PELO
TRIBUNAL A QUO. REEXAME DE MATÉRIA PROBATÓRIA. SÚMULA N.º7 DO STJ. RECURSO
ESPECIAL CONHECIDO EM PARTE E DESPROVIDO.
1. Nos termos do art. 16, § 4º, da Lei n.º 8.213/91, a dependência econômica de filho inválido
(inciso I do mesmo dispositivo legal) é presumida.
2. In casu, o acórdão recorrido, em face das provas documentais e testemunhais trazidas aos
autos, reconheceu que a Autora, mesmo recebendo o benefício por invalidez, era dependente
econômica de seu pai, razão pela qual a pretendida inversão do julgado demandaria,
necessariamente, o reexame do conjunto fático-probatório. Incidência da Súmula n.º 7 do STJ.
3. É perfeitamente possível acumulação de pensão por morte com aposentadoria por invalidez,
por possuírem naturezas distintas, com fatos geradores diversos.
4. Recurso especial conhecido em parte e desprovido.
(STJ, 5ª Turma, REsp 486030/ES, Relatora Ministra Laurita Vaz, DJ 28/04/2003).
Observo que, de acordo com a conclusão da perícia, ao tempo da eclosão da incapacidade
(24/10/1985), o autor, nascido em 21/03/1955, contava 30 anos de idade.
É válido ressaltar que a lei não exige que a invalidez deva existir desde o nascimento ou que
tenha sido adquirida até aos 21 anos de idade para que o filho possa ser considerado beneficiário
do genitor. O que a norma considera para estabelecer a relação de dependência é a invalidez,
seja ela de nascença ou posteriormente adquirida.
Nesse sentido, trago à colação a ementa de recente julgado proferido pelo Colendo Superior
Tribunal de Justiça, confira-se:
“PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. OFENSA AO
ART. 1.022 DO CPC. INEXISTÊNCIA. PENSÃO POR MORTE. FILHO MAIOR INVÁLIDO.
REQUISITOS. PREENCHIMENTO. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. REVISÃO DE PREMISSAS
FÁTICAS. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ.
1. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não caracteriza ofensa ao art.
1.022 do CPC.
2. Consoante a jurisprudência do STJ, é irrelevante o fato de a invalidez ter sido após a
maioridade do postulante, uma vez que, nos termos do artigo 16, III c/c o parágrafo 4º, da Lei
8.213/1991, é devida a pensão por morte, comprovada a dependência econômica, ao filho
inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente
incapaz, assim declarado judicialmente.
3. Alinhado a esse entendimento, há precedentes do STJ no sentido de que, em se tratando de
dependente maior inválido, basta a comprovação de que a invalidez é anterior ao óbito do
segurado. Nesse sentido: AgRg no AREsp 551.951/SP, Rel. Minª. Assusete Magalhães, Segunda
Turma, DJe 24.4.2015; AgRg no Ag 1.427.186/PE, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho,
Primeira Turma, DJe 14.9.2012; REsp 1.618.157/SP, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda
Turma, DJe 12.9.2016.
4. Na hipótese dos autos, o Tribunal de origem afirmou que a parte autora preenche todos os
requisitos para receber o benefício de pensão por morte, sobretudo o que se refere à
dependência econômica do filho maior inválido.
5. Merece transcrição o seguinte excerto da decisão combatida: "(...) Saliento, ainda, que a citada
condição de enfermo dependente do autor é corroborada pela documentação trazida aos autos
pelo INSS, bem como pelo próprio depoimento das testemunhas" (fl. 242, e-STJ).
6. Para desconstituir as conclusões abrigadas pelo acórdão quanto à demonstração de
dependência econômica exigida para fins de concessão de pensão por morte, é necessário
revolver o acervo fático-probatório dos autos, defeso ao STJ em razão da Súmula 7/STJ.
7. Agravo conhecido para conhecer se parcialmente do Recurso Especial somente com relação à
preliminar de violação do art. 1.022 do CPC e, nessa parte, não provido”.
(STJ, Segunda Turma, AREsp 1570257/ RS, Relator Ministro Herman Benjamin, Dje 19/12/2019).
Em razão do exposto, o postulante faz jus ao benefício de pensão por morte, em decorrência do
falecimento de Pedro Klemes Júnior, além da complementação da pensão, devida aos
dependentes de ex-ferroviários da RFFSA, conforme preconizado pela Lei nº 8.186/91.
Por ocasião da liquidação da sentença, deverá ser compensado o valor das parcelas auferidas
por força da antecipação da tutela.
CONSECTÁRIOS
TERMO INICIAL
O termo inicial do benefício de pensão por morte, segundo o art. 74 da Lei nº 8.213/91, com a
redação vigente ao tempo do óbito, seria a data do óbito, quando requerido em até trinta dias
após a sua ocorrência, ou na data em que fosse pleiteado, se transcorrido este prazo. No caso
dos autos, o óbito ocorreu em 22/07/2014 e o requerimento administrativo foi formulado em
15/10/2014 (id 134694376 - p. 15).
Ocorre que o benefício em questão é pleiteado por absolutamente incapaz. Dessa forma, deve
ser mantido como dies a quo a data do óbito (22/07/2014), também no que se refere ao
pagamento da complementação da pensão devida pela União Federal, tendo em vista a natureza
prescricional do prazo estipulado no art. 74 e o disposto no parágrafo único do art. 103, ambos da
Lei nº 8.213/91, em sua redação primeva, e art. 198, I, do Código Civil (Lei 10.406/2002), os quais
vedam a incidência da prescrição contra o absolutamente incapaz.
O direito à pensão por morte, que nasce para o absolutamente incapaz com o óbito do segurado
do qual dependia economicamente, não se extingue diante da inércia de seus representantes
legais. Portanto, o lapso temporal transcorrido entre a data do evento morte e a da formulação do
pedido administrativo ou da citação, na fase judicial, não pode ser considerado em desfavor
daquele que se encontra impossibilitado de exercer pessoalmente atos da vida civil.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Com o advento do novo Código de Processo Civil, foram introduzidas profundas mudanças no
princípio da sucumbência, e em razão destas mudanças e sendo o caso de sentença ilíquida, a
fixação do percentual da verba honorária deverá ser definida somente na liquidação do julgado,
com observância ao disposto no inciso II, do § 4º c.c. § 11, ambos do artigo 85, do CPC/2015,
bem como o artigo 86, do mesmo diploma legal.
Os honorários advocatícios a teor da Súmula 111 do E. STJ incidem sobre as parcelas vencidas
até a sentença de procedência.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, nego provimento à apelação do INSS e à apelação da União Federal. Os
honorários advocatícios deverão ser fixados por ocasião da liquidação do julgado, na forma da
fundamentação. Mantenho a tutela concedida.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. FILHO INVÁLIDO. QUALIDADE DE SEGURADO. O
DE CUJUS ERA TITULAR DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. EX-
FERROVIÁRIO. COMPLEMENTAÇÃO DE BENEFÍCIO INSTITUÍDA PELA LEI 8.186/91.
DEPENDÊNCIA ECONÔMICA COMPROVADA. AUTOR SUBMETIDO A PROCESSO DE
INTERDIÇÃO. PERÍCIA MÉDICA. INCAPACIDADE TOTAL E PERMANENTE ADVINDA
ANTERIORMENTE AO ÓBITO DO GENITOR. CUMULAÇÃO DE BENEFÍCIOS.
POSSIBILIDADE. TERMO INICIAL.
- O óbito de Pedro Klemes Júnior, ocorrido em 22 de julho de 2014, foi comprovado pela
respectiva Certidão.
- Também restou superado o requisito da qualidade de segurada, uma vez que o falecido era
titular de aposentadoria por tempo de contribuição, no ramo de atividade ferroviário (NB
42/0013902032), desde 01 de dezembro de 1970, cuja cessação decorreu de seu falecimento,
conforme faz prova o extrato do Sistema Único de Benefícios – DATAPREV.
- A Certidão de Nascimento revela que o autor, nascido em 21 de março de 1995, é filho do
falecido segurado.
- Conforme precedentes desta Egrégia Corte, a dependência econômica do filho maior e inválido,
ainda que já titular de aposentadoria por invalidez, é relativa e pode ser suprimidaporprovas em
sentido contrário.
- Há copiosa prova documental nos autos a indicar que o autor, desde o início da invalidez,
coabitava com o genitor, que lhe ministrava os recursos necessários para prover o seu sustento.
- A demanda foi instruída com a Certidão de Interdição, lavrada em 12 de agosto de 2016,
perante o Registro Civil de Pessoas Naturais de Franco da Rocha – SP, da qual se verifica ter
sido o autor interditado, em decorrência de sentença proferida em 18/01/2016, nos autos de
processo nº 00099792620138260197, os quais tramitaram pela 2ª Vara da Família e das
Sucessões da Comarca de Francisco Morato – SP.
- A incapacidade para exercer os atos da vida civil foi decretada com supedâneo no laudo pericial
realizado em 07/08/2014, pelo Instituto de Medicina Social e de Criminologia de São Paulo –
IMESC, o qual concluiu ser portador de síndrome demencial relacionada ao etilismo crônico –
CID-F 02-8, enfermidade degenerativa e de caráter progressivo.
- O postulante foi novamente submetido à exame pericial na presente demanda, conforme se
verifica do respectivo laudo, com data de 08 de fevereiro de 2017. Em resposta aos quesitos do
juízo, a expert confirmou que o autor se encontra incapacitado de forma total e permanente.
- A perícia reiterou ser o periciando portador de transtornos mentais e comportamentais, os quais
o incapacitava de forma permanente, impedindo-o de exercer atividade laborativa remunerada e
de exercer os atos da vida civil. Fixou a data do início da incapacidade em 24/10/1985 (quesito
11). A mesma resposta foi replicada com relação ao quesito formulado pelo INSS (nº 09).
- O autor já é titular de benefício previdenciário, instituído por Regime Próprio de Previdência –
SPPrev, no cargo de auxiliar de serviços gerais, desde 25/05/1988, consoante se infere da
declaração emitida pela Secretaria dos Negócios da Justiça do Governo de São Paulo,
juntamente com o demonstrativo de pagamento que a acompanha, pertinente à competência de
maio de 2014.
- Ressente-se a legislação previdenciária de vedação ao recebimento conjunto de pensão por
morte e aposentadoria. Precedente.
- É válido ressaltar que a lei não exige que a invalidez deva existir desde o nascimento ou que
tenha sido adquirida até aos 21 anos de idade para que o filho possa ser considerado beneficiário
do genitor. O que a norma considera para estabelecer a relação de dependência é a invalidez,
seja ela de nascença ou posteriormente adquirida. Precedente do Colendo Superior Tribunal de
Justiça.
- Termo inicial mantido na data do óbito, inclusive em relação à complementação devida pela
União Federal, tendo em vista a natureza prescricional do prazo estipulado no art. 74 e o disposto
no parágrafo único do art. 103, ambos da Lei nº 8.213/91, em sua redação primeva, e art. 198, I,
do Código Civil (Lei 10.406/2002), os quais vedam a incidência da prescrição contra o
absolutamente incapaz.
- Por ocasião da liquidação da sentença, deverá ser compensado o valor das parcelas auferidas
por força da antecipação da tutela.
- Os honorários advocatícios deverão ser fixados na liquidação do julgado, nos termos do inciso
II, do § 4º, c.c. §11, do artigo 85, do CPC/2015.
- Tutela antecipada mantida.
- Apelações do INSS e da União Federal desprovidas.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento à apelação do INSS e à apelação da União Federal, nos
termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
