Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5001018-26.2018.4.03.6141
Relator(a)
Desembargador Federal GILBERTO RODRIGUES JORDAN
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
26/07/2019
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 31/07/2019
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. ÓBITO EM 2010, NA VIGÊNCIA DA LEI Nº
8.213/91. PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA REJEITADA. QUALIDADE DE
SEGURADO. APOSENTADORIA AUFERIDA AO TEMPO DO ÓBITO. UNIÃO ESTÁVEL. INÍCIO
DE PROVA MATERIAL CORROBORADO POR TESTEMUNHAS. CONCESSÃO DO
BENEFÍCIO. TERMO INICIAL. CRITÉRIOS DE INCIDÊNCIA DOS JUROS DE MORA E DA
CORREÇÃO MONETÁRIA.
- Deve ser rejeitada a matéria preliminar. Por se tratar de testemunha do juízo, caberia ao
magistrado avaliar a conveniência de sua oitiva, para o desfecho da lide.
- O óbito de Daniel Benedicto da Conceição, ocorrido em 21 de maio de 2010, está corroborado
pela respectiva Certidão.
- Restou superado o requisito da qualidade de segurado. Consoante se infere das informações
constantes no extrato do Sistema Único de Benefícios - DATAPREV, o de cujus era titular do
benefício previdenciário de aposentadoria por invalidez (NB 32/0001034480), desde 08/05/1966,
cuja cessação, em 21/05/2010, decorreu de seu falecimento.
- A postulante já houvera ajuizado perante a 2ª Vara da Família e Sucessões de São Vicente –
SP, a ação nº 0015634-66.2010.8.26.0590, em face dos filhos do falecido segurado, cujo pedido
foi julgado procedente, para declarar a existência da união estável no período compreendido
entre 2000 e a data do falecimento.
- As provas produzidas nos autos conduzem à conclusão de que a parte autora e o falecido
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
segurado alternavam a moradia em imóveis distintos, situados na Rua Castelo Novo, no
município de São Vicente – SP.
- De acordo com a Súmula nº 382 do Supremo Tribunal Federal, a vida em comum sob o mesmo
teto, "more uxório", não é indispensável à caracterização do concubinato, sendo, ademais,
suficiente a prova testemunhal à comprovação da união estável. Precedentes.
- Na presente demanda, em audiência realizada em 07 de novembro de 2018, foram inquiridas
três testemunhas, que afirmaram que a parte autora e o falecido segurado eram vistos pela
sociedade local como se fossem casados, condição que se verificou até a data do falecimento.
- As afirmações de que a parte autora se manteve junto ao segurado até a data do falecimento
são respaldadas pela ficha de internação hospitalar, emitida em 19 de maio de 2010 (dois dias
antes do óbito), pela Secretaria Municipal de Saúde de São Vicente – SP, na qual consta a
assinatura da parte autora como responsável pelo paciente Daniel Benedicto da Conceição.
- Desnecessária a comprovação da dependência econômica, pois esta é presumida em relação
ao companheiro, segundo o art. 16, I, § 4º, da Lei de Benefícios.
- O termo inicial deve ser fixado na data do requerimento administrativo (22/07/2010), nos termos
do artigo 74, II da Lei nº 8.213/91. Deve ser respeitada a prescrição quinquenal, com efeitos
financeiros fixados a partir de 09 de abril de 2013.
- Conforme disposição inserta no art. 219 do Código de Processo Civil 1973 (atual art. 240 Código
de Processo Civil - Lei nº 13.105/2015), os juros de mora são devidos a partir da citação na
ordem de 6% (seis por cento) ao ano, até a entrada em vigor da Lei nº 10.406/02, após, à razão
de 1% ao mês, consonante com o art. 406 do Código Civil e, a partir da vigência da Lei nº
11.960/2009 (art. 1º-F da Lei 9.494/1997), calculados nos termos deste diploma legal.
- A correção monetária deve ser aplicada em conformidade com a Lei n. 6.899/81 e legislação
superveniente (conforme o Manual de Cálculos da Justiça Federal), observados os termos da
decisão final no julgamento do RE n. 870.947, Rel. Min. Luiz Fux.
- Os honorários advocatícios deverão ser fixados na liquidação do julgado, nos termos do inciso
II, do § 4º, c.c. §11, do artigo 85, do CPC/2015.
- Por se tratar de demanda aforada no Estado de São Paulo, o INSS é isento de custas e
despesas processuais, com respaldo na Lei Estadual nº 11.608/03.
- Matéria preliminar rejeitada.
- Apelação da parte autora a qual se dá provimento.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001018-26.2018.4.03.6141
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: MARIA APARECIDA TELES DE OLIVEIRA
Advogados do(a) APELANTE: DOUGLAS BLUM LIMA - SP242199-A, FELIPE FURTADO -
SP281672-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001018-26.2018.4.03.6141
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
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Advogados do(a) APELANTE: DOUGLAS BLUM LIMA - SP242199-A, FELIPE FURTADO -
SP281672-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação interposta em ação ajuizada por MARIA APARECIDA TELES DE OLIVEIRA
em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando o benefício de
pensão por morte, em decorrência do falecimento de Daniel Benedicto da Conceição, ocorrido em
21 de maio de 2010, com quem alega haver convivido em união estável.
A r. sentença recorrida julgou improcedente o pedido, ao reputar não comprovada a existência de
união estável havida entre a parte autora e o falecido segurado (id 54922140 – p. 1/4).
Em suas razões recursais, pugna a parte autora, preliminarmente, pela anulação da sentença.
Aduz que, conquanto a testemunha do juízo não houvesse comparecido à audiência de instrução
e julgamento, houve o julgamento antecipado da lide. No mérito, requer a reforma do decisum,
com o decreto de procedência do pleito, ao argumento de ter logrado comprovar a união estável
vivenciada com o segurado até a data de seu falecimento (id 54922143 – p. 1/7).
Sem contrarrazões.
Devidamente processado o recurso, subiram os autos a esta instância para decisão.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001018-26.2018.4.03.6141
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: MARIA APARECIDA TELES DE OLIVEIRA
Advogados do(a) APELANTE: DOUGLAS BLUM LIMA - SP242199-A, FELIPE FURTADO -
SP281672-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
DA MATÉRIA PRELIMINAR
Não merece prosperar a alegação de cerceamento de defesa suscitada pela parte autora em
suas razões recursais. Foi-lhe propiciada a produção de prova testemunhal, sendo que, em
audiência realizada em 07 de novembro de 2018, procedeu-se à oitiva, sob o crivo do
contraditório, de três testemunhas por ela arroladas.
Como testemunha do juízo, foi intimado o filho do falecido segurado, Daniel Benedito da
Conceição Filho, que não compareceu à audiência designada para o dia 29 de janeiro de 2019,
ocasião em que foi encerrada a instrução processual (id 54922139 – p. 1).
Por se tratar de testemunha do juízo, este tinha a prerrogativa de avaliar a conveniência de sua
oitiva para o desfecho da lide.
Tempestivo o recurso e respeitados os demais pressupostos de admissibilidade recursais, passo
ao exame da matéria objeto de devolução.
DA PENSÃO POR MORTE
O primeiro diploma legal brasileiro a prever um benefício contra as consequências da morte foi a
Constituição Federal de 1946, em seu art. 157, XVI. Após, sobreveio a Lei n.º 3.807, de 26 de
agosto de 1960 (Lei Orgânica da Previdência Social), que estabelecia como requisito para a
concessão da pensão o recolhimento de pelo menos 12 (doze) contribuições mensais e fixava o
valor a ser recebido em uma parcela familiar de 50% (cinquenta por cento) do valor da
aposentadoria que o segurado percebia ou daquela a que teria direito, e tantas parcelas iguais,
cada uma, a 10% (dez por cento) por segurados, até o máximo de 5 (cinco).
A Constituição Federal de 1967 e sua Emenda Constitucional n.º 1/69, também disciplinaram o
benefício de pensão por morte, sem alterar, no entanto, a sua essência.
A atual Carta Magna estabeleceu em seu art. 201, V, que:
"A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de
filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e
atenderá, nos termos da lei a:
V - pensão por morte do segurado, homem ou mulher, ao cônjuge ou companheiro e
dependentes, observado o disposto no § 2º."
A Lei n.º 8.213, de 24 de julho de 1991 e seu Decreto Regulamentar n.º 3048, de 06 de maio de
1999, disciplinaram em seus arts. 74 a 79 e 105 a 115, respectivamente, o benefício de pensão
por morte, que é aquele concedido aos dependentes do segurado, em atividade ou aposentado,
em decorrência de seu falecimento ou da declaração judicial de sua morte presumida.
Depreende-se do conceito acima mencionado que para a concessão da pensão por morte é
necessário o preenchimento de dois requisitos: ostentar o falecido a qualidade de segurado da
Previdência Social, na data do óbito e possuir dependentes incluídos no rol do art. 16 da
supracitada lei.
A qualidade de segurado, segundo Wladimir Novaes Martinez, é a:
"denominação legal indicativa da condição jurídica de filiado, inscrito ou genericamente atendido
pela previdência social. Quer dizer o estado do assegurado, cujos riscos estão
previdenciariamente cobertos." (Curso de Direito Previdenciário. Tomo II - Previdência Social.
São Paulo: LTr, 1998, p. 594).
Mantém a qualidade de segurado aquele que, mesmo sem recolher as contribuições, conserve
todos os direitos perante a Previdência Social, durante um período variável, a que a doutrina
denominou "período de graça", conforme o tipo de segurado e a sua situação, nos termos do art.
15 da Lei de Benefícios, a saber:
"Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício;
II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer
atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem
remuneração;
III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de
segregação compulsória;
IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso;
V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para
prestar serviço militar;
VI - até (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo."
É de se observar, ainda, que o § 1º do supracitado artigo prorroga por 24 (vinte e quatro) meses
tal período de graça aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses.
Em ambas as situações, restando comprovado o desemprego do segurado perante o órgão do
Ministério do Trabalho ou da Previdência Social, os períodos serão acrescidos de mais 12 (doze)
meses. A comprovação do desemprego pode se dar por qualquer forma, até mesmo oral, ou pela
percepção de seguro-desemprego.
Convém esclarecer que, conforme disposição inserta no § 4º do art. 15 da Lei nº 8.213/91, c.c. o
art. 14 do Decreto Regulamentar nº 3.048/99, com a nova redação dada pelo Decreto nº
4.032/01, a perda da qualidade de segurado ocorrerá no 16º dia do segundo mês seguinte ao
término do prazo fixado no art. 30, II, da Lei nº 8.212/91 para recolhimento da contribuição,
acarretando, consequentemente, a caducidade de todos os direitos previdenciários.
Conforme já referido, a condição de dependentes é verificada com amparo no rol estabelecido
pelo art. 16 da Lei de Benefícios, segundo o qual possuem dependência econômica presumida o
cônjuge, o(a) companheiro(a) e o filho menor de 21 (vinte e um) anos, não emancipado ou
inválido. Também ostentam a condição de dependente do segurado, desde que comprovada a
dependência econômica, os pais e o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21
(vinte e um) anos ou inválido.
De acordo com o § 2º do supramencionado artigo, o enteado e o menor tutelado são equiparados
aos filhos mediante declaração do segurado e desde que comprovem a dependência econômica.
DO CASO DOS AUTOS
O óbito de Daniel Benedicto da Conceição, ocorrido em 21 de maio de 2010, está comprovado
pela respectiva Certidão (id 54921995 – p. 11).
Também restou superado o requisito da qualidade de segurado. Consoante se infere das
informações constantes no extrato do Sistema Único de Benefícios - DATAPREV, o de cujus era
titular do benefício previdenciário de aposentadoria por invalidez (NB 32/0001034480), desde
08/05/1966, cuja cessação, em 21/05/2010, decorreu de seu falecimento (id 54921995 – p. 14).
A controvérsia cinge-se à comprovação da união estável vivenciada ao tempo do falecimento.
A esse respeito, os documentos que instruem a exordial indicam que, enquanto o de cujus tinha
por endereço a Rua Castelo Novo, nº 181, na Vila Margarida, em São Vicente – SP, a parte
autora estava a residir na mesma rua, porém, no número 37.
Com efeito, o extrato da Caixa Econômica Federal, emitido em 06/06/2008, a conta de energia
elétrica, pertinente a junho de 2010, indicam que, ao tempo do falecimento, Daniel Benedicto da
Conceição estava a residir na Rua Castelo Novo, nº 181, em São Vicente – SP.
Esta informação também restou consignada na Certidão de Óbito, na qual constou haver sido
esse seu último endereço.
A carta de exigências e a correspondência emitidas pela Previdência Social à parte autora, em 22
de julho de 2010 e, em 04 de novembro de 2010, respectivamente, indicam que àquele tempo
esta tinha por endereço a Rua Castelo Novo, nº 37, em São Vicente – SP (id 54921996 – p. 7).
A postulante, logo após o falecimento, em 22/07/2010, protocolizou administrativamente o pedido
de pensão por morte, o qual restou indeferido, ao fundamento de não ter sido comprovada a
dependência econômica (id 54921995 – p. 9).
Em razão disso, ajuizou perante a 2ª Vara da Família e Sucessões de São Vicente – SP, a ação
nº 0015634-66.2010.8.26.0590, em face dos filhos do falecido segurado, cujo pedido foi julgado
procedente, para declarar a existência da união estável no período compreendido entre 2000 e a
data do falecimento (id 54921998 – p. 1/15). Naquela ocasião, foram inquiridas três testemunhas,
que confirmaram o vínculo marital. Transcrevo, na sequência, parte do referido decisum:
“(...)
A prova coligida aos autos comprova que ela e o falecido efetivamente mantiveram união estável
durante anos e que esta somente foi dissolvida diante do óbito dele.
Os próprios requeridos confirmaram o relacionamento entre seu pai e a requerente, embora
tenham atribuído a esse relacionamento o status de amizade íntima ou namoro, mas não de
união estável, sob a alegação de que eles não moravam juntos.
A despeito da tese sustentada pelos requeridos, o conjunto probatório carreado aos autos
comprovou que o relacionamento entre a requerente e o falecido apresentava todos os requisitos
legais necessários para a configuração da união estável, a saber: convivência duradoura, pública
e contínua, estabelecida com o objetivo de constituição de família.
O ordenamento jurídico não traz a necessidade de convivência sob o mesmo teto para
caracterizar união estável. Pode o casal viver com as características more uxório, de forma
pública e duradoura, sem residirem na mesma casa.
(...)
Portanto, restou claro nos autos que embora a requerente e o falecido mantivessem suas
respectivas casas, ambos pernoitavam juntos com frequência, tratavam-se como marido e mulher
e nutriam um pelo outro intenso carinho, apresentando-se à sociedade como uma família (...)”.
Na exordial desta demanda, a postulante admite que, no início do relacionamento, eram apenas
vizinhos, porém, após aquele se tornar viúvo, passaram a conviver maritalmente, alternando a
moradia em casas situadas na mesma rua.
A este respeito, oportuno destacar que, de acordo com a Súmula nº 382 do Supremo Tribunal
Federal, "a vida em comum sob o mesmo teto, "more uxório", não é indispensável à
caracterização do concubinato", sendo, ademais, suficiente a prova testemunhal à comprovação
da união estável, conforme precedentes do Superior Tribunal de Justiça. Confira-se:
"PENSÃO POR MORTE. UNIÃO ESTÁVEL (DECLARAÇÃO). PROVA EXCLUSIVAMENTE
TESTEMUNHAL (POSSIBILIDADE). ARTS. 131 E 332 DO CÓD. DE PR. CIVIL (APLICAÇÃO).
1. No nosso sistema processual, coexistem e devem ser observados o princípio do livre
convencimento motivado do juiz e o princípio da liberdade objetiva na demonstração dos fatos a
serem comprovados (arts. 131 e 332 do Cód. de Pr. Civil).
2. Se a lei não impõe a necessidade de prova material para a comprovação tanto da convivência
em união estável como da dependência econômica para fins previdenciários, não há por que
vedar à companheira a possibilidade de provar sua condição mediante testemunhas,
exclusivamente.
3. Ao magistrado não é dado fazer distinção nas situações em que a lei não faz.
4. Recurso especial do qual se conheceu, porém ao qual se negou improvimento".
(STJ, 6ª Turma, RESP nº 783697, Rel. Min. Nilson Naves, j. 20/06/2006, DJU 20/06/2006)
"AÇÃO RESCISÓRIA. PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. COMPROVAÇÃO DA UNIÃO
ESTÁVEL. PROVA TESTEMUNHAL. CONCESSÃO. OFENSA LITERAL DE DISPOSIÇÃO
LEGAL. INEXISTÊNCIA. DECISÃO RESCINDENDA EM CONSONÂNCIA COM
JURISPRUDÊNCIA PACÍFICA DO STJ. ERRO DE FATO. MATÉRIA ESTRANHA À LIDE.
IMPOSSIBILIDADE. AÇÃO IMPROCEDENTE.
1. A decisão rescindenda entendeu que a legislação previdenciária não faz qualquer restrição
quanto à admissibilidade da prova testemunhal, para comprovação da união estável, com vista à
obtenção de benefício previdenciário.
2. Quanto à violação literal de dispositivo legal, constata-se a impossibilidade de rescisão do
julgado, uma vez que o relator decidiu a matéria baseado em posicionamento firme deste Tribunal
Superior, de que a prova testemunhal é sempre admissível, se a legislação não dispuser em
sentido contrário, e que a Lei nº 8.213/91 somente exige prova documental quando se tratar de
comprovação do tempo de serviço.
3. Aplica-se, à espécie, o entendimento desta Corte de Justiça, no sentido de que não cabe ação
rescisória, fundada em ofensa literal a disposição de lei, quando a decisão rescindenda estiver
em consonância com a jurisprudência pacífica do STJ.
(...)
5. Ação rescisória improcedente".
(AR nº 3.905/PE, 3ª Seção, Rel. Min. Campos Marques, DJe 01/08/2013).
Na presente ação, em audiência realizada em 07 de novembro de 2018, foram inquiridas três
testemunhas, que afirmaram que a parte autora e o falecido segurado eram vistos pela sociedade
local como se fossem casados, condição que se estendeu até a data do falecimento.
O depoente Jorge Luiz Barbosa afirmou ser vizinho da parte autora, por residirem em bairros
adjacentes, em São Vicente – SP. Porque ambos tinham afinidade por cachorros, acabaram se
conhecendo. Quando a conheceu, ela já convivia maritalmente com Daniel, tendo presenciado
que esta situação se prorrogou por cerca de três anos. Chegou a conversar com Daniel, que teria
confirmado a relação entre ambos.
A testemunha Lúcia Helena Alvarez Camargo afirmou ter sido inquilina da parte autora, em um
compartimento do imóvel situado na Rua Castelo Novo, nº 37, em São Vicente – SP. Esclareceu
que, conquanto ela mantivesse residência em um compartimento do mesmo imóvel, com
frequência, pernoitava no número 181 da mesma rua, onde morava Daniel Benedicto.
Acrescentou que ela cuidou dele e esteve a seu lado até a data do falecimento. Esclareceu, por
fim, que ela não era apenas “cuidadora” do de cujus, mas que se manteve a seu lado como se
fosse esposa e, como casados, eram vistos pelos moradores do bairro.
A testemunha Leonor Cândida de Moura afirmou ser vizinha da parte autora, em São Vicente –
SP, razão por que a conhece há cerca de quinze anos. Admitiu saber que tanto a parte autora
quanto Daniel possuíam casas distintas, situadas na mesma rua, sendo que, após o falecimento,
a autora prosseguiu morando no mesmo imóvel que pertencia ao de cujus, situado na Rua Monte
Novo, nº 181, onde, inclusive, mantém uma criação de cães. Esclareceu que Daniel ficou
bastante enfermo, vindo, na sequência a falecer, tendo estado a postulante ao seu lado até a data
do falecimento.
As afirmações de que a parte autora se manteve junto ao segurado até a data do falecimento são
respaldadas pela ficha de internação hospitalar, emitida em 19 de maio de 2010 (dois dias antes
do óbito), pela Secretaria Municipal de Saúde de São Vicente – SP, na qual consta a assinatura
da parte autora como responsável pelo paciente Daniel Benedicto da Conceição (id 54921999 –
p. 7).
Dentro deste quadro, desnecessária é a demonstração da dependência econômica, pois,
segundo o art. 16, I, § 4º, da Lei de Benefícios, a mesma é presumida em relação à companheira.
Em face de todo o explanado, a postulante faz jus ao benefício de pensão por morte.
CONSECTÁRIOS
TERMO INICIAL
O termo inicial do benefício de pensão por morte, segundo o art. 74 da Lei nº 8.213/91, com a
redação vigente ao tempo do falecimento, conferida pela Lei nº 9.528, de 10 de dezembro de
1997, seria o da data do óbito, caso requerido até trinta dias após a sua ocorrência, ou na data
em que fosse pleiteado, se transcorrido este prazo.
Na hipótese dos autos, tendo sido requerido o benefício após o lapso temporal de trinta dias, o
dies a quo deve ser a data do requerimento administrativo (22/07/2010), pois foi o momento em
que a Autarquia Previdenciária tomou conhecimento da pretensão da parte autora e ofereceu
resistência.
Deve ser respeitada a prescrição quinquenal, com efeitos financeiros fixados a partir de 09 de
abril de 2013.
JUROS DE MORA
Conforme disposição inserta no art. 219 do Código de Processo Civil 1973 (atual art. 240 Código
de Processo Civil - Lei nº 13.105/2015), os juros de mora são devidos a partir da citação na
ordem de 6% (seis por cento) ao ano, até a entrada em vigor da Lei nº 10.406/02, após, à razão
de 1% ao mês, consonante com o art. 406 do Código Civil e, a partir da vigência da Lei nº
11.960/2009 (art. 1º-F da Lei 9.494/1997), calculados nos termos deste diploma legal.
CORREÇÃO MONETÁRIA
A correção monetária deve ser aplicada em conformidade com a Lei n. 6.899/81 e legislação
superveniente (conforme o Manual de Cálculos da Justiça Federal), observados os termos da
decisão final no julgamento do RE n. 870.947, Rel. Min. Luiz Fux.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Com o advento do novo Código de Processo Civil, foram introduzidas profundas mudanças no
princípio da sucumbência, e em razão destas mudanças e sendo o caso de sentença ilíquida, a
fixação do percentual da verba honorária deverá ser definida somente na liquidação do julgado,
com observância ao disposto no inciso II, do § 4º c.c. § 11, ambos do artigo 85, do CPC/2015,
bem como o artigo 86, do mesmo diploma legal.
Os honorários advocatícios, a teor da Súmula 111 do E. STJ incidem sobre as parcelas vencidas
até a sentença de procedência; contudo, uma vez que a pretensão do segurado somente foi
deferida nesta sede recursal, a condenação da verba honorária incidirá sobre as parcelas
vencidas até a data da presente decisão ou acórdão, atendendo ao disposto no § 11 do artigo 85,
do CPC.
CUSTAS
Conquanto a Lei Federal nº 9.289/96 disponha no art. 4º, I, que as Autarquias são isentas do
pagamento de custas na Justiça Federal, seu art. 1º, §1º, delega à legislação estadual normatizar
sobre a respectiva cobrança nas causas ajuizadas perante a Justiça Estadual no exercício da
competência delegada. Note-se que, em se tratando das demandas aforadas no Estado de São
Paulo, tal isenção encontra respaldo na Lei Estadual nº 11.608/03 (art. 6º).
A isenção referidanão abrange as despesas processuais que houver efetuado, bem como,
aquelas devidas a título de reembolso à parte contrária, por força da sucumbência.
DA ANTECIPAÇÃO DA TUTELA
Por derradeiro, a hipótese da ação comporta a outorga de tutela específica nos moldes do art.
497 do Código de Processo Civil. Dessa forma, visando assegurar o resultado concreto buscado
na demanda e a eficiência da prestação jurisdicional, independentemente do trânsito em julgado,
determino seja enviado e-mail ao INSS - Instituto Nacional do Seguro Social, instruído com os
documentos da parte autora, a fim de serem adotadas as providências cabíveis ao cumprimento
desta decisão, para a implantação do benefício no prazo máximo de 20 (vinte) dias, fazendo
constar que se trata de pensão por morte, deferida a MARIA APARECIDA TELES DE OLIVEIRA,
com data de início do benefício - (DIB: 09/04/2013), em valor a ser calculado pelo INSS.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, rejeito a matéria preliminar e dou provimento à apelação da parte autora, para
reformar a sentença recorrida e julgar parcialmente procedente o pedido, deferindo-lhe o
benefício de pensão por morte, a contar da data do requerimento administrativo (22/04/2010),
respeitada a prescrição quinquenal, na forma da fundamentação. Honorários advocatícios
conforme o consignado. Concedo a tutela específica.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. ÓBITO EM 2010, NA VIGÊNCIA DA LEI Nº
8.213/91. PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA REJEITADA. QUALIDADE DE
SEGURADO. APOSENTADORIA AUFERIDA AO TEMPO DO ÓBITO. UNIÃO ESTÁVEL. INÍCIO
DE PROVA MATERIAL CORROBORADO POR TESTEMUNHAS. CONCESSÃO DO
BENEFÍCIO. TERMO INICIAL. CRITÉRIOS DE INCIDÊNCIA DOS JUROS DE MORA E DA
CORREÇÃO MONETÁRIA.
- Deve ser rejeitada a matéria preliminar. Por se tratar de testemunha do juízo, caberia ao
magistrado avaliar a conveniência de sua oitiva, para o desfecho da lide.
- O óbito de Daniel Benedicto da Conceição, ocorrido em 21 de maio de 2010, está corroborado
pela respectiva Certidão.
- Restou superado o requisito da qualidade de segurado. Consoante se infere das informações
constantes no extrato do Sistema Único de Benefícios - DATAPREV, o de cujus era titular do
benefício previdenciário de aposentadoria por invalidez (NB 32/0001034480), desde 08/05/1966,
cuja cessação, em 21/05/2010, decorreu de seu falecimento.
- A postulante já houvera ajuizado perante a 2ª Vara da Família e Sucessões de São Vicente –
SP, a ação nº 0015634-66.2010.8.26.0590, em face dos filhos do falecido segurado, cujo pedido
foi julgado procedente, para declarar a existência da união estável no período compreendido
entre 2000 e a data do falecimento.
- As provas produzidas nos autos conduzem à conclusão de que a parte autora e o falecido
segurado alternavam a moradia em imóveis distintos, situados na Rua Castelo Novo, no
município de São Vicente – SP.
- De acordo com a Súmula nº 382 do Supremo Tribunal Federal, a vida em comum sob o mesmo
teto, "more uxório", não é indispensável à caracterização do concubinato, sendo, ademais,
suficiente a prova testemunhal à comprovação da união estável. Precedentes.
- Na presente demanda, em audiência realizada em 07 de novembro de 2018, foram inquiridas
três testemunhas, que afirmaram que a parte autora e o falecido segurado eram vistos pela
sociedade local como se fossem casados, condição que se verificou até a data do falecimento.
- As afirmações de que a parte autora se manteve junto ao segurado até a data do falecimento
são respaldadas pela ficha de internação hospitalar, emitida em 19 de maio de 2010 (dois dias
antes do óbito), pela Secretaria Municipal de Saúde de São Vicente – SP, na qual consta a
assinatura da parte autora como responsável pelo paciente Daniel Benedicto da Conceição.
- Desnecessária a comprovação da dependência econômica, pois esta é presumida em relação
ao companheiro, segundo o art. 16, I, § 4º, da Lei de Benefícios.
- O termo inicial deve ser fixado na data do requerimento administrativo (22/07/2010), nos termos
do artigo 74, II da Lei nº 8.213/91. Deve ser respeitada a prescrição quinquenal, com efeitos
financeiros fixados a partir de 09 de abril de 2013.
- Conforme disposição inserta no art. 219 do Código de Processo Civil 1973 (atual art. 240 Código
de Processo Civil - Lei nº 13.105/2015), os juros de mora são devidos a partir da citação na
ordem de 6% (seis por cento) ao ano, até a entrada em vigor da Lei nº 10.406/02, após, à razão
de 1% ao mês, consonante com o art. 406 do Código Civil e, a partir da vigência da Lei nº
11.960/2009 (art. 1º-F da Lei 9.494/1997), calculados nos termos deste diploma legal.
- A correção monetária deve ser aplicada em conformidade com a Lei n. 6.899/81 e legislação
superveniente (conforme o Manual de Cálculos da Justiça Federal), observados os termos da
decisão final no julgamento do RE n. 870.947, Rel. Min. Luiz Fux.
- Os honorários advocatícios deverão ser fixados na liquidação do julgado, nos termos do inciso
II, do § 4º, c.c. §11, do artigo 85, do CPC/2015.
- Por se tratar de demanda aforada no Estado de São Paulo, o INSS é isento de custas e
despesas processuais, com respaldo na Lei Estadual nº 11.608/03.
- Matéria preliminar rejeitada.
- Apelação da parte autora a qual se dá provimento.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu rejeitar a matéria preliminar e dar provimento à apelação da parte autora,
nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
