
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5061997-15.2021.4.03.9999
RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: A. R. P.
REPRESENTANTE: ALINE PATRICIA PEREIRA
Advogados do(a) APELANTE: DARIO SERGIO RODRIGUES DA SILVA - SP163807-N,
Advogado do(a) REPRESENTANTE: DARIO SERGIO RODRIGUES DA SILVA - SP163807-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5061997-15.2021.4.03.9999
RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: A. R. P.
REPRESENTANTE: ALINE PATRICIA PEREIRA
Advogados do(a) APELANTE: DARIO SERGIO RODRIGUES DA SILVA - SP163807-N,
Advogado do(a) REPRESENTANTE: DARIO SERGIO RODRIGUES DA SILVA - SP163807-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Cuida-se de pedido de concessão do benefício de pensão por morte decorrente do falecimento de M. A. P., avó do autor, desde a data do requerimento administrativo (25/6/2018).
O juízo a quo julgou improcedente o pedido formulado.
A parte autora apelou, pleiteando a reforma da sentença, sustentando, em síntese, o cumprimento dos requisitos legais à concessão pretendida.
Parecer do Ministério Público Federal opinando pela nulidade do feito ante a ausência do órgão do Ministério Público Federal no primeiro grau.
Decisão monocrática Id. 265228435 acolheu o parecer ministerial, declarou a nulidade do feito determinou o retorno ao juízo a quo para regular processamento.
Os autos baixaram para o primeiro grau e a instrução transcorreu.
A parte autora apela, pleiteando a reforma da sentença, sustentando, em síntese, o cumprimento dos requisitos legais à concessão pretendida.
Sem contrarrazões, subiram os autos.
Parecer do Ministério Público Federal opinando pelo desprovimento do recurso.
É o relatório.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5061997-15.2021.4.03.9999
RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: A. R. P.
REPRESENTANTE: ALINE PATRICIA PEREIRA
Advogados do(a) APELANTE: DARIO SERGIO RODRIGUES DA SILVA - SP163807-N,
Advogado do(a) REPRESENTANTE: DARIO SERGIO RODRIGUES DA SILVA - SP163807-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Tempestivo o recurso e presentes os demais requisitos de admissibilidade, passa-se ao exame da insurgência propriamente dita, considerando-se a matéria objeto de devolução.
PENSÃO POR MORTE
O benefício de pensão por morte encontra-se disciplinado pelos arts. 74 a 79 da Lei n.º 8.213/91, cujo texto original foi objeto de alterações, vigorando atualmente a redação dada pela Lei n.º 13.846, de 18/6/2019.
Aplicável, quanto à concessão desse benefício, a lei vigente à época do óbito do segurado, consoante o teor do verbete n.º 340, da Súmula da Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.
Para se obter a implementação da aludida pensão, é necessário o preenchimento de dois requisitos: o falecido deve deter a qualidade de segurado e é imprescindível subsistir relação de dependência econômica entre ele e os requerentes do benefício.
Dispensa-se a demonstração do período de carência, nos termos do art. 26, inciso I, da Lei n.° 8.213/91, conquanto sua duração possa variar conforme a quantidade de contribuições recolhidas pelo instituidor, consoante o disposto no art. 77 do mesmo diploma legal.
Com relação à dependência econômica, o art. 16 da Lei n.º 8.213/91 estabelece o rol dos beneficiários, dividindo-os em três classes e indicando tanto as hipóteses em que a dependência econômica é presumida quanto aquelas em que ela deverá ser comprovada.
Cumpre observar, ainda, que é vedada a concessão da pensão aos dependentes do segurado que perder essa qualidade, nos termos do art. 15 da Lei de Benefícios, salvo se antes preenchidos os requisitos para a obtenção da aposentadoria, conforme previsto no art. 102, §§ 1.º e 2.º.
DO CASO DOS AUTOS
A controvérsia cinge-se à possibilidade da autora, nascido em 22/11/2010, na condição de neta, receber benefício previdenciário de pensão por morte decorrente do óbito de sua avó M. A. P., ocorrido em 8/5/2018.
Para demonstrar suas alegações, juntou documentos, entre os quais se destacam:
- Carteira de identidade da autora e sua genitora;
- Certidão de nascimento da autora;
- Certidão de óbito de M. A. P., ocorrido em 8/5/2018;
- Requerimento administrativo de pensão por morte apresentado pela autora em 25/6/2018 e indeferido em razão da falta da qualidade de dependente.
- CTPS da falecida sem anotações;
- Atestado de residência e atividade rural da falecida da falecida e de sua filha (mãe da autora), indicando o labor rural no período de 1986 até a data do documento (13/6/2018).
- Declaração de que a autora está matriculada no 2.º ano do ensino fundamental, datada de 15/6/2018.
Cabe ressaltar a existência de prova oral.
A testemunha Maria Aparecida dos Santos afirmou que a família trabalha na agricultura, a autora morava na casa da avó, era a falecida que pagava as contas de subsistência da autora, comentava com a testemunha. A genitora da autora também ajudava nas contas da casa. Acrescentou que presenciou a falecida fazendo compras no mercado para a casa.
A testemunha Jucilene Oliveira aduziu que conheceu a falecida, ela trabalhava na agricultura, roça, lá mesmo no sítio dela. Lá ela plantava tudo, mandioca, essas coisas, a testemunha morava perto. Moravam na casa a falecida, a filha, a neta. Esclareceu que a mãe da autora também ajudava nas contas da casa.
Pois bem.
A autora apresentou tão somente um documento que comprovaria o labor rural da avó, expedido, inclusive, após o falecimento, indicando que a falecido teria exercido atividades rurais até 13/6/2018, data posterior ao passamento, logo, prova não confiável.
Em que pese a prova testemunhal confirme a atividade desempenhada pela parte autora é, por si só, insuficiente para atestar o reconhecimento do tempo de serviço rural alegado, porquanto inexistente indicativo material do trabalho campesino, exigido para a comprovação do labor sem registro, conforme balizas estabelecidas na legislação de regência e parâmetros consolidados na jurisprudência.
Diante da inexistência de conjunto probatório consistente, representado por início de prova material corroborado por prova testemunhal, impossível reconhecer o exercício de atividade rural pela autora.
Em suma, não comprovada a qualidade de segurada da falecida.
A Lei nº 9.528/97, originada da Medida Provisória n.º 1.523/96, alterou a redação do art. 16, § 2.º, para dispor que, apenas "o enteado e o menor tutelado equiparam-se a filho mediante declaração do segurado e desde que comprovada a dependência econômica na forma estabelecida no Regulamento".
Contudo, verifica-se que o E. Superior Tribunal de Justiça no julgamento do REsp 1.411.258/RS de Relatoria do Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, julgado sob a sistemática dos recursos especiais repetitivos (art. 543-C, do CPC), firmou entendimento no sentido de que “o menor sob guarda tem direito à concessão do benefício de pensão por morte do seu mantenedor, comprovada a sua dependência econômica, nos termos do art. 33, §3º, de Estatuto da Criança e do Adolescente, ainda que o óbito do instituidor da pensão seja posterior à vigência da Medida Provisória 1.523/96, reeditada e convertida na Lei 9.528/97. Funda-se essa conclusão na qualidade de Lei Especial do Estatuto do Estatuto da Criança e do Adolescente (8.069/90), frente à legislação previdenciária.”, in verbis:
DIREITO PREVIDENCIÁRIO E HUMANITÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. PROCESSAMENTO NOS TERMOS DO ART. 543-C DO CPC E DA RESOLUÇÃO 08/STJ. DIREITO DO MENOR SOB GUARDA À PENSÃO POR MORTE DO SEU MANTENEDOR. EMBORA A LEI 9.528/97 O TENHA EXCLUÍDO DO ROL DOS DEPENDENTES PREVIDENCIÁRIOS NATURAIS OU LEGAIS DOS SEGURADOS DO INSS. PROIBIÇÃO DE RETROCESSO. DIRETRIZES CONSTITUCIONAIS DE ISONOMIA, PRIORIDADE ABSOLUTA E PROTEÇÃO INTEGRAL À CRIANÇA E AO ADOLESCENTE (ART. 227 DA CF). APLICAÇÃO PRIORITÁRIA OU PREFERENCIAL DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE (LEI 8.069/90), POR SER ESPECÍFICA, PARA ASSEGURAR A MÁXIMA EFETIVIDADE DO PRECEITO CONSTITUCIONAL DE PROTEÇÃO. PARECER DO MPF PELO NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO, A TEOR DA SÚMULA 126/STJ. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO, PORÉM DESPROVIDO.
1. A não interposição de Recurso Extraordinário somente tem a força de impedir o conhecimento de Recurso Especial quando (e se) a matéria decidida no acórdão recorrido apresenta dupla fundamentação, devendo a de nível constitucional referir imediata e diretamente infringência à preceito constitucional explícito; em tema de concessão de pensão por morte a menor sob guarda, tal infringência não se verifica, tanto que o colendo STF já decidiu que, nestas hipóteses, a violação à Constituição Federal, nesses casos, é meramente reflexa. A propósito, os seguintes julgados, dentre outros: ARE 804.434/PI, Rel. Min. DIAS TOFFOLI, DJe 19.3.2015; ARE 718.191/BA, Rel. Min. LUIZ FUX, DJe 17.9.2014; RE 634.487/MG, Rel. Min. ROSA WEBER, DJe 1.8.2014; ARE 763.778/RS, Rel. Min. CARMEN LÚCIA, DJe 24.10.2013; não se apresenta razoável afrontar essa orientação do STF, porquanto se trata, neste caso, de questão claramente infraconstitucional.
2. Dessa forma, apesar da manifestação ministerial em sentido contrário, entende-se possível, em princípio, conhecer-se do mérito do pedido recursal do INSS, afastando-se a incidência da Súmula 126/STJ, porquanto, no presente caso, o recurso deve ser analisado e julgado, uma vez que se trata de matéria de inquestionável relevância jurídica, capaz de produzir precedente da mais destacada importância, apesar de não interposto o Recurso Extraordinário.
3. Quanto ao mérito, verifica-se que, nos termos do art. 227 da CF, foi imposto não só à família, mas também à sociedade e ao Estado o dever de, solidariamente, assegurar à criança e ao adolescente os direitos fundamentais com absoluta prioridade. Além disso, foi imposto ao legislador ordinário a obrigação de garantir ao menor os direitos previdenciários e trabalhistas, bem como o estímulo do Poder Público ao acolhimento, sob a forma de guarda, de criança ou adolescente órfão ou abandonado.
4. A alteração do art. 16, § 2o. da Lei 8.213/91, pela Lei 9.528/97, ao retirar o menor sob guarda da condição de dependente previdenciário natural ou legal do Segurado do INSS, não elimina o substrato fático da dependência econômica do menor e representa, do ponto de vista ideológico, um retrocesso normativo incompatível com as diretrizes constitucionais de isonomia e de ampla e prioritária proteção à criança e ao adolescente. 5. Nesse cenário, a jurisprudência desta Corte Superior tem avançado na matéria, passando a reconhecer ao menor sob guarda a condição de dependente do seu mantenedor, para fins previdenciários. Precedentes: MS 20.589/DF, Rel. Min. RAUL ARAÚJO, Corte Especial, DJe 2.2.2016; AgRg no AREsp. 59.461/MG, Rel. Min. OLINDO MENEZES, DJe 20.11.2015; AgRg no REsp. 1.548.012/PE, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 20.11.2015; AgRg no REsp. 1.550.168/SE, Rel. Min. MAURO CAMPBELL MARQUES, DJe 22.10.2015; REsp. 1.339.645/MT, Rel. Min. SÉRGIO KUKINA, DJe 4.5.2015.
6. Não se deve perder de vista o sentido finalístico do Direito Previdenciário e Social, cuja teleologia se traduz no esforço de integração dos excluídos nos benefícios da civilização e da cidadania, de forma a proteger as pessoas necessitadas e hipossuficientes, que se encontram em situações sociais adversas; se assim não for, a promessa constitucional de proteção a tais pessoas se esvai em palavras sonoras que não chegam a produzir qualquer alteração no panorama jurídico.
7. Deve-se proteger, com absoluta prioridade, os destinatários da pensão por morte de Segurado do INSS, no momento do infortúnio decorrente do seu falecimento, justamente quando se vêem desamparados, expostos a riscos que fazem periclitar a sua vida, a sua saúde, a sua alimentação, a sua educação, o seu lazer, a sua profissionalização, a sua cultura, a sua dignidade, o seu respeito individual, a sua liberdade e a sua convivência familiar e comunitária, combatendo-se, com pertinácia, qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão (art. 227, caput da Carta Magna).
8. Considerando que os direitos fundamentais devem ter, na máxima medida possível, eficácia direta e imediata, impõe-se priorizar a solução ao caso concreto de forma que se dê a maior concretude ao direito. In casu, diante da Lei Geral da Previdência Social que apenas se tornou silente ao tratar do menor sob guarda e diante de norma específica que lhe estende a pensão por morte (Lei 8.069/90, Estatuto da Criança e do Adolescente, art. 33, § 3o.), cumpre reconhecer a eficácia protetiva desta última lei, inclusive por estar em perfeita consonância com os preceitos constitucionais e a sua interpretação inclusiva.
9. Em consequência, fixa-se a seguinte tese, nos termos do art. 543-C do CPC/1973: O MENOR SOB GUARDA TEM DIREITO À CONCESSÃO DO BENEFÍCIO DE PENSÃO POR MORTE DO SEU MANTENEDOR, COMPROVADA A SUA DEPENDÊNCIA ECONÔMICA, NOS TERMOS DO ART. 33, § 3o. DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE, AINDA QUE O ÓBITO DO INSTITUIDOR DA PENSÃO SEJA POSTERIOR À VIGÊNCIA DA MEDIDA PROVISÓRIA 1.523/96, REEDITADA E CONVERTIDA NA LEI 9.528/97. FUNDA-SE ESSA CONCLUSÃO NA QUALIDADE DE LEI ESPECIAL DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE (8.069/90), FRENTE À LEGISLAÇÃO PREVIDENCIÁRIA.
10. Recurso Especial do INSS desprovido.
(REsp 1411258/RS, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 11/10/2017, DJe 21/02/2018)
Assim sendo, ainda que o menor sob guarda possa ser inscrito como dependente, faz-se necessária a comprovação da dependência econômica em relação ao segurado guardião, nas relações estabelecidas sob a égide da Medida Provisória n.º 1.523 de 11/10/1996 e suas posteriores reedições, que culminaram na Lei n.º 9.528/97.
In casu, a parte autora não comprovou que estava sob a guarda da avó, ao revés disso, conforme relatado nos autos e bem pontuado pelo representante do Ministério Público Federal, a parte autora residia com a genitora além da avó, o que evidencia que é mantida pela mãe, tendo a avó o papel de suporte comum prestado pela família extensa.
Inclusive, ressalta-se que a testemunhas confirmaram que a genitora da autora trabalhava, residia no mesmo local e também mantinha os gastos da família.
De rigor, portanto, o indeferimento do benefício ante a ausência de cumprimento dos requisitos legais.
Majoro a condenação ao pagamento de honorários fixados pelo juízo a quo em 2%, com base no art. 85, § 11, do CPC, observada a suspensão de exigibilidade decorrente do deferimento da gratuidade da justiça.
Posto isso, nego provimento a apelação.
É o voto.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. MENOR SOB GUARDA. NÃO COMPROVADA A QUALIDADE DE DEPENDENTE. APELAÇÃO DESPROVIDA.
- A parte autora não estava sob a guarda do sua avó falecido, não tendo sido comprovada dependência econômica.
- A Lei nº 9.528/97, originada da Medida Provisória nº 1.523/96, alterou a redação do art. 16, §2º, para dispor que, apenas "o enteado e o menor tutelado equiparam-se a filho mediante declaração do segurado e desde que comprovada a dependência econômica na forma estabelecida no Regulamento".
- O STJ, no julgamento do REsp 1.411.258/RS de Relatoria do Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, julgado sob a sistemática dos recursos especiais repetitivos (art. 543-C, do CPC), firmou entendimento no sentido de que “o menor sob guarda tem direito à concessão do benefício de pensão por morte do seu mantenedor, comprovada a sua dependência econômica, nos termos do art. 33, §3º, de Estatuto da Criança e do Adolescente, ainda que o óbito do instituidor da pensão seja posterior à vigência da Medida Provisória 1.523/96, reeditada e convertida na Lei 9.528/97. Funda-se essa conclusão na qualidade de Lei Especial do Estatuto do Estatuto da Criança e do Adolescente (8.069/90), frente à legislação previdenciária.”.
- Reconhecida, portanto, a improcedência do pedido inicial.
ACÓRDÃO
DESEMBARGADORA FEDERAL
