
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5008681-40.2018.4.03.6104
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. JOÃO CONSOLIM
APELANTE: VALDEMIR RIO LAMARCK
LITISCONSORTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: MARCUS ANTONIO COELHO - SP191005-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
LITISCONSORTE: VALDEMIR RIO LAMARCK
Advogado do(a) LITISCONSORTE: MARCUS ANTONIO COELHO - SP191005-A
OUTROS PARTICIPANTES:
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5008681-40.2018.4.03.6104
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. JOÃO CONSOLIM
APELANTE: VALDEMIR RIO LAMARCK
LITISCONSORTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: MARCUS ANTONIO COELHO - SP191005-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
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Advogado do(a) LITISCONSORTE: MARCUS ANTONIO COELHO - SP191005-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O Excelentíssimo Desembargador Federal JOÃO CONSOLIM (Relator):
Trata-se de recursos de apelação interpostos por VALDEMIR RIO LAMARCK e pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS em face da sentença (Ids 309061589 e 309061593) proferida pelo Juízo da 1ª Vara Federal da Subseção Judiciária de Santos, SP, que extinguiu parcialmente o feito, sem resolução de mérito, em relação ao pedido de reconhecimento de tempo especial no período de 18.8.1986 a 28.4.1995, com fundamento no artigo 485, inciso VI, do Código de Processo Civil; e, na parte remanescente, julgou parcialmente procedentes os pedidos veiculados na inicial, para o fim de não reconhecer como tempo especial o período de 6.3.1997 a 18.11.2003, e condenar o INSS a revisar a aposentadoria por tempo de contribuição (NB 42/170.269.012-9) mediante o reconhecimento da especialidade laboral dos períodos de 29.4.1995 a 5.3.1997 e de 19.11.2003 a 2.2.2015, com efeitos financeiros a partir da data do requerimento administrativo, em 2.2.2015. Ainda, em razão da sucumbência recíproca, condenou as partes ao pagamento de honorários advocatícios, fixados no percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, distribuídos à razão de 7% em favor do autor e 2% em favor do réu.
Em suas razões recursais (Id 309061592), o INSS alega, sucintamente, que:
- quanto ao agente ruído, sempre foi necessária a confecção de laudo técnico ambiental por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho;
- a metodologia aplicável para fim de aferir a exposição ao agente ruído em período anterior 19.11.2003 está prevista na Norma Regulamentadora n.15;
- a partir de 19.11.2003, por força do Decreto n. 4.882/2003, é obrigatória a indicação dos níveis de ruído em Nível de Exposição Normalizado (NEN);
- a mera indicação de atividades especiais no formulário previdenciário, sem que haja a informação expressa do NEN não é suficiente para caracterizar a nocividade da exposição;
- a relação de substâncias químicas descritas nos Decretos n. 53.831/1964 e 83.080/1979 é exaustiva, e a avaliação deve adotar o critério quantitativo;
- até 18.11.2003, a metodologia de avaliação dos agentes químicos é regida pelos anexos da Norma Regulamentadora n. 15;
- a partir de 19.11.2003, devem ser observadas as metodologias das Normas de Higiene Ocupacional n. 2 e n. 7 da FUNDACENTRO para o fim de aferir a nocividade dos agentes químicos;
- a legislação previdenciária exige a especificação da composição química dos óleos, graxas, e demais hidrocarbonetos aferidos no ambiente laboral;
- a informação sobre a existência de responsável técnico pela avaliação das condições ambientais do trabalho deve abranger todo o período sob análise;
- o fato da aferição técnica indicar que o benzeno ultrapassou os limites ideais no ambiente de trabalho não permite concluir que o referido agente químico encontra-se acima dos limites legais de tolerância;
- os Perfis Profissiográficos Previdenciários (PPP) juntados aos autos não atendem os requisitos legais de validade;
- a utilização de EPI eficaz neutraliza a nocividade, mesmo quando se trata de agentes químicos cancerígenos; e
- a parte autora não faz jus à especialidade dos períodos controversos, bem como não preenche os requisitos mínimos necessários para a revisão do benefício previdenciário.
Ao final, prequestiona a matéria para fins recursais e pugna pelo provimento do apelo para que seja julgado improcedente o pedido de reconhecimento de tempo especial, e negado o direito à revisão da aposentadoria por tempo de contribuição NB 42/170.269.012-9, condenando-se a parte autora nos ônus da sucumbência, com fulcro no art. 85, §§ 2º e 6º, do Código de Processo Civil. Em caso de eventual manutenção da sentença recorrida, requer a observância da prescrição quinquenal, a intimação da parte autora para firmar e juntar aos autos a autodeclaração prevista no anexo I da Portaria INSS n. 450, a fixação dos honorários advocatícios nos termos da Súmula n. 111 do STJ, a declaração de isenção de custas e outras taxas judiciárias, e o desconto dos valores já pagos administrativamente ou de qualquer benefício inacumulável recebido no período.
Por sua vez (Id 309061595), a parte autora alega, preliminarmente, o cerceamento da defesa. E, no mérito, aduz que, a despeito de a perícia judicial juntada nos autos comprovar a exposição habitual e permanente do segurado a agente químico altamente tóxico e comprovadamente cancerígeno (benzeno) durante o exercício de suas atividades profissionais, o juízo de origem não reconheceu como tempo especial o intervalo de 6.3.1997 a 18.11.2003.
Por fim, pugna pelo provimento do apelo para que seja julgado procedente o pedido de reconhecimento da especialidade laboral do período de 6.3.1997 a 18.11.2003, e determinada a integração do referido intervalo no cálculo de revisão do benefício previdenciário NB 42/170.269.012-9.
Com contrarrazões somente da parte autora, subiram os autos a esta Corte (Id 309061596).
É o relatório.
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5008681-40.2018.4.03.6104
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LITISCONSORTE: VALDEMIR RIO LAMARCK
Advogado do(a) LITISCONSORTE: MARCUS ANTONIO COELHO - SP191005-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O Excelentíssimo Desembargador Federal JOÃO CONSOLIM (Relator):
Trata-se de recursos de apelação interpostos por VALDEMIR RIO LAMARCK e pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS em face da sentença (Ids 309061589 e 309061593) proferida pelo Juízo da 1ª Vara Federal da Subseção Judiciária de Santos, SP, que extinguiu parcialmente o feito, sem resolução de mérito, em relação ao pedido de reconhecimento de tempo especial no período de 18.8.1986 a 28.4.1995, com fundamento no artigo 485, inciso VI, do Código de Processo Civil; e, na parte remanescente, julgou parcialmente procedentes os pedidos veiculados na inicial, para o fim de não reconhecer como tempo especial o período de 6.3.1997 a 18.11.2003, e condenar o INSS a revisar a aposentadoria por tempo de contribuição (NB 42/170.269.012-9) mediante o reconhecimento da especialidade laboral dos períodos de 29.4.1995 a 5.3.1997 e 19.11.2003 a 2.2.2015, com efeitos financeiros a partir da data do requerimento administrativo, em 2.2.2015. Ainda, em razão da sucumbência recíproca, condenou as partes ao pagamento de honorários advocatícios, fixados no percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, distribuídos à razão de 7% em favor do autor e 2% em favor do réu.
Da tempestividade dos recursos
Não se vislumbra, no caso em tela, hipótese de intempestividade recursal.
Da nulidade da sentença por cerceamento de defesa
É cediço que o juiz não está obrigado a produzir todas as provas requeridas pelas partes, caso já possua elementos de convicção suficientes para o julgamento do mérito. Sendo assim, é plenamente possível o indeferimento de provas que considerar desnecessárias, em consonância com o disposto nos artigos 355, I, e 370, caput, ambos do Código de Processo Civil.
Assim, não há que se falar em cerceamento de defesa em decorrência do indeferimento de produção probatória, mormente para a hipótese em que o preenchimento das condições da norma previdenciária deve se dar, em regra, por prova documental e, especialmente, por prova pericial.
Portanto, em nosso sistema jurídico, o juiz é, por excelência, o destinatário da prova, cabendo a ele, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias à instrução do processo, indeferindo as diligências inúteis ou meramente protelatórias (artigo 370, CPC). Assim, incumbe ao órgão julgador a valoração do conjunto probatório trazido a exame. Nesse sentido: STJ, RESP n. 200802113000, Quarta Turma, Relator Ministro Luis Felipe Salomão, DJE 26.3.2013; AGA 200901317319, Primeira Turma, Relator Ministro Arnaldo Esteves Lima, DJE 12.11.2010; TRF3, AI n. 5031841-97.2023.4.03.0000, Oitava Turma, Relator Desembargador Federal Toru Yamamoto, DJE 29.4.2024).
No mesmo sentido é o entendimento do colendo Superior Tribunal de Justiça:
“PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. SERVIDOR PÚBLICO. INDEFERIMENTO DE PRODUÇÃO DE PROVA TESTEMUNHAL. DISCRICIONARIEDADE DO JULGADOR. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. REEXAME DE PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO.
1. O Agravo Interno não merece prosperar, pois a ausência de argumentos hábeis para alterar os fundamentos da decisão ora agravada torna incólume o entendimento nela firmado.
2. Não há cerceamento de defesa quando o julgador, ao constatar nos autos a existência de provas suficientes para o seu convencimento, indefere pedido de produção de prova testemunhal. Cabe ao juiz decidir, motivadamente, sobre os elementos necessários à formação de seu entendimento, pois, como destinatário da prova, é livre para determinar as provas necessárias ou indeferir as inúteis ou protelatórias.
3. Consoante entendimento desta Corte, "a apuração da necessidade de produção da prova testemunhal ou a ocorrência de cerceamento de defesa decorrente da falta daquela demandam reexame de aspectos fático-probatórios, o que encontra óbice na Súmula 7 do STJ" (STJ, REsp 1.791.024/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe de 23/04/2019).
4. Agravo interno não provido.”
(STJ, AgInt no AREsp n. 1.604.351/MG, relator Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, Segunda Turma, julgado em 14.6.2022, DJe de 20.6.2022)
Todavia, essa assertiva de que o juiz é o destinatário da prova, cabendo a ele determinar as provas necessárias à instrução do processo, deve ser tratada de forma contextualizada, principalmente diante das inovações introduzidas pelo Código de Processo Civil, as quais permitem afirmar que o conjunto probatório é de interesse de todos os sujeitos do processo.
O artigo 6º do Código de Processo Civil, com intuito de garantir que as partes contribuam de forma efetiva para o deslinde processual e que tenham a convicção de que os elementos comprobatórios foram adequados ao caso concreto, trouxe o princípio da cooperação como norte do devido processo legal.
Noutro giro, não se pode olvidar que, salvo em excepcionalíssimos casos, a jurisdição não se exaure na primeira instância, cumprindo aos Tribunais de segundo grau conhecerem das questões de fato que envolvem a lide, sendo ínsito uma reanálise da prova produzida. Esse fato, por si só, já induz à conclusão de que, embora o juiz singular seja o responsável direto pela mais completa instrução do feito, a prova é destinada a todos que possuem a competência para definir o resultado da lide.
Dessa forma, impõe-se considerar que o princípio do livre convencimento motivado ou da persuasão racional não pode ser traduzido como uma autorização para que o magistrado descuide do fato de que não é o único destinatário da prova. E, a fim de se evitar nulidade do processo por cerceamento de defesa, o juiz deve indicar em sua decisão os motivos pelos quais acolhe ou rejeita os elementos probatórios e, principalmente, os pedidos de produção de provas classificadas como imprescindíveis pelos demais interessados no processo.
No que se refere à prova pericial, a Lei n. 9.032/1995, em seu artigo 57, § 3º, estabelece que “a concessão da aposentadoria especial dependerá de comprovação pelo segurado, perante o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), do tempo de trabalho permanente, não ocasional nem intermitente, em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante o período mínimo fixado.”
O artigo 369 do Código de Processo Civil, preconiza que “as partes têm o direito de empregar todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste Código, para provar a verdade dos fatos em que se funda o pedido ou a defesa e influir eficazmente na convicção do juiz.”
Esta Décima Turma tem firmado o entendimento de que é necessária a produção de prova pericial quando os documentos apresentados não são suficientes para demonstrar que a parte foi submetida à ação de agentes agressivos, ou quando há notícia do encerramento das atividades do empregador. Nesse sentido: AI n. 5002067-85.2024.4.03.0000, Décima Turma, Relatora Juíza Federal Convocada Raecler Baldresca, DJE 13.5.2024.
Portanto, a perícia judicial torna-se necessária para a resolução do litígio na medida em que é imprescindível para subsidiar o magistrado na formação de sua convicção sobre o pedido formulado pelo autor, conforme ilação extraída do artigo 480 do Código de Processo Civil.
No caso, observa-se que as conclusões veiculadas no laudo da perícia judicial anexado aos autos (Id 309061579) é suficiente para a resolução da demanda. Portanto, resta suprida qualquer eventual omissão probatória alegada pelo autor.
Da aposentadoria especial
A aposentadoria especial foi criada pela Lei n. 3.807/1960 e mantida pela Lei n. 8.213/1991. É uma modalidade de aposentadoria por tempo de contribuição, com período de carência reduzido para 15, 20 ou 25 anos, conforme a atividade habitualmente exercida pelo trabalhador, o qual, no exercício dessas atividades, fica exposto a agentes nocivos químicos, físicos, biológicos ou a uma associação desses agentes, que são prejudiciais à saúde ou à integridade física.
A Lei n. 8.213/1991, na redação que lhe foi dada pela Lei n. 9.032/1995, estabelece que: “A aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei”.
Originariamente, o artigo 58 da Lei n. 8.213/1991 determinava que as atividades profissionais prejudiciais à saúde ou à integridade física seriam definidas em lei específica. Posteriormente, a Lei 9.528/1997 alterou a mencionada norma, transferindo ao Poder Executivo a incumbência de elaborar a relação dos agentes nocivos a serem considerados para a concessão da aposentadoria especial.
O benefício pode ser concedido aos segurados que preencheram os respectivos requisitos até a data da promulgação da Emenda Constitucional n. 103/2019 (13.11.2019), a qual estabeleceu que, para a concessão de aposentadoria aos segurados que trabalham em condições especiais, devem ser observadas regras de tempo de contribuição e de idade mínima a serem definidas por meio de lei complementar.
Importa destacar que a nova redação do inciso II, do § 1.º, do artigo 201 da Constituição da República, retirou do seu texto a menção à exposição dos segurados a agentes insalubres e perigosos:
“Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma do Regime Geral de Previdência Social, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, na forma da lei, a:
(...)
§ 1º É vedada a adoção de requisitos ou critérios diferenciados para concessão de benefícios, ressalvada, nos termos de lei complementar, a possibilidade de previsão de idade e tempo de contribuição distintos da regra geral para concessão de aposentadoria exclusivamente em favor dos segurados:
I - com deficiência, previamente submetidos a avaliação biopsicossocial realizada por equipe multiprofissional e interdisciplinar;
II - cujas atividades sejam exercidas com efetiva exposição a agentes químicos, físicos e biológicos prejudiciais à saúde, ou associação desses agentes, vedada a caracterização por categoria profissional ou ocupação.
(...)
§ 7º É assegurada aposentadoria no regime geral de previdência social, nos termos da lei, obedecidas as seguintes condições:
I - 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 62 (sessenta e dois) anos de idade, se mulher, observado tempo mínimo de contribuição; ”.
A Emenda Constitucional n. 103/2019 ainda estabeleceu:
“Art. 19. Até que lei disponha sobre o tempo de contribuição a que se refere o inciso I do § 7º do art. 201 da Constituição Federal, o segurado filiado ao Regime Geral de Previdência Social após a data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional será aposentado aos 62 (sessenta e dois) anos de idade, se mulher, 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, com 15 (quinze) anos de tempo de contribuição, se mulher, e 20 (vinte) anos de tempo de contribuição, se homem.
§ 1º Até que lei complementar disponha sobre a redução de idade mínima ou tempo de contribuição prevista nos §§ 1º e 8º do art. 201 da Constituição Federal, será concedida aposentadoria:
I - aos segurados que comprovem o exercício de atividades com efetiva exposição a agentes químicos, físicos e biológicos prejudiciais à saúde, ou associação desses agentes, vedada a caracterização por categoria profissional ou ocupação, durante, no mínimo, 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, nos termos do disposto nos arts. 57e 58 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, quando cumpridos:
a) 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, quando se tratar de atividade especial de 15 (quinze) anos de contribuição;
b) 58 (cinquenta e oito) anos de idade, quando se tratar de atividade especial de 20 (vinte) anos de contribuição; ou
c) 60 (sessenta) anos de idade, quando se tratar de atividade especial de 25 (vinte e cinco) anos de contribuição...”
Assim, para os segurados filiados ao Regime Geral de Previdência Social após a promulgação da Emenda Constitucional n. 103/2019, há a exigência de idade mínima e de tempo de contribuição.
Em razão da necessidade de garantir a segurança jurídica àqueles que já estavam filiados ao Regime Geral de Previdência Social, a referida Emenda Constitucional ressalvou regras de transição:
“Art. 21. O segurado ou o servidor público federal que se tenha filiado ao Regime Geral de Previdência Social ou ingressado no serviço público em cargo efetivo até a data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional cujas atividades tenham sido exercidas com efetiva exposição a agentes químicos, físicos e biológicos prejudiciais à saúde, ou associação desses agentes, vedada a caracterização por categoria profissional ou ocupação, desde que cumpridos, no caso do servidor, o tempo mínimo de 20 (vinte) anos de efetivo exercício no serviço público e de 5 (cinco) anos no cargo efetivo em que for concedida a aposentadoria, na forma dos arts. 57 e 58 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, poderão aposentar-se quando o total da soma resultante da sua idade e do tempo de contribuição e o tempo de efetiva exposição forem, respectivamente, de:
I - 66 (sessenta e seis) pontos e 15 (quinze) anos de efetiva exposição;
II - 76 (setenta e seis) pontos e 20 (vinte) anos de efetiva exposição; e
III - 86 (oitenta e seis) pontos e 25 (vinte e cinco) anos de efetiva exposição.
§ 1º A idade e o tempo de contribuição serão apurados em dias para o cálculo do somatório de pontos a que se refere o caput.”
A regra de transição, portanto, exige a pontuação decorrente da soma da idade e do tempo de contribuição do segurado e o tempo de efetiva exposição aos agentes nocivos.
Cabe ressaltar que a ADI 6309, de relatoria do Ministro Roberto Barroso e que está pendente de julgamento pelo excelso Supremo Tribunal Federal, versa sobre a declaração de inconstitucionalidade das seguintes mudanças promovidas pela Emenda Constitucional n. 103/2019: i) fixação de idade mínima para a aposentadoria especial; ii) forma de cálculo de cálculo da aposentadoria especial; e iii) impossibilidade de conversão de tempo de trabalho especial em comum.
Nesta oportunidade, ainda importa ressaltar que, com relação à constitucionalidade do § 8.º, do artigo 57, da Lei n. 8.213/1991, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento da Repercussão Geral no Recurso Extraordinário n. 791.961 (Tema n. 709), firmou a seguinte tese jurídica:
I) É constitucional a vedação de continuidade da percepção de aposentadoria especial se o beneficiário permanece laborando em atividade especial ou a ela retorna, seja essa atividade especial aquela que ensejou a aposentação precoce ou não.
II) Nas hipóteses em que o segurado solicitar a aposentadoria e continuar a exercer o labor especial, a data de início do benefício será a data de entrada do requerimento, remontando a esse marco, inclusive, os efeitos financeiros. Efetivada, contudo, seja na via administrativa, seja na judicial a implantação do benefício, uma vez verificado o retorno ao labor nocivo ou sua continuidade, cessará o pagamento do benefício previdenciário em questão.
Da comprovação da atividade especial
É importante observar que a dinâmica da legislação previdenciária impõe uma breve exposição sobre as sucessivas leis que disciplinaram o critério para reconhecimento do tempo de serviço em atividade especial, pois a delineação do tempo de serviço como especial deve absoluta observância à legislação da época do trabalho prestado.
Com efeito, a jurisprudência pacificou-se no sentido de que a legislação aplicável para a caracterização da atividade especial é a vigente no período em que a atividade a ser avaliada foi efetivamente exercida.
A aposentadoria especial foi instituída pelo artigo 31 da Lei n. 3.807/1960. Nesse contexto, foram baixados pelo Poder Executivo os Decretos n. 53.831/1964 e 83.080/1979, relacionando os serviços considerados penosos, insalubres ou perigosos.
A Lei n. 8.213/1991, em suas disposições finais e transitórias, estabeleceu, em seu artigo 152, que a relação de atividades profissionais prejudiciais à saúde ou à integridade física deverá ser submetida à apreciação do Congresso Nacional, prevalecendo, até então, a lista constante da legislação em vigor para aposentadoria especial.
O artigo 57 da Lei n. 8.213/1991, na redação da Lei n. 9.032/1995, dispõe que a aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida na Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos.
Até a publicação da Lei n. 9.032, de 28.4.1995, o reconhecimento do tempo de serviço em atividade especial dava-se pelo enquadramento da atividade ou grupo profissional do trabalhador aos termos dos Decretos n. 53.831/1964 e 83.080/1979.
Cabe ressaltar que os citados Decretos vigeram de forma simultânea, não havendo revogação daquela legislação por esta, de forma que, verificando-se divergência entre as duas normas, deverá prevalecer aquela mais favorável ao segurado. O colendo Superior Tribunal de Justiça já se pronunciou nesse sentido:
“PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO COMUM. RUÍDO. LIMITE. 80 DB. CONVERSÃO ESPECIAL. POSSIBILIDADE.
1. As Turmas que compõem a Egrégia Terceira Seção firmaram sua jurisprudência no sentido de que é garantida a conversão do tempo de serviço prestado em atividade profissional elencada como perigosa, insalubre, ou penosa em rol expedido pelo Poder Executivo (Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79), antes da edição da Lei nº 9.032/95.
2. Quanto ao lapso temporal compreendido entre a publicação da Lei nº 9.032/95 (29/04/1995) e a expedição do Decreto nº 2.172/97 (05/03/1997), e deste até o dia 28/05/1998, há necessidade de que a atividade tenha sido exercida com efetiva exposição a agentes nocivos, sendo que a comprovação, no primeiro período, é feita com os formulários SB-40 e DSS-8030, e, no segundo, com a apresentação de laudo técnico.
3. O art. 292 do Decreto nº 611/92 classificou como especiais as atividades constantes dos anexos dos decretos acima mencionados. Havendo colisão entre preceitos constantes nos dois diplomas normativos, deve prevalecer aquele mais favorável ao trabalhador, em face do caráter social do direito previdenciário e da observância do princípio in dúbio pro misero.
4. Deve prevalecer, pois, o comando do Decreto nº 53.831/64, que fixou em 80 db o limite mínimo de exposição ao ruído, para estabelecer o caráter nocivo da atividade exercida.
5. A própria autarquia reconheceu o índice acima, em relação ao período anterior à edição do Decreto nº 2.172/97, consoante norma inserta no art. 173, inciso I, da Instrução Normativa INSS/DC nº 57, de 10 de outubro de 2001 (D.O.U. de 11/10/2001).
6. Recurso especial conhecido e parcialmente provido”.
(STJ, Resp. n. 412351/RS, Quinta Turma, Relatora Ministra LAURITA VAZ, julgado em 21.10.2003, DJ 17.11.2003, p. 355).
Alterando critério anterior, a Lei n. 9.032/1995 impôs a necessidade de apresentação de formulário, inicialmente conhecido como SB-40 e depois chamado DSS-8030, que descrevia a atividade do segurado e dos agentes nocivos, aos quais ele era exposto em razão do exercício da atividade laboral.
Os agentes prejudiciais à saúde foram relacionados no Decreto n. 2.172, de 5.3.1997 (art. 66 e Anexo IV), mas por tratar de matéria reservada à lei, o mencionado Decreto somente teve eficácia a partir da edição da Lei n. 9.528, de 10.12.1997, que deu nova redação ao artigo 58 da Lei n. 8.213/1991, reafirmando a necessidade de laudo técnico, estabelecendo que os agentes nocivos seriam definidos por ato do Poder Executivo, instituindo o perfil profissiográfico (§ 4.º).
Cabe anotar, nesta oportunidade, que a Medida Provisória n. 1.523, de 11.10.1996 foi convalidada pela MP n. 1.596-14, de 10.11.1997 e, posteriormente, convertida na Lei n. 9.528/1997.
Nesse sentido, esta Décima Turma entendeu que “... Até 29/04/95 a comprovação do tempo de serviço laborado em condições especiais era feita mediante o enquadramento da atividade no rol dos Decretos 53.831/64 e 83.080/79. A partir daquela data até a publicação da Lei 9.528/97, em 10/12/1997, por meio da apresentação de formulário que demonstre a efetiva exposição de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais a saúde ou a integridade física. Após 10/12/1997, tal formulário deve estar fundamentado em laudo técnico das condições ambientais do trabalho, assinado por médico do trabalho ou engenheiro do trabalho. Quanto aos agentes ruído e calor, o laudo pericial sempre foi exigido. (TRF/3ª Região, ApRemNec n. 5000491-95.2017.4.03.6113, Relator Desembargador Federal PAULO OCTAVIO BAPTISTA PEREIRA,10ª Turma, DJEN DATA: 2.5.2024).
Com a edição do Decreto n. 3.048/1999, vigente a partir de 12 de maio de 1999, a comprovação da efetiva exposição aos agentes nocivos passou a ser feita em formulário emitido pela empresa, com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho (§ 2.º do art. 68). O citado Decreto, no § 2.º de seu artigo 68 com a redação dada pelo Decreto n. 4.032/2001, estabeleceu que “a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos será feita mediante formulário denominado perfil profissiográfico previdenciário, na forma estabelecida pelo Instituto Nacional do Seguro Social, emitido pela empresa ou seu preposto, com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho”.
O Decreto n. 4.032, de 26.11.2001 alterou dispositivos do Decreto n. 3.048/1999, regulamentando o “Perfil Profissiográfico Previdenciário” (PPP), documento regulamentado em várias Instruções Normativas do Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, até que o artigo 272 da Instrução Normativa 45/2010, dispunha que: “A partir de 1º de janeiro de 2004, conforme estabelecido pela Instrução Normativa nº 99, de 2003, a empresa ou equiparada à empresa deverá preencher o formulário PPP, conforme Anexo XV, de forma individualizada para seus empregados, trabalhadores avulsos e cooperados, que laborem expostos a agentes nocivos químicos, físicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física...”. Nesse sentido: TRF/3ª Região, AI 5011336-22.2022.4.03.0000, Décima Turma, Relator Desembargador Federal NELSON DE FREITAS PORFIRIO JUNIOR, DJEN 28.10.2022.
O Perfil Profissiográfico Previdenciário, que retrata as características do trabalho do segurado e traz a identificação do engenheiro ou perito responsável pela avaliação das condições de trabalho, é apto a comprovar o exercício de atividade sob aventadas condições especiais, passando a substituir o laudo técnico.
Além disso, o próprio INSS reconhece que o PPP é documento suficiente a comprovar o histórico laboral do segurado e as condições especiais de trabalho, bem como que o referido documento, que substituiu os formulários SB-40, DSS-8030, reúne as informações do Laudo Técnico de Condições Ambientais de Trabalho - LTCAT e é de entrega obrigatória aos trabalhadores, por ocasião do desligamento da empresa.
Outrossim, a jurisprudência desta Corte destaca a prescindibilidade de juntada de laudo técnico aos autos ou de realização de laudo pericial, nos casos em que o segurado apresenta PPP para comprovar o trabalho em condições especiais:
“PREVIDENCIÁRIO. MATÉRIA PRELIMINAR. INEXISTÊNCIA DE CERCEAMENTO DE DEFESA. DECADÊNCIA E PRESCRIÇÃO DE FUNDO DE DIREITO. INOCORRÊNCIA. REVISÃO DE BENEFÍCIO. ATIVIDADE ESPECIAL. RECONHECIMENTO DE SEU EXERCÍCIO. CONVERSÃO PARA TEMPO DE SERVIÇO COMUM.
I. Apresentado, com a inicial, o PPP - Perfil Profissiográfico Previdenciário, não cabe a produção de prova pericial, já que nele consubstanciada. Eventual perícia realizada por perito nomeado pelo juízo não espelharia a realidade da época do labor, já que o que se pretende demonstrar é o exercício de condições especiais de trabalho existentes na empresa num interregno muito anterior ao ajuizamento da ação. Desnecessidade de produção da prova testemunhal, já que a questão posta nos autos prescinde de provas outras que as já existentes nos autos, para análise.
(Omissis)
IV. A legislação aplicável ao reconhecimento da natureza da atividade exercida pelo segurado - se comum ou especial -, bem como à forma de sua demonstração, é aquela vigente à época da prestação do trabalho respectivo.
V. A atividade especial pode ser assim considerada mesmo que não conste expressamente em regulamento, bastando a comprovação da exposição a agentes agressivos por prova pericial. Súmula nº 198/TFR. Orientação do STJ.
(Omissis)”
(TRF/3.ª Região, AC 1117829/SP, Relatora Desembargadora Federal MARISA SANTOS, Nona Turma, DJU 20.5.2010, p. 930)
No mesmo sentido: TRF/3.ª Região, AC 2008.03.99.028390-0, Relator Desembargador Federal SÉRGIO NASCIMENTO, 10.ª Turma, DJU 24.2.2010, pág. 1406; e TRF/3.ª Região, AC 2008.03.99.032757-4, Relatora Desembargadora Federal Giselle França, 10.ª Turma, DJU 24.9.2008.
Feitas essas considerações sobre as regras de comprovação das condições especiais de trabalho, cabe destacar que, quanto aos agentes “calor” e “ruído”, sempre se exigiu laudo para a comprovação da respectiva nocividade.
Destarte, o trabalho em atividades especiais, ressalvados os agentes calor e ruído, para os quais sempre se exigiu laudo, deve se dar da seguinte forma:
| Período | Forma de Comprovação |
| Até 28.4.1995 | Por mero enquadramento profissional ou pela presença dos agentes físicos, químicos ou biológicos previstos nos anexos I e II do Decreto n. 83.080/79, e anexo do Decreto n. 53.831/64 Sem necessidade de apresentação de laudo técnico (exceto exposição aos agentes nocivos ruído, poeira e calor) |
| De 29.4.1995 (data do início da vigência da Lei n. 9.032) a 10.12.1997 (dia que antecedeu o início da vigência da Lei n. 9.528) | Pelos formulários SB-40 ou DSS-8030 (ou laudo) |
| De 11.12.1997 (início da vigência da Lei n. 9.528) a 31.12.2003 | Por formulários SB-40 ou DSS-8030 ou PPP, fundamentados em laudo técnico |
| A partir de 1.º.1.2004 (artigo 272 da IN – INSS n. 45/2010) | Por meio de PPP, o qual deve conter a identificação do responsável técnico pela avaliação das condições do ambiente de trabalho |
Observo, ainda, que, consoante o que dispõe o artigo 58, § 2.º, da Lei n. 8.213/1991, na redação da Lei n. 9.732/1998, o laudo técnico deve conter informação sobre a existência de tecnologia de proteção coletiva ou individual que diminua a intensidade do agente agressivo a limites de tolerância e recomendação sobre a sua observância pelo estabelecimento.
Do agente nocivo ruído
No tocante ao agente nocivo “ruído”, de acordo com a legislação previdenciária, e respectivas alterações, tem-se o seguinte: “1.1.6 – ruído acima de 80 decibéis”, do Decreto n. 53.831/1964; “2.0.1 - ruído acima de 90 decibéis”, do Anexo IV do Decreto 2.172/1997 e do Decreto n. 3.048/1999, em sua redação original; e “2.0.1 – ruído acima de 85 decibéis", do Anexo IV do Decreto n 3.048, de 1999, com as alterações do Decreto n. 4.882, de 2003.
Cabe observar que o colendo Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento de que o Decreto n. 53.831/1964 e o Decreto n. 83.080/1979 vigeram simultaneamente, de forma que, constatando-se divergência entre as duas normas, deverá prevalecer aquela mais favorável ao segurado (REsp 412351/RS, 5.ª Turma, Relatora Ministra LAURITA VAZ, DJU 17.11.2003).
Outrossim, de acordo com o julgamento do REsp 1.398.260/PR, representativo da controvérsia, aquela colenda Corte se posicionou no sentido de que o limite de tolerância para o agente agressivo “ruído”, no período de 6.3.1997 a 18.11.2003, deve ser de 90dB, conforme previsto no Anexo IV do Decreto n. 2.172/1997, sendo indevida a aplicação retroativa do Decreto n. 4.882/2003, que reduziu tal patamar para 85dB. Confira-se o julgado:
“ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. PREVIDENCIÁRIO. REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL. TEMPO ESPECIAL. RUÍDO. LIMITE DE 90 DB NO PERÍODO DE 6.3.1997 A 18.11.2003. DECRETO 4.882/2003. LIMITE DE 85 DB. RETROAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. APLICAÇÃO DA LEI VIGENTE À ÉPOCA DA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. Controvérsia submetida ao rito do art. 543-C do CPC.
(Omissis)
2. O limite de tolerância para configuração da especialidade do tempo de serviço para o agente ruído deve ser de 90 dB no período de 6.3.1997 a 18.11.2003, conforme Anexo IV do Decreto 2.172/1997 e Anexo IV do Decreto 3.048/1999, sendo impossível aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB (ex-LICC). Precedentes do STJ.
(Omissis)”
(STJ, REsp 1398260/PR, Primeira Seção, Relator Ministro Herman Benjamim, DJ 5.12.2014)
Assim, a exposição a ruído será considerada prejudicial quando não observados os limites de tolerância relativos aos seguintes períodos:
Período | Nível de ruído | Fundamentação |
| até 5.3.1997 | 80 decibéis (dB) | Item 1.1.6 do Anexo do Decreto n. 53.831/1964 (item inserido dentro código 1.0.0) |
| de 6.3.1997 a 18.11.2003 | 90 decibéis (dB) | código 2.0.1 do Anexo IV do Decreto 2.172/1997 e do Decreto n. 3.048/1999, em sua redação original |
| A partir de 19.11.2003 | 85 decibéis (dB) | código 2.0.1 do Anexo IV do Decreto n. 3.048/1999, com redação dada pelo Decreto n. 4.882/2003 |
Salienta-se, ainda, que, segundo a tese firmada pelo Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do REsp n. 1.886.795/RS e REsp n. 1.890.010/RS, afetados ao rito dos recursos repetitivos (Tema 1.083), “O reconhecimento do exercício de atividade sob condições especiais pela exposição ao agente nocivo ruído, quando constatados diferentes níveis de efeitos sonoros, deve ser aferido por meio do Nível de Exposição Normalizado (NEN). Ausente essa informação, deverá ser adotado como critério o nível máximo de ruído (pico de ruído), desde que perícia técnica judicial comprove a habitualidade e a permanência da exposição ao agente nocivo na produção do bem ou na prestação do serviço”.
Note-se que o mencionado acórdão REsp n. 1.886.795/RS asseverou que “a utilização do critério do pico máximo não fere o disposto no § 1º, do art. 58, da Lei nº 8.213/91 (...) Dessa forma, mostra-se desarrazoado desconsiderar a exposição habitual do trabalhador a pico de ruído que, por mesmo por alguns minutos, passa do tolerável, sem reconhecer-lhe o direito ao cômputo diferenciado de sua atividade, que é a própria finalidade da norma previdenciária (...)”.
Nesse sentido, destaque-se o entendimento desta Corte:
“PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. ATIVIDADE ESPECIAL. RUÍDO VARIÁVEL. TEMA Nº 1.083 DO STJ. RECONHECIMENTO.
(Omissis)
14 - Segundo a Tese nº 1.083 do STJ, firmada no julgamento dos Recursos Especiais nº 1.886.795/RS e nº 1.890.010/RS, pela sistemática de Recursos Repetitivos, somente é exigível a aferição do ruído por meio do Nível de Exposição Normalizado (NEN) quando constatados diferentes níveis de efeitos sonoros a partir da edição do Decreto nº 4.882/03 (publicado em 19 de novembro de 2003).
15 - Assim, em período anterior à publicação do decreto, é certo que, até então, vinha-se aplicando o entendimento no sentido da impossibilidade de reconhecimento da especialidade da atividade, na hipótese de submissão do empregado a nível de pressão sonora de intensidade variável, em que aquela de menor valor fosse inferior ao limite estabelecido pela legislação vigente.
16 - Ao revisitar os julgados sobre o tema, tormentoso, percebe-se nova reflexão jurisprudencial, a qual se adere, para admitir a possibilidade de se considerar, como especial, o trabalho desempenhado sob sujeição a ruído em sua maior intensidade, na medida em que esta acaba por mascarar a de menor intensidade, militando em favor do segurado a presunção de que uma maior pressão sonora prevalecia sobre as demais existentes no mesmo setor.
17 - Registre-se, a esse respeito, precedente do C. Superior Tribunal de Justiça, segundo o qual "não sendo possível aferir a média ponderada, deve ser considerado o maior nível de ruído a que estava exposto o segurado, motivo pelo qual deve ser reconhecida a especialidade do labor desenvolvido pelo segurado no período, merecendo reforma, portanto, a decisão agravada que considerou equivocadamente que o labor fora exercido pelo segurado com exposição permanente a ruído abaixo de 90dB no período de 6.3.1997 a 18.11.2003" (AgRg no REsp nº 1.398.049/PR, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, decisão monocrática, DJe 13/03/2015).
(Omissis)”
(TRF/3.ª Região, ApCiv 0006692-80.2014.4.03.6183, Relator Desembargador Federal CARLOS EDUARDO DELGADO, Sétima Turma, DJe 16.3.2022)
Ainda, não há que falar em aplicação da legislação trabalhista à espécie, uma vez que a questão é eminentemente previdenciária, existindo normatização específica a regê-la no Direito pátrio.
Dos agentes químicos (orgânicos e inorgânicos)
A exposição habitual e permanente, durante o exercício da atividade laboral, a agentes químicos tais como: chumbo, hidróxido de sódio, óxido de alumínio, cobre e outros tóxicos inorgânicos, é apta a classificar os respectivos períodos como especiais, conforme estabelecido nos itens 1.2.9 e 1.2.11, do Quadro do Decreto n. 53.831/1964; e 1.2.10 e 1.2.11 do Anexo I do Decreto n. 83.080/1979 e 1.0.17 e 1.0.19 dos Decretos 2.172/1997 e 3.048/1999.
No que tange ao enquadramento da atividade especial por trabalho em contato com agentes químicos da classe dos hidrocarbonetos, o Decreto n. 53.831/1964, revogado pelo Decreto n. 62.755/1968, que dispunha sobre a aposentadoria especial, previa como “serviços insalubres, perigosos ou penosos” aqueles que ensejavam contato com agentes nocivos elencados em seu anexo. A referida norma reconhecia o direito ao cômputo, como tempo especial de trabalho, dos períodos em que o segurado trabalhava exposto a derivados tóxicos do carbono.
O Decreto n. 83.080/1979, revogado pelo Decreto n. 3.048/1999, nos itens 1.2.10 e 1.2.11 de seu Anexo I, estabelecia o enquadramento específico dos hidrocarbonetos e de outros compostos de carbono como agentes nocivos.
A partir da vigência do Decreto n. 2.172/1997, posteriormente revogado pelo Decreto n. 3.048/1999, o regulamento da Previdência Social deixou de conter previsão específica da concessão de aposentadoria especial em razão de trabalho que ocasione contato com hidrocarbonetos.
Quanto à prova da exposição do segurado aos mencionados agentes químicos, cabe destacar que não se desconhece o entendimento firmado por ocasião do julgamento do Tema TNU n. 298: “A partir da vigência do Decreto n. 2.172/97, a indicação genérica de exposição a ‘hidrocarbonetos’ ou 'óleos e graxas', ainda que de origem mineral, não é suficiente para caracterizar a atividade como especial, sendo indispensável a especificação do agente nocivo”.
Outrossim, não se desconhece o parecer da Fundacentro, que fundamentou a tese vencedora no julgamento do mencionado Tema e que contém explicação didática acerca da existência de alguns hidrocarbonetos que não nocivos quando presentes no ambiente de trabalho.
Todavia, considerando-se o caráter social e protetivo do Direito Previdenciário, entendo que a aplicação da tese relativa ao Tema TNU n. 298 não é adequada ao presente caso. Com efeito, ainda que haja omissão acerca da especificação do agente nocivo hidrocarboneto, deve-se ponderar que, ao registrar determinados agentes químicos, no PPP, como "fator de risco", a empresa empregadora indica essas substâncias como “prejudiciais à saúde”; e que o referido registro, que é subscrito por responsável técnico habilitado, enseja um impacto financeiro decorrente dos acréscimos incidentes nas contribuições previdenciárias a cargo da empresa (artigo 57, § 6º da Lei n. 8.213/1991).
Anoto, ainda, que o preenchimento de formulário ou elaboração de laudo técnico insuficiente, sem a especificação exata dos agentes químicos contidos no ambiente de trabalho, não pode prejudicar o trabalhador que esteve exposto a tais agentes, uma vez que compete ao Ministério do Trabalho e Emprego a fiscalização das empresas, inclusive quanto à correta avaliação das condições ambientais do trabalho prestado.
Por outro lado, não se pode ignorar que, por ser o julgador o destinatário das provas, a ele incumbe a valoração do conjunto probatório trazido a exame, bem como formar sua convicção à luz do princípio do livre convencimento motivado, inclusive mediante a utilização das regras de experiência comum, consoante expressa disposição do artigo 375 do Código de Processo Civil.
Assim, ganha importância a análise das condições em que a atividade laboral é desempenhada e, caso haja a constatação de que a exposição a agente nocivo é inerente à profissão do segurado, é possível o reconhecimento da especialidade das condições de trabalho, mesmo sem a especificação exata do mencionado agente.
Nesse contexto, é razoável que se atribua ao INSS o ônus de comprovar que as condições ambientais de trabalho, por exposição a agente químico hidrocarboneto específico, não são prejudiciais à saúde do trabalhador.
Nesta oportunidade, importa destacar a tese firmada pelo colendo Superior Tribunal de Justiça por ocasião do julgamento do REsp 1.306.113, atinente ao Tema n. 534:
“As normas regulamentadoras que estabelecem os casos de agentes e atividades nocivos à saúde do trabalhador são exemplificativas, podendo ser tido como distinto o labor que a técnica médica e a legislação correlata considerarem como prejudiciais ao obreiro, desde que o trabalho seja permanente, não ocasional, nem intermitente, em condições especiais (art. 57, § 3º, da Lei 8.213/1991).”.
Cabe anotar que a Norma Regulamentadora n. 15, aprovada pela Portaria MT n. 3.214/1978, em seu Anexo 13, relaciona, como “atividade insalubre”, a mera manipulação de óleos minerais, hidrocarbonetos aromáticos, tóxicos inorgânicos e poeiras mineiras.
Dessa forma, os riscos ocupacionais gerados por esses agentes, não requerem, como regra, a análise quantitativa de sua concentração, ou a verificação da intensidade máxima e mínima presente no ambiente de trabalho, bastando o contato físico para caracterização da especialidade do trabalho, posto que, não há limites de tolerância estabelecidos na legislação previdenciária.
A Instrução Normativa MPS n. 77/2015, em seu artigo 278, estabelece:
“Art. 278. Para fins da análise de caracterização da atividade exercida em condições especiais por exposição à agente nocivo, consideram-se:
I - nocividade: situação combinada ou não de substâncias, energias e demais fatores de riscos reconhecidos, presentes no ambiente de trabalho, capazes de trazer ou ocasionar danos à saúde ou à integridade física do trabalhador; e
(...)
§ 1º Para a apuração do disposto no inciso I do caput, há que se considerar se a avaliação de riscos e do agente nocivo é:
I - apenas qualitativo, sendo a nocividade presumida e independente de mensuração, constatada pela simples presença do agente no ambiente de trabalho, conforme constante nos Anexos 6, 13 e 14 da Norma Regulamentadora nº 15 - NR-15 do MTE, e no Anexo IV do RPS, para os agentes iodo e níquel, a qual será comprovada mediante descrição.
(...)”
Sobre a questão, cabe destacar os seguintes julgados:
“PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTE QUÍMICO TOLUENO. BENEFÍCIO DEVIDO.
1. Aposentadoria integral exige-se o tempo mínimo de contribuição (35 anos para homem, e 30 anos para mulher) e será concedida levando-se em conta somente o tempo de serviço, sem exigência de idade ou pedágio, nos termos do Art. 201, § 7º, I, da CF.
2. Até 29/04/95 a comprovação do tempo de serviço laborado em condições especiais era feita mediante o enquadramento da atividade no rol dos Decretos 53.831/64 e 83.080/79. A partir daquela data até a publicação da Lei 9.528/97, em 10/12/1997, por meio da apresentação de formulário que demonstre a efetiva exposição de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais a saúde ou a integridade física. Após 10/12/1997, tal formulário deve estar fundamentado em laudo técnico das condições ambientais do trabalho, assinado por médico do trabalho ou engenheiro do trabalho. Quanto aos agentes ruído e calor, o laudo pericial sempre foi exigido.
3.O tolueno é agente nocivo previsto no item 1.2.11 do Decreto 53.831/64. Nos termos do §4º do art. 68, do Decreto 3.048/99 com a nova redação dada pelo Decreto 8.123/2013, a exposição, habitual e permanente, às substâncias químicas cancerígenas justifica a contagem especial, independentemente de sua concentração. Sobretudo que os hidrocarbonetos aromáticos possuem em sua composição o benzeno, substância relacionada como cancerígena no anexo nº13-A da NR-15 e da do Ministério do Trabalho e da Portaria Interministerial 9, de 7/10/2014 do Ministério do Trabalho e Emprego.
4. O uso do equipamento de proteção individual - EPI, pode ser insuficiente para neutralizar completamente a nocividade a que o trabalhador esteja submetido. (STF, ARE 664335/SC, Tribunal Pleno, Relator Ministro Luiz Fux, j. 04/12/2014, DJe-029 DIVULG 11/02/2015 Public 12/02/2015).
5. O tempo de contribuição computado administrativamente, satisfaz a carência exigida pelo Art. 25, II, da Lei 8213/91.
6. Preenchidos os requisitos, a autora faz jus ao benefício de aposentadoria integral por tempo de contribuição.
(Omissis)
11. Apelação provida em parte.”
(TRF/3ª Região, AC 0043695-33.2015.4.03.9999, Décima Turma, Relator Desembargador Federal BAPTISTA PEREIRA, e-DJF3 9.8.2018)
“PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. CERCEAMENTO DE DEFESA. ATIVIDADE ESPECIAL. LEI VIGENTE À ÉPOCA DO EXERCÍCIO LABORAL. RUÍDO. AGENTES QUÍMICOS. ANÁLISE QUALITATIVA. AUSÊNCIA DE EPI EFICAZ. BENEFÍCIO DEVIDO. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. TUTELA ANTECIPADA
(Omissis)
- Conforme orientação do C. Superior Tribunal de Justiça, a natureza especial da atividade deve ser reconhecida em razão do tempo da prestação e da legislação então vigente, tornando-se direito adquirido do empregado.
- O agente nocivo deve, em regra, ser definido em legislação contemporânea ao labor, admitindo-se excepcionalmente que se reconheça como nociva a sujeição do segurado a agente não previsto em regulamento, desde que comprovada a sua efetiva prejudicialidade.
- O labor deve ser exercido de forma habitual e permanente, com exposição do segurado ao agente nocivo indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço.
(Omissis)
- A intensidade dos referidos agentes químicos se dá por meio de análise qualitativa, nos termos do Anexo 13 da NR-15 do Ministério do Trabalho, ou seja, basta apenas o contato físico para caracterização da especialidade do labor. Precedentes.
(Omissis)
- Preliminar rejeitada. Apelação do INSS desprovida. Apelação da parte autora parcialmente provida."
(TRF3, ApCiv n. 5001740-60.2022.4.03.6128, Relatora Desembargadora Federal LEILA PAIVA, Décima Turma, intimação via sistema 18.6.2024)
Importa salientar que, diversamente do que ocorria na vigência do Decreto n. 83.080/1979, não há mais a exigência de que, para a caracterização da especialidade das condições ambientais de trabalho, o contato do trabalhador com o agente químico se dê exclusivamente no seu processo de fabricação. Para a caracterização da referida especialidade, basta que, em outros processos produtivos ou serviços, haja contato do trabalhador com o agente nocivo, de forma habitual e permanente.
Ainda é importante destacar que os óleos minerais não tratados ou pouco tratados estão arrolados na Lista de Agentes Nocivos Reconhecidamente Cancerígenos em Humanos (LINACH), anexada à Portaria Interministerial MPS/MTE/MS n. 9/2014.
Observo que o fato de essas substâncias não possuírem registro no "Chemical Abstracts Service - CAS", conforme estabelecido no Memorando-Circular Conjunto n. 2/DIRSAT/DIRBEN/INSS, não afasta a respectiva nocividade, uma vez que esse registro não está previsto no artigo 68, § 4º, do Decreto n. 3.048/1999.
Dessa forma, a presença no ambiente de trabalho de agentes nocivos reconhecidamente cancerígenos em humanos, listados pelo Ministério do Trabalho e Emprego, será suficiente para a comprovação de efetiva exposição do trabalhador, de modo que a presença dos óleos minerais no ambiente de trabalho qualifica a atividade como insalubre.
O colendo Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento e que os óleos minerais são agentes químicos nocivos à saúde, enquadrados na subespécie hidrocarbonetos e outros compostos de carbono, independentemente de especificação sobre qual o tipo de óleo (STJ, AgInt no AREsp 1204070/MG, Segunda Turma, Relator Ministro FRANCISCO FALCÃO, j. 08.05.2018).
Aliás, já decidiu o STJ que os óleos minerais são agentes químicos nocivos à saúde, enquadrados na subespécie hidrocarbonetos e outros compostos de carbono, independente de especificação sobre qual o tipo de óleo (STJ, AgInt no AREsp 1204070/MG, Rel. Min. Francisco Falcão, DJe 15. 5.2018).
Dessa forma, ainda que diante de menções genéricas à presença de hidrocarbonetos, óleos, graxas e outros agentes químicos constantes da documentação apresentada nos autos, há possibilidade de reconhecimento da especialidade das condições de ambientais de trabalho, notadamente quando, em formulários e laudos assinados por responsável técnico, tiver o registro que indique a presença de agente como nocivo.
Da extemporaneidade da documentação
Conforme precedente desta Corte, “O documento extemporâneo também é hábil a comprovar a exposição aos agentes nocivos. Primeiro, porque não existe tal previsão decorrente da legislação e, segundo, porque a evolução da tecnologia aponta para o avanço das condições ambientais em relação àquelas experimentadas pelo trabalhador à época da execução dos serviços. Enfim, nos termos da jurisprudência desta E. Corte, a extemporaneidade da prova não obsta o reconhecimento de tempo de trabalho sob condições especiais” (TRF/3ª Região, ApelRemNec n. 0006072-54.2013.4.03.6102, Relatora Desembargadora Federal LEILA PAIVA MORRISON, Décima Turma, DJ 4.10.2023).
Do uso de equipamento de proteção individual
O colendo Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do Tema 1090, fixou o entendimento de que, em princípio, a indicação no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) sobre a utilização de equipamento de proteção individual (EPI) eficaz durante o exercício laboral é suficiente para afastar a nocividade do agente e, consequentemente, impedir o reconhecimento do tempo especial.
Não obstante, verifica-se que a presunção estabelecida no Tema 1090/STJ é “juris tantum”, uma vez que a tese firmada admite que a eficácia do EPI declarada no formulário previdenciário possa ser contestada pelo segurado, desde que o faça de forma fundamentada, utilizando-se de critérios técnicos e objetivos, consoante requisitos delineados no referido julgado:
“I - A informação no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) sobre a existência de equipamento de proteção individual (EPI) descaracteriza, em princípio, o tempo especial, ressalvadas as hipóteses excepcionais nas quais, mesmo diante da comprovada proteção, o direito à contagem especial é reconhecido.
II - Incumbe ao autor da ação previdenciária o ônus de comprovar: (i) a ausência de adequação ao risco da atividade; (ii) a inexistência ou irregularidade do certificado de conformidade; (iii) o descumprimento das normas de manutenção, substituição e higienização; (iv) a ausência ou insuficiência de orientação e treinamento sobre o uso adequado, guarda e conservação; ou (v) qualquer outro motivo capaz de conduzir à conclusão da ineficácia do EPI.
III - Se a valoração da prova concluir pela presença de divergência ou de dúvida sobre a real eficácia do EPI, a conclusão deverá ser favorável ao autor”
(STJ, 1ª Seção, REsp n. 2.082.072/RS, Relatora Ministra Maria Thereza de Assis Moura, DJEN: 22.4.2025)
Não se pode olvidar, ainda, dos preceitos estabelecidos no artigo 64, § 1º, do Decreto n. 3.048/1999, e artigo 58 da Lei n. 8.213/1991, os quais estabelecem os deveres do empregador de adoção de medidas para a eliminação da nocividade laboral, e de registro de informação fidedigna quanto ao fornecimento e uso de EPI, fundamentado em Laudo Técnico das Condições Ambientais do Trabalho (LTCAT) que ateste a efetividade desses equipamentos:
Decreto n. 3.048/1999: “- Art. 64. § 1º - A efetiva exposição a agente prejudicial à saúde configura-se quando, mesmo após a adoção das medidas de controle previstas na legislação trabalhista, a nocividade não seja eliminada ou neutralizada. (Redação dada pelo Decreto nº 10.410, de 2020).”
Lei n. 8.213/1991: “- Art. 58. A relação dos agentes nocivos químicos, físicos e biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física considerados para fins de concessão da aposentadoria especial de que trata o artigo anterior será definida pelo Poder Executivo.
§ 1º A comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos será feita mediante formulário, na forma estabelecida pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, emitido pela empresa ou seu preposto, com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho nos termos da legislação trabalhista.
(...)
§ 4º A empresa deverá elaborar e manter atualizado perfil profissiográfico abrangendo as atividades desenvolvidas pelo trabalhador e fornecer a este, quando da rescisão do contrato de trabalho, cópia autêntica desse documento.”
Por outro lado, somente pode ser considerado eficaz o EPI que, em conformidade com a Norma Regulamentadora n. 6 do MTE, seja eficiente na neutralização, ou na manutenção dos níveis de agentes nocivos dentro dos limites legais de tolerância, sem prejuízo do cumprimento dos requisitos fixados na Instrução Normativa INSS/PRES n. 128/2022, quais sejam:
“Art. 291 - I - da hierarquia estabelecida na legislação trabalhista, ou seja, medidas de proteção coletiva, medidas de caráter administrativo ou de organização do trabalho e utilização de EPI, nesta ordem, admitindo-se a utilização de EPI somente em situações de inviabilidade técnica, insuficiência ou provisoriamente até a implementação do EPC ou, ainda, em caráter complementar ou emergencial;
II - das condições de funcionamento e do uso ininterrupto do EPI ao longo do tempo, conforme especificação técnica do fabricante, ajustada às condições de campo;
III - do prazo de validade, conforme Certificado de Aprovação do Ministério do Trabalho e Previdência ou do órgão que venha sucedê-la;
IV - da periodicidade de troca definida pelos programas ambientais, comprovada mediante recibo assinado pelo usuário em época própria; e
V - da higienização”
Assim, ao interpretar a tese firmada no Tema 1090/STJ, deve-se levar em consideração a vulnerabilidade do segurado, bem como o princípio do ônus dinâmico da prova estabelecido no Código de Processo Civil:
“Art. 373: O ônus da prova incumbe:
I - ao autor, quanto ao fato constitutivo de seu direito;
II - ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor."
Dessa forma, não é crível entender que o único elemento válido para averiguar as condições nocivas do labor seja o PPP emitido unilateralmente pelo empregador.
Ademais, o princípio do “in dubio pro misero” admite que, diante da divergência entre laudos, prevaleça a conclusão favorável ao trabalhador, firmada em perícia judicial realizada por profissional equidistante das partes.
Portanto, ratificada por perícia judicial, a presença de elementos de prova que evidenciem a desconformidade da declaração de efetiva proteção do EPI fixada pelo empregador, permite que se reconheça a especialidade de períodos controversos.
Por oportuno, observa-se que o entendimento veiculado no julgamento do REsp n. 2.082.072/RS não contraria a tese fixada pelo excelso Supremo Tribunal Federal no julgamento do Tema 555, que reconhece a ineficácia do EPI em relação ao agente ruído:
“- (i) a primeira tese objetiva que se firma é: o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial”;
- (ii) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual – EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria.”
(STF, Tribunal Pleno, ARE n. 664335, Relator Ministro LUIZ FUX, DJEN: 4.3.2015. Grifei)
Noutro giro, a tese veiculada no Tema 1090/STJ também não alcança:
- a presunção legal de nocividade decorrente do enquadramento por categoria profissional, até 28.4.1995, nos termos dos Decretos n. 53.831/1964 e 83.080/79;
- os períodos laborais anteriores a 3.12.1998, data de alteração do § 2º do artigo 58 da Lei 8.213/1991 pela Medida Provisória n. 1.729/1998, que passou a considerar a informação de uso de EPI eficaz para o fim de reconhecimento de tempo especial;
- a especialidade por exposição a agentes nocivos cancerígenos, consoante artigo 298 da Instrução Normativa INSS/PRES n. 128/2022; e
- o reconhecimento da especialidade que decorre da exposição a agentes e atividades, cuja natureza não permite que o uso de EPIs descaracterize a nocividade laboral, como: eletricidade, explosivos, combustíveis, entre outros.
Do gozo de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez
A especialidade laboral dos intervalos em que o segurado esteve em gozo dos benefícios de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez acidentários deve ser considerada se, na data do afastamento, o segurado estiver exposto a agentes nocivos, conforme preceitua o artigo 65 do Decreto n. 3.048/1999 (Regulamento da Previdência Social):
"Artigo 65. Considera-se tempo de trabalho permanente aquele que é exercido de forma não ocasional nem intermitente, no qual a exposição do empregado, do trabalhador avulso ou do cooperado ao agente nocivo seja indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço. Parágrafo único. Aplica-se o disposto no caput aos períodos de descanso determinados pela legislação trabalhista, inclusive férias, aos de afastamento decorrentes de gozo de benefícios de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez acidentários, bem como aos de percepção de salário-maternidade, desde que, à data do afastamento, o segurado estivesse exposto aos fatores de risco de que trata o art. 68.”
Nesse sentido, o entendimento firmado pelo colendo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Recurso Especial n. 1.759.098:
PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL ADMITIDO COMO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 1.036 DO CÓDIGO FUX. POSSIBILIDADE DE CÔMPUTO DO TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL, PARA FINS DE APOSENTADORIA, PRESTADO NO PERÍODO EM QUE O SEGURADO ESTEVE EM GOZO DE AUXÍLIO-DOENÇA DE NATUREZA NÃO ACIDENTÁRIA. PARECER MINISTERIAL PELO PROVIMENTO PARCIAL DO RECURSO. RECURSO ESPECIAL DO INSS A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1. Até a edição do Decreto 3.048/1999 inexistia na legislação qualquer restrição ao cômputo do tempo de benefício por incapacidade não acidentário para fins de conversão de tempo especial. Assim, comprovada a exposição do Segurado a condições especiais que prejudicassem a sua saúde e a integridade física, na forma exigida pela legislação, reconhecer-se-ia a especialidade pelo período de afastamento em que o Segurado permanecesse em gozo de auxílio-doença, seja este acidentário ou previdenciário.
2. A partir da alteração então promovida pelo Decreto 4.882/2003, nas hipóteses em que o Segurado fosse afastado de suas atividades habituais especiais por motivos de auxílio-doença não acidentário, o período de afastamento seria computado como tempo de atividade comum.
(Omissis)
4. Contudo, a legislação continuou a permitir o cômputo, como atividade especial, de períodos em que o Segurado estivesse em gozo de salário-maternidade e férias, por exemplo, afastamentos esses que também suspendem o seu contrato de trabalho, tal como ocorre com o auxílio-doença não acidentário, e retiram o Trabalhador da exposição aos agentes nocivos. Isso denota irracionalidade na limitação imposta pelo decreto regulamentar, afrontando as premissas da interpretação das regras de Direito Previdenciário, que prima pela expansão da proteção preventiva ao Segurado e pela máxima eficácia de suas salvaguardas jurídicas e judiciais.
5. Não se pode esperar do poder judicial qualquer interpretação jurídica que venha a restringir ou prejudicar o plexo de garantias das pessoas, com destaque para aquelas que reivindicam legítima proteção do Direito Previdenciário. Pelo contrário, o esperável da atividade judicante é que restaure visão humanística do Direito, que foi destruída pelo positivismo jurídico.
6. Deve-se levar em conta que a Lei de Benefícios não traz qualquer distinção quanto aos benefícios auxílio-doença acidentário ou previdenciário. Por outro lado, a Lei 9.032/1995 ampliou a aproximação da natureza jurídica dos dois institutos e o § 6o. do artigo 57 da Lei 8.213/1991 determinou expressamente que o direito ao benefício previdenciário da aposentadoria especial será financiado com os recursos provenientes da contribuição de que trata o art. 22, II da Lei 8.212/1991, cujas alíquotas são acrescidas conforme a atividade exercida pelo Segurado a serviço da empresa, alíquotas, estas, que são recolhidas independentemente de estar ou não o Trabalhador em gozo de benefício.
(Omissis)
9. Impõe-se reconhecer que o Segurado faz jus à percepção de benefício por incapacidade temporária, independente de sua natureza, sem que seu recebimento implique em qualquer prejuízo na contagem de seu tempo de atividade especial, o que permite a fixação da seguinte tese: O Segurado que exerce atividades em condições especiais, quando em gozo de auxílio-doença, seja acidentário ou previdenciário, faz jus ao cômputo desse mesmo período como tempo de serviço especial.
10. Recurso especial do INSS a que se nega provimento
(STJ, Primeira Seção, Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Recurso Especial n. 1.759.098/RS, julgado em 29.6.2019, DJ 1º.8.2019)
Dessa forma, é direito do segurado o reconhecimento da nocividade do labor dos períodos em que esteve em gozo de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez, independentemente se acidentário ou previdenciário, quando a exposição aos agentes for anterior à concessão do benefício.
Da ausência de documento de autodeclaração
Prevista no artigo 62 da Portaria do INSS n. 450/2020, a autodeclaração é um documento a ser assinado pelo segurado, no momento em que formula seu requerimento administrativo, para o fim de informar se já recebe benefício em outro regime previdenciário.
Art. 62. Para o atendimento à previsão inscrita no art. 12 da EC nº 103, de 2019, até a criação de sistema integrado de dados relativos às remunerações, proventos e pensões dos segurados dos regimes de previdência geral e próprio, a comprovação do recebimento de benefício em regime de previdência diverso, bem como de seu valor, se fará por meio de autodeclaração firmada pelo requerente do benefício no RGPS, conforme Anexo I desta Portaria.
Parágrafo único. A autodeclaração de que trata o caput poderá ser firmada no ato do requerimento, por meio dos canais remotos de atendimento, hipótese em que se dispensará a apresentação de documento físico.
A autodeclaração será protocolizada juntamente com o requerimento administrativo ou, tratando-se de requerimento anterior à edição da Portaria INSS n. 450/2020, será apresentada no curso do processo administrativo.
Importante salientar que, na via judicial, não se exige a autodeclaração, razão pela qual a ausência do mencionado documento não obsta a análise do pedido de concessão de benefício previdenciário, que foi formulado em Juízo. Nesse sentido:
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. PERÍCIA JUDICIAL. TEMA 1124/STJ. TERMO INICIAL DOS EFEITOS FINANCEIROS. DIFERIMENTO.
- A parte autora buscou obter o benefício previdenciário perante a Autarquia Previdenciária, verificando-se das provas dos autos que não apresentou na data do requerimento administrativo (DER), em 25/07/2018, toda a documentação necessária para a comprovação do labor em condições especiais, a qual se deu por meio de perícia judicial
(...)
- Não assiste razão ao INSS no que tange à apresentação pela parte autora da autodeclaração prevista no artigo 62 da Portaria n. 450, de 03/04/2020, pertinente à vedação de cumulação de benefícios contido no artigo 24 da Emenda Constitucional n. 103, de 12/11/2019, porquanto se trata de procedimento a ser realizado na esfera administrativa, não obstando a concessão judicial do benefício
- Remessa necessária não conhecida. Apelação do INSS parcialmente provida.
(TRF-3 - ApelRemNec: 50560781120224039999 SP, Relator: Desembargador Federal LEILA PAIVA MORRISON, Data de Julgamento: 09/11/2022, 10ª Turma, Data de Publicação: DJEN DATA: 16/11/2022)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. PREVIDENCIÁRIO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. MULTA PELO ATRASO NO CUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
(...)
- É verdade que a EC n. 103/2019, em seu art. 24, dispõe sobre acumulação de benefícios em regimes de previdência social diversos, sendo necessário, no âmbito administrativo, o preenchimento da Declaração constante do Anexo I da Portaria PRES/INSS n. 450/2020. No entanto, a exigência para que a parte firme autodeclaração para os pedidos de aposentadorias está prevista apenas em norma administrativa (Portaria INSS nº 450/2020), não se aplicando na esfera judicial. Ademais, os requisitos para a concessão do benefício foram preenchidos antes do advento da EC 103/2019, de sorte que as disposições desta não se lhes aplica
(...)
- Com essas considerações, sopesando as circunstâncias fáticas do caso, o tempo decorrido entre a primeira determinação de implantação do benefício (13/04/2021) e o efetivo cumprimento da obrigação (09/2022), que o valor da multa diária fixada foi excessiva (R$ 200,00), e que esta C. 7ª Turma em casos semelhantes fixa o valor da multa diária em R$ 100,00; o valor total inicial da multa fixada na sentença (R$ 12.000,00) não é razoável, tampouco o valor reduzido ao final para R$ 1.000,00 - Dessa forma, com base no art. 537, § 1º, do CPC, fixa-se a multa no montante final de R$ 6.000,00, que corresponde à metade do limite inicialmente estipulado pelo Juízo "a quo" - valor que diante da singularidade do caso, considera-se razoável e compatível com o valor do benefício em questão e o tempo decorrido para cumprimento da ordem judicial - Recurso parcialmente provido.
(TRF-3 - AI: 50314118220224030000 SP, Relator: INES VIRGINIA PRADO SOARES, Data de Julgamento: 20/06/2023, 7ª Turma, Data de Publicação: Intimação via sistema DATA: 26/06/2023)
Dos honorários advocatícios em sentença ilíquida
A verba honorária de sucumbência deve incidir sobre o valor da condenação. Nos termos do julgamento do Tema Repetitivo n. 1105, deverá ser observada a Súmula n. 111 do colendo Superior Tribunal de Justiça, segundo a qual os honorários advocatícios, nas ações de cunho previdenciário, não incidirão sobre o valor das prestações vencidas após a data da prolação da sentença ou, na hipótese de a pretensão do segurado somente ser deferida em sede recursal, não incidirão sobre as parcelas vencidas após a prolação da decisão ou acórdão.
Conforme o Código de Processo Civil de 2015, sendo parte a Fazenda Pública e ilíquida a sentença, deve-se adotar o previsto no seu artigo 85, § 4º, inciso II, que determina a fixação dos honorários por ocasião da liquidação do julgado, ou seja, no cumprimento de sentença:
"Art. 85. A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor.
(Omissis)
§ 3º Nas causas em que a Fazenda Pública for parte, a fixação dos honorários observará os critérios estabelecidos nos incisos I a IV do § 2º e os seguintes percentuais:
(Omissis)
§ 4º Em qualquer das hipóteses do § 3º:
(Omissis)
II -Não sendo líquida a sentença, a definição do percentual, nos termos previstos nos incisos I a V, somente ocorrerá quando liquidado o julgado;"
Frisa-se que, ao julgar o REsp 1.865.553/PR, sob a sistemática dos recursos repetitivos (Tema n. 1059), o colendo Superior Tribunal de Justiça firmou a seguinte tese jurídica:
“A majoração dos honorários de sucumbência prevista no art. 85, § 11, do CPC pressupõe que o recurso tenha sido integralmente desprovido ou não conhecido pelo tribunal, monocraticamente ou pelo órgão colegiado competente. Não se aplica o art. 85, § 11, do CPC em caso de provimento total ou parcial do recurso, ainda que mínima a alteração do resultado do julgamento ou limitada a consectários da condenação”.
Dessa forma, na hipótese de o recurso não ser provido ou não ser conhecido, restará configurada hipótese que autoriza a majoração dos honorários de sucumbência, cabendo ao Juízo de origem, no momento da liquidação, levá-la em consideração na sua fixação.
Outrossim, cumpre destacar a orientação jurisprudencial do colendo Superior Tribunal de Justiça, conforme decidido nos Embargos de Divergência em Agravo em Recurso Especial EAREsp n. 1.847.842/PR, no sentido “de que são incabíveis honorários recursais no recurso interposto pela parte vencedora para ampliar a condenação, pela própria redação do art. 85, § 11, do CPC/2015”. No mesmo julgado, também elucida “O descabimento da fixação de honorários advocatícios recursais em recurso da parte vencedora para ampliar a condenação, rejeitado, não provido ou não conhecido decorre do teor do art. 85, § 11, do CPC/2015” e o “descabimento de majoração de honorários quando inexistente prévia fixação de verba honorária em desfavor da parte recorrente na origem”.
De outro lado, é importante salientar que, na hipótese de provimento do recurso de apelação da parte vencida no primeiro grau de jurisdição, caberá apenas a inversão dos honorários advocatícios, sem majoração do percentual.
Segundo esta Décima Turma, tratando-se de sentença ilíquida, o percentual da verba honorária deverá ser fixado por ocasião da liquidação do julgado, observando-se o disposto no artigo 85, § 3º, § 4º, II, e § 11, e no artigo 86, todos do Código de Processo Civil. Nesse sentido:
"PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. AUTORAS ABSOLUTAMENTE INCAPAZES. TERMO INICIAL MANTIDO NA DATA DO ÓBITO DO INSTITUIDOR. APELAÇÃO DO INSS DESPROVIDA. CONSECTÁRIOS LEGAIS E HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS FIXADOS DE OFÍCIO.
(Omissis)
4. Com relação aos honorários advocatícios, tratando-se de sentença ilíquida, o percentual da verba honorária deverá ser fixado somente na liquidação do julgado, na forma do disposto no art. 85, § 3º, § 4º, II, e § 11, e no art. 86, todos do Código de Processo Civil, e incidirá sobre as parcelas vencidas até a data da decisão que reconheceu o direito ao benefício (Súmula 111 do STJ).
5. Deve aplicar-se, também, a majoração dos honorários advocatícios, prevista no artigo 85, §11, do Código de Processo Civil, observados os critérios e percentuais estabelecidos nos §§ 2º e 3º do mesmo artigo.
6. Apelação do INSS desprovida. Fixados, de ofício, os consectários legais e os honorários advocatícios."
(TRF 3ª Região, ApCiv 0001190-50.2016.4.03.6003, 10ª Turma, Relator Desembargador Federal NELSON DE FREITAS PORFIRIO JUNIOR, DJEN 20/8/2024)
Do caso dos autos
Conforme mencionado, o INSS alega que a parte autora não faz jus ao reconhecimento de tempo especial nos intervalos de 29.4.1995 a 5.3.1997 e de 19.11.2003 a 2.2.2015, e nem à revisão da aposentadoria por tempo de contribuição NB 42/170.269.012-9.
Por sua vez, sustenta o autor que tem direito ao reconhecimento da especialidade do período de 6.3.1997 a 18.11.2003, bem como à conversão da aposentadoria por tempo de contribuição em aposentadoria especial, ou subsidiariamente, à majoração da RMI do respectivo benefício.
A fim de fazer prova do direito ao cômputo de tempo especial, a parte autora juntou aos autos Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), cópias da CTPS e extrato CNIS, demonstrando ter trabalhado nos intervalos de:
- 29.4.1995 a 5.3.1997, 6.3.1997 a 18.11.2003 e de 19.11.2003 a 2.2.2015, junto à Empresa PETRÓLEO BRASILEIRO S.A., nas função de técnico químico de petróleo.
Conclusão: períodos especiais por exposição habitual e permanente a ruídos acima de 80 dB(A), até 5.3.1997, consoante item 1.1.6 do Anexo do Decreto n. 53.831/1964, e item 1.1.5. do Anexo I, do Decreto n. 83.080/1979; acima de 90 dB(A), até 18.11.2003, conforme código 2.0.1 do Anexo IV do Decreto 2.172/1997 e do Decreto n. 3.048/1999, em sua redação original; e acima de 85 dB(A), a partir de 19.11.2003, nos termos do código 2.0.1 do Anexo IV do Decreto n. 3.048/1999, com redação dada pelo Decreto n. 4.882/2003; e por exposição a agentes químicos hidrocarbonetos (benzeno, tolueno e xileno), consoante itens 1.0.17 e 1.0.19 dos Anexos IV dos Decretos ns. 2.172/1997 e 3.048/1999.
Provas: Perícia Judicial (Id 309061579), PPP (Id 309061439, p. 3-13), LTCAT (Id 309061439, p. 14-27), CTPS (Id 309061463, p. 9) e CNIS (Id 309061463, p. 34).
Cumpre ressaltar que a utilização de equipamento de proteção individual pelo segurado não elide a nocividade laboral decorrente da exposição a agentes carcinogênicos, ou a ruídos.
Ademais, o princípio do “in dubio pro misero” admite que, diante da divergência entre o laudo e o PPP, prevaleça a conclusão mais favorável ao trabalhador, a qual foi firmada em perícia judicial realizada por profissional equidistante das partes.
Dessarte, a parte autora faz jus ao reconhecimento da especialidade dos períodos de 29.4.1995 a 5.3.1997, 6.3.1997 a 18.11.2003 e de 19.11.2003 a 2.2.2015.
No presente caso, somados os períodos especiais, ora reconhecidos, aos períodos especiais incontroversos constantes do relatório CNIS (Id 309061463, p. 34) a parte autora totaliza 31 anos, 1 mês e 10 dias de tempo especial na DER, o suficiente para a conversão da aposentadoria por tempo de contribuição (NB 42/170.269.012-9) em aposentadoria especial. Segue a planilha:
Assim, em 2.2.2015, o segurado tem direito à aposentadoria especial, consoante preceitua o artigo 57 da Lei 8.213/1991, porque cumpre o tempo mínimo de 25 anos sujeito a condições prejudiciais à saúde e à integridade física.
No caso, verifica-se que a parte autora não apresentou na data do requerimento administrativo (DER) toda a documentação necessária para a comprovação de tempo especial, tendo em vista que a especialidade laboral de parte dos períodos controversos foi reconhecida com fundamento exclusivo em perícia judicial.
Sob tal perspectiva, embora mantida a data de revisão do benefício na data do requerimento administrativo, o termo inicial dos efeitos financeiros, representativo da data do início do pagamento (DIP), deverá ser estabelecido na fase da liquidação, nos exatos parâmetros do que vier a ser decidido pelo colendo Superior Tribunal de Justiça, na definição do Tema 1124/STJ.
Considerando que a presente ação foi ajuizada em 7.11.2018, não há que se falar na ocorrência da prescrição quinquenal prevista no artigo 103, parágrafo único, da Lei n. 8.213/1991, uma vez que não transcorreu mais de 5 anos da data de concessão do benefício previdenciário objeto da presente revisão, em 2.2.2015 (Id 309061463, p. 39).
Com relação aos honorários advocatícios, tratando-se de sentença ilíquida, o percentual da verba honorária deverá ser fixado somente na liquidação do julgado, na forma do disposto no art. 85, § 3º, § 4º, II, e § 11, e no art. 86, todos do Código de Processo Civil, e incidirá sobre as parcelas vencidas até a data da decisão que concedeu a revisão do benefício (Súmula 111 do STJ), devendo, ainda, ser considerada a majoração decorrente da sucumbência recursal.
O cálculo da correção monetária observará os critérios preconizados pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, que refere à aplicação da Emenda Constitucional n. 113/2021.
Isento o INSS do pagamento de custas e emolumentos, tanto no âmbito da Justiça Federal, quanto nas ações processadas perante a Justiça do Estado de São Paulo, consoante artigo 4º, inciso I, da Lei Federal n. 9.289/1996; e artigo 6º da Lei do Estado de São Paulo n. 11.608/2003, respectivamente. Não obstante, nos termos do artigo 4º, parágrafo único, da Lei n. 9.289/1996, eventuais despesas judiciais feitas pela parte autora devem ser reembolsadas pela Autarquia Previdenciária.
É desnecessária a referência expressa aos dispositivos legais e constitucionais tidos por violados, pois o exame da controvérsia, à luz dos temas invocados, é mais que suficiente para caracterizar o prequestionamento da matéria.
Ante o exposto, rejeito a preliminar de nulidade do processo, nego provimento ao recurso de apelação do INSS, e dou provimento ao recurso de apelação da parte autora, nos termos da fundamentação.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PRELIMINAR. NULIDADE DA SENTENÇA. NÃO CABIMENTO. APOSENTADORIA ESPECIAL. AGENTE NOCIVO RUÍDO. AGENTES QUÍMICOS. RECONHECIMENTO. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS PARA A CONVERSÃO DO BENEFÍCIO. TERMO INICIAL. DER. EFEITOS FINANCEIROS. TEMA 1124/STJ. HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS.
1. A aposentadoria especial foi criada pela Lei n. 3.807/1960 e mantida pela Lei n. 8.213/1991. É uma modalidade de aposentadoria por tempo de contribuição, com período de carência reduzido para 15, 20 ou 25 anos, conforme a atividade habitualmente exercida pelo trabalhador, o qual, no exercício dessas atividades, fica exposto a agentes nocivos químicos, físicos, biológicos ou a uma associação desses agentes, que são prejudiciais à saúde ou à integridade física.
2. Com a edição do Decreto n. 3.048/1999, vigente a partir de 12 de maio de 1999, a comprovação da efetiva exposição aos agentes nocivos passou a ser feita em formulário emitido pela empresa, com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho.
3. O documento extemporâneo também é hábil a comprovar a exposição aos agentes nocivos. Primeiro, porque não existe tal previsão decorrente da legislação e, segundo, porque a evolução da tecnologia aponta para o avanço das condições ambientais em relação àquelas experimentadas pelo trabalhador à época da execução dos serviços. Precedentes desta Corte.
4. Admite-se o enquadramento especial do labor em razão da exposição a níveis de ruídos superiores aos limites de tolerância, quais sejam: 80 dB(A), até 5.3.1997, 90 dB(A), até 18.11.2003, e 85 dB(A), a partir de 19.11.2003, conforme item 1.1.6 do Anexo do Decreto n. 53.831/1964, item 1.1.5. do Anexo I, do Decreto n. 83.080/1979, item 2.0.1 do Anexo IV do Decreto n. 2.172/1997 e item 2.0.1 do Anexo IV do Decreto 3.048/1999.
5. Ainda que diante de menções genéricas à presença de hidrocarbonetos, óleos, graxas e outros agentes químicos constantes da documentação apresentada nos autos, há possibilidade de reconhecimento da especialidade das condições de ambientais de trabalho, notadamente quando, em formulários e laudos assinados por responsável técnico, tiver o registro que indique a presença do agente como nocivo.
6. A parte autora juntou aos autos Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), Laudo Técnico de Condições Ambientais de Trabalho (LTCAT), cópias da CTPS e extrato CNIS. Ainda, foi realizada perícia judicial demonstrando a especialidade dos períodos de 29.4.1995 a 5.3.1997, 6.3.1997 a 18.11.2003 e de 19.11.2003 a 2.2.2015, por exposição habitual e permanente a ruídos acima dos limites legais de tolerância, e a agentes químicos hidrocarbonetos (benzeno, tolueno e xileno).
7. Somados os períodos especiais, ora reconhecidos, aos períodos especiais incontroversos constantes do relatório CNISa parte autora totaliza 31 anos, 1 mês e 10 dias de tempo especial na DER, o suficiente para a conversão da aposentadoria por tempo de contribuição (NB 42/170.269.012-9) em aposentadoria especial. Assim, em 2.2.2015, o segurado tem direito à aposentadoria especial, consoante preceitua o artigo 57 da Lei 8.213/1991, porque cumpre o tempo mínimo de 25 anos sujeito a condições prejudiciais à saúde e à integridade física.
8. Verifica-se que a parte autora não apresentou na data do requerimento administrativo (DER) toda a documentação necessária para a comprovação de tempo especial, tendo em vista que a especialidade laboral de parte dos períodos controversos foi reconhecida com fundamento exclusivo em perícia judicial. Sob tal perspectiva, embora mantida a data de revisão do benefício na data do requerimento administrativo, o termo inicial dos efeitos financeiros, representativo da data do início do pagamento (DIP), deverá ser estabelecido na fase da liquidação, nos exatos parâmetros do que vier a ser decidido pelo colendo Superior Tribunal de Justiça, na definição do Tema 1124/STJ.
9. Tratando-se de sentença ilíquida, o percentual da verba honorária deverá ser fixado somente na liquidação do julgado, na forma do disposto no art. 85, § 3º, § 4º, II, e § 11, e no art. 86, todos do Código de Processo Civil, e incidirá sobre as parcelas vencidas até a data da decisão que concedeu a revisão do benefício (Súmula 111 do STJ), devendo, ainda, ser considerada a majoração decorrente da sucumbência recursal. O cálculo da correção monetária observará os critérios preconizados pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, que refere à aplicação da Emenda Constitucional n. 113/2021.
10. Preliminar rejeitada. Apelação do INSS não provida.
11. Apelação da parte autora provida.
ACÓRDÃO
Desembargador Federal
