Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5732479-07.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal INES VIRGINIA PRADO SOARES
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
31/07/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 12/08/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO - PENSÃO POR MORTE - PERÍCIA MÉDICA INDIRETA: NECESSIDADE -
CERCEAMENTO DE DEFESA - APELO DA PARTE AUTORA PROVIDO - SENTENÇA
DESCONSTITUÍDA.
1. Por ter sido a sentença proferida sob a égide do Código de Processo Civil de 2015 e, em razão
de sua regularidade formal, conforme certificado nos autos, a apelação interposta deve ser
recebida e apreciada em conformidade com as normas ali inscritas.
2. O benefício de pensão por morte independe de carência, devendo ser comprovados, para a
sua obtenção, (i) o óbito ou a morte presumida, (ii) a condição de segurado do falecido e (iii) a
condição de dependente do requerente.
3. E o artigo 16 da Lei nº 8.213/91 prevê três classes de dependentes (incisos I a III) - a primeira,
cuja dependência econômica é presumida; outras duas, cuja dependência depende de
comprovação (parágrafo 4º) -, estabelecendo, entre elas, uma hierarquia, segundo a qual a
existência de dependente de uma classe exclui, do direito às prestações, os das classes
seguintes (parágrafo 1º).
4. Havendo dúvida quanto à incapacidade laborativa do falecido no período entre a cessação das
contribuições e a data do óbito, e tendo a parte autora requerido expressamente a realização de
perícia indireta, é de ser dado provimento ao recurso, a fim de ser desconstituída a sentença, em
razão de cerceamento de defesa, para que seja reaberta a instrução.
5. Conforme entendimento do Egrégio Superior Tribunal de Justiça, "a legislação previdenciária
não exige início de prova material para comprovação de união estável, para fins de concessão de
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
benefício de pensão por morte, sendo bastante, para tanto, a prova testemunhal, uma vez que
não cabe ao julgador criar restrições quando o legislador assim não o fez" (REsp nº
1.824.663/SP, 2ª Turma, Relator Ministro Herman Benjamin, DJe 11/10/2019).
6. O julgamento antecipado da lide, sem a realização da prova requerida pela parte autora,
consubstanciou-se em evidente cerceamento do direito constitucional à ampla defesa (art. 5º, LV,
da CF/88).
7. Apelo provido. Sentença desconstituída.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5732479-07.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: M. D. S. B., EMANUELLE DOS SANTOS MOREIRA
REPRESENTANTE: AGNALDO DE MORAES BULGARIM, OLAIR JOSE RODRIGUES
MOREIRA
Advogado do(a) APELANTE: CLEBER RODRIGO MATIUZZI - SP211741-N,
Advogado do(a) APELANTE: CLEBER RODRIGO MATIUZZI - SP211741-N,
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5732479-07.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: M. D. S. B., EMANUELLE DOS SANTOS MOREIRA
REPRESENTANTE: AGNALDO DE MORAES BULGARIM, OLAIR JOSE RODRIGUES
MOREIRA
Advogado do(a) APELANTE: CLEBER RODRIGO MATIUZZI - SP211741-N,
Advogado do(a) APELANTE: CLEBER RODRIGO MATIUZZI - SP211741-N,
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
R E L A T Ó R I O
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): Trata-se de
apelação por M. S. B. e E. S. M. (menores impúberes) contra sentença que, nos autos da ação de
concessão de PENSÃO POR MORTE, em decorrência do óbito de sua mãe, Solange Aparecida
dos Santos, julgou IMPROCEDENTE o pedido, sob o fundamento de que houve perda da
condição de segurado.
Em suas razões de recurso, sustentam os autores:
- preliminarmente, a nulidade da sentença, tendo em vista o cerceamento de defesa, pelo
indeferimento do pedido de oitiva de testemunhas e de prova pericial, a fim de comprovar que a
de cujus estava incapacitada, e por isso não estava trabalhando;
-no mérito, pela reforma da r. sentença, para concessão do benefício pleiteado.
Sem contrarrazões, os autos foram remetidos a esta Corte Regional.
Parecer do Ministério Público Federal, opinando pela conversão do julgamento em diligência,
para realização de perícia em primeiro grau, ou pelo provimento do recurso, com a concessão do
benefício aos autores. (ID107381171).
É O RELATÓRIO.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5732479-07.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: M. D. S. B., EMANUELLE DOS SANTOS MOREIRA
REPRESENTANTE: AGNALDO DE MORAES BULGARIM, OLAIR JOSE RODRIGUES
MOREIRA
Advogado do(a) APELANTE: CLEBER RODRIGO MATIUZZI - SP211741-N,
Advogado do(a) APELANTE: CLEBER RODRIGO MATIUZZI - SP211741-N,
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
V O T O
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): Recebo a
apelação interposta sob a égide do Código de Processo Civil/2015, e, em razão de sua
regularidade formal, possível sua apreciação, nos termos do artigo 1.011 do Código de Processo
Civil.
O benefício de pensão por morte destina-se aos dependentes do segurado que falece, seja ele
aposentado ou não, devendo a sua concessão observar, por força do princípio tempus regit
actum, a legislação vigente à época do óbito.
Nos termos da Lei nº 8.213/91, em seus artigos 74 a 79, que regulam atualmente a pensão por
morte, esta independe de carência, devendo ser comprovados, para a sua obtenção, (i) o óbito ou
a morte presumida, (ii) a condição de segurado do falecido e (iii) a condição de dependente do
requerente.
O artigo 16 da Lei nº 8.213/91 prevê três classes de dependentes (incisos I a III) - a primeira, cuja
dependência econômica é presumida; outras duas, cuja dependência depende de comprovação
(parágrafo 4º) -, estabelecendo, entre elas, uma hierarquia, segundo a qual a existência de
dependente de uma classe exclui, do direito às prestações, os das classes seguintes (parágrafo
1º).
No caso dos autos, o óbito ocorreu em 29/09/2017 (ID 68663842).
Quanto à qualidade de segurado, consta do Extrato CNIS (ID 68663851) alguns recolhimentos
como facultativa, sendo o último deles relativo ao período de 01/02/2015 a 30/11/2015.
De outra parte, afirmam os autores que a de cujus estava com problemas psiquiátricos, razão
pela qual deixou de trabalhar e não mais contribuiu para o INSS, conforme demonstram
receituários médicos, petição inicial para obtenção de medicamentos junto à rede pública,
indicando que a falecida era portadora de depressão (ID 68663845; ID 68663844; ID 68663844).
Assim, entendo que os documentos antes arrolados, cotejados com a certidão de óbito, que
indica que a instituidora da pensão cometeu suicídio, servem como indício material de uma
possível incapacidade laboral.
E, ao julgar o feito, sem propiciar a realização da prova requerida, o Juízo "a quo" vulnerou o
princípio da ampla defesa, insculpido no artigo 5º da Constituição Federal, que diz:
LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são
assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.
Nesse sentido, confira-se o seguinte julgado desta Egrégia Corte Regional:
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. PERDA DA
QUALIDADE DE SEGURADO. PEDIDO DE PERICIA INDIRETA. APELAÇÃO DA PARTE
AUTORA PARCIALMENTE PROVIDA. SENTENÇA ANULADA.
1. Para a obtenção do benefício da pensão por morte, faz-se necessário a presença de dois
requisitos: qualidade de segurado e condição de dependência.
2. No que se refere à dependência econômica, é inconteste, pois, conforme demonstra a certidão
de casamento acostada e a certidão de nascimento os autores são esposa e filho do de cujus.
3. Desse modo, a sua dependência econômica com relação ao de cujus é presumida, nos termos
do § 4º, do artigo 16, da Lei nº 8.213/91, por se tratar de dependentes arrolados no inciso I do
mesmo dispositivo.
4. Por outro lado, a qualidade de segurado não restou comprovada, em consulta ao extrato do
sistema CNIS/DATAPREV, verifica-se que foi concedido judicialmente aposentadoria por
invalidez em 06/01/2016 a partir de 22/08/2013, entretanto foi cessada na mesma data.
5. Alega, entretanto, que o falecido fazia jus ao beneficio de auxilio doença ou aposentadoria por
invalidez.
6. Assim, o D. Juízo a quo, ao julgar antecipadamente a lide, impossibilitou a produção de prova
pericial essencial para a comprovação da incapacidade do falecido à época de sua última
contribuição.
7. Há necessidade, portanto, de realização de perícia médica indireta, por profissional que tenha
conhecimento técnico ou científico para tanto, a constatar se à época que o falecido parou de
trabalhar devido a doença incapacitante, o que se revela indispensável ao deslinde da questão.
8. Destarte, há que ser anulada a r. sentença, reabrindo-se a instrução processual, a fim de ser
realizada perícia médica indireta a apurar a efetiva incapacidade do de cujus e proferido, assim,
novo julgamento, com aplicação do disposto no art. 130 do Código de Processo Civil.
9. Assim, merece reparo a sentença proferida pelo órgão judicante singular, pois frustrada a
concretização do conjunto probatório, em decorrência da ausência da pericia indireta.
10. Apelação parcialmente provida.
(TRF 3ª Região, 7ª Turma, ApCiv 5556380-85.2019.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal
TORU YAMAMOTO, j. em 02/10/2019, Intimação via sistema DATA: 04/10/2019)
Desse modo, tendo os autores requerido, já na petição inicial, a realização de perícia indireta,
com vistas a comprovar o estado de saúde do de cujus no período entre o último recolhimento
(30/11/2015) e a data do óbito (29/09/2017), na medida em que, à míngua de outros elementos, a
prova pericial era essencial para a comprovação das alegações dos autores, o julgamento
antecipado da lide, sem a sua realização, consubstanciou-se em evidente cerceamento do direito
constitucional à ampla defesa.
Cabe lembrar, nesse sentido, anotação jurisprudencial dos ilustres Theotônio Negrão et alii, em
seu Código de Processo Civil e legislação processual em vigor (São Paulo, Saraiva, 2016, nota
"6" ao artigo 370 do CPC/2015, pág. 441):
"O indeferimento de realização de provas, possibilidade oferecida pelo art. 130 do CPC, não está
ao livre arbítrio do juiz, devendo ocorrer apenas, e de forma motivada, quando forem
dispensáveis e de caráter meramente protelatório" (STJ-1ª T., REsp 637.547, Min. José Delgado,
j. 10.8.04, DJU 13.9.04).
O julgamento antecipado da lide deve acontecer quando evidenciada a desnecessidade de
produção de prova; de outro modo, caracterizado fica o cerceamento de defesa" (RSTJ 48/405).
"Se a pretensão do autor depende da produção da prova requerida, esta não lhe pode ser
negada, nem reduzido o âmbito de seu pedido com um julgamento antecipado, sob pena de
configurar-se uma situação de autêntica denegação de Justiça" (RSTJ 21/416). No mesmo
sentido: RJM 189/95 (AP 1.0027.07.134463-7/001).
Logo, merece provimento a apelação dos autores para que, uma vez anulada a sentença, seja
reaberta a instrução a fim de que seja promovida, pelo juízo de origem, a determinação de
complementação da prova pela parte autora, com vistas a demonstrar a incapacidade laborativa
do de cujus no período que antecedeu o óbito, por meio da realização de perícia indireta.
Antes da realização de tal perícia, deve o juízo a quo intimar as partes para que ofereçam
quesitos e, e especial, a parte autora para que junte atestados médicos, prontuários de
internações hospitalares, resultados de exames e outros documentos hábeis a comprovar a
incapacidade laborativa do falecido, para que, à vista de tais documentos, o perito judicial possa
firmar uma conclusão segura acerca das condições laborais do de cujus no intervalo entre o
encerramento de suas contribuições (12/2005) até o óbito (09/2017).
Outrossim, deve ser oportunizada às partes a produção de prova testemunhal, se assim
entenderem necessário.
Por tais fundamento, DOU PROVIMENTO ao recurso da parte autora para desconstituir a r.
sentença, caracterizado o cerceamento de defesa, e determinar o retorno dos autos ao Juízo de
origem, para prosseguimento do feito, com a reabertura da instrução probatória, nos termos
expendidos.
É COMO VOTO.
/gabiv/...
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO - PENSÃO POR MORTE - PERÍCIA MÉDICA INDIRETA: NECESSIDADE -
CERCEAMENTO DE DEFESA - APELO DA PARTE AUTORA PROVIDO - SENTENÇA
DESCONSTITUÍDA.
1. Por ter sido a sentença proferida sob a égide do Código de Processo Civil de 2015 e, em razão
de sua regularidade formal, conforme certificado nos autos, a apelação interposta deve ser
recebida e apreciada em conformidade com as normas ali inscritas.
2. O benefício de pensão por morte independe de carência, devendo ser comprovados, para a
sua obtenção, (i) o óbito ou a morte presumida, (ii) a condição de segurado do falecido e (iii) a
condição de dependente do requerente.
3. E o artigo 16 da Lei nº 8.213/91 prevê três classes de dependentes (incisos I a III) - a primeira,
cuja dependência econômica é presumida; outras duas, cuja dependência depende de
comprovação (parágrafo 4º) -, estabelecendo, entre elas, uma hierarquia, segundo a qual a
existência de dependente de uma classe exclui, do direito às prestações, os das classes
seguintes (parágrafo 1º).
4. Havendo dúvida quanto à incapacidade laborativa do falecido no período entre a cessação das
contribuições e a data do óbito, e tendo a parte autora requerido expressamente a realização de
perícia indireta, é de ser dado provimento ao recurso, a fim de ser desconstituída a sentença, em
razão de cerceamento de defesa, para que seja reaberta a instrução.
5. Conforme entendimento do Egrégio Superior Tribunal de Justiça, "a legislação previdenciária
não exige início de prova material para comprovação de união estável, para fins de concessão de
benefício de pensão por morte, sendo bastante, para tanto, a prova testemunhal, uma vez que
não cabe ao julgador criar restrições quando o legislador assim não o fez" (REsp nº
1.824.663/SP, 2ª Turma, Relator Ministro Herman Benjamin, DJe 11/10/2019).
6. O julgamento antecipado da lide, sem a realização da prova requerida pela parte autora,
consubstanciou-se em evidente cerceamento do direito constitucional à ampla defesa (art. 5º, LV,
da CF/88).
7. Apelo provido. Sentença desconstituída.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma decidiu,
por unanimidade, dar provimento ao recurso dos autores, para desconstituir a sentença, nos
termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
