
| D.E. Publicado em 09/08/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0027433-76.2013.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
Trata-se de Apelação interposta pelo INSS contra sentença que, julgando parcialmente procedente o pedido veiculado por Neide Zonho Lima, reconheceu o período de 01/08/1961 a 31/12/1992, como tempo trabalhado na qualidade de trabalhadora rural, com direito à averbação pertinente, observando-se as disposições do art. 55, §2º, da Lei nº 8213/91.
Segundo a inicial, a autora laborou como trabalhadora rural em regime familiar em terras arrendadas por seu pai e depois, por seu marido, pugnando pelo reconhecimento da atividade laboral naquele período, a possibilitar o reconhecimento do tempo de serviço para fins de aposentadoria.
Em razões recursais, intenta o INSS o reexame necessário, em face de sentença ilíquida e, no mérito, alega a inexistência de comprovação do tempo de serviço rural, diante da ausência de início de prova material e vedação de prova exclusivamente testemunhal para comprovação do tempo de serviço nas lides rurais.
Contrarrazões recursais, pelo improvimento do recurso da autarquia.
É o relatório.
LUIZ STEFANINI
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0027433-76.2013.4.03.9999/SP
VOTO
De início, rechaço o pedido de reexame necessário no presente caso, porquanto incabível, à luz do disposto no art. 496, §3º, I, do CPC/2015 e em face da estipulação do valor da condenação que não atinge mil salários mínimos, lembrando que a sentença apenas reconheceu tempo serviço laboral no período destacado, para fins de averbação não se tratando de concessão de aposentadoria.
No que diz com o mérito, a sentença merece ser mantida, havendo início razoável de prova material corroborada pelos depoimentos testemunhais colhidos.
A respeito da matéria abordada na inicial, destaco que o artigo 26, inciso III, da Lei nº 8.213/91, isentou o segurado especial - produtor rural em regime de economia familiar - do recolhimento de contribuições, fazendo jus a benefício previdenciário, independentemente de contribuição, desde que comprove exercício de atividade rural pelo número de meses correspondentes à carência do benefício pretendido, "verbis":
"Art. 26. Independe de carência a concessão das seguintes prestações:
[...]
III - os benefícios concedidos na forma do inciso I do art. 39, aos segurados especiais referidos no inciso VII do art. 11 desta Lei".
Na atividade desempenhada em regime de economia familiar, toda a documentação comprobatória, como talonários fiscais e títulos de propriedade, é expedida, em regra, em nome daquele que faz frente aos negócios do grupo familiar. Ressalte-se, contudo, que nem sempre é possível comprovar o exercício da atividade em regime de economia familiar através de documentos. Muitas vezes o pequeno produtor cultiva apenas o suficiente para o consumo da família e, caso revenda o pouco do excedente, não emite a correspondente nota fiscal, cuja eventual responsabilidade não está sob análise nesta esfera. O homem simples, oriundo do meio rural, comumente efetua a simples troca de parte da sua colheita por outros produtos, de sua necessidade, que um sitiante vizinho eventualmente tenha colhido, ou a entrega, como forma de pagamento, pela parceria na utilização do espaço de terra cedido para plantar.
De qualquer forma, é entendimento já consagrado pelo C. Superior Tribunal de Justiça (AG nº 463855, Ministro Paulo Gallotti, Sexta Turma, j. 09/09/03) que documentos apresentados em nome dos pais, ou outros membros da família, que os qualifiquem como lavradores, constituem início de prova do trabalho de natureza rurícola dos filhos.
Ressalte-se que o trabalho urbano de membro da família não descaracteriza, por si só, o exercício de trabalho rural em regime de economia familiar de outro. Para ocorrer essa descaracterização, é necessária a comprovação de que a renda obtida com a atividade urbana é suficiente à subsistência da família.
O art. 106 da Lei nº 8.213/91 apresenta um rol de documentos que não configura numerus clausus, já que o "sistema processual brasileiro adotou o princípio do livre convencimento motivado" (AC nº 94.03.025723-7/SP, TRF 3ª Região, Rel. Juiz Souza Pires, 2º Turma, DJ 23.11.94, p. 67691), cabendo ao Juízo, portanto, a prerrogativa de decidir sobre a sua validade e sua aceitação.
A lei não distinguiu entre trabalhadores urbanos e rurais. A equiparação dos trabalhadores urbanos e rurais, para fins previdenciários, é garantia da Carta de 1988 e não pode ser olvidada, sem justificativa plausível, sob pena de ofensa ao princípio da isonomia e à previsão contida no seu art. 194, parágrafo único, II.
No que se refere ao recolhimento das contribuições previdenciárias, destaco que o dever legal de promover seu recolhimento junto ao INSS e descontar da remuneração do empregado a seu serviço, compete exclusivamente ao empregador, por ser este o responsável pelo seu repasse aos cofres da Previdência, a quem cabe a sua fiscalização, possuindo, inclusive, ação própria para haver o seu crédito, podendo exigir do devedor o cumprimento da legislação. No caso da prestação de trabalho em regime de economia familiar, é certo que o segurado é dispensado do período de carência, nos termos do disposto no art. 26, III, da Lei de Benefícios e, na condição de segurado especial, assim enquadrado pelo art. 11, VII, da legislação em comento, caberia o dever de recolher as contribuições, tão-somente se houvesse comercializado a produção no exterior, no varejo, isto é, para o consumidor final, para empregador rural-pessoa física, ou a outro segurado especial (art. 30, X, da Lei de Custeio).
Outra questão que suscita debates é a referente ao trabalho urbano eventualmente exercido pelo segurado ou por seu cônjuge, cuja qualificação como lavrador lhe é extensiva. Perfilho do entendimento no sentido de que o desempenho de atividade urbana, de per si, não constitui óbice ao reconhecimento do direito aqui pleiteado, desde que o mesmo tenha sido exercido por curtos períodos, especialmente em época de entressafra, quando o humilde campesino se vale de trabalhos esporádicos em busca da sobrevivência.
Do caso dos autos.
A parte autora, Neide Zonho Lima, nasceu em 01/08/1949 (fl.14v) e completou o requisito etário (55anos) em 01/08/2004, devendo comprovar o período de carência de 138 meses, conforme previsto no artigo 142 da Lei nº 8.213/91.
Como início de prova material de seu trabalho no campo no período destacado na inicial apresentou os seguintes documentos:
- Cópia de conta de energia referente a 2009, da residência em Tatuí/SP em nome de Antonio Rocha Lima;
- Certidão de Casamento celebrado em 09/10/1965 com lavrador;
- Notas fiscais de produtor rural em nome do seu marido, datadas de 1982, 1983;
-Nota promissória em nome do seu marido (1983);
-Recibos (1983);
-Certidão de posse de terras em nome de Pedro Rodrigues da Silva;
-Certidão de posse de terras em nome de Joel Novais Lima;
-Contrato de Crédito com Banco Itaú em nome de Joel Novais Lima (1983);
-Certidões de Nascimento dos filhos havidos pelo casal em (1974, 1975 e 1966).
As anotações do CNIS (fl.55) confirmam a existência dos vínculos que comprovam atividade laborativa urbana com contribuição individual, em 1993 a 1995 e 2001 a 2010, razão pela qual a D. Julgadora consignou na sentença não se tratar de aposentadoria por idade rural, já que a autora exerceu atividade urbana desde 1992, não se enquadrando no período como segurada especial, conforme preceitua o art. 11 da lei previdenciária.
Contudo, restou provado pela documentação acima arrolada que os pais da autora e seu marido exerceram a profissão de lavrador enquadrando a autora como segurada especial no período de reconhecimento pretendido inicial, representando início razoável de prova material corroborada pela prova testemunhal de efetivo trabalho prestado na lavoura por parte da autora no período destacado.
E, com efeito, o labor rural em período anterior à vigência da Lei nº 8213/91 pode ser computado independentemente de recolhimento de contribuições previdenciárias a ele correspondentes e suficiente labor rural no período reconhecido na sentença que foi corroborado por prova testemunhal.
As testemunhas ouvidas em Juízo (Alamir José Ribeiro de Souza e Neusa de Melo Costa) afirmaram que a parte demandante exerceu atividade rural lavoura de algodão, feijão e milho, em regime de economia familiar, sendo que Alamir foi quem vendeu a propriedade rural após a saída da autora das terras de Joel Novais Lima. Afirmaram ainda em seus depoimentos que conhecem a autora por mais de dez anos.
Tais depoimentos corroboram a prova documental apresentada aos autos quanto à atividade rural, possibilitando a conclusão pelo efetivo exercício de atividade rural pela parte autora, apta a tornar viável o reconhecimento de período laboral rural, uma vez que, como visto, houve início razoável de prova material corroborado pela prova oral produzida em juízo, a demonstrar que a parte autora manteve-se, no aludido período, de forma predominante nas lides rurais, em período reconhecido na sentença, tendo sido cumpridos os requisitos legais exigidos.
Dessa forma, preenchidos os pressupostos necessários ao reconhecimento do trabalho rural no período explicitado, deve ser mantida a r. sentença, na íntegra.
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS.
É o voto.
LUIZ STEFANINI
Desembargador Federal
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| Data e Hora: | 27/07/2016 16:13:48 |
