Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0001462-78.2020.4.03.6302
Relator(a) para Acórdão
Juiz Federal TAIS VARGAS FERRACINI DE CAMPOS GURGEL
Relator(a)
Juiz Federal FERNANDA SOUZA HUTZLER
Órgão Julgador
14ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
17/02/2022
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 21/02/2022
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. UNIÃO ESTÁVEL NÃO COMPROVADA.
IMPROCEDÊNCIA. RECURSO DA PARTE AUTORA NÃO PROVIDO.
1. A união estável não restou adequadamente comprovada nos autos pela documentação juntada
e pelas testemunhas ouvidas em Juízo
2. Recurso a que se nega provimento.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIO
Nº
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
RELATOR:
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0001462-78.2020.4.03.6302
RELATOR:40º Juiz Federal da 14ª TR SP
RECORRENTE: CONCEICAO AMARO
Advogados do(a) RECORRENTE: LARISSA SOARES SAKR - SP293108-A, RICARDO
VASCONCELOS - SP243085-A
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de recurso inominado interposto pela parte autora, em face da sentença que julgou
IMPROCEDENTE o pedido de pensão por morte porque a magistrada não considerou haver
suficiente comprovação da união estável, pois o relacionamento seria nos moldes de um
namoro.
Nas razões recursais, a parte autora afirma que conviveu em união estável desde meados de
1985 até o óbito de Gumercindo Batista de Santana, em 2014, tendo resultado no nascimento
da filha do casal em 12/06/1987. Argumenta que, por ocasião do pedido administrativo, o
patrono à época solicitou justificação administrativa para comprovar a união estável e o INSS
intimou apenas a autora e as testemunhas. Alega que, em sentença, a magistrada optou pela
improcedência da demanda, condenando a recorrente à pena de litigância de má-fé e uma das
testemunhas à pena de falso testemunho. Sustenta a nulidade dos depoimentos prestados
administrativamente, porque as testemunhas estiveram desacompanhadas do procurador, sem
o cumprimento da determinação do artigo 589, da Instrução Normativa INSS/PRES nº 77/2015
e contendo alterações manuscritas pelo servidor da autarquia. Sustenta que o convívio da união
estável foi comprovado por documentos e testemunhas em juízo, e a dependência econômica é
presumida, com a possibilidade de cumulação de pensão por morte com a aposentadoria. Por
estas razões, pretende a reforma da r. sentença ora recorrida.
Sem contrarrazões.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0001462-78.2020.4.03.6302
RELATOR:40º Juiz Federal da 14ª TR SP
RECORRENTE: CONCEICAO AMARO
Advogados do(a) RECORRENTE: LARISSA SOARES SAKR - SP293108-A, RICARDO
VASCONCELOS - SP243085-A
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Divirjo do voto apresentado pela E. Juíza Relatora.
Entendo que não assiste razão à Recorrente.
No mérito.
A sentença recorrida decidiu o pedido inicial de modo exauriente, analisando todas as questões
suscitadas pelas partes, revelando-se desnecessárias meras repetições de sua fundamentação.
Vejamos seu conteúdo quanto a análise do mérito pertinente ao objeto do recurso:
“(...)
3 - Da dependência econômica
Conforme se depreende da dicção do art. 16, caput, I, a dependência econômica entre os
companheiros é presumida em caráter absoluto. A união estável entre eles, todavia, deve ser
demonstrada.
No presente caso, a autora não obteve êxito em comprovar a existência de união estável entre
ela e o segurado falecido no momento do óbito.
Com efeito, consta dos autos certidão de nascimento de filha em comum da autora e do de
cujus, nascida em 1987, data muito distante da que deseja comprovar.
No mais, são apresentados diversos comprovantes de residência referentes a datas entre 2009
e 2010, alguns com endereço em comum e outros divergentes. Nota-se ainda que o endereço
declarado pela autora como sendo o último do casal diverge do apontado como sendo o
endereço do instituidor na certidão de óbito. Não foram apresentados documentos que
comprovassem coabitação em anos imediatamente anteriores ao óbito.
Foram apresentadas cópias dos autos do processo administrativo (doc. 19), nas quais, em fls.
75/79 constam depoimentos de testemunhas que alegaram que a autora e o instituidor não
viviam juntos, mas que tinham um relacionamento de namoro e que ocasionalmente viajavam
juntos. Consta ainda nesses depoimentos que permaneceram separados muitos anos e que o
de cujus chegou até mesmo a viver em união estável com outra mulher nessa época. Por fim,
além de ambas as testemunhas no processo administrativo terem sido clara no sentido de que
não viviam juntos, colocaram ainda que o falecido ajudava financeiramente a filha, mas não
alegaram que a autora também dependesse economicamente dele.
As testemunhas ouvidas em juízo afirmaram que o casal vivia no mesmo lar e que nunca teria
havido separação, o que confronta diretamente com os depoimentos colhidos na justificação
administrativa. Vale ressaltar que uma das testemunhas ouvidas em juízo também havia sido
ouvida no processo administrativo, apresentando nas duas esferas depoimentos
completamente conflitantes.
Diante de tamanhas divergências entre as alegações da inicial e das provas produzidas nos
autos, especialmente naquilo que foi apresentado no processo administrativo, determinou essa
julgadora que a parte autora apresentasse o endereço de outra testemunha ouvida
administrativamente, sra. Eladir Mendonça, a fim que fosse providenciada a tomada de seu
depoimento como testemunha do juízo. Contudo, mesmo tendo sido intimada duas vezes para
apresentação dessa informação, a parte autora permaneceu inerte, não apresentando os dados
requeridos nem qualquer justificativa para sua não apresentação.
Desse modo, ante o descumprimento reiterado e sem justo motivo das ordens de apresentação
do endereço da referida testemunha, entendo que incorre a parte autora no previsto no art. 80,
IV, do Código de Processo Civil, representando sua postura resistência injustificada ao
andamento do processo.
Por fim, observo que, diante do conjunto probatório que demonstrou a existência de um
relacionamento entre a autora e o segurado falecido, mas que esse relacionamento tinha os
moldes de um namoro, sem coabitação e sem dependência econômica, com elementos
insuficientes para firmar nessa magistrada o convencimento de que havia relação de união
estável na ocasião do óbito.
Sendo assim, a improcedência é medida de rigor.
(...)”
Desta feita, o artigo 46 combinadamente com o § 5º do art. 82, ambos da Lei nº 9099/95,
facultam à Turma Recursal dos Juizados especiais a remissão aos fundamentos adotados na
sentença.
Ademais a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal firmou-se no sentido de que a adoção
dos fundamentos contidos na sentença pela Turma Recursal não contraria o art. 93, inciso IX,
da Constituição Federal, vejamos, por exemplo, o seguinte julgado:
“EMENTA - AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. MATÉRIA
INFRACONSTITUCIONAL. OFENSA
INDIRETA. JUIZADO ESPECIAL. REMISSÃO AOS FUNDAMENTOS DA SENTENÇA.
AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. INOCORRÊNCIA.
1. Controvérsia decidida à luz de legislações infraconstitucionais. Ofensa indireta à Constituição
do Brasil.
2. O artigo 46 da Lei nº 9.099/95 faculta ao Colégio Recursal do Juizado Especial a remissão
aos fundamentos adotados na sentença, sem que isso implique afronta ao artigo 93, IX ,da
Constituição do Brasil.
Agravo Regimental a que se nega provimento. ( AI 726.283-7-AgR, Rel. Min. Eros Grau, 2ª
Turma, DJe nº 227, Publicação 28/11/2008).”
O parágrafo 5º do artigo 82 da Lei nº 9.099/95, dispõe “se a sentença for confirmada pelos
próprios fundamentos, a súmula do julgamento servirá de acórdão.”
O dispositivo legal prevê, expressamente, a possibilidade de o órgão revisor adotar como razão
de decidir os fundamentos do ato impugnado, o que não implica violação do artigo 93, IX, da
Constituição Federal.
Assim, considerando que a sentença recorrida bem decidiu a questão, deve ser mantida nos
termos do artigo 46 da Lei nº 9.099/95.
Posto isso, nego provimento ao recurso.
Condeno a recorrente Autora vencida ao pagamento de honorários advocatícios no valor de
10% sobre o valor da causa nos termos do artigo 55 da Lei 9.099/95. Para o beneficiário da
gratuidade de justiça, o pagamento da verba honorária se sujeita ao disposto no art. 98, § 3º, do
Código de Processo Civil.
É como voto.
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
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RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0001462-78.2020.4.03.6302
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RECORRENTE: CONCEICAO AMARO
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OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Primeiramente, esclareço que o art. 16, § 5º, da Lei 8.213/91 (introduzido pela Lei 13.846/2019)
passou a prever expressamente que: “As provas da união estável e de dependência econômica
exigem início de prova material contemporânea dos fatos, produzido em período não superior a
24 (vinte e quatro) meses anterior à data do óbito ou do recolhimento à prisão do segurado, não
admitida a prova exclusivamente testemunhal, exceto na ocorrência de motivo de força maior
ou caso fortuito, conforme disposto no regulamento”.
Saliente-se, ainda, que se tratando de norma de caráter processual, tem vigência imediata e se
aplica, inclusive, aos processos em curso, como no presente caso.
Ao contrário das conclusões da r. sentença, entendo que a prova documental produzida nos
autos, corroborada pela prova oral, comprova que o casal viveu em união estável, como marido
e mulher, por mais de 26 anos, ou seja, ao menos desde 12/06/1987 até a data do óbito do
segurado (em 10/02/2014).
Para comprovar tais fatos, a parte autora juntou as seguintes provas documentais que
interessam ao caso:
1) certidão de óbito de Gumercindo Batista de Santana, na qual não consta a data do
falecimento, tendo como declarante a filha em comum (Cássia Amaro Batista de Santana,
nascida em 12/06/1987), com endereço à rua Paulo de Frontin, 2005, bloco C, apartamento 24,
Jardim Centenário, Ribeirão Preto.
Na certidão, foi mencionado o filho Leonardo Batista de Santana (nasceu em 28/07/1993), o
qual recebeu o NB 21/167.796.348-1, com DIB em 10/02/2014 e, segundo o DATAPREV, sua
mãe é Tânia de Jesus Cabral.
2) carta de concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, em nome do
falecido, NB 42/149.236.406-9, com DIB em 02/07/2007, contendo o endereço Rua Visconde de
Inhaúma, 1153 Centro – Ribeirãpo Preto.
3) certidão de nascimento da filha em comum Cássia Amaro Batista de Santana, nascida em
12/06/1987;
4) fatura de cartão de crédito, com vencimento em 01/09/2010, em nome de Gumercindo
Batista de Santana, com endereço Rua Fiorigio Casilo, 75 – Santa Cruz, Ribeirão Preto;
5) correspondência em nome da autora, com data de 17/06/1985, com endereço Rua Fiorigio
Casilo, 75 – Santa Cruz, Ribeirão Preto;
6) conta de energia elétrica em nome da autora, referente a maio de 2010, com endereço Rua
Miguel Hurtado, 1141 – Ribeirão Preto;
7) correspondência em nome de Gumercindo Batista de Santana, com endereço Rua Miguel
Hurtado, 1141 – Ribeirão Preto, na data de 10/10/2009;
8) contrato de plano de assistência familiar, mencionando como dependentes a autora e a filha
do casal, com data de adesão em 23/05/2007.
9) voucher de viagem da autora e do senhor Gumercindo Batista de Santana, de 06/01/2013 a
14/01/2013.
Também foram juntadas algumas fotografias, sem data.
A prova documental elencada acima, demonstra que pelo menos desde o ano de 1985
(endereço em comum e nascimento da filha em 1987) até 2014, o falecido viveu em união
estável com a autora, tendo juntado prova que viviam sob o mesmo teto nos anos de 1985,
1987, 2007, 2009, 2010, 2013 e 2014.
O fato de haver outro filho do falecido, nascido de outro relacionamento (Leonardo Batista de
Santana, nasceu em 28/07/1993, filho de Tânia de Jesus Cabral), não constitui óbice à
comprovação de união estável com a autora, diante da prova documental juntada ́, que faz
presumir que o falecido teve um caso extraconjugal no ano de 1993, mas que permaneceu com
a autora mesmo após tal fato.
Ademais, a autora, nascida em 04/10/1953, contava com 60 anos por ocasião do falecimento de
Gumercindo Batista de Santana (nascido em 28/07/1957), em 10/02/2014.
No caso, portanto, configura-se a mútua assistência material e moral, visto que tanto a autora
como o falecido já eram idosos ao tempo do óbito.
Para a caracterização da união estável, é necessário o preenchimento de alguns requisitos de
ordem subjetiva e objetiva. Os requisitos de ordem subjetiva são a convivência more uxorio e o
affectio marital, os quais consistem na comunhão de vidas, no sentido material e imaterial, e
envolve a mútua assistência moral, material e espiritual, caracterizada pelos interesses e atos
comuns, inerentes à entidade familiar.
Quanto aos requisitos de ordem objetiva temos a notoriedade, a estabilidade ou duração
prolongada, a continuidade, a inexistência de impedimentos matrimoniais e a relação
monogâmica, o respeito mútuo, a comunhão de interesses, a estabilidade da relação, o
companheirismo, não esgotando os pressupostos somente na coabitação (STJ, AgRg nos EDcl
no REsp 805265/AL, Rel. Ministro VASCO DELLA GIUSTINA (Desembargador Convocado do
TJ/RS), TERCEIRA TURMA, julgado em 14/09/2010, DJe 21/09/2010).
No caso dos autos, a magistrada considerou relevantes as divergências existentes nos
depoimentos prestados, aplicando a sanção por litigância de má-fé a uma das testemunhas,
com base no art. 80, inciso IV, c/c art. 81, ambos do CPC, cominando à autora multa de 1%
sobre o valor da causa, além de indenização num total de 10%, também sobre o valor da causa
e determinou o encaminhamento de cópia integral dos autos ao Ministério Público Federal com
o fim de apurar, caso entenda cabível, o crime de falso testemunho, diante das divergências
apontadas no depoimento, nos termos do art. 40, do CPP.
Apesar do entendimento da magistrada de primeiro grau, entendo que a prova material se
apresenta robusta.
Em seu depoimento, a autora afirmou que se mudou para o atual endereço em outubro de
2014, mencionando que morou antes em São Sebastião, Miguel Hurtado, 1141. Narrou que
conheceu o senhor Gumercindo em agosto de 1985, por trabalhar no hospital e ele foi morar na
casa dela. Explicou que o endereço indicado na certidão de óbito se refere a um apartamento
comprado pelo casal e o senhor Gumercindo ficava reformando e às vezes dormia ali. Na
certidão de óbito consta data indeterminada porque era rotineiro ele ficar naquele apartamento,
enquanto ela trabalhava no hospital, fazendo horário noturno. Ela disse que ligou e ele não
atendeu, mas ela achou que ele estivesse no bar. Questionada, ela mencionou que o endereço
declarado pelo falecido por ocasião do benefício de aposentadoria foi diferente porque ele ia
naquela casa, mas viviam juntos. Disse que nunca se separaram.
A testemunha Carmen Lúcia Cunha informou que trabalha há muitos anos com a autora e
conheceu o senhor Gumercindo como marido da autora. Conviveu com o casal inclusive por
causa das festas infantis, pois também tem uma filha da mesma idade de Cássia. Não se
lembrou da data do óbito nem do endereço do casal. Não conheceu a residência deles, sabia
das informações porque trabalhava junto com a autora.
A testemunha Jandira Brassarola Cavanzani respondeu que conheceu a autora há muitos anos,
trabalharam juntas e moram em bairros diferentes atualmente. Disse que conheceu o senhor
Gumercindo como marido e a filha do casal. Mostrou-se firme nas respostas, inclusive
lembrando do nome da filha do casal. Soube do falecimento por meio da filha Cássia, embora
não lembrasse exatamente a data do óbito. Foram vizinhas no bairro Santa Cruz e disse que a
autora comprou uma casa e mudou.
A testemunha Luci Aparecida Sobral informou que conhece a autora há cerca de 19 anos
porque trabalharam juntas, por volta de 1989 até 2016. Ela disse que o senhor Gumercindo
trabalhou no hospital e era conhecido como marido da autora. Foi segura ao informar o nome
da filha do casal. Não soube dar o endereço de residência, porque não tinham o hábito de se
visitar, mas tinha conhecimento de algumas situações pelas conversas no trabalho. Esclareceu
que os horários de trabalho do senhor Gumercindo, da autora e dela eram diferentes. Ao ser
questionada sobre o depoimento na esfera administrativa, no qual disse que o casal não vivia
junto, a testemunha disse que não falou isso. Também foi lido seu depoimento na esfera
administrativa, no qual ela declarou que a autora e o falecido nunca moraram juntos, tiveram um
relacionamento e romperam, voltando a conviver. Em juízo, a senhora Luci disse que moraram
juntos e o falecido auxiliava tanto a autora como a filha. Disse que não conheceu a mãe do
outro filho, mas afirmou que não considera que tenha sido outro relacionamento.
Não se nota dúvidas ou incongruências quando a autora foi questionada.
É importante salientar que, para fins do recebimento do benefício previdenciário de pensão por
morte, basta a comprovação da união estável, com os requisitos da affectio societatis, não se
exigindo a coabitação como requisito essencial.
Cumpre frisar que o Art. 1.723, do CC (que disciplina a união estável) não se refere
expressamente à coabitação ou vida em comum sob o mesmo teto, mas apenas a
comprovação da convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida como objetivo de
constituição de família.
Ainda que o senhor Gumercindo Batista de Santana seja o pai de Leonardo Batista de Santana
(nasceu em 28/07/1993), cuja mãe é Tânia de Jesus Cabral, entendo que mesmo que o falecido
tenha tido um relacionamento extraconjugal no ano de 1993 (e em razão dele tenha gerado um
filho), o fato é que se evidencia que a união estável entre a autora e o segurado falecido foi
restabelecida no período posterior.
Do mesmo modo, ainda que a parte autora tenha alegado “que o endereço indicado na certidão
de óbito se refere a um apartamento comprado pelo casal e o senhor Gumercindo ficava
reformando e às vezes dormia ali”, tal fato não abala o reconhecimento da união entre o casal,
visto que a coabitação não é requisito indispensável para a configuração da união.
Portanto, ainda que a parte autora e o falecido supostamente não vivessem sob o mesmo teto
na data do óbito, comprovou-se que por longos anos viveram sob o mesmo teto e que
mantinham, na data do óbito, união estável (com ou sem coabitação).
Assim, uma vez comprovada a existência da união estável ao tempo do óbito, dispensável é a
prova da dependência econômica, uma vez que, ela é presumida por lei, nos termos do art. 16,
I e § 4º, da Lei 8.213/91, entendendo-se essa presunção como absoluta, pois decorre dos
deveres de assistência mútua inerentes à união estável.
A Turma Nacional de Uniformização, ao julgar o Tema 226, dirimiu qualquer controvérsia a
respeito da questão, fixando a seguinte tese: "A dependência econômica do cônjuge ou do
companheiro relacionados no inciso I do art. 16 da Lei 8.213/91, em atenção à presunção
disposta no §4º do mesmo dispositivo legal, é absoluta".
Finalmente, restando comprovada a qualidade de segurado e a qualidade de dependente da
parte autora, é de rigor a procedência da demanda, e o consequente provimento do presente
recurso, sendo que considerando que a autora tinha mais de 44 anos ao tempo do óbito, e que
restou comprovado que a união estável do casal perdurou por mais de 02 anos, e ainda, que o
segurado falecido verteu mais de 18 contribuições mensais ao RGPS, deve ser aplicado ao
caso o art. 77, § 2º, V, “c”, “6”, da Lei 8.213/91 com redação da Lei 13.135 de 17/06/2015, razão
pela qual a pensão por morte da parte autora deverá ser implantada de forma vitalícia.
Revogo a sanção aplicada à autora por litigância de má fé, bem como a determinação de ofício
ao Ministério Público Federal com a finalidade de apurar crime de falso testemunho.
Observo que a testemunha Luci Aparecida Sobral narrou os fatos na via administrativa com a
mesma visão que tem do relacionamento do casal ao ser inquirida em juízo. O fato de
mencionar a existência do filho do falecido com outra mulher na via administrativa de uma
maneira e, no depoimento em juízo, afirmar que a autora e o falecido viveram juntos, leva a
concluir a maneira como a senhora Luci compreendeu o relacionamento de união estável entre
a autora e o falecido, pois mencionou com firmeza que não considera relacionamento o que
houve com a senhora Tânia.
Diante do exposto, dou provimento ao recurso da parte autora, para julgar PROCEDENTE o
pedido para o fim de condenar o INSS a implantar o benefício de pensão por morte em favor da
autora, com DIB na data do óbito, de forma vitalícia, nos termos do art. 77, § 2º, V, c), 6), da Lei
8.213.
Condeno, outrossim, o INSS ao pagamento das prestações vencidas desde a DER. Nos
cálculos de liquidação, deve ser aplicada a Resolução nº 658/2020, que alterou a Resolução nº
267/2013 do CJF (Manual de Cálculos da Justiça Federal, expedido pelo Conselho da Justiça
Federal) e os parâmetros fixados pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso
Extraordinário nº 870.947 (Tema 810 STF), em regime de repercussão geral, obedecida a
prescrição quinquenal.
Tendo em vista a natureza alimentar do benefício e considerando o disposto no art. 43 da Lei nº
9.099/95 e no art. 461, § 4º, do Código de Processo Civil, concedo tutela específica para
determinar a implantação do benefício independentemente do trânsito em julgado.
Expeça-se ofício, através do portal de intimações, à Procuradoria do INSS da presente decisão
e a CEAB-DJ, para dar cumprimento à tutela, mediante comprovação nos autos, no prazo de 30
(trinta) dias, a contar da referida intimação.
Sem condenação em honorários, porque somente o Recorrente vencido deve arcar com as
verbas sucumbenciais, nos termos do art. 55 da Lei nº 9.099/95, combinado com o art. 1º da Lei
nº 10.259/2001.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. UNIÃO ESTÁVEL NÃO COMPROVADA.
IMPROCEDÊNCIA. RECURSO DA PARTE AUTORA NÃO PROVIDO.
1. A união estável não restou adequadamente comprovada nos autos pela documentação
juntada e pelas testemunhas ouvidas em Juízo
2. Recurso a que se nega provimento. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, visto, relatado e discutido
este processo, em que são partes as acima indicadas, decide a Décima Quarta Turma Recursal
do Juizado Especial Federal da Terceira Região, Seção Judiciária de São Paulo, por maioria,
negar provimento ao recurso, nos termos do voto da Juíza Federal TAIS VARGAS FERRACINI
DE CAMPOS GURGEL, acompanhada pela Juíza Federal MARCELLE RAGAZONI
CARVALHO FERREIRA. Vencida a relatora Juíza Federal FERNANDA SOUZA HUTZLER, nos
termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
