O Juiz Federal Convocado Ney Gustavo Paes de Andrade (Relator):
Trata-se de apelação interposta em ação objetivando o recebimento das diferenças apuradas em revisão administrativa do benefício de pensão por morte concedido à segurada. A r. sentença julgou procedentes os pedidos. Apelou o INSS sustentando a improcedência dos pedidos diante da decadência.
Não assiste razão à apelante.
Preliminarmente, quanto ao pedido de efeito suspensivo, o artigo 1.012, §1º, V, do CPC, estabelece que a apelação terá efeito meramente devolutivo quando interposta contra sentença que confirma, concede ou revoga tutela provisória. Esta disposição visa assegurar a eficácia das decisões judiciais que concedem medidas urgentes, garantindo que a demora no grau recursal não frustre o direito do beneficiário.
Considerando que a sentença de primeiro grau deferiu a tutela de urgência, a apelação deve ser recebida apenas no efeito devolutivo quanto a este ponto, preservando-se a eficácia da medida protetiva concedida à apelada. Rejeita-se, portanto, o pedido de efeito suspensivo.
Superada a questão preliminar, passo à análise do mérito.
A apelante sustenta a ocorrência de decadência do direito à revisão do benefício de pensão por morte, argumentando que o benefício foi concedido em 22/09/2001, sob a égide da Lei 9.711/1998, que estabelecia prazo decadencial de cinco anos para a revisão do ato de concessão, afirmando que a citação na ação civil pública 0002320-59.2012.4.03.6183/SP, ocorrida em 17/04/2012, se deu quase onze anos após a concessão, extrapolando o referido prazo.
A questão da decadência na revisão de benefícios previdenciários envolve a sucessão de normas no artigo 103 da Lei 8.213/1991. A Lei 8.213/1991, em sua redação original, não previa prazo decadencial. A Medida Provisória 1.523-9/1997 introduziu o prazo de dez anos, posteriormente reduzido para cinco anos pela Lei 9.711/1998, e restabelecido em dez anos pela Medida Provisória 138/2003, convertida na Lei 10.839/2004.
O benefício da apelada foi concedido em 22/09/2001, período em que a Lei 9.711/1998 estabelecia o prazo decadencial de cinco anos. Contudo, antes que esse prazo se exaurisse, a Lei 10.839/2004 entrou em vigor, restabelecendo o prazo de dez anos. Neste cenário de sucessão legislativa, o entendimento consolidado é que, se o prazo decadencial menor não havia se consumado quando da entrada em vigor da lei que ampliou o prazo, aplica-se o novo prazo, computando-se o lapso temporal já decorrido sob a égide da norma anterior.
Ademais, deve ser considerado o impacto do Memorando 21/DIRBEN/PFE/INSS, de 15/04/2010, que reconheceu o direito à revisão de benefícios pela aplicação do artigo 29, II, da Lei 8.213/1991, atuando como causa interruptiva do prazo prescricional e, por extensão, do prazo decadencial, reiniciando a contagem a partir de sua publicação. Nesse sentido é o entendimento desta Corte: ApCiv 5000930-39.2018.4.03.6124, Rel. Des. Fed. BAPTISTA PEREIRA, DJe 11/02/2021.
Considerando que o benefício foi concedido em 22/09/2001 e que o Memorando supracitado foi publicado em 15/04/2010, o prazo decadencial de dez anos, que recomeçou a correr em abril de 2010, ainda não havia se esgotado quando da propositura da presente ação. Portanto, a sentença de primeiro grau está correta ao afastar a decadência.
Quanto ao argumento da apelante de que possui o poder-dever de anular atos eivados de vícios e de cobrar valores indevidamente pagos, ressalta-se que é incontroversa a natureza alimentar dos benefícios previdenciários, conforme expresso no artigo 100, §1º, da Constituição Federal.
Este caráter alimentar confere aos proventos de aposentadoria e pensão uma proteção especial, reiterada pelo artigo 833, IV, do CPC, que os declara impenhoráveis, e pelo artigo 1.707 do CC, que trata da irrepetibilidade de alimentos.
No caso dos autos, a revisão do benefício ocorreu de forma automática, por força de acordo em ação civil pública, e não por solicitação ou fraude da beneficiária. A boa-fé no recebimento dos valores é evidente, pois a segurada apenas se beneficiou de uma revisão que a própria apelante implementou.
Em situações como esta, o entendimento consolidado na jurisprudência pátria é pela irrepetibilidade dos valores recebidos de boa-fé, mesmo que posteriormente a Administração entenda que houve erro (Temas 531 e 979 do STJ), destacando-se que no presente caso os descontos efetuados pela apelante foram indevidos, o que torna o caso específico diante da conduta ilegal da apelante.
Assim, a conduta do INSS de promover o estorno da revisão e a consequente redução do benefício, bem como a cobrança de valores já recebidos, é manifestamente indevida. A manutenção do benefício revisto e o pagamento das diferenças apuradas são imperativos, em prestígio aos princípios da boa-fé e da dignidade da pessoa humana (artigo 1º, III, da CF/1988).
Tratando os consectários legais de matéria de ordem pública, o efeito translativo do recurso permite a reapreciação da questão pelo órgão ad quem, ainda que de ofício.
Verifica-se que sentença foi proferida em 12/09/2018, antes, portanto, da vigência do artigo 3º da EC 113/2021, e da alteração promovida pela EC 136/2025, de modo que a atualização monetária foi estabelecida conforme a legislação então vigente, notadamente os artigos 41-A da Lei 8.213/1991 e 1º-F da Lei 9.494/1997.
Entretanto, já que as prestações serão atualizadas até a data do pagamento, ainda não efetivado, é evidente que haverá incidência de juros de mora e correção monetária após a entrada em vigor da EC 113/2021, razão pela qual há necessidade de redefinir os parâmetros do cálculo.
Nesse sentido, as parcelas vencidas deverão ser objeto de um único pagamento e serão corrigidas monetariamente e acrescidas de juros de mora em conformidade com o entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal no RE 870.947 (Tema 810 da Repercussão Geral), até a entrada em vigor da EC 113/2021, quando então passará a incidir, de forma exclusiva, a taxa Selic, conforme disposto no Manual de Cálculos da Justiça Federal e na Nota Técnica 02/2025 do CJF, emitida após a entrada em vigor da EC 136/2025.
Considerado o trabalho adicional realizado pelo advogado, em decorrência da apelação, os honorários advocatícios a cargo do INSS, por ocasião da liquidação, deverão ser acrescidos de percentual de 2%, nos termos do artigo 85, §11, do CPC, observados os termos da Súmula 111 e do Tema 1.105, ambos do STJ.
Ante o exposto, nego provimento à apelação. Corrijo, de ofício, o capítulo da sentença referente aos consectários legais.
É como voto.