
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0036430-09.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 30 - DES. FED. MARISA SANTOS
APELANTE: TIAGO DOS SANTOS
Advogado do(a) APELANTE: RODOLFO DA COSTA RAMOS - SP312675-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0036430-09.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 30 - DES. FED. MARISA SANTOS
APELANTE: TIAGO DOS SANTOS
Advogado do(a) APELANTE: RODOLFO DA COSTA RAMOS - SP312675-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
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R E L A T Ó R I O
A Desembargadora Federal MARISA SANTOS (RELATORA):
Ação ajuizada contra o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, em 17/06/2016, objetivando a concessão de aposentadoria por invalidez ou benefício assistencial, acrescidas as parcelas vencidas dos consectários legais. Requereu a antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional.
O Juízo de 1º grau julgou improcedente o pedido ao argumento de ausência de incapacidade total e de comprovação da miserabilidade. Condenou o autor nos ônus de sucumbência, observado o deferimento da justiça gratuita.
A sentença foi proferida em 15/05/2017.
O autor apelou, sustentando que restou demonstrada a incapacidade laboral, fazendo jus aos benefícios de auxílio-doença, ou aposentadoria por invalidez. Alega, também, que as provas carreadas aos autos são hábeis a comprovar os requisitos previstos no art. 20, da Lei 8.742/93. Pede a reforma da sentença.
Sem contrarrazões, vieram os autos.
Nesta Corte, o Ministério Público Federal requereu a conversão do julgamento em diligência para a produção de nova perícia socioeconômica. O referido pedido foi deferido.
Após a complementação da instrução probatória, o Ministério Público Federal opinou pelo provimento da apelação para concessão de benefício assistencial.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0036430-09.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 30 - DES. FED. MARISA SANTOS
APELANTE: TIAGO DOS SANTOS
Advogado do(a) APELANTE: RODOLFO DA COSTA RAMOS - SP312675-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O princípio da vinculação do magistrado ao pedido formulado exige o enfrentamento das questões suscitadas na inicial (arts. 141 e 492 do CPC/2015).
No caso dos autos, observo que a sentença deixou de analisar o pedido de aposentadoria por invalidez, daí exsurgindo a natureza citra petita da decisão recorrida.
Contudo, em consonância com o art. 1.013, § 3º, I, do CPC/2015, em homenagem ao princípio da economia processual, ações cujas decisões logravam anulação em segundo grau, agora, ultrapassado o vício processual, terão apreciado seu mérito.
Assim, superado o obstáculo formal, deve-se adentrar ao mérito da causa já madura, procedendo ao julgamento dos pedidos efetivamente formulados.
Nesse sentido:
CONSTITUCIONAL. PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. JULGAMENTO EXTRA PETITA. OCORRÊNCIA. NULIDADE DA SENTENÇA. ART. 515 DO CPC. REVISÃO. RENDA MENSAL INICIAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. RURÍCOLA. INÍCIO RAZOÁVEL DE PROVA MATERIAL. PROVA TESTEMUNHAL. ATIVIDADE COMPROVADA. TERMO INICIAL. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CUSTAS E DESPESAS PROCESSUAIS.
1 - A parte autora ingressou com a ação para obtenção de revisão do benefício de aposentadoria por tempo de serviço, sendo-lhe concedido, pela r. sentença monocrática, o benefício da aposentadoria por idade.
2 - Em virtude da concessão de aposentadoria por idade não ter sido objeto do pedido da parte autora, a mesma não poderia ter sido deferida pelo douto Juízo monocrático e, portanto, não pode ser mantida por este Relator, sob pena de se estar caracterizando julgamento extra petita.
3 - O art. 515, § 3º, do CPC, acrescentado pela Lei n.º 10.352, de 26 de dezembro de 2001, possibilitou a esta Corte, nos casos de extinção do processo sem apreciação do mérito, dirimir de pronto a lide, desde que a mesma verse sobre questão exclusivamente de direito e esteja em condições de imediato julgamento. Aplicação dos princípios da celeridade e da economia processual.
4 - Exegese do art. 515, § 3º, do CPC ampliada para abarcar as hipóteses em que, à semelhança do que ocorre nos casos de extinção do processo sem apreciação do mérito, magistrado profere sentença divorciada da pretensão deduzida em Juízo (extra petita) ou aquém do pedido (citra petita).
5 - (...)
9 - Reconhecido o lapso temporal desempenhado no meio rural, o autor conta com tempo superior a 35 anos de serviço, fazendo jus, assim, à elevação do coeficiente de sua aposentadoria por tempo de serviço para 100%, nos termos do disposto no art. 53, II, da Lei nº 8.213/91.
10 - Termo inicial da revisão fixado na data do requerimento administrativo.
11 - Correção monetária das parcelas em atraso nos moldes do Provimento nº 64/05 da Corregedoria-Geral da Justiça Federal da 3ª Região, da Lei nº 6.899/81 e das Súmulas no 148 do Colendo Superior Tribunal de Justiça e nº 8 deste Tribunal.
12 - Juros de mora fixados em 6% (seis por cento) ao ano, contados a partir da citação, conforme disposição inserta no art. 219 do Código de Processo Civil, até a entrada em vigor da Lei nº 10.406/02 e, após, à razão de 1% (um por cento) ao mês, nos termos do art. 406 do Código Civil, c.c. o art. 161, §1º, do Código Tributário Nacional.
13 - Honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) sobre as parcelas devidas até a data da prolação da sentença, de acordo com o entendimento desta Turma.
14 - Isenta a Autarquia Previdenciária do pagamento de custas processuais, nos termos do art. 4º, I, da Lei Federal nº 9.289/96 e do art. 6º da Lei nº 11.608/03, do Estado de São Paulo, e das Leis nos 1.135/91 e 1.936/98, com a redação dada pelos arts. 1º e 2º da Lei nº 2.185/00, todas do Estado do Mato Grosso do Sul. Tal isenção não abrange as despesas processuais que houver efetuado, bem como aquelas devidas a título de reembolso à parte contrária, por força da sucumbência.
15 - Remessa oficial e apelação providas. Sentença anulada. Pedido julgado parcialmente procedente. Tutela específica concedida. (TRF 3ª Região, 9ª Turma, Processo nº 0113937-76.1999.4.03.9999, Rel. Des. Fed. Nelson Bernardes, DJF3 Judicial 1 16/09/2009, p. 1741).
Quanto ao pedido de benefício por incapacidade (auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez), observo que, tornou-se hábito requerer diretamente ao Poder Judiciário o que deve ser providenciado pela autoridade administrativa, com a justificativa de que administrativamente não há êxito por parte do segurado. As consequências são graves, tanto para a autarquia quanto para o segurado: para a autarquia, porque a lenta tramitação do processo levará ao pagamento de verbas acessórias que, se bem empregadas, poderiam compor o custeio da previdência social; para o segurado, porque a mesma lentidão o fará aguardar por anos a fio o que é de seu direito. Não há quem ganhe com essa lentidão, e, no entanto, esse procedimento se repete, reiteradamente, causando o grande congestionamento do Poder Judiciário.
É bem verdade que, muitas vezes, o INSS sequer recebe os pedidos no protocolo. Mas também é verdade que, muitas vezes, os pedidos são rapidamente analisados e dada resposta ao requerimento do segurado, concedendo ou indeferindo o benefício, com o que a função administrativa foi exercida.
O que ocorre, na prática, é que a falta de ingresso na via administrativa transfere para o Poder Judiciário o exercício de uma função que, na realidade, não lhe é típica, substituindo-se ao Administrador porque, tradicionalmente, o INSS reluta em cumprir sua função constitucional.
Está correta a decisão que determina a suspensão do processo para que a parte promova o requerimento do benefício no local certo: o INSS. É a esta autarquia que cabe apreciar o pedido. Na hipótese de indeferimento do pedido ou da falta de decisão administrativa é que nasce para o segurado o interesse de agir.
O art. 41-A, § 5º, da Lei nº 8213/91, concede à autoridade administrativa o prazo de 45 dias para efetuar o pagamento da primeira renda mensal do benefício, após a apresentação, pelo segurado, da documentação necessária.
Atento à realidade, quis o legislador pôr fim à conhecida demora na decisão de processos administrativos previdenciários, que causa desamparo a muitos segurados justamente no momento em que a cobertura previdenciária deveria socorrê-los.
A apreciação do requerimento, com a formulação de exigências, concessão ou indeferimento do benefício, assim, deve ocorrer em 45 dias.
A dicção da Súmula 9 desta Corte e da jurisprudência dominante não é a que lhe pretende dar o(a) apelante. Não há necessidade de prévio esgotamento da via administrativa, ou seja, o interessado não precisa esgotar todos os recursos administrativos. Mas não excluem a atividade administrativa.
É hora de mudar esse hábito de transferir para o Poder Judiciário o que é função típica do INSS. Se o requerimento administrativo não for recebido no protocolo, ou não for apreciado no prazo de 45 dias, ou for indeferido, aí sim, surgirá o interesse de agir.
O STF, em repercussão geral, decidiu nesse mesmo sentido:
RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO E INTERESSE EM AGIR.
1. A instituição de condições para o regular exercício do direito de ação é compatível com o art. 5º, XXXV, da Constituição. Para se caracterizar a presença de interesse em agir, é preciso haver necessidade de ir a juízo.
2. A concessão de benefícios previdenciários depende de requerimento do interessado, não se caracterizando ameaça ou lesão a direito antes de sua apreciação e indeferimento pelo INSS, ou se excedido o prazo legal para sua análise. É bem de ver, no entanto, que a exigência de prévio requerimento não se confunde com o exaurimento das vias administrativas.
3. A exigência de prévio requerimento administrativo não deve prevalecer quando o entendimento da Administração for notória e reiteradamente contrário à postulação do segurado.
4. Na hipótese de pretensão de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido, considerando que o INSS tem o dever legal de conceder a prestação mais vantajosa possível, o pedido poderá ser formulado diretamente em juízo - salvo se depender da análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração -, uma vez que, nesses casos, a conduta do INSS já configura o não acolhimento ao menos tácito da pretensão.
5. Tendo em vista a prolongada oscilação jurisprudencial na matéria, inclusive no Supremo Tribunal Federal, deve-se estabelecer uma fórmula de transição para lidar com as ações em curso, nos termos a seguir expostos.
6. Quanto às ações ajuizadas até a conclusão do presente julgamento (03.09.2014), sem que tenha havido prévio requerimento administrativo nas hipóteses em que exigível, será observado o seguinte: (i) caso a ação tenha sido ajuizada no âmbito de Juizado Itinerante, a ausência de anterior pedido administrativo não deverá implicar a extinção do feito; (ii) caso o INSS já tenha apresentado contestação de mérito, está caracterizado o interesse em agir pela resistência à pretensão; (iii) as demais ações que não se enquadrem nos itens (i) e (ii) ficarão sobrestadas, observando-se a sistemática a seguir.
7. Nas ações sobrestadas, o autor será intimado a dar entrada no pedido administrativo em 30 dias, sob pena de extinção do processo. Comprovada a postulação administrativa, o INSS será intimado a se manifestar acerca do pedido em até 90 dias, prazo dentro do qual a Autarquia deverá colher todas as provas eventualmente necessárias e proferir decisão. Se o pedido for acolhido administrativamente ou não puder ter o seu mérito analisado devido a razões imputáveis ao próprio requerente, extingue-se a ação. Do contrário, estará caracterizado o interesse em agir e o feito deverá prosseguir.
8. Em todos os casos acima - itens (i), (ii) e (iii) -, tanto a análise administrativa quanto a judicial deverão levar em conta a data do início da ação como data de entrada do requerimento, para todos os efeitos legais.
9. Recurso extraordinário a que se dá parcial provimento, reformando-se o acórdão recorrido para determinar a baixa dos autos ao juiz de primeiro grau, o qual deverá intimar a autora - que alega ser trabalhadora rural informal - a dar entrada no pedido administrativo em 30 dias, sob pena de extinção. Comprovada a postulação administrativa, o INSS será intimado para que, em 90 dias, colha as provas necessárias e profira decisão administrativa, considerando como data de entrada do requerimento a data do início da ação, para todos os efeitos legais. O resultado será comunicado ao juiz, que apreciará a subsistência ou não do interesse em agir. (RE 631240/MG, Rel. Min. Roberto Barroso, DJe 10/112014).
O STJ também passou a adotar o mesmo entendimento. Nesse sentido o julgamento do REsp 1.369.834/SP, Rel. Min. Benedito Gonçalves, DJe 02/12/2014:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. NECESSIDADE. CONFIRMAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE SUPERIOR AO QUE DECIDIDO PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NO JULGAMENTO DO RE 631.240/MG, JULGADO SOB A SISTEMÁTICA DA REPERCUSSÃO GERAL.
1. O Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 631.240/MG, sob rito do artigo 543-B do CPC, decidiu que a concessão de benefícios previdenciários depende de requerimento administrativo, evidenciando situações de ressalva e fórmula de transição a ser aplicada nas ações já ajuizadas até a conclusão do aludido julgamento (03/9/2014).
2. Recurso especial do INSS parcialmente provido a fim de que o Juízo de origem aplique as regras de modulação estipuladas no RE 631.240/MG. Julgamento submetido ao rito do artigo 543-C do CPC.
Saliento que o pedido administrativo de benefício assistencial (ID 89937310) não tem o condão de suprir a citada exigência, pois os requisitos para a concessão dos benefícios pleiteados são diferentes, bem como não houve manifestação do INSS acerca da qualidade segurado do autor.
No que tange ao pedido de benefício assistencial, considerando que já houve apresentação de defesa pela autarquia e produzidas as provas necessárias ao deslinde da questão, passo à análise do feito.
O benefício da assistência social, de caráter não contributivo, tem como alguns de seus princípios norteadores a construção de uma sociedade livre, justa e solidária e o enfrentamento da pobreza no nosso País, que constituem os objetivos fundamentais consagrados no art. 3º, I e III, da CF, garantindo-se os mínimos sociais àqueles que efetivamente necessitam.
A Lei nº 8.742, de 07.12.1993, regulamentou a Assistência Social, prevista no mencionado art. 203, V, da CF. Em seu art. 20, dispôs sobre as condições para a concessão do benefício: ser pessoa portadora de deficiência, ou idoso com 70 (setenta) anos ou mais - idade posteriormente reduzida para 67 (sessenta e sete) anos - e, em ambos os casos, sem condições de prover seu próprio sustento ou tê-lo provido pela família.
O Estatuto do Idoso - Lei nº 10.741, de 01.10.2003 - reduziu a idade mínima do idoso para 65 anos - art. 34.
O art. 20 da LOAS - Lei Orgânica da Assistência Social foi alterado pela Lei nº 12.435, de 06.7.2011 (DOU 07.7.2011), que adotou a expressão "pessoa com deficiência" e a idade de 65 (sessenta e cinco) anos ou mais já prevista no Estatuto do Idoso.
Também o conceito de pessoa com deficiência foi alterado pela nova lei. O § 2º do art. 20 passou a dispor:
§ 2º. Para efeito de concessão deste benefício, considera-se:
I - pessoa com deficiência: aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade com as demais pessoas;
II - impedimentos de longo prazo: aqueles que incapacitam a pessoa com deficiência para a vida independente e para o trabalho pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos.
O § 3º do art. 20 da Lei 8.742/93 estabelece que a renda per capita familiar deve ser inferior a ¼ do salário mínimo. A inconstitucionalidade desse dispositivo da LOAS foi arguida na ADIN nº 1.232-1, julgada improcedente por maioria de votos pelo Plenário do STF.
A questão não restou pacificada na jurisprudência do STJ e do próprio STF, que passaram a adotar o entendimento de que a ADIn nº 1.232-1 não retirou a possibilidade de aferição da necessidade por outros meios de prova que não a renda per capita familiar, mas, sim, que o § 3º do art. 20 estabeleceu uma presunção objetiva e absoluta de miserabilidade. Assim sendo, a família com renda mensal per capita inferior a ¼ do salário mínimo encontra-se em estado de penúria, configurando tal situação prova incontestável de necessidade do benefício, dispensando outros elementos probatórios. Daí que, caso suplantado tal limite, outros meios de prova poderiam ser utilizados para a demonstração da condição de miserabilidade, expressa na situação de absoluta carência de recursos para a subsistência.
Nesse sentido o entendimento do STJ - REsp 222778/SP, 5ª Turma, Rel. Min. Edson Vidigal, j. 04.11.1999, DJU 29.11.1999, p. 190:
"A Lei 8742/93, Art. 20, § 3º, quis apenas definir que a renda familiar inferior a ¼ do salário-mínimo é, objetivamente considerada, insuficiente para a subsistência do idoso ou portador de deficiência; tal regra não afasta, no caso em concreto, outros meios de prova da condição de miserabilidade da família do necessitado".
A questão foi novamente levada a julgamento pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, que reconheceu a Repercussão Geral da matéria nos autos do Recurso Extraordinário 567985/MT, Rel. Min. Marco Aurélio, Rel. p/ Acórdão Min. Gilmar Mendes, j. 18/04/2013, publicado em 03.10.2013:
"... O requisito financeiro estabelecido pela lei teve sua constitucionalidade contestada, ao fundamento de que permitiria que situações de patente miserabilidade social fossem consideradas fora do alcance do benefício assistencial previsto constitucionalmente. Ao apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.232-1/DF, o Supremo Tribunal Federal declarou a constitucionalidade do art. 20, § 3º, da LOAS. 3. Decisões judiciais contrárias aos critérios objetivos preestabelecidos e Processo de inconstitucionalização dos critérios definidos pela Lei 8.742/1993. A decisão do Supremo Tribunal Federal, entretanto, não pôs termo à controvérsia quanto à aplicação em concreto do critério da renda familiar per capita estabelecido pela LOAS. Como a lei permaneceu inalterada, elaboraram-se maneiras de se contornar o critério objetivo e único estipulado pela LOAS e de se avaliar o real estado de miserabilidade social das famílias com entes idosos ou deficientes. Paralelamente, foram editadas leis que estabeleceram critérios mais elásticos para a concessão de outros benefícios assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004, que criou o Bolsa Família; a Lei 10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de Acesso à Alimentação; a Lei 10.219/01, que criou o Bolsa Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro a Municípios que instituírem programas de garantia de renda mínima associados a ações socioeducativas. O Supremo Tribunal Federal, em decisões monocráticas, passou a rever anteriores posicionamentos acerca da intransponibilidade do critérios objetivos. Verificou-se a ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro).
4. Declaração de inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993.
5. Recurso extraordinário a que se nega provimento" (destaquei).A fixação da renda per capita familiar inferior ao salário mínimo é excludente do bem-estar e justiça sociais que o art. 193 da Constituição Federal elegeu como objetivos da Ordem Social.
A fixação do salário mínimo como garantia do trabalhador e do inativo para fins de garantir sua manutenção e de sua família, com o mínimo necessário à sobrevivência com dignidade, representa um critério quantificador do bem-estar social que a todos deve ser garantido, inclusive aos beneficiários do benefício assistencial previsto no art. 203, V, da Constituição.
Nessa linha de entendimento, o correto seria que a renda per capita familiar, para fins de concessão do BPC, não pudesse ser superior a 1 (um) salário mínimo. Esse critério traria para dentro do sistema de Assistência Social um número bem maior de pessoas idosas e com deficiência. Seria dar a todos, dentro e fora do sistema de Assistência Social, o mesmo grau de dignidade e de bem-estar, reduzindo desigualdades sociais.
A declaração de inconstitucionalidade do § 3º do art. 20 da LOAS - Lei Orgânica da Assistência Social, na prática, resulta na inexistência de nenhum critério, abrindo a possibilidade de o intérprete utilizar todos os meios de provas disponíveis para a verificação da situação de miséria que a lei quer remediar.
Cabe à legislação infraconstitucional a definição dos critérios e requisitos para concessão do benefício, conforme prevê o art. 203, V, da CF. Deve, para isso, obedecer aos princípios do art. 194, dentre eles a seletividade e distributividade. Ou seja, cabe ao legislador ordinário selecionar as contingências merecedoras de proteção e distribuí-las de acordo com o número de beneficiários e o orçamento de que dispõe.
A seletividade e a distributividade, contudo, por serem princípios setoriais, estão conformadas ao princípio geral do respeito à isonomia. Não pode a lei eleger como discrimen critério violador da isonomia.
A fixação do critério aferidor da necessidade é atribuição do legislador e não do juiz. Mas, diante do caso concreto, a jurisdição não pode ser negada por falta de critério legal.
A atividade legislativa não é do Poder Judiciário, de modo que não lhe cabe criar critério que substitua o previsto no § 3º do art. 20. Porém, parece razoável estabelecer presunção absoluta de miserabilidade quando a renda per capita familiar for inferior a metade do salario mínimo vigente, para que, em sendo superior, outras provas possam ser consideradas para averiguar a real necessidade de concessão do benefício.
O estudo social feito em 01.10.2016 (ID-89937310 – PAG. 138/148) informa que o autor reside com a mãe, Ângela Mara Chiareto, de 41 anos, e o pai, Nilson dos Santos, de 44, em “imóvel próprio (financiado), construção de alvenaria, coberta com telha romana, sem forro, fiação aparente, piso cimentado coberta por tinta (“verde”), paredes pintadas a cal, murada. Está dividida em: sala, cozinha, dois quartos, banheiro e uma área no fundo. Guarnecida por sofá de 2 e 3 lugares, estante com TV; fogão, geladeira, armário deteriorado, mesa com cadeira, camas e guarda roupas. Possui rede elétrica e água encanada”. Quanto à receita da família, advém do trabalho do pai, porém, relata que “trabalha por conta própria como serralheiro, contudo, neste cenário de crise que assola o pais, os clientes têm encontrado dificuldades para quitar os serviços realizados por ele. A família toda depende dessa renda. Na qualidade de chefe de família e mantenedor do lar, o Sr. Nilson, mencionou suas dificuldades e mostrou três chegues no valor de R$ 1.600,00 (um mil e seiscentos reais), que não tiveram fundo, colocando a família em uma condição ainda mais vulnerável”. As despesas são: necessidades básicas R$ 450,00; gás R$ 55,00; água R$ 35,02; prestação da casa R$ 108,15; energia R$ 181,88; assistência mortuária R$ 25,00; IPTU R$ 206,70 (anual).
Complementado em 09.04.2018, o estudo social relata que o autor reside com os pais e o irmão, Cristian dos Santos, de 10 anos, no mesmo imóvel. As despesas são: alimentação R$ 500,00; energia R$ 188,24; água R$ 53,13; auxílio-funerário R$ 26,00; gás R$ 85,00; telefone R$ 50,00; farmácia R$ 250,00. A única renda da família advém do trabalho do pai do autor, como serralheiro, no valor de R$ 1.000,00 (mil reais) mensais.
O laudo médico-pericial feito em 04.01.2017 (ID-89937310 – PAG. 118/125) atesta que o autor é portador de esquizofrenia e episódios depressivos, problemas que o incapacitam de forma parcial e definitiva para o trabalho, sendo suscetível de reabilitação profissional. Em resposta aos quesitos, o perito relata que o autor é capaz de realizar a rotina diária, tais como, administrar o tempo para executar atividades e deveres ao longo do dia.
Dessa forma, a situação apontada pelo perito não se ajusta ao conceito de pessoa com deficiência previsto no art. 20, § 2º, I e II.
Por isso, o autor não preenche todos os requisitos necessários para a obtenção do benefício.
ANULO
, de ofício, a sentença citra petita, JULGO PREJUDICADA a apelação e, nos termos do art. 1.013, §3º, I, do CPC, JULGO EXTINTO SEM APRECIAÇÃO DO MÉRITO O PEDIDO DE CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ/AUXÍLIO-DOENÇA. JULGO IMPROCEDENTE O PEDIDO DE CONCESSÃO DO BENEFÍCIO ASSISTENCIAL.Condeno o autor ao pagamento de honorários advocatícios de R$ 1.000,00 (mil reais), na forma do art. 85, §8º, do CPC/2015, observados os §§ 2º e 3º do art. 98 do mesmo diploma legal.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDÊNCIA SOCIAL. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ OU DE BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. APELAÇÃO DO (A) AUTOR(A). JULGAMENTO CITRA PETITA CARACTERIZADO. SENTENÇA ANULADA. APLICAÇÃO DO ART. 1.013, § 3º, II, DO CPC/2015. CAUSA MADURA. PEDIDO DE CONCESSÃO DE BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE EXTINTO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO. AUSÊNCIA DE REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO PREJUDICADA. BENEFÍCIO INDEVIDO.
I - A sentença deixou de analisar o pedido de aposentadoria por invalidez, daí exsurgindo a natureza citra petita da decisão recorrida.
II - Em homenagem ao princípio da economia processual, ações cujas decisões logravam anulação em segundo grau, agora, ultrapassado o vício processual, terão apreciado seu mérito. Superado o obstáculo formal, deve-se adentrar ao mérito da causa já madura, procedendo ao julgamento dos pedidos efetivamente formulados. Apresentação de defesa pela autarquia e produzidas as provas necessárias. Análise do pedido, nos termos do art. 1.013, § 3º, II, do CPC/2015.
III – O Supremo Tribunal Federal, no RE n. 567.985, reconheceu a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art.20, §3º, da Lei nº 8.742/93, e do art. 34, par. único, da Lei nº 10.741/2003.
IV – O laudo médico-pericial feito em 04.01.2017 (ID-89937310 – PAG. 118/125) atesta que o autor é portador de esquizofrenia e episódios depressivos, problemas que o incapacitam de forma parcial e definitiva para o trabalho, sendo suscetível de reabilitação profissional. E resposta aos quesitos, o perito relata que o autor é capaz de realizar a rotina diária, tais como, administrar o tempo para executar atividades e deveres ao longo do dia.
V - A situação apontada pelo perito não se ajusta ao conceito de pessoa com deficiência previsto no art. 20, § 2º, I e II.
VI - Honorários advocatícios fixados nos termos do § 8º do art. 85 do CPC/2015, observados os §§ 2º e 3º do art. 98 do mesmo diploma legal.
VII - Sentença anulada, de ofício. Julgamento nos termos do art. 1.013, § 3°, II, do CPC/2015. Apelação prejudicada. Pedido de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez extinto sem julgamento do mérito. Pedido de benefício assistencial improcedente.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por unanimidade, decidiu anular, de ofício, a sentença citra petita, julgar prejudicada a apelação e, nos termos do art. 1.013, § 3º, I, julgar extinto sem apreciação do mérito o pedido de concessão de aposentadoria por invalidez/auxílio-doença. Julgar improcedente o pedido de concessão do benefício assistencial, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
