
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003706-66.2023.4.03.6114
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. JEAN MARCOS
APELANTE: ELIANE CRISTINA PEREIRA DE CARVALHO CIPRIANO
Advogado do(a) APELANTE: PEDRO FLORENTINO DA SILVA - SP202562-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, ARISTEA DIAS DA SILVA
Advogados do(a) APELADO: ALESSANDRA BARROS DE MEDEIROS - SP240756-A, LAUANA BARQUETE TEIXEIRA - SP403434-A
OUTROS PARTICIPANTES:
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003706-66.2023.4.03.6114
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. JEAN MARCOS
APELANTE: ELIANE CRISTINA PEREIRA DE CARVALHO CIPRIANO
Advogado do(a) APELANTE: PEDRO FLORENTINO DA SILVA - SP202562-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, ARISTEA DIAS DA SILVA
Advogados do(a) APELADO: ALESSANDRA BARROS DE MEDEIROS - SP240756-A, LAUANA BARQUETE TEIXEIRA - SP403434-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O Desembargador Federal Jean Marcos (Relator):
Trata-se de ação ordinária objetivando a concessão do benefício previdenciário de pensão por morte.
A r. sentença (ID 286493369) julgou o pedido inicial improcedente, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil e condenou a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da causa, observada a gratuidade.
Apelação da parte autora(ID 286493370) em que requer a reforma da r. sentença. Alega o cumprimento dos requisitos para a obtenção do benefício, com prova da união estável e da qualidade de dependente.
Contrarrazões (ID 286493373).
É o relatório.
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003706-66.2023.4.03.6114
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. JEAN MARCOS
APELANTE: ELIANE CRISTINA PEREIRA DE CARVALHO CIPRIANO
Advogado do(a) APELANTE: PEDRO FLORENTINO DA SILVA - SP202562-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, ARISTEA DIAS DA SILVA
Advogados do(a) APELADO: ALESSANDRA BARROS DE MEDEIROS - SP240756-A, LAUANA BARQUETE TEIXEIRA - SP403434-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O Desembargador Federal Jean Marcos (Relator):
A Constituição Federal de 1988, a teor do preceituado no artigo 201, inciso V, garante cobertura em razão do evento morte:
Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma do Regime Geral de Previdência Social, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, na forma da lei,a:
(...)
V - pensão por morte do segurado, homem ou mulher, ao cônjuge ou companheiro e dependentes, observado o disposto no § 2º.
(...)
§ 2º Nenhum benefício que substitua o salário de contribuição ou o rendimento do trabalho do segurado terá valor mensal inferior ao salário mínimo.
Dispõe a Lei Federal nº 8.213/91, de 24-07-1991:
Art. 74. A pensão por morte será devida ao conjunto dos dependentes do segurado que falecer, aposentado ou não, a contar da data:
I - do óbito, quando requerida em até 180 (cento e oitenta) dias após o óbito, para os filhos menores de 16 (dezesseis) anos, ou em até 90 (noventa) dias após o óbito, para os demais dependentes;
II - do requerimento, quando requerida após o prazo previsto no inciso anterior;
III - da decisão judicial, no caso de morte presumida.
O artigo 16, da Lei de Benefícios estabelece quem serão dependentes do segurado falecido e como a dependência deve ser analisada, in verbis:
Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:
I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente;
II - os pais;
III - o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente.
§ 1º A existência de dependente de qualquer das classes deste artigo exclui do direito às prestações os das classes seguintes.
(...)
§ 4º A dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I é presumida e a das demais deve ser comprovada
Trata-se, portanto, de prestação de pagamento continuado, substitutiva da remuneração do segurado falecido, podendo ter origem comum ou acidentária, sendo esta última oriunda de falecimento por doença do trabalho ou doença ocupacional. Tal diferenciação é relevante para fixação da competência; aquela compete à Justiça Federal e esta à Justiça Estadual.
O benefício de pensão por morte, assim, possui três requisitos: a qualidade de segurado do falecido; o óbito ou morte presumida dele e a existência de dependentes que possam se habilitar como beneficiários perante o INSS.
A legislação relativa ao benefício em comento passou por mudanças estruturais e, a partir da Lei nº 13.135 de 2015, passou a limitar a percepção do benefício em razão da idade do beneficiário na data do óbito do segurado. Neste caso, passou a exigir prova do recolhimento de, pelo menos, 18 contribuições mensais e, mais de 02 anos do início da união estável ou do casamento. Também impôs hipóteses de perda do direito ao benefício em razão de crime, assim como, estabeleceu regramento sobre as pensões concedidas aos filhos e aos dependentes com deficiência (art. 77, §2º, incisos I a V, da Lei 8.213/91).
Cabe ressaltar que a legislação aplicável à pensão por morte é aquela vigente à época do óbito, em consonância com o princípio tempus regit actum, conforme fixado no verbete de nº 340, do Superior Tribunal de Justiça.
Nos termos do §6º do artigo 16 do Decreto nº 3.308/99, a união estável é aquela configurada na convivência pública, contínua e duradoura entre o homem e a mulher, estabelecida com intenção de constituição de família, observado o §1º do artigo 1.723 do Código Civil (Lei n. 10.406/2002).
E, a teor do artigo 16, § 5º, da Lei Federal nº. 8.213/91, “as provas de união estável e de dependência econômica exigem início de prova material contemporânea dos fatos, produzido em período não superior a 24 (vinte e quatro) meses anterior à data do óbito ou do recolhimento à prisão do segurado, não admitida a prova exclusivamente testemunhal, exceto na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no regulamento”.
À vista do exposto, examina-se o caso concreto.
A questão controvertida nos autos versa sobre a qualidade de dependente da parte autora (fl. 45, ID 286492897)
O óbito é incontroverso nos autos e ocorreu em 28/05/2021 (fl. 07, ID 286492897), assim como a condição de segurado do falecido (fl. 32, ID 286492897)
A parte autora afirma que convivia em união estável com o segurado há mais de 20 anos. Para provar o alegado juntou os seguintes documentos:
-
Certidão do óbito do segurado
-
CTPS do segurado
-
Comprovante de endereço no nome dela, datado de
-
Ficha empresarial em que consta o segurado como seu sócio
A empresa foi constituída em 09/2009 e em 11/2009 o segurado saiu da sociedade. Consta na averbação de sua saída o seu endereço sito Rua São João, 20, apto 05, Jd. São Paulo/SBC e o dela na Rua Frutuoso Ferreira de Lima, 73, Vila Euclides, SBC
-
Cadastro na Secretaria de Segurança Pública onde consta o endereço do segurado como Rua São João, 20, apto 05, Jd. São Paulo/SBC (fls. 30/31, ID 286492897)
-
Seu Cadastro da Secretaria de Segurança Pública onde consta seu endereço consta como Rua Frutuoso Ferreira de Lima, 73, Vila Euclides, SBC
Em seu depoimento pessoal afirmou que vivia com o segurado desde 2010; que não tiveram filhos juntos; que morreu de insuficiência respiratória; que o segurado fazia tratamentos regulares; que morreu em Sto André; que ele morava em SBC com ela; que ele recebia aposentadoria do INSS; que ela não trabalhava no período em que estiveram juntos; que ele pagava as contas da casa; que ele era divorciado desde 2010; que ele pagava pensão para ex-esposa, descontado do benefício; que ele tinha filhos do casamento; que no começo da convivência deles ele não falava com os filhos; que ela não tinha contato com os filhos do segurado; que eles tinham um apto na Praia Grande; que depois ele decidiu tentar a vida na Praia e abriu a sorveteria em 2019 em Itanhaém; que não tinha conhecimento dos negócios dele lá porque ele não falava; que ele só pagava as contas e viviam juntos; que ele morava na Praia Grande e de vez em quando dormia em Itanhaém porque não conseguia voltar; não fizeram inventário porque a casa em que moravam em SBC era dela desde 1995 e o apartamento da Praia Grande ela devolveu, através de negociação porque não aguentou pagar depois que ele morreu; que ele não deixou bens; que ele tinha uma fazenda no Piauí, mas deu a documentação do local para a família; que a filha fez a internação porque a família não deixou ela participar de nada; que na Pandemia ele ficou na Praia e ela aqui porque ela tem asma; que só ficou sabendo porque leu no Facebook; que mandou a mensagem para a filha e ela não respondeu; que a filha ligou para ela pedindo os documentos, mas não falou nada; que não sabe se ele fechou a sorveteria e nem quando; que sabe que a sorveteria ia de mal a pior; que se dava bem com o segurado; que ele não falava a verdade sobre as coisas do trabalho porque ele era enrolado; que ele mandava dinheiro pela conta no Bradesco todos os meses ou pagava as contas diretamente; que eles viveram juntos de 2010 até a data do óbito; que o cartão de crédito, emitido em 11/08/2021, chegou sem pedido; não sabe o endereço da sorveteria em Itanhaém e nem o endereço da casa que morava em Itanhaém; que viu o segurado a última vez em 2020.
Já a corré afirma que a parte autora era fornecedora de roupas; que ela nunca teve um relacionamento com o segurado e que ele viveu sozinho nos últimos 03 anos de vida. Para fazer prova do alegado juntou os seguintes documentos:
-
Ficha de Internação do segurado, datada de 25/05/2021, onde consta como seu endereço a Rua Aguapeí, 148, Sta Maria, Sto André e seus acompanhantes Marinalva Lopes e Fabio Lopes (seus filhos) – ID 286493230
-
Documentos Médicos (ID 286493234)
-
Contrato de Aluguel comercial, datado de 01/02/2021 onde consta o segurado como locatário do imóvel na Av. Peruíbe. Consta que a residência do segurado era na Estrada Gentil (ID 286493219)
-
Print da página do filho do segurado no Facebook em que a parte autora pergunta o que aconteceu e deseja condolências (ID)
Em depoimento pessoal, a corré Sra. Aristéa Dias da Silva, afirma que é separada do segurado desde 2010; afirma que o relacionamento deu certo por isso se separaram; não sabe informar se ele teve outros relacionamentos; que recebia pensão do segurado de $1070 até ele morrer; recebe de pensão por morte desde o óbito; que nunca trabalhou; mora sozinha em casa própria; não tem outro benefício do INSS; afirma que não conhece a parte autora (ID 286493254).
Foram ouvidas as testemunhas para melhor elucidação dos fatos. Confira:
Sr. Marcos Vinicius Meduri afirma que conheceu o segurado no bairro de Boa Vista/SBC porque ele tinha uma loja de roupas e sabia que ele morava no bairro DER/SBC; afirma que a parte autora frequentava um centro cardecista e ele fazia doação para o Centro que ele entregava ou na loja ou no centro mesmo; afirma que eles sempre estavam juntos; que ele os via como casal até aproximadamente 2019 por causa da pandemia; afirma que o comércio fechou e ele não teve mais contato; afirma que eles moravam na Rua Frutuoso Ferreira Lima; ele afirmou que a parte autora o informou que o segurado morreu; ele acha que a morte foi em decorrência de problemas respiratórios; não sabe se era COVID; afirma que os via em média, 3 vezes por semana; afirma que nunca perguntou se a parte autora era casada com o segurado porque eles estavam sempre juntos e pareciam viver bem; que tinham uma vida normal de casal; afirma que o segurado havia dito a ele que teve problema grave de próstata; afirma que sabia que o segurado tinha uma casa de praia, mas não sabia que ele havia mudado para lá (ID 286493258).
A testemunha Sra. Sheila Aparecida da Costa afirma que trabalhou com o segurado e com a parte autora em 2012/2016 em uma loja que eles montaram no centro de SBC; que trabalhou cerca de 04 anos com eles; que o contato era profissional; que sabia que o segurado era casado com a parte autora, que moravam na mesma casa e que ele pagava todas as contas e os funcionários; que o dono da loja era o segurado; que quando saiu da loja perdeu o contato mas em 2019 foi a um aniversário do segurado na casa deles na Rua Frutuoso; ficou sabendo que ele teve doença respiratória e morreu disso; não teve conhecimento de que ele se mudou para Itanhaém (ID 286493268).
A testemunha Clóvis Tavares de Souza Filho afirma que conheceu o segurado desde 1980; que era sócio do segurado em Itanhém; que morava com o segurado inicialmente na Praia Grande e depois forma para Itanhaém; se mudaram para lá em por volta de 2018, na Estrada Gentil Peres; que moravam em cima do comércio que tinham: uma sorveteria; que quando o segurado faleceu eles tinham se mudado do local; que tinham mais duas filiais; que com a pandemia eles fecharam as filiais, mas ficaram com a sorveteria na Av. Peruíbe, em Itanhaém; que quando ele faleceu eles tinham somente esta sorveteria lá em Itanhaém; que ele passou mal e pediu ajuda para a filha; afirma que os filhos deles sempre moraram em SBC; que ele se mudou para SBC com filha para se tratar e não retornou mais; acredita que ele morreu depois de 05 dias que tinha se mudado; nos 03 anos anteriores ao óbito ele vivia exclusivamente em Itanhém; que moraram juntos Julho/2018 até 2019 e quando um saía o outro tomava conta da loja e a noite eles faziam a contabilidade; quando ele se mudou em 2019, o segurado ficou com o apartamento, residindo sozinho até o óbito; disse que via os filhos quando eles o visitavam; que o segurado não ia porque o segurado não conseguia dirigir; que conhece a parte autora “de vista” da época que moraram na Praia Grande: 2017/2018; que a parte autora fornecia as roupas que ele vendia na Praia Grande; que o segurado e a parte autora eram sócios; que o segurado nunca falou que teve nada com a parte autora; que ele nunca teve outra esposa; não tinha conhecimento que ele mantinha contato com a parte autora; que não conversava assuntos pessoais com o segurado; que no último ano de vida ele teve uma namorada de nome Marcia Elena Rodrigues; que o segurado a conheceu no trabalho; que ela morou com ele em Itanhaém; (Ids 286493271, 286493314 e 286493282)
O depoimento das partes, autora e corré, juntamente com a prova testemunhal foi esclarecedor: a parte autora não conseguiu provar a convivência pública e notória e nem a dependência econômica.
A união estável é aquela configurada na convivência pública, contínua e duradoura entre o homem e a mulher, estabelecida com intenção de constituição de família e cuja dependência econômica é presumida, observado o §1º do artigo 1.723 do Código Civil e o artigo 16, § 4º, da Lei nº 8.213/91.
A parte autora, após o período de 2019, não consegue afirmar de forma assertiva os acontecimentos da vida do segurado. O extrato bancário apresentado a fim de provar sua dependência econômica, fez prova do envio de apenas duas remessas de valor do segurado a ela, no ano de 2017, ambas com valor altíssimo. Os demais valores que a parte afirma ter sido enviado por ele, constam como remetente “Fornecedor” e vão até Julho/2019. Esses fatos corroboram o testemunho do Sr. Clóvis que afirmou que a relação deles era profissional e durou até eles abrirem a sorveteria.
Neste contexto, a parte autora não faz jus ao benefício de pensão por morte pleiteado porque não logrou êxito em provar a convivência pública e notória com o segurado.
Considerado o trabalho adicional realizado pelos advogados, em decorrência da interposição de recurso, majoro os honorários advocatícios em 1% (um por cento), sobre o valor arbitrado na sentença, nos termos do artigo 85, § 11, do Código de Processo Civil, observada a suspensão da exigibilidade, em razão do deferimento da assistência judiciária gratuita, conforme, o § 3º, do artigo 98, do Código de Processo Civil.
Por tais fundamentos, nego provimento à apelação da parte autora.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. UNIÃO ESTÁVEL. CONVIVÊNCIA PÚBLICA E NOTÓRIA NÃO PROVADA. SENTENÇA MANTIDA. MAJORAÇÃO DE HONORÁRIOS.
1. Para a concessão do benefício de pensão por morte é necessário o preenchimento cumulativo de três requisitos; o óbito do instituidor, a condição de dependente da parte autora e a qualidade de segurado do falecido.
2. A questão controvertida nos autos versa sobre a qualidade de dependente da parte autora
3. A união estável é aquela configurada na convivência pública, contínua e duradoura entre o homem e a mulher, estabelecida com intenção de constituição de família e cuja dependência econômica é presumida, observado o §1º do artigo 1.723 do Código Civil e o artigo 16, § 4º, da Lei nº 8.213/91.
4. O depoimento das partes, autora e corré, juntamente com a prova testemunhal foi esclarecedor: a parte autora não conseguiu provar a convivência pública e notória e nem a dependência econômica.
5. Apelação da parte autora desprovida.
