
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5060832-59.2023.4.03.9999
RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: BENEDITO AMARILDO DONEDA
Advogados do(a) APELADO: HUMBERTO NEGRIZOLLI - SP80153-N, JOAO NEGRIZOLLI NETO - SP334578-N
OUTROS PARTICIPANTES:
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5060832-59.2023.4.03.9999
RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: BENEDITO AMARILDO DONEDA
Advogados do(a) APELADO: HUMBERTO NEGRIZOLLI - SP80153-N, JOAO NEGRIZOLLI NETO - SP334578-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Demanda proposta objetivando o reconhecimento como especiais de períodos laborados em condições insalubres, para fins de concessão da aposentadoria especial ou por tempo de contribuição, desde a DER.
O juízo a quo julgou parcialmente procedente o pedido formulado, concedendo a aposentadoria por tempo de contribuição, a partir da DER.
O INSS apela, alegando a falta de interesse de agir, em relação aos períodos enquadrados como especiais administrativamente e a necessidade de análise do reexame necessário. Alega ainda a nulidade da perícia judicial, tendo em vista que realizada sem a vistoria no local de trabalho e com base no relato da parte autora. No mérito, pleiteia a reforma da sentença, sustentando, em síntese, a não comprovação da efetiva exposição a agentes nocivos de forma habitual e permanente. Se vencido, requer a alteração do termo inicial e dos consectários, nos termos do recurso.
A parte autora apresenta contrarrazões e recurso adesivo, requerendo o reconhecimento como especiais dos demais períodos pleiteados, com a concessão da aposentadoria especial, a partir da DER.
Subiram os autos.
É o relatório.
VANESSA MELLO
Juíza Federal Convocada
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5060832-59.2023.4.03.9999
RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: BENEDITO AMARILDO DONEDA
Advogados do(a) APELADO: HUMBERTO NEGRIZOLLI - SP80153-N, JOAO NEGRIZOLLI NETO - SP334578-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Tempestivos os recursos e presentes os requisitos de admissibilidade, passa-se ao exame das insurgências propriamente ditas, considerando-se a matéria objeto de devolução.
Inicialmente, não é caso de se ter submetida a decisão de 1.º grau ao reexame necessário, considerando o disposto no art. 496, § 3.º, inciso I, do Código de Processo Civil, que afasta a exigência do duplo grau de jurisdição quando a condenação ou o proveito econômico for inferior a 1.000 salários mínimos.
Ademais, os períodos de 5/10/1992 a 19/4/1994 e de 13/2/1995 a 28/4/1995 já foram enquadrados como especiais administrativamente, conforme se extrai do Resumo de Documentos para Cálculo de Tempo de Contribuição (documento de Id. 273123634, p. 74), devendo o pedido ser extinto sem análise do mérito, por falta de interesse de agir.
A parte autora ajuizou a presente demanda requerendo o reconhecimento da especialidade dos períodos de 8/7/1977 a 4/10/1977, de 21/5/1984 a 28/7/1986, de 1/8/1987 a 16/6/1992, de 29/4/1995 a 7/10/1996, de 1/4/1997 a 2/5/2002, de 1/11/2002 a 10/9/2003, de 15/9/2003 a 29/12/2009, de 22/11/2010 a 18/6/2011, de 10/8/2012 a 29/7/2014 e de 3/2/2015 a 29/8/2015, para fins de concessão da aposentadoria especial ou por tempo de contribuição, a partir da DER.
Para comprovar a especialidade das atividades desenvolvidas, apresentou os PPP’s emitidos pelos empregadores e em fase de instrução processual, requereu a realização da prova pericial, tendo em vista que os documentos não retratam a realidade da exposição aos agentes nocivos, o que restou deferido.
Juntado o laudo pericial, após as manifestações das partes, o juízo a quo julgou parcialmente procedente o pedido formulado, concedendo a aposentadoria por tempo de contribuição, a partir da DER.
Ocorre que não foi realizada perícia direta em qualquer das empresas em que a parte autora trabalhou, tendo em vista as diversas atividades desenvolvidas; nem sequer houve vistoria técnica em firma alguma.
De fato, o perito judicial baseou o laudo técnico em informações prestadas pelo próprio autor e utilizou resultado quantitativo de laudo por ele confeccionado em outro processo e em laudo fornecido pela empresa.
Não foi realizada nem mesmo a efetiva medição do agente nocivo no local de trabalho da parte autora, na empresa Resitran Comércio e Transporte de Resíduos, em que realizada a perícia judicial no dia 3/6/2022 (Id. 273123734), tendo o perito declarado que apurou a exposição ao ruído de 82,2 dB(A), com base no laudo técnico fornecido pelo estabelecimento.
A jurisprudência tem admitido a utilização de perícia por similaridade, realizada em empresa com características semelhantes àquela em que se deu a prestação do serviço, quando impossível sua realização no próprio ambiente de trabalho do segurado.
Nesse sentido, é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, in verbis:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. SÚMULA 284/STF. CÔMPUTO DE TEMPO ESPECIAL. PROVA TÉCNICA. PERÍCIA POR SIMILARIDADE. CABIMENTO. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO EM PARTE E NESSA PARTE PROVIDO.
(...)
2. A tese central do recurso especial gira em torno do cabimento da produção de prova técnica por similaridade, nos termos do art. 429 do CPC e do art. 55, § 3º, da Lei 8.213/1991.
3. A prova pericial é o meio adequado e necessário para atestar a sujeição do trabalhador a agentes nocivos à saúde para seu enquadramento legal em atividade especial. Diante do caráter social da previdência, o trabalhador segurado não pode sofrer prejuízos decorrentes da impossibilidade de produção da prova técnica.
4. Quanto ao tema, a Segunda Turma já teve a oportunidade de se manifestar, reconhecendo nos autos do Recurso Especial 1.397.415/RS, de Relatoria do Ministro Humberto Martins, a possibilidade de o trabalhador se utilizar de perícia produzida de modo indireto, em empresa similar àquela em que trabalhou, quando não houver meio de reconstituir as condições físicas do local onde efetivamente prestou seus serviços.
5. É exatamente na busca da verdade real/material que deve ser admitida a prova técnica por similaridade. A aferição indireta das circunstâncias de labor, quando impossível a realização de perícia no próprio ambiente de trabalho do segurado é medida que se impõe.
6. A perícia indireta ou por similaridade é um critério jurídico de aferição que se vale do argumento da primazia da realidade, em que o julgador faz uma opção entre os aspectos formais e fáticos da relação jurídica sub judice, para os fins da jurisdição.
7. O processo no Estado contemporâneo tem de ser estruturado não apenas consoante as necessidades do direito material, mas também dando ao juiz e à parte a oportunidade de se ajustarem às particularidades do caso concreto.
8. Recurso especial conhecido em parte e nessa parte provido.
(REsp nº 1.370.229-RS, Segunda Turma, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, v.u., j. 25/02/14, DJe 11/03/14)
PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE ESPECIAL. CONFIGURAÇÃO. PERÍCIA INDIRETA EM EMPRESA SIMILAR. LOCAL DE TRABALHO ORIGINÁRIO INEXISTENTE. POSSIBILIDADE.
1. “Mostra-se legítima a produção de perícia indireta, em empresa similar, ante a impossibilidade de obter os dados necessários à comprovação de atividade especial, visto que, diante do caráter eminentemente social atribuído à Previdência, onde sua finalidade primeira é amparar o segurado, o trabalhador não pode sofrer prejuízos decorrentes da impossibilidade de produção, no local de trabalho, de prova, mesmo que seja de perícia técnica”. (REsp 1.397.415/RS, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 20.11.2013).
2. Agravo Regimental não provido.
(AgRg no REsp nº 1.422.399-RS, Segunda Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, v.u., j. 18/03/14, DJe 27/03/14)
No entanto, não constam do processo informações se as empresas em que o autor laborou tiveram as atividades encerradas ou não.
Assim, sendo o laudo pericial inconsistente, imprescindível para viabilizar a análise do pedido de reconhecimento da especialidade das atividades, a realização de nova perícia técnica para a comprovação do efetivo exercício de atividade em condições agressivas, idôneas a ocasionar danos à saúde ou à integridade física do trabalhador.
Registre-se que a perícia deve ser realizada por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho, nos termos do art. 58, § 1.º, da Lei n.º 8.213/91, com o objetivo de apurar a efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos no ambiente laborado.
Neste caso, a sentença é apenas aparentemente favorável à parte autora, já que sua manutenção depende do exame do cumprimento das exigências contidas nos dispositivos que disciplinam a matéria, não bastando a mera afirmação de que o direito lhe assiste, sem lastro suficiente nos elementos contidos nos autos.
Consoante se tem decidido desde sempre, “caracteriza-se, portanto, ainda que de modo indireto, o cerceamento de defesa, motivado por decisão precipitada, de fundamentação insuficiente, que estaria fadada a reforma, com irreparáveis prejuízos à parte, que deixou de recorrer, à vista do aparente sucesso de sua pretensão” (Rel. Des. Fed. Marianina Galante, Proc. nº 2003.03.99.029775-4).
Logo, a anulação da sentença, para a realização de nova perícia judicial, é medida que se impõe.
Posto isto, rejeito a matéria preliminar, julgo extinto o feito, sem análise do mérito, em relação aos períodos de 5/10/1992 a 19/4/1994 e de 13/2/1995 a 28/4/1995, já enquadrados como especiais administrativamente e dou parcial provimento à apelação do INSS para anular a sentença proferida, determinando o retorno dos autos à vara de origem para a produção de nova prova pericial, nos termos da fundamentação, supra, restando prejudicada a análise do mérito da apelação do INSS e o recurso adesivo da parte autora.
É o voto.
VANESSA MELLO
Juíza Federal Convocada
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PRELIMINAR. APOSENTADORIA ESPECIAL OU POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. EXPOSIÇÃO A AGENTES NOCIVOS. NECESSIDADE DE REALIZAÇÃO DE NOVA PROVA PERICIAL. ANULAÇÃO DA SENTENÇA.
- Não é caso de se ter submetida a decisão de 1.º grau ao reexame necessário, considerando o disposto no art. 496, § 3.º, inciso I, do Código de Processo Civil, que afasta a exigência do duplo grau de jurisdição quando a condenação ou o proveito econômico for inferior a 1.000 salários mínimos.
- Não foi realizada perícia direta em qualquer das empresas em que a parte autora trabalhou, tendo em vista as diversas atividades desenvolvidas; nem sequer houve vistoria técnica em firma alguma.
- O perito judicial baseou o laudo técnico em informações prestadas pelo próprio autor e utilizou resultado quantitativo de laudo por ele confeccionado em outro processo e de laudo fornecido pela empresa.
- A jurisprudência tem admitido a utilização de perícia por similaridade, realizada em empresa com características semelhantes àquela em que se deu a prestação do serviço, quando impossível sua realização no próprio ambiente de trabalho do segurado.
- Não constam do processo informações se as empresas em que o autor laborou tiveram as atividades encerradas ou não.
- Sendo o laudo pericial inconsistente, imprescindível para viabilizar a análise do pedido de reconhecimento da especialidade das atividades, a realização de nova perícia técnica para a comprovação do efetivo exercício de atividade em condições agressivas, idôneas a ocasionar danos à saúde ou à integridade física do trabalhador.
- Sentença anulada para a realização de nova perícia judicial.
ACÓRDÃO
JUÍZA FEDERAL CONVOCADA
