Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5070354-86.2018.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal GILBERTO RODRIGUES JORDAN
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
08/05/2019
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 10/05/2019
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. TRABALHADOR URBANO. ÚLTIMA
CONTRIBUIÇÃO EM OUTUBRO DE 2010. ÓBITO EM OUTUBRO DE 2013, NA VIGÊNCIA DA
LEI Nº 8213/91. FILHA MENOR DE 21 ANOS. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA PRESUMIDA.
DOENÇA INCAPACITANTE. PERÍCIA MÉDICA INDIRETA. ECLOSÃO DA ENFERMIDADE
APÓS A PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADO. INAPLICÁVEL O ARTIGO 102, §2º DA LEI
DE BENEFÍCIOS.
- O óbito de Decimar da Silva Cardoso, ocorrido em 30 de outubro de 2013, está comprovado
pela respectiva Certidão.
- A dependência econômica do filho menor de 21 anos é presumida, segundo o art. 16, I, § 4º, da
Lei de Benefícios.
- Entre a data da cessação do último contrato de trabalho e o óbito, transcorreram mais de 03
(três) anos, acarretando a perda da qualidade de segurado, nos termos do art. 15, II da Lei de
Benefícios, ante a não incidência à espécie das ampliações do período de graça previstas nos
§§1º e 2º do aludido dispositivo legal (contribuições por mais de 120 meses e recebimento de
seguro- desemprego).
- Os laudos de perícia médica indireta conquanto tivessem apontado que o de cujus era portador
de doença incapacitante, não foram conclusivos em demonstrar se a enfermidade tivesse
eclodido quando ainda ostentada a qualidade de segurado.
- Inaplicável à espécie o teor do artigo 102, § 2º da Lei de Benefícios, porquanto não
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
demonstrado que o de cujus fizesse jus a qualquer espécie de benefício previdenciário.
- Honorários advocatícios majorados ante a sucumbência recursal, observando-se o limite legal,
nos termos do §§ 2º e 11 do art. 85 do CPC/2015.
- Apelação da parte autora a qual se nega provimento.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5070354-86.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: ANA NOEMI SILVA CARDOSO
REPRESENTANTE: FRANCISCA DA SILVA PEREIRA
Advogados do(a) APELANTE: ALESSANDRO APARECIDO HERMINIO - SP143517-N,
EMERSON RODRIGO FARIA - SP360195-N,
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5070354-86.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: ANA NOEMI SILVA CARDOSO
REPRESENTANTE: FRANCISCA DA SILVA PEREIRA
Advogados do(a) APELANTE: ALESSANDRO APARECIDO HERMINIO - SP143517-N,
EMERSON RODRIGO FARIA - SP360195-N,
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação interposta em ação ajuizada por ANA NOEMI SILVA CARDOSO (incapaz)
em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando o benefício de
pensão por morte, em decorrência do falecimento de seu genitor, Decimar da Silva Cardoso,
ocorrido em 30 de outubro de 2013.
A r. sentença recorrida julgou improcedente o pedido, ao reputar não comprovada a qualidade de
segurado do de cujus (id 8138831 – p. 1/2).
Em suas razões recursais, pugna a parte autora pela reforma da sentença, com o decreto de
procedência do pleito, ao argumento de que restaram preenchidos os requisitos necessários à
concessão do benefício. Sustenta que Decimar da Silva Cardoso padecia de grave doença
incapacitante (AIDS), o que estaria a lhe conferir a qualidade de segurado ao tempo do óbito,
porquanto preenchia os requisitos necessários ao deferimento de auxílio-doença ou
aposentadoria por invalidez (id 8138833 – p. 1/3).
Sem contrarrazões.
Devidamente processado o recurso, subiram os autos a esta instância para decisão.
Parecer do Ministério Público Federal, em que se manifesta pelo não conhecimento do recurso de
apelação interposto pela parte autora, por não preencher os pressupostos de admissibilidade
recursal (id 38753769 – p. 1/5).
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5070354-86.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: ANA NOEMI SILVA CARDOSO
REPRESENTANTE: FRANCISCA DA SILVA PEREIRA
Advogados do(a) APELANTE: ALESSANDRO APARECIDO HERMINIO - SP143517-N,
EMERSON RODRIGO FARIA - SP360195-N,
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
V O T O
Tempestivo o recurso e respeitados os demais pressupostos de admissibilidade recursais, passo
ao exame da matéria objeto de devolução.
DA PENSÃO POR MORTE
O primeiro diploma legal brasileiro a prever um benefício contra as consequências da morte foi a
Constituição Federal de 1946, em seu art. 157, XVI. Após, sobreveio a Lei n.º 3.807, de 26 de
agosto de 1960 (Lei Orgânica da Previdência Social), que estabelecia como requisito para a
concessão da pensão o recolhimento de pelo menos 12 (doze) contribuições mensais e fixava o
valor a ser recebido em uma parcela familiar de 50% (cinquenta por cento) do valor da
aposentadoria que o segurado percebia ou daquela a que teria direito, e tantas parcelas iguais,
cada uma, a 10% (dez por cento) por segurados, até o máximo de 5 (cinco).
A Constituição Federal de 1967 e sua Emenda Constitucional n.º 1/69, também disciplinaram o
benefício de pensão por morte, sem alterar, no entanto, a sua essência.
A atual Carta Magna estabeleceu em seu art. 201, V, que:
"A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de
filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e
atenderá, nos termos da lei a:
V - pensão por morte do segurado, homem ou mulher, ao cônjuge ou companheiro e
dependentes, observado o disposto no § 2º."
A Lei n.º 8.213, de 24 de julho de 1991 e seu Decreto Regulamentar n.º 3048, de 06 de maio de
1999, disciplinaram em seus arts. 74 a 79 e 105 a 115, respectivamente, o benefício de pensão
por morte, que é aquele concedido aos dependentes do segurado, em atividade ou aposentado,
em decorrência de seu falecimento ou da declaração judicial de sua morte presumida.
Depreende-se do conceito acima mencionado que para a concessão da pensão por morte é
necessário o preenchimento de dois requisitos: ostentar o falecido a qualidade de segurado da
Previdência Social, na data do óbito e possuir dependentes incluídos no rol do art. 16 da
supracitada lei.
A qualidade de segurado, segundo Wladimir Novaes Martinez, é a:
"denominação legal indicativa da condição jurídica de filiado, inscrito ou genericamente atendido
pela previdência social. Quer dizer o estado do assegurado, cujos riscos estão
previdenciariamente cobertos." (Curso de Direito Previdenciário. Tomo II - Previdência Social.
São Paulo: LTr, 1998, p. 594).
Mantém a qualidade de segurado aquele que, mesmo sem recolher as contribuições, conserve
todos os direitos perante a Previdência Social, durante um período variável, a que a doutrina
denominou "período de graça", conforme o tipo de segurado e a sua situação, nos termos do art.
15 da Lei de Benefícios, a saber:
"Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício;
II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer
atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem
remuneração;
III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de
segregação compulsória;
IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso;
V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para
prestar serviço militar;
VI - até (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo."
É de se observar, ainda, que o § 1º do supracitado artigo prorroga por 24 (vinte e quatro) meses
tal período de graça aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses.
Em ambas as situações, restando comprovado o desemprego do segurado perante o órgão do
Ministério do Trabalho ou da Previdência Social, os períodos serão acrescidos de mais 12 (doze)
meses. A comprovação do desemprego pode se dar por qualquer forma, até mesmo oral, ou pela
percepção de seguro-desemprego.
Convém esclarecer que, conforme disposição inserta no § 4º do art. 15 da Lei nº 8.213/91, c.c. o
art. 14 do Decreto Regulamentar nº 3.048/99, com a nova redação dada pelo Decreto nº
4.032/01, a perda da qualidade de segurado ocorrerá no 16º dia do segundo mês seguinte ao
término do prazo fixado no art. 30, II, da Lei nº 8.212/91 para recolhimento da contribuição,
acarretando, consequentemente, a caducidade de todos os direitos previdenciários.
Conforme já referido, a condição de dependentes é verificada com amparo no rol estabelecido
pelo art. 16 da Lei de Benefícios, segundo o qual possuem dependência econômica presumida o
cônjuge, o(a) companheiro(a) e o filho menor de 21 (vinte e um) anos, não emancipado ou
inválido. Também ostentam a condição de dependente do segurado, desde que comprovada a
dependência econômica, os pais e o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21
(vinte e um) anos ou inválido.
De acordo com o § 2º do supramencionado artigo, o enteado e o menor tutelado são equiparados
aos filhos mediante declaração do segurado e desde que comprovem a dependência econômica.
DO CASO DOS AUTOS
O óbito de Decimar da Silva Cardoso, ocorrido em 30 de outubro de 2013, está comprovado pela
respectiva Certidão (id 8138831 – p. 1/2).
A Certidão de Nascimento (id 8138573 – p. 1) evidencia que, por ocasião do falecimento do
genitor, a postulante, nascida em 14/05/2002, era menor absolutamente incapaz, sendo
desnecessária a demonstração da dependência econômica, pois, segundo o art. 16, I, § 4º, da Lei
de Benefícios, a mesma é presumida em relação ao filho não emancipado, de qualquer condição,
menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o
torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente.
As anotações lançadas na CTPS (id 8138577 - p. 1/23) evidenciam que o último contrato de
trabalho do falecido havia cessado em 01 de outubro de 2010. Dentro deste quadro, à mingua de
qualquer causa de ampliação prevista pelo artigo 15, §§ 1º e 2º da Lei nº 8.213/91, a qualidade de
segurado do de cujus foi ostentada até 15 de dezembro de 2011, não abrangendo, portanto, à
época do falecimento (30/10/2013).
No que tange à alegação de que o de cujus padecia de grave doença incapacitante, foi propiciada
a realização de perícia médica indireta.
Nos respectivos laudos periciais (id 8138811 – p. 2/6 e 8138822 – p. 1/3), a expert concluiu que
Decimar da Silva Cardoso foi diagnosticado como portador do vírus H.I.V. nos últimos meses de
vida, conforme consignou no item “Comentários/Conclusão”:
“(...) documentos médicos disponibilizados não atestam incapacidade laborativa à época de sua
última demissão, nem em período imediatamente posterior: ele apenas fez controle pressórico
entre junho e setembro de 2011, devido crise hipertensiva, bem como, não há dados de consultas
médicas em 2012.
Quanto ao ano de 2013, as fichas médicas disponibilizadas atestam que o de cujus começou a
procurar atendimentos em setembro, quando as queixas incluíam queda abrupta do peso corporal
(30 Kg em poucos meses), além de fraqueza, inapetência e redução da força muscular – dados
compatíveis com infecção do HIV em progressão aguda.Não há qualquer dado médico apontando
a infecção em anos anteriores (...)".
No laudo pericial complementar, acrescentou:
“(...) Não há como determinar a data de contágio por HIV, a não ser que seja apresentada alguma
testemunha que possa ter presenciado o ato de contaminação (usando droga com seringa
contaminada, participando de relação sexual com indivíduo soropositivo, etc.).
Em outras palavras, conquanto reste incontroverso que o de cujus estivesse acometido por
doença incapacitante, ressentem-se os autos de prova documental a indicar que a enfermidade
tivesse eclodido em período em que ele ainda ostentava a qualidade de segurado.
Importa consignar que mesmo não sendo comprovada a qualidade de segurado do instituidor, se
esse já houvesse preenchido na data do óbito os requisitos para a concessão de aposentadoria, a
requerente fariam jus ao benefício, nos termos do § 2º do art. 102 da Lei n.º 8.213/91.
Contudo, nada veio a demonstrar nos autos que no momento do falecimento Decimar da Silva
Cardoso fizesse jus a alguma espécie de benefício, porquanto não houvera completado a idade
mínima para a aposentadoria por idade (faleceu com 40 anos). Tampouco se produziu nos autos
prova de que estava incapacitado ao trabalho enquanto ostentava a qualidade de segurado,
afastando o reconhecimento de aposentadoria por invalidez, bem como não logrou comprovar o
período mínimo de trabalho exigido em lei para a concessão de aposentadoria por tempo de
serviço, ainda que na modalidade proporcional.
Nesse contexto, se torna inviável o acolhimento do pedido, sendo de rigor a manutenção do
decreto de improcedência do pleito.
Em razão da sucumbência recursal, majoro em 100 % os honorários fixados em sentença,
observando-se o limite máximo de 20% sobre o valor da causa, a teor dos §§ 2º e 11 do art. 85
do CPC/2015, ficando suspensa sua execução, em razão de ser beneficiário da Justiça Gratuita,
enquanto persistir sua condição de miserabilidade.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, nego provimento à apelação da parte autora e, em razão da sucumbência
recursal, majoro em 100% os honorários fixados em sentença, observando-se o limite máximo de
20% sobre o valor da causa, a teor dos §§ 2º e 11 do art. 85 do CPC/2015.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. TRABALHADOR URBANO. ÚLTIMA
CONTRIBUIÇÃO EM OUTUBRO DE 2010. ÓBITO EM OUTUBRO DE 2013, NA VIGÊNCIA DA
LEI Nº 8213/91. FILHA MENOR DE 21 ANOS. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA PRESUMIDA.
DOENÇA INCAPACITANTE. PERÍCIA MÉDICA INDIRETA. ECLOSÃO DA ENFERMIDADE
APÓS A PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADO. INAPLICÁVEL O ARTIGO 102, §2º DA LEI
DE BENEFÍCIOS.
- O óbito de Decimar da Silva Cardoso, ocorrido em 30 de outubro de 2013, está comprovado
pela respectiva Certidão.
- A dependência econômica do filho menor de 21 anos é presumida, segundo o art. 16, I, § 4º, da
Lei de Benefícios.
- Entre a data da cessação do último contrato de trabalho e o óbito, transcorreram mais de 03
(três) anos, acarretando a perda da qualidade de segurado, nos termos do art. 15, II da Lei de
Benefícios, ante a não incidência à espécie das ampliações do período de graça previstas nos
§§1º e 2º do aludido dispositivo legal (contribuições por mais de 120 meses e recebimento de
seguro- desemprego).
- Os laudos de perícia médica indireta conquanto tivessem apontado que o de cujus era portador
de doença incapacitante, não foram conclusivos em demonstrar se a enfermidade tivesse
eclodido quando ainda ostentada a qualidade de segurado.
- Inaplicável à espécie o teor do artigo 102, § 2º da Lei de Benefícios, porquanto não
demonstrado que o de cujus fizesse jus a qualquer espécie de benefício previdenciário.
- Honorários advocatícios majorados ante a sucumbência recursal, observando-se o limite legal,
nos termos do §§ 2º e 11 do art. 85 do CPC/2015.
- Apelação da parte autora a qual se nega provimento.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto
que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
