
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5013136-06.2022.4.03.6105
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ELIZABETH PRADO PINTO
Advogado do(a) APELADO: EDERSON DE SOUZA - SP343278-N
OUTROS PARTICIPANTES:
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5013136-06.2022.4.03.6105
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ELIZABETH PRADO PINTO
Advogado do(a) APELADO: EDERSON DE SOUZA - SP343278-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação interposta em face de sentença, não submetida a reexame necessário, que julgou procedente o pedido de pensão por morte à autora, desde a data do requerimento administrativo e de caráter vitalício, discriminados os consectários legais, antecipados os efeitos da tutela.
A Autarquia Previdenciária alega, em síntese, a não comprovação da condição de companheira da autora na data do óbito. Requer a reforma integral do julgado. Subsidiariamente, requer a alteração do termo inicial do benefício para a data da citação e, ainda: ''1. A observância da prescrição quinquenal; 2. Na hipótese de concessão de aposentadoria, a intimação da parte autora para firmar e juntar aos autos a autodeclaração prevista no anexo I da Portaria INSS nº 450, de 03 de abril de 2020, em observância às regras de acumulação de benefícios estabelecida no art. 24, §§ 1.º e 2.º da Emenda Constitucional 103/2019; 3. A fixação dos honorários advocatícios nos termos da Súmula 111 do STJ; 4. A declaração de isenção de custas e outras taxas judiciárias; 5. O desconto dos valores já pagos administrativamente ou de qualquer benefício inacumulável recebido no período e a cobrança de eventuais valores pagos em sede de antecipação dos efeitos da tutela posteriormente revogada."
Com contrarrazões, os autos subiram a esta Corte.
É o relatório.
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5013136-06.2022.4.03.6105
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ELIZABETH PRADO PINTO
Advogado do(a) APELADO: EDERSON DE SOUZA - SP343278-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Conheço do recurso, em razão da satisfação de seus requisitos.
Discute-se o preenchimento dos requisitos necessários à concessão do benefício de pensão por morte, previsto nos artigos 74 a 79 da Lei n. 8.213/1991, cujo texto original, alterado diversas vezes ao longo dos anos, vigora atualmente com a redação dada pela Lei n. 13.846/2019.
No entanto, em atenção ao princípio tempus regit actum, aplica-se, no tocante à concessão desse benefício previdenciário, a lei vigente à época do fato que o originou, qual seja, a da data do óbito.
De toda forma, são requisitos para a obtenção de pensão por morte: a condição de dependente e a qualidade de segurado do falecido.
Segundo o artigo 26, I, da Lei n. 8.213/1991, a concessão do benefício independe do cumprimento de período de carência, conquanto sua duração possa variar conforme a quantidade de contribuições recolhidas pelo instituidor, como previsto no artigo 77 da mesma lei.
Quanto à condição de dependente do segurado, o artigo 16 da Lei n. 8.213/1991 estabelece o rol dos beneficiários, divididos em três classes, e indica as hipóteses em que a dependência econômica é presumida e aquelas em que esta deverá ser comprovada. Vejamos (g. n.):
"Art. 16 - São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:
I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido;
(...)
§ 4º A dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I é presumida e a das demais deve ser comprovada."
Especificamente sobre a companheira, apesar de sua dependência econômica ser presumida, consoante dispõe o artigo 16, § 4º, da Lei n. 8.213/1991, é preciso, antes, perquirir a existência de seu pressuposto: a união estável.
Desse modo, não basta a afirmação da qualidade de companheira na data do óbito; faz-se necessário provar essa condição para que possa valer a presunção mencionada no dispositivo legal.
Nesse sentido, cito julgado desta Corte:
"PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. COMPANHEIRA. UNIÃO ESTÁVEL. COMPROVAÇÃO. DEPENDÊNCIA PRESUMIDA.
- Em decorrência do cânone tempus regit actum, resultam aplicáveis ao caso os ditames da Lei nº 8.213/91 e modificações subsequentes até então havidas, reclamando-se, à outorga do benefício de pensão por morte, a concomitância de dois pressupostos, tais sejam, ostentação pelo falecido de condição de segurado à época do passamento e a dependência econômica, figurando dispensada a comprovação de carência (artigo 26, inciso I, da Lei n° 8.213/91).
- Comprovada a união estável entre a autora e o segurado falecido, ao tempo do óbito, e sendo presumida sua dependência econômica, na qualidade de companheira, é devido o benefício de pensão por morte, a partir da data de entrada do requerimento administrativo.
- Verba honorária de sucumbência recursal majorada na forma do § 11 do art. 85 do NCPC.
- Antecipação de tutela concedida.
- Apelação do INSS parcialmente provida." (Proc. 5001766-09.2017.4.03.6104 – Rel. Des. Fed. Ana Pezarini, 9ª Turma, Publ.13/11/2018)
E não é só, com a edição da Medida Provisória n. 871/2019, publicada em 18/1/2019, posteriormente convertida na Lei n. 13.846/2019, exige-se início de prova material para comprovação de união estável, sendo insuficiente a prova exclusivamente testemunhal.
Antes dessa alteração legislativa, era possível, por construção jurisprudencial (Súmula n. 63 da Turma Nacional de Uniformização de Jurisprudência - TNU), a comprovação da união estável por prova exclusivamente testemunhal, porque semelhante disposição até então não havia.
É o que colhe expressamente do seguinte precedente do Superior Tribunal de Justiça (STJ):
“PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. UNIÃO ESTÁVEL. REEXAME DE PROVAS. IMPOSSIBILIDADE.
1. A jurisprudência desta Corte Superior tem prestigiado o entendimento de que, antes da Lei n. 13.846/2019, a legislação previdenciária não exigia início de prova material para a comprovação de união estável, para efeito de concessão de pensão por morte, considerando suficiente a apresentação de prova testemunhal, por não ser dado ao julgador adotar restrições não impostas pelo legislador.
2. Hipótese em que o Tribunal de origem, pautado no conjunto probatório dos autos, considerou indevida a concessão de pensão por morte, tendo em vista a falta de comprovação da união estável, até mesmo pela prova testemunhal, cuja inversão do julgado demandaria o reexame de prova, inviável em sede de recurso especial, nos termos da Súmula 7 do STJ.
3. Agravo interno desprovido." (AgInt no REsp 1854823 / SP, AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL 2019/0382572-0, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA - T1 - PRIMEIRA TURMA, Data da Publicação/Fonte DJe 17/12/2020) (g.n.)
No tocante à duração do benefício concedido, ocorrido o óbito após a edição da Lei n. 13.135/2015, deverá ser observada norma inserta no artigo 77, § 2º, da Lei de Benefícios, a qual, para os cônjuges, companheiras e companheiros, estabelece regras diferenciadas levando em conta: (i) o número de contribuições recolhidas pelo segurado falecido, se superior ou inferior a 18 (dezoito) meses; (ii) a data do casamento ou do início da união estável, se anterior ou não a dois anos da ocasião do óbito; (iii) a idade do dependente na data do fato gerador.
No caso em análise, o óbito do instituidor - João Izidio da Silva - ocorreu em 20/11/2016.
A qualidade de segurado está comprovada, pois os dados do Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS) informam o recolhimento de contribuições desde 4/2014 até 11/2016, mês do óbito.
A questão controvertida cinge-se, pois, à condição de dependente da autora.
Segundo narrativa da petição inicial, ELIZABETH PRADO PINTO (nascida em 1961) mantinha relação de união estável com o de cujus por mais de 13 anos até a data do óbito.
Para fins de comprovação da união estável, apresentou: (i) certidão de óbito, com endereço na Rua Renê Verinaud, n. 485, Jardim Novo Maracanã, Campinas - SP; (ii) comprovantes de residência comum do casal no endereço acima; (iii) Comprovante de inscrição cadastral de pessoa jurídica do falecido, que era gesseiro, com o mesmo endereço citado, com data de abertura da inscrição em 2013; (iv) Ficha de identificação no Centro de Saúde Parque Valença em nome da autora e do falecido, constando que convivem como companheiros, sendo a data de emissão do cadastro do falecido no ano de 2011 e da autora em 2020, ambos residindo no mesmo endereço citado; (v) Apólice de seguro do Banco Bradesco, na qual a autora é beneficiária do falecido, incluída no ano de 2014; (vi) Comprovante de residência da autora na mesma rua em que viviam juntos, comprovando que a autora seguiu residindo no mesmo endereço após o óbito.
Por sua vez, os depoimentos das testemunhas, colhidos em audiência realizada em 19/10/2023 abaixo transcritos, de forma plausível confirmaram a existência de união estável da autora e do falecido por vários anos até a data do óbito. Vejamos:
"A testemunha Aparecida, após advertida sobre as penas do crime de falso testemunho, declarou que: conheceu o sr. João em 2003, no bar da testemunha, sendo que ele apresentou a autora como sua esposa; depois de meses que se conheceram, foram morar juntos na casa dele; sempre conviveram juntos até a data do óbito, morando no mesmo endereço, que era "antiga rua 8", Jardim Maracanã.
A testemunha José Roberto, após advertida sobre as penas do crime de falso testemunho, declarou que: conhece a autora Elizabeth há uns 18 anos, no bairro onde ela mora; eram vizinhos de bairro; a autora morava com o sr. João, a quem conheceu há mais tempo, há uns 30 anos, pois trabalharam juntos; conheceu a Elizabeth depois que ela foi morar com o Sr. João; na verdade ele foi morar na casa dela, no bairro Maracanã; eles conviveram juntos até ele falecer, pois ela cuidava dele; ele ficou doente e faleceu depois; nesse período a Elizabeth ficou com ele todo tempo até o falecimento.
A testemunha José Ribeiro, após advertida sobre as penas do crime de falso testemunho, declarou que: conheceu a Elizabeth do bairro Novo Maracanã, porque morava perto; ela casou com o Sr. João, a quem eu conhecia há muito tempo, desde os anos 1980; eles passaram a morar juntos em 2004; eles eram um casal; eles só se separaram pela morte; a testemunha era como motorista do Sr. João."
Nesse passo, entendo comprovada a relação de dependência e união estável, tendo em vista o conjunto probatório apto a demonstrar que a autora e o falecido viviam juntos, em união estável até o momento do óbito.
O termo inicial do benefício fica mantido na data do requerimento administrativo (DER 25/10/2018 - NB 190.676.693-0), o qual foi apresentado após o decurso do prazo de noventa dias previsto no artigo 74 da Lei n. 8.213/1991.
É mantida a condenação do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) a pagar honorários de advogado, cujo percentual majoro para 12% (doze por cento) sobre a condenação, excluindo-se as prestações vencidas após a data da sentença, consoante Súmula n. 111 do STJ e critérios do artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I, e 11, do CPC.
Todavia, na fase de execução, o percentual deverá ser reduzido se o valor da condenação ou do proveito econômico ultrapassar 200 (duzentos) salários mínimos (artigo 85, § 4º, II, do CPC).
Diante do exposto, nego provimento à apelação.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. UNIÃO ESTÁVEL COMPROVADA. REQUISITOS PREENCHIDOS. TERMO INICIAL. SUCUMBÊNCIA RECURSAL.
- Em atenção ao princípio tempus regit actum, aplica-se, no tocante à concessão da pensão por morte, a lei vigente à época do fato que o originou, qual seja, a da data do óbito.
- São requisitos para a obtenção de pensão por morte: a condição de dependente e a qualidade de segurado do falecido (artigos 74 a 79 da Lei n. 8.213/1991).
- Comprovadas a condição de dependente e a qualidade de segurado do falecido, é devido o benefício pleiteado.
- À luz do artigo 74 da Lei n. 8.213/1991, a pensão por morte será devida ao conjunto dos dependentes do segurado que falecer, aposentado ou não, a contar do requerimento administrativo, quando não requerida nos noventa dias posteriores à data do óbito.
- Sucumbência recursal. Honorários de advogado arbitrados em favor da parte autora majorados para 12% (doze por cento) sobre a condenação, excluindo-se as prestações vencidas após a data da sentença, consoante Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça e critérios do artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I, e 11, do Código de Processo Civil.
- Apelação não provida.
