
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5085010-38.2024.4.03.9999
RELATOR: Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: FLORENTINO WERNECK DO AMARAL
Advogados do(a) APELADO: BRUNO BORGES SCOTT - SP323996-N, MARCOS JASOM DA SILVA PEREIRA - SP286251-N
OUTROS PARTICIPANTES:
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5085010-38.2024.4.03.9999
RELATOR: Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: FLORENTINO WERNECK DO AMARAL
Advogados do(a) APELADO: BRUNO BORGES SCOTT - SP323996-N, MARCOS JASOM DA SILVA PEREIRA - SP286251-N
R E L A T Ó R I O
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Trata-se de ação proposta por FLORENTINO WERNECK DO AMARAL em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando a concessão do benefício de pensão por morte.
Juntados procuração e documentos.
Deferido o pedido de gratuidade da justiça.
O INSS apresentou contestação.
Réplica da parte autora.
Foi realizada audiência de instrução e julgamento.
O MM. Juízo de origem julgou procedente o pedido.
Inconformada, a autarquia interpôs recurso de apelação alegando, em síntese, que não restaram comprovadas a união estável entre a parte autora e a falecida, nem a qualidade de segurada rural desta, sendo de rigor a improcedência da ação. Subsidiariamente, requer a alteração da DIB para a data do requerimento administrativo indeferido (11.07.2022).
Com contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5085010-38.2024.4.03.9999
RELATOR: Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: FLORENTINO WERNECK DO AMARAL
Advogados do(a) APELADO: BRUNO BORGES SCOTT - SP323996-N, MARCOS JASOM DA SILVA PEREIRA - SP286251-N
V O T O
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Em sede de Pensão por Morte devem-se demonstrar, basicamente, os seguintes requisitos: (a) qualidade de segurado do falecido, aposentado ou não; (b) dependência econômica do interessado, a teor do artigo 74 e seguintes da Lei 8.213/91.
Relativamente ao requisito da dependência econômica, verifica-se do inciso I, do artigo 16, da Lei 8.213/91, que o companheiro é beneficiário do Regime Geral de Previdência Social na condição de dependente do segurado. Ainda, determina o §4º do referido artigo que a sua dependência econômica é presumida:
"Art. 16 - São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:
I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido;
("omissis")
§ 4º - A dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I é presumida e a das demais deve ser comprovada.".
No caso, a parte autora alega que era companheiro da falecida, de modo que a dependência é presumida. Para isso, no entanto, necessária a comprovação da união estável entre eles.
Da análise dos autos, observa-se que foram trazidos documentos que podem ser considerados como início de prova material da referida convivência, haja vista: (i) as certidões de nascimento dos filhos em comum (páginas 01/03 - ID 295911574); e (ii) a certidão do casamento religioso (página 01 - ID 295911577).
Corroborando o início de prova material apresentado, a testemunha foi contundente em afirmar que a parte autora conviveu em união estável com a falecida por muitos anos, até o óbito dela.
Neste contexto, diante da suficiência de provas que atestam a existência de vida comum, restou comprovada a alegada união estável, sendo, portanto, presumida a dependência econômica da parte autora em relação à falecida.
Quanto ao requisito da qualidade de segurado, alega a parte autora que, apesar da ausência de anotações, a falecida sempre trabalhou nas lides rurais em regime de economia familiar, tendo exercido tal atividade até seu falecimento.
Conforme entendimento pacificado do C. Superior Tribunal de Justiça, cristalizado na Súmula 149, a comprovação da atividade rural requer a existência de início de prova material a ser corroborado pela prova testemunhal, sendo insuficiente a produção apenas desta última:
"A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção do benefício previdenciário".
Compulsando os autos, observa-se que foi anexado razoável início de prova material, consubstanciado: (i) na certidão de nascimento de um dos filhos, em que é qualificada como lavradora (página 01 - ID 295911574); (ii) no contrato de abertura de crédito rural firmado pela parte autora (páginas 01/02 - ID 295911578); (iii) no contrato de comodato de imóvel rural firmado pela parte autora (página 01 - ID 295911579); (iv) na declaração de aptidão ao Pronaf (páginas 01 - IDs 295911580 e 295912032); (v) na cédula de crédito rural (páginas 01/10 - ID 295911581); e (vi) no certificado de página 01 - ID 295912033.
Ressalte-se, por oportuno, que é possível que os documentos da parte autora sejam considerados como início de prova material do labor rural da falecida em regime de economia familiar, pois, devido às peculiaridades da vida campesina, tem-se admitido que nessas situações a condição de rurícola comprovada por documento pertencente ao marido seja estendida à esposa.
Nessa linha, julgados da Corte Superior:
"AGRAVO REGIMENTAL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. CERTIDÃO DE CASAMENTO ONDE CONSTA O MARIDO LAVRADOR. EXTENSÃO DA QUALIDADE DE TRABALHADOR RURAL EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR À ESPOSA. PRECEDENTES.
1. Conforme consignado na análise monocrática, consta dos autos a certidão de casamento da autora com o Sr. Sebastião Maurilio da Silva, já falecido, e lá qualificado como lavrador que, aliada à prova testemunhal, dão conta do exercício de atividade rural exercido em regime de economia familiar. Tal fato é reconhecido pela própria Corte.
2. Ora, se o Tribunal de origem reconheceu que há documento público do qual se consta como profissão do marido da autora lavrador e que houve testemunha para corroborar o depoimento da recorrente, não poderia ter decidido que "o Plano de Benefícios da Previdência Social, Lei n.º 8.213/91, não admite prova exclusivamente testemunhal para comprovação de tempo de serviço, dispondo em seu artigo 55, parágrafo 3º, que a prova testemunhal só produzirá efeito quando baseada em início de prova material." Isto, frise-se novamente, porque há certidão de casamento onde a profissão de seu falecido esposo como rurícola.
3. Com efeito, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça firmou-se no sentido de que o documento probante da situação de camponês do marido é extensível à esposa, ainda que desenvolva tarefas domésticas, ante a situação de campesinos comum ao casal.
4. Saliente-se, por fim, que não há violação do enunciado da Súmula 7/STJ quando a decisão desta Corte se fundamenta nas próprias premissas traçadas pela Corte de origem para fundamentar sua decisão.
Agravo regimental improvido.". (AgRg no REsp 1448931/SP, Rel. Ministro Humberto Martins, 2ª Turma, julgado em 27/05/2014, DJe 02/06/2014).
"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. CERTIDÃO DE CASAMENTO. EXTENSÃO À ESPOSA.
1. A jurisprudência do STJ há muito firmou entendimento de que, diante da dificuldade de comprovação da atividade rural, em especial da mulher, há de se presumir que, se o marido desempenha este tipo de labor, a esposa também o fazia, em razão das características da atividade.
2. A execução em maior parte de tarefas domésticas pela autora não é óbice para a concessão da aposentadoria rural, visto a situação de campesinos comum ao casal.
3. Precedente: "Verificando-se, na certidão de casamento, a profissão de rurícola do marido, e de se considerar extensível a profissão da mulher, apesar de suas tarefas domésticas, pela situação de campesinos comum ao casal." (EREsp 137697/SP, Rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, Terceira Seção, julgado em 13.5.1998, DJ 15.6.1998, p. 12.) Agravo regimental improvido." (AgRg no REsp 1309123/SP, Rel. Ministro Humberto Martins, 2ª Turma, julgado em 08/05/2012, DJe 15/05/2012).
Consoante a Súmula 149/STJ, para a comprovação da atividade rurícola, indispensável que o início de prova material verificado seja ratificado pela prova testemunhal, uma vez que nenhuma delas é suficiente para, por si só, demonstrar o preenchimento do requisito.
No caso, o depoimento da testemunha corroborou o alegado, afirmando que a falecida trabalhava junto com a parte autora, em regime de economia familiar, na propriedade do sogro, no cultivo de milho, feijão e arroz, tendo exercido tal atividade até data próxima ao seu falecimento.
Observa-se, assim, que a prova testemunhal ratificou o início de prova material, pelo quê entende-se comprovado o trabalho rural da falecida em regime de economia familiar e sua condição de segurada especial à época do óbito.
Conclui-se, portanto, pelo preenchimento de todos os requisitos ensejadores da pensão por morte, de modo que a parte autora faz jus ao benefício, sendo de rigor a manutenção da r. sentença neste ponto.
No que tange à data de início do benefício, com razão o INSS.
O termo inicial deve ser fixado na data do requerimento administrativo do benefício de pensão por morte (11.07.2022), nos termos do artigo 74, II, da Lei nº 8.213/91, e não do requerimento de aposentadoria por idade rural conforme fixado pela r. sentença (12.05.2021).
A correção monetária deverá incidir sobre as prestações em atraso desde as respectivas competências e os juros de mora desde a citação, observada eventual prescrição quinquenal, nos termos do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, aprovado pela Resolução nº 784/2022 (que já contempla a aplicação da Selic, nos termos do artigo 3º da Emenda Constitucional nº 113/2021), do Conselho da Justiça Federal (ou aquele que estiver em vigor na fase de liquidação de sentença). Os juros de mora deverão incidir até a data da expedição do PRECATÓRIO/RPV, conforme entendimento consolidado pela colenda 3ª Seção desta Corte. Após a devida expedição, deverá ser observada a Súmula Vinculante 17.
Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação do INSS, tão somente para alterar o termo inicial do benefício para a data do requerimento administrativo de pensão por morte (11.07.2022), fixando, de ofício, os consectários legais na forma acima explicitada.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. QUALIDADE DE DEPENDENTE. UNIÃO ESTÁVEL COMPROVADA. QUALIDADE DE SEGURADO. ATIVIDADE RURAL DEMONSTRADA. REQUISITOS PREENCHIDOS. BENEFÍCIO DEVIDO. TERMO INICIAL FIXADO NA DATA DO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDA. CONSECTÁRIOS LEGAIS FIXADOS DE OFÍCIO.
1. Nos termos dos artigos 74 e 26 da Lei 8.213/91, a pensão por morte é devida ao conjunto dos dependentes do segurado que falecer, aposentado ou não, independentemente de carência.
2. Em face dos ditames do artigo 16 da Lei 8.213/91, a dependência econômica do companheiro é presumida.
3. Demonstrada a alegada união estável entre a parte autora e a falecida, estando satisfeito o requisito da qualidade de dependente.
4. O trabalho rural em regime de economia familiar e a condição de segurada especial da falecida foram comprovados através de início de prova material corroborado por prova testemunhal.
5. Preenchidos os requisitos necessários à concessão do benefício, faz jus a parte autora ao recebimento da pensão por morte.
6. O termo inicial deve ser fixado na data do requerimento administrativo do benefício de pensão por morte (11.07.2022), nos termos do artigo 74, II, da Lei nº 8.213/91, e não do requerimento de aposentadoria por idade rural conforme fixado pela r. sentença (12.05.2021).
7. A correção monetária deverá incidir sobre as prestações em atraso desde as respectivas competências e os juros de mora desde a citação, observada eventual prescrição quinquenal, nos termos do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, aprovado pela Resolução nº 784/2022 (que já contempla a aplicação da Selic, nos termos do artigo 3º da Emenda Constitucional nº 113/2021), do Conselho da Justiça Federal (ou aquele que estiver em vigor na fase de liquidação de sentença). Os juros de mora deverão incidir até a data da expedição do PRECATÓRIO/RPV, conforme entendimento consolidado pela colenda 3ª Seção desta Corte. Após a devida expedição, deverá ser observada a Súmula Vinculante 17.
8. Apelação do INSS parcialmente provida. Fixados, de ofício, os consectários legais.
ACÓRDÃO
DESEMBARGADOR FEDERAL
