Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0002852-08.2020.4.03.6327
Relator(a)
Juiz Federal CIRO BRANDANI FONSECA
Órgão Julgador
6ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
19/11/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 01/12/2021
Ementa
EMENTA
PROCEDIMENTO COMUM DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS – SENTENÇA
DEVIDAMENTE FUNDAMENTADA OBSERVADAS AS PECULIARIDADES DO CASO
CONCRETO - SENTENÇA MANTIDA PELOS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
6ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0002852-08.2020.4.03.6327
RELATOR:16º Juiz Federal da 6ª TR SP
RECORRENTE: ANTONIO MARQUES DA SILVA NICOLA
Advogado do(a) RECORRENTE: PRYSCILA PORELLI FIGUEIREDO MARTINS - SP226619-N
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0002852-08.2020.4.03.6327
RELATOR:16º Juiz Federal da 6ª TR SP
RECORRENTE: ANTONIO MARQUES DA SILVA NICOLA
Advogado do(a) RECORRENTE: PRYSCILA PORELLI FIGUEIREDO MARTINS - SP226619-N
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de recurso interposto pela parte autora, em face de sentença que decidiu a lide nos
seguintes termos:
“ANTONIO MARQUES DA SILVA NICOLA ajuizou ação pelo procedimento comum em face do
INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL, postulando a concessão do benefício de
prestação continuada de assistência social à pessoa com deficiência (LOAS). A inicial veio
acompanhada de documentos.
O INSS apresentou contestação e pugnou pela improcedência da ação.
Anexados Estudo socioeconômico e laudo médico pericial.
Parecer do Ministério Público Federal opinando pela improcedência da ação.
É A SÍNTESE DO NECESSÁRIO. DECIDO.
Nos termos do art. 355, inciso I do Código de Processo Civil, o julgamento antecipado da lide é
possível, porquanto a questão de mérito, sendo de direito e de fato, depende unicamente de
provas pericial e documental, suficientemente acostadas aos autos.
Estão presentes as condições da ação, bem como os pressupostos processuais de constituição
e desenvolvimento válido e regular do processo.
Não foram argüidas preliminares. Passo, assim, ao exame do mérito.
O benefício assistencial está disciplinado na Constituição Federal nos seguintes termos:
"Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente da
contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:
(...)
V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao
idoso que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida
por sua família, conforme dispuser a lei".
A norma descrita foi regulamentada pelo art. 20 da Lei nº 8.742/93, combinado com o art. 34 da
Lei nº 10.741/93 (Estatuto do Idoso). Dessa forma, o benefício assistencial é devido à pessoa
portadora de deficiência e ao idoso com 65 anos e que comprovem não possuir meios de prover
a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.
Pessoa portadora de deficiência é aquela impedida de participar da sociedade em igualdade de
condições com as demais pessoas em virtude de anomalias físicas, mentais ou sensoriais, ou
de lesões irreversíveis de longa duração, isto é, que produza efeitos pelo prazo mínimo de 2
anos (§10). É o que dispõe o art. 20, §2º, da Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº
13.146/2015, "in verbis":
"§2º Para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com
deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual
ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação
plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas."
No que tange à hipossuficiência, o art. 20, §3º, da Lei nº 8.742/93, exige que a renda familiar
"per capita" seja inferior a 1/4 do salário mínimo. Contudo, no julgamento do RE nº 567985/ MT,
realizado em 18/04/2013, o Col. Supremo Tribunal Federal declarou "incidenter tantum" a
inconstitucionalidade do referido dispositivo legal.
Em que pese tal julgamento ter sido proferido em sede de controle difuso de
constitucionalidade, observa-se que as decisões como tais tendem a ser adotadas por todos os
tribunais, de modo que se afigura inútil tecer considerações adicionais.
Destarte, com o afastamento do limite anteriormente gizado pelo legislador, cumpre ao julgador
preencher essa lacuna a fim de encontrar o parâmetro adequado para nortear a concessão do
benefício reclamado consoante expressa o art. 140 do CPC/2015. É o art. 4º do Decreto-Lei nº
4.657/42 (Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro) que impõe o recurso à analogia,
aos costumes e aos princípios gerais de direito.
Nesta toada, a Lei nº 10.836/2004, que criou o Programa Bolsa Família, consistente na
transferência direta de renda para famílias em situação de pobreza e extrema pobreza, assim
consideradas aquelas que possuam renda "per capita" de até R$ 120,00 (art. 2º, §3º),
aumentada para R$ 140,00 por força do art. 18 do Decreto nº 5.209/2009.
Noutro giro, registre-se que já se admitia que o estado de miserabilidade fosse aferido
considerando outras circunstâncias do caso. Neste sentido, o Col. Superior Tribunal de Justiça
decidiu (grifei):
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. VIOLAÇÃO AO ART. 6º DA LICC. AUSÊNCIA DE
PREQUESTIONAMENTO. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ASSISTÊNCIA
SOCIAL. PREVISÃO CONSTITUCIONAL. ART. 20, § 3º, DA LEI Nº 8.742/93. ANÁLISE DO
CRITÉRIO UTILIZADO PELO TRIBUNAL DE ORIGEM PARA AFERIR A RENDA MENSAL
PER CAPITA DA PARTE. IMPOSSIBILIDADE DE REAPRECIAÇÃO POR ESTA CORTE.
INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7/STJ. NÃO-CARACTERIZAÇÃO DA DIVERGÊNCIA. RECURSO
ESPECIAL IMPROVIDO. 1. Impossibilidade de análise da violação ao art. 6º da LICC, tendo em
vista a ausência do indispensável prequestionamento. Aplicação, por analogia, das Súmulas
282 e 356 do STF. 2. O benefício de prestação continuada é uma garantia constitucional, de
caráter assistencial, previsto no art. 203, inciso V, da Constituição Federal, e regulamentado
pelo art. 20 da Lei nº 8.742/93, que consiste no pagamento de um salário mínimo mensal aos
portadores de deficiência ou idosos que comprovem não possuir meios de prover a própria
manutenção e nem de tê-la provida pelo núcleo familiar. 3. A Terceira Seção deste Superior
Tribunal consolidou o entendimento de que o critério de aferição da renda mensal deve ser tido
como um limite mínimo, um quantum considerado insatisfatório à subsistência da pessoa
portadora de deficiência ou idosa, não impedindo, contudo, que o julgador faça uso de outros
elementos probatórios, desde que aptos a comprovar a condição de miserabilidade da parte e
de sua família. 4. Infere-se dos autos que o Tribunal de origem reconheceu que a autora não
preenche um dos requisitos legais para o deferimento do pleito, qual seja, o seu estado de
miserabilidade. 5. A reapreciação do contexto fático-probatório em que se baseou o Tribunal de
origem para deferir o benefício pleiteado, em sede de recurso especial, esbarra no óbice da
Súmula 7/STJ. 6. Quanto à alínea "c", o recurso também não merece acolhida, porquanto a
recorrente deixou de atender os requisitos previstos nos arts. 541 do CPC e 255 do RISTJ. 7.
Recurso especial a que se nega provimento" (REsp nº 868.600/SP - 6ª Turma - Rel. Min. Maria
Thereza de Assis Moura Publicado em 26/03/07).
Quanto ao grupo familiar, na redação original da Lei nº 8.742/93, ele era formado pelas pessoas
indicadas no art. 16 da Lei nº 8.213/91 que viviam sob o mesmo teto. Com o advento da Lei nº
12.435/11, a família é integrada pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na
ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados
solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.
Impende destacar que o benefício em questão não é, de modo algum, instrumento para afastar
o dever legal de prestar alimentos de modo a “socializar” os gastos da família com seus idosos
e dependentes portadores de deficiência física. Não tem por finalidade complementar a renda
familiar ou proporcionar maior conforto à parte interessada, mas amparar a pessoa deficiente ou
idosa em efetivo estado de miserabilidade.
Feitas tais considerações, passo a apreciar o caso concreto.
A parte autora foi submetida à perícia médica no dia 08/10/2020, na qual foi constatado que
apresenta Retardo Mental Grave, incapaz para os atos de vida civil.
Precisa de cuidados na atividades de vida diária
No presente caso, no que concerne ao requisito subjetivo, o laudo médico pericial atesta que a
parte autora comprovou impedimento para a vida em sociedade (evento 20).
Diante da conclusão da perícia médica, vê-se que o autor atende aos requisitos da Lei nº
8.742/93, sendo categorizado como pessoa portadora de deficiência.
Passo, então, à apreciação do requisito socioeconômico.
Do estudo social coligido aos autos (evento 28), extrai-se que o demandante reside com seus
genitores Daniel Nicola e Sebastiana da Silva Nicola, em imóvel próprio com 05 cômodos, 01
sala, 01 cozinha/despensa, 03 quartos, 01 banheiro social, área de serviço, corredores nas
laterais da casa, quintal e garagem.
"No mesmo terreno em que a família reside ficam localizadas mais 02 casas, o hidrômetro é o
mesmo para as 03 casas e o relógio medidor de energia elétrica é individualizado. Uma das
casas encontra-se vazia e em 01 das casas mora o irmão do autor, Sr. Carlos Alessandro da
Silva Nicola, a Sra. Sebastiana disse que a família cede a casa para seu filho morar".
Apesar das dificuldades naturais que os cuidados com o autor acarretaram à família,
especialmente à sua genitora, o valor da renda auferida (R$1.400,00) supera o valor das
dívidas (R$1.146,33) e as condições de moradia são dignas, obstaculizando, neste momento, a
caracterização da miserabilidade e o acesso ao benefício assistencial.
No caso em exame, restou demonstrado que o autor tem condições de ter provida a sua
manutenção pelos genitores, o que impede o deferimento do pedido formulado na inicial.
Ante o exposto, julgo improcedente o pedido e extingo o feito com resolução de mérito na forma
do art. 487, I, do Código de Processo Civil.
Sem condenação em custas e honorários.
Com o trânsito de julgado, remetam-se os autos ao arquivo com as cautelas e formalidades
legais.
Publicada e registrada no neste ato. Intime-se.”
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0002852-08.2020.4.03.6327
RELATOR:16º Juiz Federal da 6ª TR SP
RECORRENTE: ANTONIO MARQUES DA SILVA NICOLA
Advogado do(a) RECORRENTE: PRYSCILA PORELLI FIGUEIREDO MARTINS - SP226619-N
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
No caso, observo que a matéria ventilada em sede recursal foi devidamente analisada pelo
juízo de primeiro grau, cujas conclusões estão em consonância com os elementos constantes
dos autos.
Consoante destacado pela sentença, a renda familiar é suficiente para fazer frente aos gastos
mensais.
Com efeito, feita a análise do laudo socioeconômico, constata-se que a parte autora possui
condições minimamente dignas de sobrevivência, não estando o núcleo familiar em situação de
miserabilidade.
No relatório do laudo social consta que o autor reside em imóvel próprio com seus genitores, o
qual se encontra em boas condições de habitabilidade, e os móveis e eletrodomésticos que o
guarnecem encontram-se em bom estado de conservação.
Nesse ponto, conquanto evidentemente a parte autora seja pobre, o seu núcleo familiar não se
encontra em situação de miserabilidade, uma vez que possui condições razoáveis econômicas
e de habitação.
Ressalte-se, ademais, que, consoante o disposto no art. 203, V, da Constituição, depreende-se
que, para fins deste benefício, a responsabilidade do Estado é subsidiária, uma vez que deve
ser concedido somente àqueles que comprovem não possuir meios de prover à própria
manutenção ou de tê-la provida por sua família.
Assim, embora o pretendido benefício possa melhorar o padrão de vida da demandante e de
seu núcleo familiar, o sistema da assistência social foi concebido para auxiliar pessoas em
situações de miséria, e não para incremento de padrão de vida.
Portanto, não se encontra preenchido o requisito miserabilidade.
Assim, não merece nenhum reparo a sentença recorrida, que resta confirmada pelos próprios
fundamentos.
A esse respeito, ressalte-se que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal firmou
entendimento no sentido de que a adoção dos fundamentos contidos na sentença pela Turma
Recursal não contraria o art. 93, IX, da Constituição Federal, in verbis:
“EMENTA - AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. MATÉRIA
INFRACONSTITUCIONAL. OFENSA INDIRETA. JUIZADO ESPECIAL. REMISSÃO AOS
FUNDAMENTOS DA SENTENÇA. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. INOCORRÊNCIA.
1. Controvérsia decidida à luz de legislações infraconstitucionais. Ofensa indireta à Constituição
do Brasil.
2. O artigo 46 da Lei nº 9.099/95 faculta ao Colégio Recursal do Juizado Especial a remissão
aos fundamentos adotados na sentença, sem que isso implique afronta ao artigo 93, IX ,da
Constituição do Brasil.
Agravo Regimental a que se nega provimento.” (AI 726.283-7-AgR, Rel. Min. Eros Grau, 2ª
Turma, DJe nº 227, Publicação 28/11/2008).
No mesmo sentido, não há que se falar em ofensa ao art. 489, § 1º, do Código de Processo
Civil (Lei nº 13.105/2015), uma vez que sua aplicação é subsidiária no âmbito dos Juizados
Especiais.
Anote-se, a propósito, dispor o § 5º do art. 82 da Lei nº 9.099/95, que “se a sentença for
confirmada pelos próprios fundamentos, a súmula do julgamento servirá de acórdão”.
Ante o exposto, com fulcro no art. 46 da Lei nº 9.099/95, combinado com o art. 1º da Lei nº
10.259/2001, nego provimento ao recurso e mantenho a sentença recorrida por seus próprios
fundamentos.
Tendo em vista a existência de disposição específica na Lei nº 9.099/95, não se aplicam
subsidiariamente as disposições contidas no art. 85 da Lei nº 13.105/2015, razão pela qual
condeno a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios, que fixo em 10% (dez por
cento) do valor atribuído à causa, nos termos do art. 55 da Lei nº 9.099/95, com a ressalva de
que nas hipóteses em que foi concedido benefício de assistência judiciária gratuita, ou em que
tal pedido ainda não foi apreciado e deve ser deferido pela simples alegação da parte de que
não tem condições de pagar as custas do processo e os honorários de advogado, sem prejuízo
próprio ou de sua família, o pagamento dos valores mencionados ficará suspenso nos termos
do § 3º do art. 98 do Código de Processo Civil.
É como voto.
EMENTA
PROCEDIMENTO COMUM DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS – SENTENÇA
DEVIDAMENTE FUNDAMENTADA OBSERVADAS AS PECULIARIDADES DO CASO
CONCRETO - SENTENÇA MANTIDA PELOS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, Vistos, relatados e
discutidos estes autos eletrônicos, em que são partes as acima indicadas, decide a Sexta
Turma Recursal do Juizado Especial Federal da Terceira Região da Seção Judiciária de São
Paulo, por unanimidade, negar provimento ao recurso da parte autora, nos termos do relatório e
voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado, nos termos do relatório e voto que
ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
