
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000049-06.2023.4.03.6183
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: JOSE NILTON ALMEIDA DOS SANTOS
Advogado do(a) APELANTE: ROBERTA GUARINO VIEIRA - SP221755-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000049-06.2023.4.03.6183
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: JOSE NILTON ALMEIDA DOS SANTOS
Advogado do(a) APELANTE: ROBERTA GUARINO VIEIRA - SP221755-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
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R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação interposta pela parte autora em face da sentença que julgou improcedentes os pedidos de auxílio por incapacidade temporária ou auxílio-acidente, condenando-a ao pagamento de verba honorária, observada a gratuidade de justiça.
Nas razões recursais, alega o preenchimento de todos os requisitos necessários à obtenção dos benefícios e exora a reforma integral do julgado.
Sem contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000049-06.2023.4.03.6183
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: JOSE NILTON ALMEIDA DOS SANTOS
Advogado do(a) APELANTE: ROBERTA GUARINO VIEIRA - SP221755-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Conheço da apelação, em razão da satisfação de seus pressupostos de admissibilidade.
No caso, salta patente a ocorrência de coisa julgada, porquanto a parte autora movera outra ação idêntica, em 17/5/2019, na Juizado Especial Federal Cível de São Paulo (autos n. 0020347-80.2019.03.6301), julgada improcedente em 25/12/2019, sobrevindo o trânsito em julgado em 30/1/2020.
Na petição inicial daquela ação, o autor alegou ter sofrido "Acidente sendo atropelado em agosto de 2014, sendo acometido das seguintes patologias: TRAUMATISMO SUPERFICIAL DA PERNA (CID 10 S80), FRATURA PLATO TÍBIAL (CID 10 S82 / S82.1), SEQUELAS DE FRATURA DO FÊMUR (CID 10 T 93.1), não obtendo melhoras, restando totalmente incapacitado para o trabalho e com dificuldades de realizar atividades habituais" e requereu a concessão de benefício por incapacidade laboral desde a cessação do "auxílio-doença previdenciário n.º 608.537.932-7 o qual foi concedido até 25 de Abril de 2019, quando o autor levou alta médica".
Naqueles autos, a perícia médica judicial de 5/8/2019 constatou a incapacidade parcial e permanente do autor para a atividade habitual de pintor/eletricista, em razão de "histórico de atropelamento por automóvel em 30/08/2014, sofrendo fratura do planalto tibial perna esquerda".
A sentença julgou improcedente os pedidos de benefício por incapacidade laboral e de auxílio-acidente, nos seguintes termos:
"(...) 8. Em caso de incapacidade parcial, informar que tipo de atividade o periciando está apto a exercer, indicando quais as limitações do periciando. R. pode ser reabilitado para desempenhar atividade compatível com sua escolaridade que não necessitem grandes esforços com o membro inferior esquerdo, como por exemplo, atividades de portaria e atendimento."
O autor apresentou impugnação ao laudo pericial, sustentando sua incapacidade total e permanente (ev. 23). No entanto, a impugnação apresentada pela parte autora não merece qualquer agasalho, pois manifesta mera discordância ao laudo pericial, natural da inconformidade da parte com o resultado do exame, deixando de apresentar prova documental robusta o suficiente ou apontar quaisquer falhas ou lacunas que mereçam reforma. Por tal razão, não verifico a necessidade de nova perícia, na mesma ou em outra especialidade médica, ou razões para esclarecimentos periciais.
O perito médico é profissional totalmente isento e de confiança deste Juizado, que conta com sua experiência na lavratura de diagnósticos e análise de exames, não sendo de seu interesse ou deste Judiciário atestar falsamente para causar prejuízo à parte autora.
A incapacidade parcial e permanente enseja a concessão do benefício auxílio-acidente, previsto no artigo 86 da Lei 8.213/91.
A despeito do auxílio-acidente não ter sido explicitamente requerido na petição inicial, entendo que o pedido está implícito, na medida em que se trata de benefício decorrente de incapacidade em grau inferior à necessária à concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio- doença.
Pela mesma razão, dispensável o prévio requerimento administrativo de auxílio-acidente, tendo em vista que o autor requereu benefício por incapacidade (auxílio-doença), cabendo ao INSS conceder o benefício adequado em cada caso.
Uma vez que foi comprovada a incapacidade parcial e permanente do autor para o exercício de sua atividade habitual de pintor/eletricista, o benefício adequado é o auxílio-acidente.
Ressalto que não há controvérsia acerca do preenchimento do requisito concernente à manutenção da qualidade de segurado empregado na data de início da incapacidade, tendo em vista que o autor manteve vínculo de emprego com a empresa MP Santana Pintura em Geral, no período de 06/03/2014 a 17/04/2014, além do que foi beneficiário do auxílio-doença NB 608.537.932-7, de 13/11/2014 a 01/04/2019 (ev. 26).
A consolidação da lesão decorrente de acidente de qualquer natureza foi comprovada pela perícia judicial, que constatou a incapacidade parcial e permanente do autor em razão de sequela decorrente de acidente de trânsito ocorrido em 30/08/2014.
No entanto, o autor não faz jus à concessão do auxílio-acidente, tendo em vista sua recusa em participar do Programa de Reabilitação Profissional.
Ressalto que o referido auxílio-doença NB 608.537.932-7 foi cessado administrativamente, justamente em razão da recusa do autor à reabilitação profissional (fls. 18/20 do ev. 10).
(...) Assim, diante da recusa injustificada à reabilitação profissional, o auxílio-doença NB 608.537.932-7 foi licitamente cessado.
Pela mesma razão, não faz jus o autor à concessão do auxílio- acidente.
Diante do exposto, julgo improcedente o pedido, resolvendo o mérito, nos termos do artigo 487, I, do CPC.
Sem custas e honorários advocatícios, a teor do art. 1º da Leinº 10.259/01 c.c. o art. 55, caput da Lei nº 9.099/95.
Defiro a gratuidade da justiça.
Publicado e registrado neste ato.
Intime-se. Cumpra-se."
A Sexta Turma Recursal negou provimento à apelação do autor em 25/11/2019 e a ação transitou em julgado em 30/1/2020.
Nesta ação, ajuizada em 4/1/2023, também pretende a parte autora a concessão de auxílio-doença ou auxílio-acidente, alegando o mesmíssimo fato gerador como causa petendi da ação anterior - incapacidade laboral decorrente dos mesmos problemas de saúde (sequelas de atropelamento sofrido em 30/8/2014).
Vejamos:
" (...) O Autor foi vítima de atropelamento na data de 30/08/2014 o que ocasionou fratura de planalto tibial esquerdo, realizando cirurgia e acompanhamento com ortopedia, sendo que atualmente há evidente limitação de flexo-extensão crônica e permanente de membro inferior esquerdo (CID – S 82-1 e T 43-2).
Em 30/06/15 submeteu-se a retirada parcial de material de síntese em e evoluiu com limitação sequelar de amplitude articular do joelho, com dificuldades de permanecer em pé por muito tempo, o que reduz de modo patente a sua capacidade profissional.
Referido acidente gerou ao Autor e segurado da previdência social o afastamento de suas atividades do período compreendido entre 13/11/2014 a 01/04/2019 em gozo de auxílio-doença previdenciário, documentos anexos, sendo que os posteriores pedidos de restabelecimento / concessão foram indeferidos, decisão está mantida quando do julgamento do recurso a Junta da Previdência Social, decisão está com a qual não concorda o autos pelos diversos fundamentos a seguir alinhavados.
(...) Inobstante tenha postulado junto a Autarquia a manutenção/reativação do benefício teve o pedido indeferido conforme nos dão conta a documentação encartada, sendo que desde 17/04/2019 (pedido de reativação de benefício) busca a concessão / restabelecimento do benefício, sem êxito – NB n° 6278097641, relatórios encartados.
Diante de todo o acima narrado, é notório que o médico perito do INSS não poderia ter dado alta médica ao Autor, cessando o pagamento do auxílio-doença que lhe é devido, conforme preceituam os artigos 59 e 62, ambos da Lei 8.213/91.
(...) Diante de todo o exposto, o Postulante requer:
(...) e) Que seja, ao final, o Requerido condenado:
e.1) a implantar o benefício do auxílio-doença previdenciário;
e.2) sucessivamente, na remota hipótese de se constatar apenas a redução da capacidade laborativa do Requerente, a conceder o benefício de auxílio-acidente;
f) Que seja condenado o Requerido ao pagamento de todas as parcelas vencidas (desde a data da cessação indevida do benefício - 01/04/2019) e vincendas, inclusive abono anual, acrescidos de correção monetária e juros, observando em tudo os termos do julgamento do tema 862 pelo C. STJ;"
Destaca-se que a despeito de pedido de concessão de benefício por incapacidade aduzido na petição inicial daquela ação, em caso de acidente com geração de incapacidade parcial, em tese, pode ser concedido o auxílio-acidente, considerando-se um minus, não um extra, em relação ao pedido. Nesse diapasão: APELREE 1.171.256 Processo: 2007.03.99.003143-7 UF: SP Órgão Julgador: NONA TURMA Data do Julgamento:28/02/2011; AC 1.661.693 Processo: 0004191-11.2010.4.03.6114 UF: SP Órgão Julgador: DÉCIMA TURMA Data do Julgamento: 18/10/2011.
Nesse passo, a pretensão de concessão de auxílio-acidente já foi analisada na ação anterior, havendo, portanto, coisa julgada quanto à essa matéria, não obstante a parte alegar não ter formulado esse pedido.
Note-se, ainda, que a parte autora omitiu a propositura de ação pretérita e, ao narrar os fatos e fundamentos jurídicos do pedido na petição inicial desta ação e sequer alegou ter havido alteração da situação fática.
Ocorre que, como dito, as doenças apontadas nesta ação são as mesmas indicadas na anterior (sequelas de atropelamento sofrido em 30/8/2014) e a parte autora sequer formulou novo requerimento administrativo.
Não é possível que se repitam ações previdenciárias desta maneira, sob pena de gerar amesquinhamento da coisa julgada.
Segundo o disposto no artigo 337, §1º do Código de Processo Civil (CPC), "verifica-se a litispendência ou a coisa julgada quando se reproduz ação anteriormente ajuizada".
A doutrina também ensina:
"Dá-se a litispendência quando se repete ação idêntica a uma que se encontra em curso, isto é, quando a ação proposta tem as mesmas partes, a mesma causa de pedir (próxima e remota) e o mesmo pedido (mediato e imediato). A segunda ação tem de ser extinta sem conhecimento do mérito. V. coment. CPC 301." (Nelson Nery Jr, Rosa Maria Andrade Nery, Código de Processo Civil, São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, notas ao art. 267, p. 728).
Nesse sentido, colaciono os seguintes julgados:
"PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO. COISA JULGADA. ART. 267, V, DO CPC.
1. Verificada a existência de omissão, esta deve ser sanada.
2. A ratio essendi da litispendência obsta a que a parte promova duas ações visando o mesmo resultado o que, em regra, ocorre quando o autor formula, em face do mesmo sujeito processual idêntico pedido fundado na mesma causa petendi (REsp 610.520/PB, Rel. Min. Luiz Fux, DJU de 02.8.04).
3. A ocorrência de coisa julgada pode ser conhecida de ofício a qualquer tempo e grau de jurisdição, mesmo que não tenha sido provocada pelas partes.
4. Embargos de declaração acolhidos com efeitos modificativos." (STJ, EDREsp n. 597414, processo n. 200301804746/SC, Segunda Turma, Rel. Min. Castro Meira, data da decisão 13/12/2005, DJ 6/2/2006, p. 242)
"EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. PROCESSUAL CIVIL. LITISPENDÊNCIA. MANDADO DE SEGURANÇA VERSANDO O MESMO PEDIDO DE AÇÃO ORDINÁRIA. TRÂNSITO EM JULGADO DA SENTENÇA. COISA JULGADA.
1. A forma de realização do direito pretendido definir pertine à execução do julgado, por isso não constitui nem pedido nem causa de pedir. In casu, a forma de compensação da exação que se pretende afastar, pressupõe a declaração desse direito à conjuração do tributo cujo pedido foi formulado, anteriormente, em outro Mandado de Segurança.
2. Mandado de segurança onde se repete o pedido de compensação de contribuição previdenciária incidente sobre a remuneração de autônomos e administradores já deduzido anteriormente em juízo, acrescendo-se apenas que a compensação se faça também com valores retidos dos empregados por ocasião do pagamento dos salários; com correção monetária (expurgos inflacionários) juros moratórios e compensatórios; sem as limitações percentuais previstas nas Lei nº 9.032/95 e 9.129/95 e sem a comparação do não repasse do ônus tributário correspondente a terceiros; adendos que não afastam dessa nova impetração a pecha da litispendência detectada pelo juízo de origem.
3. A "ratio essendi" da litispendência obsta a que a parte promova duas ações visando o mesmo resultado o que, em regra, ocorre quando o autor formula, em face do mesmo sujeito processual idêntico pedido fundado na mesma causa petendi.
4. Deveras, um dos meios de defesa da coisa julgada é a eficácia preclusiva prevista no art. 474, do CPC, de sorte que, ainda que outro o rótulo da ação, veda-se-lhe o prosseguimento ao pálio da coisa julgada , se ela visa infirmar o resultado a que se alcançou na ação anterior.
5. Consectariamente, por força desses princípios depreendidos das normas e da ratio essendi das mesmas é possível afirmar-se que há litispendência quando duas ou mais ações conduzem ao "mesmo resultado"; por isso: electa una via altera non datur.
6. Inocorrentes as hipóteses de omissão, contradição, obscuridade ou erro material, não há como prosperar o inconformismo, cujo real objetivo é a pretensão de reformar o decisum no que pertine ao mérito da questão, o que é inviável de ser revisado em sede de embargos de declaração, dentro dos estreitos limites previstos no artigo 535 do CPC.
7. Embargos de declaração rejeitados." (STJ, EDRESP nº 610520, processo nº 200302082475/PB, Primeira Turma, Rel. Min. Luiz Fux, data da decisão 05/10/2004, DJ 25/10/2004, p. 238)
Assim, esta ação não pode prosseguir diante da ocorrência de coisa julgada, devendo, por isso, ser extinta, sem resolução de mérito.
Cabe ressaltar que, a teor do §3º do artigo 485, inciso V, do Código de Processo Civil (CPC), a ocorrência de coisa julgada pode ser conhecida de ofício a qualquer tempo e grau de jurisdição, mesmo que não tenha sido provocada pelas partes.
Fica a parte autora condenada a pagar honorários de advogado, arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, conforme critérios do artigo 85 do CPC, suspensa, porém, a exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do mesmo diploma processual, por tratar-se de beneficiária da justiça gratuita.
Diante do exposto, reconheço, de ofício, a ocorrência de coisa julgada e extingo o processo, sem resolução do mérito, nos termos do artigo 485, inciso V e §3º, do CPC. Em decorrência, julgo prejudicada a apelação.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. AÇÃO ANTERIOR TRANSITADA EM JULGADO. OCORRÊNCIA DE COISA JULGADA. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. HONORÁRIOS DE ADVOGADO.
- A teor do artigo 337, §1º do Código de Processo Civil (CPC), "verifica-se a litispendência ou a coisa julgada quando se reproduz ação anteriormente ajuizada".
- Repetida ação idêntica a uma outra com trânsito em julgado, a segunda ação tem que ser extinta sem o julgamento do mérito, a fim de evitar o advento de sentenças conflitantes e o congestionamento da Justiça.
- À luz do §3º do artigo 485, inciso V, do CPC, a ocorrência de coisa julgada pode ser conhecida de ofício a qualquer tempo e grau de jurisdição, mesmo que não tenha sido provocada pelas partes.
- Extinção do processo sem resolução do mérito.
- Condenação da parte autora condenada ao pagamento de honorários de advogado, arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, conforme critérios do artigo 85 do CPC, suspensa, porém, a exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do mesmo diploma processual, por tratar-se de beneficiária da justiça gratuita.
- Apelação prejudicada.
