
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0001523-57.2011.4.03.6106
RELATOR: Gab. 51 - DES. FED. FONSECA GONÇALVES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: LUIS PAULO SUZIGAN MANO - SP228284-N
APELADO: LUCI BORGES
Advogado do(a) APELADO: ALINE PEREIRA MARTINS DE ASSIS - SP238917-A
OUTROS PARTICIPANTES:
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0001523-57.2011.4.03.6106
RELATOR: Gab. 51 - DES. FED. FONSECA GONÇALVES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: LUIS PAULO SUZIGAN MANO - SP228284-N
APELADO: LUCI BORGES
Advogado do(a) APELADO: ALINE PEREIRA MARTINS DE ASSIS - SP238917-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação objetivando a concessão de benefício de pensão por morte a companheira.
O feito foi sentenciado.
Julgou-se parcialmente procedente o pedido, deferindo-se o benefício postulado à autora, a partir da data da citação.
O INSS e a autora apelaram da sentença e contra-arrazoaram o recurso da parte adversa.
Sobreveio decisão de grau, anulando os atos processuais praticados depois da contestação e determinando a inclusão dos filhos menores do falecido no polo passivo da ação, com o prosseguimento do feito a partir daí.
Baixados os autos e aditada a petição inicial, deferiu-se a inclusão dos filhos no polo passivo da demanda (Vera Lúcia Borges Caldeira, Aline Baitera Caldeira, Izabel Cristina Caldeira e Devanil Luis Caldeira Júnior), determinando-se a citação deles.
Com contestação do réu Devanil e decreto de revelia das demais rés incluídas, regularmente instruído o processo, proferiu-se nova sentença, que julgou parcialmente procedente o pedido, condenando a autarquia a pagar pensão por morte à autora, a partir data da citação.
O INSS interpôs, então, a apelação que está em apreço.
Nas razões recursais, alega, em síntese, não demonstrada a união estável afirmada na inicial, assim como não comprovada a qualidade de segurado do instituidor do benefício de que se cuida. Forte nisso, requer a reforma da sentença julgando-se improcedente o pedido.
Com contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0001523-57.2011.4.03.6106
RELATOR: Gab. 51 - DES. FED. FONSECA GONÇALVES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: LUIS PAULO SUZIGAN MANO - SP228284-N
APELADO: LUCI BORGES
Advogado do(a) APELADO: ALINE PEREIRA MARTINS DE ASSIS - SP238917-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O recurso preenche os pressupostos de admissibilidade; dele, pois, se conhece.
Para a concessão do benefício de pensão por morte é necessário o preenchimento dos seguintes requisitos: (I) o fato do óbito; (II) qualidade de dependente de quem pleiteia o benefício e (III) comprovação da qualidade de segurado do “de cujus” ou, em caso de perda da qualidade de segurado, o adimplemento dos requisitos para a concessão de aposentadoria (artigos 15 e 102 da Lei nº 8.213/91, com a redação dada pela Lei nº 9.528/97, e Lei nº 10.666/03).
No caso, demonstrou-se a morte do instituidor Devanil Luiz Caldeira em 25/04/2001 (ID 90305825 - Pág. 23), na vigência da Lei nº 8.213/91, a conter, em seu artigo 74, a previsão do benefício em disquisição, dispondo ser ele devido ao conjunto de dependentes do segurado que falecer, aposentado ou não.
A relação de dependência previdenciária, ditou-a o artigo 16 do mencionado compêndio, baixando rol no qual figura, para o que aqui interessa, no inciso I, a companheira, à qual se conferiu a presunção de dependência econômica (parágrafo 4º do citado versículo legal).
Quer dizer, companheira capta a indução legal de dependência econômica; é por isso que está dispensada de prová-la.
Mas a existência da união estável precisa ficar evidenciada.
Nos termos da lei civil, "é reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família" (artigo 1.723 do Código Civil).
Para efeitos previdenciários, companheira é a pessoa que, sem ser casada, mantém união estável com segurado ou segurada, de acordo com o artigo 226, § 3º, da Constituição Federal (artigo 16, §3º, da Lei nº 8.213/91).
Na hipótese dos autos, a autora sustenta ter mantido união estável com o falecido Devanil.
As provas coligidas dão conta de demonstrá-lo.
Segundo certidão de óbito apresentada (ID 90305817 - Pág. 20), ao falecer, Devanil residia na Rua Aparecida do Taboado, nº 3.291, em São José do Rio Preto/SP, e estava divorciado de Iara Tereza Camargo, com quem teve os filhos Izabel, Devanil e Aline. A certidão ainda aponta que o falecido deixou a filha de nome Vera, cuja mãe é a autora. De fato, no ID 90305817 - Pág. 26 está a certidão de nascimento de Vera Lúcia Borges Caldeira, filha da autora e Devanil, nascida em 22/04/1989.
Na declaração de ID 90305817 - Pág. 27, firmada por Devanil Luiz Caldeira em 28/09/1990, afirmou ele união estável com a autora desde junho de 1986; residiam, ambos, na Rua dos Catequistas, nº 223, em São José do Rio Preto.
O carnê de IPTU do ID 90305817 - Pág. 28, em nome da autora e relativo ao exercício de 2008, refere-se ao imóvel localizado na Rua dos Catequistas, nº 223.
No contrato de sociedade de ID 90305817 - Págs. 29-32, celebrado em 04/09/1992, consta para Devanil o endereço da Rua dos Catequistas, nº 223, São José do Rio Preto. No citado instrumento, o falecido qualifica-se solteiro.
Na ficha da Sociedade Mutuária Rio Preto Ltda. de ID 90305817 - Pág. 34, datada de 14/01/1995, indicou-se para a autora o estado civil de “amasiada”; Devanil está apontado como seu dependente, na qualidade de esposo. O endereço para ela referido no documento é o da Rua Fernandópolis, nº 2.364, em São José do Rio Preto.
No ano de 2001, quando Devanil faleceu, ainda figurava ele como beneficiário da autora, designado esposo, em plano de assistência familiar (ID 90305817 - Pág. 38).
Por meio do instrumento particular de transação de ID 90305817 - Págs. 39-41, firmado em 1998, Devanil e a autora declararam convivência por doze anos e dispuseram sobre bens.
De sua vez, a prova oral colhida em audiência realizada no dia 23/05/2012 corrobora a convivência alegada (ID 90305825 - Págs. 122-126 e ID 270651387 ao ID 270651397).
A autora, em depoimento pessoal, declarou que nunca foi casada. Disse que depois do falecimento do Devanil não viveu com ninguém. Relatou que quando sua filha Vera Lúcia nasceu, em 1987, já morava com Devanil. Permaneceram juntos até 2001, quando ele faleceu. Afirmou que não ficou separada de Devanil por nenhum período. Quando ele morreu, sua filha tinha onze anos. Tentou pedir pensão por morte em nome da filha. Um amigo ajudou a pedir, mas disse que não conseguiu porque Devanil não tinha contribuído por muito tempo. Quando faleceu, ele não estava trabalhando. Ele foi mandado embora em abril de 2000. Ele morreu em abril de 2001. Ele nunca foi registrado. Ele era vendedor de joias. Ele trabalhava para a Sarma, que era uma indústria de Rio Preto. Ele contribuiu por um tempo, mas foi pouco. Devanil era divorciado. Quando o conheceu, ele ainda vivia com a esposa. Quando Vera nasceu, já estava morando com Devanil, na casa da Rua dos Catequistas. Disse que conheceu Devanil em 1984. Teve a filha Vera Lúcia e depois adotou um menino. Referiu que a filha trabalha e ainda mora com ela. Devanil teve três filhos do primeiro casamento. Desse casamento ele tinha uma casa. Disse que a casa em que vive hoje, Devanil deixou para ela. Colocaram em nome da filha Vera Lúcia, com usufruto em favor dela, depoente. Quando conheceu Devanil, ele já trabalhava como vendedor para essa empresa Sarma. Ele recebia comissão. Pouco antes de falecer, eles tinham ajustado um salário para ele com uma pequena comissão. O salário era de dois mil e quinhentos reais. Devanil teve uma firma em nome dele, uma boate, mas foi por pouco tempo, um ano, um ano e pouco. Ele ficou com essa boate por uns seis meses. Afirmou que ele ficou doente e quem passou a tomar conta da boate foi o irmão dele. Muito tempo antes, no começo do relacionamento entre ambos, ele teve essa mesma boate com outras duas pessoas. Nessa época ele pagava INSS. Sabe que ele vendia para a Sarma, mas não tem conhecimento se ele vendia joias para outro fornecedor.
Vera Calmem Gomes, testemunha arrolada pela autora, disse tê-la conhecido quando o marido dela ficou doente. Ela pediu ajuda para cuidar dele. Isso foi em 2000. Falou que morava perto e ajudava na limpeza da casa para a autora cuidar do marido. Ia a cada dez ou quinze dias. Disse que a autora pagava pelo serviço. Não se lembra se a autora trabalhava. Devanil já estava acamado e não trabalhava. Antes desse trabalho não conhecia a autora. Falou que não continuou trabalhando para ela. Agora mora em outro lugar. Na casa morava a autora, o marido e a filha, Vera Lúcia, que era uma menina. Não tem certeza, mas acha que a casa da autora era alugada.
A testemunha Vaniusa Jacomeli de Souza, por sua vez, afirmou ser vendedora de roupas. Nunca vendeu joias. Disse que não tem loja. Conhece a autora porque ela mudou para perto de sua casa. A autora mudou-se para lá em 1995. Disse que a filha dela brincava com a sua. O pai da filha dela era o Devanil. Depois ela mudou dali. Ficou sabendo, depois de um tempo, que ele estava doente. A filha dela se chama Vera Lúcia. Quando se mudaram, em 1995, para aquela casa, foram os três. Sabe que Devanil era vendedor de joias. Nunca comprou nada dele. A autora era dona de casa. Não se lembra se ela trabalhava fora. Disse que não frequentava a casa dela. Só levava a filha para brincar. Não sabe se o marido da autora tinha alguma empresa.
Já a testemunha Cleuza da Silva Correia Paes disse que é costureira. Afirmou que conheceu a autora quando ela se mudou próxima a sua casa. Ela se mudou de lá em 1994. Ela morava com o marido e uma filha. Parece que ele tinha outros filhos. Soube, depois de um tempo, que o marido da autora faleceu. Afirmou que ele trabalhava com joias. A autora era do lar. Enquanto ela morou perto de sua casa, não trabalhou fora. A casa dela era alugada. Não sabe para onde ela se mudou. Disse que a autora era sua cliente de costura. O marido também encomendava camisas. Não sabe para qual empresa o marido da autora vendia joias. Parece que ele teve uma boate chamada Feitiço. Foi nessa época que eles moraram perto de sua casa. Sabe que o marido da autora sempre morou com ela.
Explica ROLF MADALENO: "Revestida dos caracteres de entidade familiar com proteção constitucional, a união estável está representada pela convivência de homem e mulher, podendo até não coabitarem, mas que, solteiros ou casados, desde que separados de fato ou judicialmente, divorciados ou viúvos, se apresente o casal aos olhos da sociedade como se fossem marido e mulher. Unidos pela inequívoca intenção de constituírem uma verdadeira família, a relação não precisa ter sua origem legal apenas no casamento, pois na relação informal estável entre o homem e a mulher é reconhecida uma entidade familiar, cujo conceito se estende também à comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes, conforme os §§ 3º e 4º, do artigo 226 da CF" ["A União (Ins)Estável (Relações Paralelas)", disponível no sítio do autor].
Nessa medida, havendo vida em comum que induz união estável, a dependência econômica é presumida.
Nesse sentido, segue julgado desta E. Corte:
“PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. REMESSA OFICIAL TIDA POR INTERPOSTA. PENSÃO POR MORTE. COMPANHEIRO. UNIÃO ESTÁVEL COMPROVADA. TERMO INICIAL.
I - Aplica-se ao presente caso o Enunciado da Súmula 490 do E. STJ, que assim dispõe: A dispensa de reexame necessário, quando o valor da condenação ou do direito controvertido for inferior a sessenta salários mínimos, não se aplica a sentenças ilíquidas.
II - Ante a comprovação da relação marital entre o autor e a falecida, há que se reconhecer a sua condição de dependente, sendo, pois, desnecessário trazer aos autos qualquer outra prova de dependência econômica, eis que esta é presumida, nos termos do § 4º, do artigo 16, da Lei nº 8.213/91, por se tratar de dependentes arrolados no inciso I do mesmo dispositivo.
III - A condição de segurada da falecida é incontroversa, tendo em vista que até o momento do óbito era beneficiária de auxílio-doença, conforme se infere do CNIS.
IV - Os juros de mora e a correção monetária deverão observar o disposto na Lei nº 11.960/09 (STF, Repercussão Geral no Recurso Extraordinário 870.947, 16.04.2015, Rel. Min. Luiz Fux).
V - Nos termos do caput do artigo 497 do Novo CPC, determinada a imediata implantação do benefício.
VI - Preliminar acolhida. Apelação do réu e remessa oficial tida por interposta parcialmente providas.”
(ApCiv 0013335-81.2016.4.03.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL SERGIO NASCIMENTO, TRF3 - DÉCIMA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA: 26/10/2016)
Está, portanto, exuberantemente comprovada a união estável entre a autora e Devanil Luiz Caldeira.
Sobra analisar qualidade de segurado do instituidor ao tempo do óbito.
Qualidade de segurado tem a ver com filiação. É a situação em que o sujeito se encontra perante a Previdência decorrente do regular recolhimento de contribuições, circunstância que lhe confere o atributo de desfrutar dos benefícios legalmente previstos ou de instituí-los. A Previdência Social é organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo. Nessa medida, é necessário conservar filiação para ter acesso a prestações previdenciárias ou gerá-las.
Qualidade de segurado se mantém enquanto os recolhimentos estão sendo efetuados ou, quando cessados, pelos prazos previstos no artigo 15 da Lei nº 8.213/91, o qual estabelece:
"Art. 15. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
(...)
II – até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem remuneração.
(...)
§1º O prazo do inciso II será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já tiver pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.
§2º Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.”
O extrato CNIS de ID 90305825 - Pág. 77 acusa, para Devanil, recolhimentos previdenciários, como contribuinte individual, de 01 a 03/1985 e, depois, em 06/2005 (posterior ao óbito).
A certidão de óbito de Devanil atribui a ele a profissão de autônomo (ID 90305825 - Pág. 23).
Já o CNIS de ID 90305825 - Pág. 78 demonstra recolhimentos como contribuinte individual, sob diferente número de inscrição, de 05/1986 a 06/1988, de 08/1988 a 02/1991 e de 04/1991 a 12/1993.
Devanil inscreveu-se no INSS como empresário em 09/12/1992 (ID 90305825 - Pág. 81).
Ao que consta dos documentos de ID 90305825 - Págs. 28-35, a partir de 1992 Devanil figurou como sócio da “Boite Brisa da Noite Ltda. ME”, empresa que em 1999 foi classificada “inapta” pela Receita Federal (ID 90305825 - Pág. 70).
Também vieram à baila cópias de peças extraídas de reclamação trabalhista aforada por Devanil Luiz Caldeira em face de “Sarma Indústria e Comércio Ltda.”
Nos citados autos, Devanil pediu o reconhecimento de vínculo empregatício mantido com a reclamada, na função de vendedor de joias, no período de 01/04/1996 a 31/05/2000 (ID 90305817 - Págs. 49-53).
As partes, no curso daquele processado, atravessaram termo de transação, que rogaram fosse homologada. Conquanto tenham convencionado o pagamento de valor, por parte da reclamada, para darem fim ao processo, deixaram expressa a inexistência do vínculo empregatício descrito na inicial (ID 90305817 - Págs. 62-63).
Referido acordo foi judicialmente homologado (ID 90305817 - Pág. 77).
Sabe-se que a situação de fato reconhecida na orla trabalhista não pode ser ignorada e projeta efeitos na tela previdenciária (TRF 3ª Região, ApCiv 0007735-55.2011.4.03.6119, Desembargador Federal BAPTISTA PEREIRA, TRF3 - DÉCIMA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:30/04/2013 e ApCiv 0044884-51.2012.4.03.9999, Desembargador Federal SERGIO NASCIMENTO, TRF3 - DÉCIMA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:15/05/2013).
É de considerar, porém, que a sentença trabalhista será considerada início de prova material se naquela seara judicial encontrarem-se documentos que atendam ao disposto no artigo 55, §3º, da Lei nº 8.213/91. Ela só, homologando acordo, sem se fazer acompanhar de nenhum indício de prova material (livro de registro, folha de ponto, assinaturas em papéis da empresa etc.) não possui o condão de transmudar em material o que não é.
Sem controvérsia real, resolvida a demanda trabalhista por acordo, no bojo da qual nenhum indício razoável de prova material foi coligido -- o que se repete nesta ação de natureza previdenciária --, a utilização desse título judicial como fragmento de prova para fins de obtenção de benefício previdenciário não satisfaz o comando do dispositivo legal mencionado.
A esse propósito, confira-se a jurisprudência:
“MANDADO DE SEGURANÇA. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. VÍNCULO EMPREGATÍCIO REGISTRADO EM CTPS DE FORMA EXTEMPORÂNEA. CONTRATO LABORAL RECONHECIDO POR SENTENÇA TRABALHISTA CONDENATÓRIA. EFICÁCIA PROBATÓRIA. CTPS. PRESUNÇÃO DE VERACIDADE. RESTABELECIMENTO DEVIDO. REMESSA NECESSÁRIA E APELAÇÃO DO INSS DESPROVIDAS.
(...)
5 - A celeuma cinge-se à possibilidade de utilização dos períodos laborais reconhecidos na esfera da Justiça do Trabalho.
6 - É cediço que a sentença trabalhista é admitida como início de prova material para fins previdenciários, contudo, o título judicial só pode ser considerado se fundado em elementos que demonstrem o labor exercido e os períodos alegados pelo trabalhador, nos termos do artigo 55, § 3º, da Lei nº 8.213/91, excetuado, portanto, os casos originados pela decretação da revelia da reclamada ou de acordo entre as partes, ante a inexistência de provas produzidas em Juízo.
(...)”
(ApReeNec 00082800420064036119, Desembargador Federal CARLOS DELGADO, TRF3 – SÉTIMA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:31/10/2017)
É assim que, tratando-se de sentença meramente homologatória – quer dizer, não baseada em análise da prova –, para servir à demonstração do tempo de serviço para os fins aqui pretendidos, havia de ser coadjuvada por outros quaisquer indícios materiais, um só que fosse, vestígio, entretanto, que aqui não se corporificou.
Importante ressaltar que, segundo se apurou, o processo trabalhista foi resolvido por acordo, sem qualquer revolvimento da prova, no bojo qual ambas as partes declararam a inexistência de vínculo empregatício. Isso faz concluir que o falecido Devanil trabalhou para a empresa reclamada como vendedor autônomo, profissão lançada na certidão de óbito, e a ele tocava, nessa condição, o recolhimento das contribuições previdenciárias correspondentes (artigo 12, V, g, e artigo 30, II, Lei nº 8.212/91).
O que se tem, então, é que Devanil verteu sua última contribuição previdenciária em 12/1993, mantendo qualidade de segurado até 15/02/1994, nos termos do artigo 15, II e §4º, da Lei nº 8.213/91.
A respeito do recolhimento realizado em 06/2005, constante do CNIS (ID 90305825 - Pág. 77), pondere-se que é inadmissível, para fim de obtenção de pensão por morte, recolhimento ou complementação post mortem de contribuições previdenciárias de contribuinte individual.
Nesse sentido é a jurisprudência do C. STJ, ao que se vê das seguintes ementas:
“PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. PENSÃO POR MORTE. IMPOSSIBILIDADE DE RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÕES POST MORTEM PARA FINS DE CONCESSÃO DE BENEFÍCIO. PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADO. IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DA PENSÃO. RECURSO DO INSS PROVIDO.
1. Nos termos do art. 74 da Lei 8.213/1991, a pensão por morte será devida ao conjunto dos dependentes do Segurado falecido, não sendo exigido o cumprimento de carência.
2. Para que seja concedida a pensão por morte, faz-se necessária a comprovação da condição de dependente, bem como a qualidade de Segurado, ao tempo do óbito, sendo imprescindível o recolhimento das contribuições respectivas pelo próprio Segurado, quando em vida, para que seus dependentes possam receber o benefício de pensão por morte; o que não é o caso dos autos.
3. Esta Corte firmou a orientação de que não há base legal para, pretendendo a parte a obtenção de pensão por morte, uma inscrição post mortem ou regularização das contribuições pretéritas não recolhidas em vida pelo de cujus.
4. Recurso Especial do INSS provido.”
(RESP 1574676, Relator(a) NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, STJ - Primeira Turma, DJE DATA:12/03/2019)
“PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. PENSÃO POR MORTE. TRABALHADOR URBANO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE SEGURADO DA PREVIDÊNCIA SOCIAL. REQUISITOS NÃO ATENDIDOS. BENEFÍCIO INDEVIDO. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO MANTIDA.
1. O reconhecimento do direito à pensão por morte pressupõe que a pessoa apontada como instituidora detenha, por ocasião do falecimento, a qualidade de segurado da Previdência Social ou tenha anteriormente preenchido os requisitos para a obtenção do benefício de aposentadoria.
2. O recorrente sustenta que o inadimplemento das contribuições não retira a qualidade de segurado obrigatório, mesmo decorrido o período de graça, requerendo seja reconhecido o direito de recolhimento post mortem das contribuições do de cujus.
3. O STJ firmou a tese, em Recurso Especial Repetitivo (REsp 1.110.565/SE), no sentido da impossibilidade de recolhimento pelos dependentes, para fins de concessão do benefício de pensão por morte, de contribuições vertidas após o óbito do instituidor, no caso de contribuinte individual.
4. O acórdão recorrido está em sintonia com o atual entendimento deste Tribunal Superior, razão pela qual não merece prosperar a irresignação. Incide, in casu, o princípio estabelecido na Súmula 83/STJ: ‘Não se conhece do Recurso Especial pela divergência, quando a orientação do Tribunal se firmou no mesmo sentido da decisão recorrida.’
5. Recurso Especial não conhecido.”
(RESP 1776395, Relator(a) HERMAN BENJAMIN, STJ - Segunda Turma, DJE DATA:19/12/2018)
Em suma, Devanil Luiz Caldeira não mais dispunha de qualidade de segurado em 25/04/2001, data em que morreu.
Dessa maneira, não tendo comprovado a autora filiação previdenciária do instituidor, improcede o pedido inicial.
Invertida a sucumbência, condeno a autora a pagar honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) do valor atualizado atribuído à causa, na forma do artigo 85 do CPC, cuja exigibilidade enfrenta a ressalva do artigo 98, § 3º, do mesmo diploma processual, por tratar-se de beneficiária da justiça gratuita.
Sem custas, ante a gratuidade deferida (art. 4º, II, da Lei nº 9.289/1996).
Diante do exposto, dou provimento à apelação do INSS, na forma da fundamentação.
Em virtude disso, revogo a tutela antecipada deferida em primeiro grau.
Informe-se ao INSS, via sistema, a respeito da presente decisão, com vistas à cessação do benefício implantado por força da antecipação de tutela ora revogada.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. UNIÃO ESTÁVEL COMPROVADA. RECLAMAÇÃO TRABALHISTA. RECOLHIMENTO POST MORTEM DE CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADO. BENEFÍCIO INDEVIDO. APELO PROVIDO.
- Para a concessão do benefício de pensão por morte é necessário o preenchimento dos seguintes requisitos: (i) fato do óbito; (ii) qualidade de dependente de quem requer o benefício e (ii) comprovação da qualidade de segurado do “de cujus” ou, em caso de perda da qualidade de segurado, o adimplemento dos requisitos para a concessão de aposentadoria (artigos 15 e 102 da Lei nº 8.213/91, com a redação dada pela Lei nº 9.528/97, e Lei nº 10.666/03).
- A relação de dependência previdenciária, ditou-a o artigo 16 da Lei nº 8.213/91, baixando rol no qual figura, para o que aqui interessa, no inciso I, a companheira, à qual se conferiu a presunção de dependência econômica (parágrafo 4º do citado versículo legal).
- Para efeitos previdenciários, companheira é a pessoa que, sem ser casada, mantém união estável com segurado ou segurada, de acordo com o artigo 226, § 3º, da Constituição Federal (artigo 16, §3º, da Lei nº 8.213/91).
- O artigo 16 da Lei nº 8.213/91, em seu § 5º, após modificação introduzida pela Medida Provisória nº 871/2019, convertida na Lei nº 13.846, de 18/06/2019, passou a exigir início de prova material recente (produzida em período não superior a 24 meses, antecedentes ao óbito), para fins de reconhecimento de união estável, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal. Tal regramento, todavia, não se aplica a óbitos anteriores à mencionada modificação legislativa.
- Relação afetiva a introverter vínculo estável e duradouro, com demonstração de convivência e coabitação, objetivando a constituição de família, caracteriza união estável.
- Presente a comprovação da união estável, reconhece-se a situação de dependência previdenciária necessária à concessão da pensão por morte perseguida.
- Qualidade de segurado tem a ver com filiação. É a situação em que o sujeito se encontra perante a Previdência decorrente do regular recolhimento de contribuições, circunstância que lhe confere o atributo de desfrutar dos benefícios legalmente previstos ou de instituí-los. A qualidade de segurado se mantém enquanto os recolhimentos estão sendo efetuados ou, quando cessados, pelos prazos previstos no artigo 15 da Lei nº 8.213/91.
- Sabe-se que a situação de fato reconhecida na orla trabalhista não pode ser ignorada e projeta efeitos na tela previdenciária. É de considerar, porém, que a sentença trabalhista será considerada início de prova material se naquela seara judicial encontrarem-se documentos que atendem ao disposto no artigo 55, §3º, da Lei nº 8.213/91. Ela só, homologando acordo, sem se fazer acompanhar de nenhum indício de prova material (livro de registro, folha de ponto, assinaturas em papéis da empresa etc.) não transmuda em material o que não é.
- O processo trabalhista foi resolvido por acordo, sem qualquer revolvimento da prova, no bojo qual ambas as partes declararam a inexistência de vínculo empregatício. Isso faz concluir que o falecido trabalhou para a empresa reclamada como vendedor autônomo e a ele tocava, nessa condição, o recolhimento das contribuições previdenciárias correspondentes (artigo 12, V, g, e artigo 30, II, Lei nº 8.212/91).
- Inadmissível, para fim de obtenção de pensão por morte, recolhimento ou complementação post mortem de contribuições previdenciárias de contribuinte individual (RESP 1574676, Relator(a) NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, STJ - Primeira Turma, DJE DATA:12/03/2019 e RESP 1776395, Relator(a) HERMAN BENJAMIN, STJ - Segunda Turma, DJE DATA:19/12/2018).
- Não demonstrada qualidade de segurado do instituidor ao tempo do óbito, o benefício postulado não é devido.
- Invertida a sucumbência, fica a autora condenada a pagar honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) do valor atualizado atribuído à causa, na forma do artigo 85 do CPC, cuja exigibilidade, porém, enfrenta a ressalva do artigo 98, § 3º, do mesmo diploma processual, por tratar-se de beneficiária da justiça gratuita. Sem custas, ante a gratuidade deferida.
- Apelo provido. Tutela antecipada revogada.