
3ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5065196-74.2023.4.03.9999
RELATOR: Gab. 10 - DES. FED. CONSUELO YOSHIDA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARCELO LUIZ SENSULINI
Advogado do(a) APELADO: LUCIANA ALVES MOREIRA SIQUEIRA - SP223461-N
OUTROS PARTICIPANTES:
3ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5065196-74.2023.4.03.9999
RELATOR: Gab. 10 - DES. FED. CONSUELO YOSHIDA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARCELO LUIZ SENSULINI
Advogado do(a) APELADO: LUCIANA ALVES MOREIRA SIQUEIRA - SP223461-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação interposta pelo Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, contra sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos deduzidos em ação reparatória, ajuizada por MARCELO LUIZ SENSULINI, objetivando a implantação de benefício previdenciário e o recebimento de indenização por danos morais, em razão da mora na apreciação de processo administrativo.
A r. sentença recorrida foi proferida nos seguintes termos:
DIANTE DO EXPOSTO, com fundamento no art. 487, I, do CPC, TORNODEFINITIVA a tutela antecipada concedida initio litis às fls. 143-147 e, JULGOPARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados por MARCELO LUIS SENSULINI em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL INSS para:
1. DETERMINAR que a autarquia promova o encerramento definitivo do processo administrativo e implante o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição [NB 1873922016], concedido ao autor na esfera administrativa, desde a data do requerimento administrativo (21/04/2019 fl. 120); 2. CONDENAR o requerido ao pagamento ao autor o valor de R$ 6.000,00 (seis mil reais) a título de danos morais, o qual deverá ser corrigido pelo IPCA-E a contar desta data [súmula 362 do STJ] e juros moratórios de 1% ao mês a partir da citação; 3. CONDENAR o réu a pagar as prestações atrasadas, a contar da DER [21/04/2019], com juros e correção monetária calculados de acordo como Manual de Cálculos da Justiça Federal, atualmente com as alterações promovidas pela Resolução n° 658/2020 CJF, de 10 de agosto de 2020, observando-se que desde a promulgação da Emenda Constitucional n° 113, de 08 de dezembro de 2021, a apuração do débito se dará unicamente pela taxa SELIC, mensalmente e de forma simples, nos termos do disposto em seu artigo 3º, ficando vedada a incidência da taxa SELIC cumulada com juros e correção monetária.
Em razão da sucumbência, CONDENO o requerido ao pagamento dos honorários advocatícios do procurador do autor, os quais fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, observando-se a súmula 111 do STJ, levando em consideração a natureza da causa, bem como o tempo e o trabalho despendidos, em conformidade com o art. 85, § 2º, do Código de Processo Civil.
Em suas razões recursais, a autarquia previdenciária aduz que não poderia implantar o benefício sem verificação diante da informação do óbito do beneficiário. No mais, alega não estar caracterizada a responsabilidade civil do Estado, por inexistência de ato ilícito e falta de comprovação do dano. Subsidiariamente, requer a redução do valor da condenação em danos morais.
Com contrarrazões, os autos vieram a esta E. Corte.
É o relatório.
3ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5065196-74.2023.4.03.9999
RELATOR: Gab. 10 - DES. FED. CONSUELO YOSHIDA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARCELO LUIZ SENSULINI
Advogado do(a) APELADO: LUCIANA ALVES MOREIRA SIQUEIRA - SP223461-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Inicialmente, deixo de conhecer a apelação na parte em que se alega que a mora administrativa decorreu da necessidade de verificação de óbito do beneficiário.
As razões da insurgência encontram-se divorciadas do decisório hostilizado, ressaindo evidente a ausência de pressuposto de admissibilidade recursal, não comportando conhecimento da apelação neste capítulo recursal.
Confira-se o entendimento do C. Superior Tribunal de Justiça:
PROCESSUAL CIVIL. RAZÕES DA APELAÇÃO DISSOCIADAS DA SENTENÇA. ART. 514, INCISO II, CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. 1. No presente caso, o recorrente, ao apresentar sua apelação, limitou-se a defender o mérito da ação, qual seja, seu direito à indenização pelas benfeitorias efetuadas no imóvel, não impugnando, em qualquer momento, o fundamento da sentença apelada que extinguiu o feito, em razão da ocorrência de coisa julgada, fundamento suficiente a manter a decisão do juízo a quo. 2. A jurisprudência desta Corte Superior é no sentido de que as razões de apelação dissociadas do que decidido pela sentença equiparam-se à ausência de fundamentos de fato e de direito, exigidos pelo art. 514, II, do CPC, como requisitos de regularidade formal da apelação. 3. Agravo regimental não provido". (STJ, AgRg no REsp 1381583, Relator Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, j. 05/09/2013, DJE 11/09/2013)
No mais, a questão posta nos autos e devolvida à esta Corte diz respeito à responsabilidade civil do Estado.
A responsabilidade civil tem cláusula geral nos art. 186 e 927 do Código Civil, e apresenta, como seus pressupostos, a ação ou omissão do agente, a culpa em sentido amplo, o nexo de causalidade e o dano, do qual surge o dever de indenizar.
Por sua vez, a responsabilidade civil do Estado é, em regra, objetiva, isto é, fundamenta-se no risco e prescinde da comprovação de culpa do agente, bastando que se demonstre o nexo causal entre a conduta do administrador e o dano. Está consagrada no art. 37, § 6º, da Constituição Federal, sob a seguinte redação:
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
§ 6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.
O trecho extraído do voto do Ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal, no recurso extraordinário nº. 109.615, ilustra com clareza a norma do referido artigo:
A teoria do risco administrativo, consagrada em sucessivos documentos constitucionais brasileiros desde a Carta Política de 1946, confere fundamento doutrinário à responsabilidade civil objetiva do Poder Público pelos danos a que os agentes públicos houverem dado causa, por ação ou por omissão. Essa concepção teórica, que informa o princípio constitucional da responsabilidade civil objetiva do Poder Público, faz emergir, da mera ocorrência de ato lesivo causado à vítima pelo Estado, o dever de indenizá-la pelo dano pessoal e/ou patrimonial sofrido, independentemente de caracterização de culpa dos agentes estatais ou de demonstração de falta do serviço público. Os elementos que compõem a estrutura e delineiam o perfil da responsabilidade civil objetiva do Poder Público compreendem (a) a alteridade do dano, (b) a causalidade material entre o eventus damni e o comportamento positivo (ação) ou negativo (omissão) do agente público, (c) a oficialidade da atividade causal e lesiva, imputável a agente do Poder Público, que tenha, nessa condição funcional, incidido em conduta comissiva ou omissiva, independentemente da licitude, ou não, do comportamento funcional (RTJ 140/636) e (d) a ausência de causa excludente da responsabilidade estatal. (RE 109615, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Primeira Turma, julgado em 28/05/1996, DJ 02-08-1996 PP-25785 EMENT VOL-01835-01 PP-00081)
No caso dos autos, é certa a aplicação da responsabilidade civil em sua vertente objetiva, tendo em vista que as alegações da parte autora narram a ocorrência de conduta comissiva, consistente na demora em implantação de benefício previdenciário, com interposição intempestiva de diversos recursos administrativos, fato reconhecido até mesmo pelo Conselho de Recursos da Seguridade Social.
Não há dúvidas acerca do ato ilícito, visto que o apelado requereu a concessão de seu benefício previdenciário em 06/02/2020 e até o momento, mesmo após diversas decisões administrativas favoráveis, não obteve a implantação de sua aposentadoria. Ainda, há evidente liame causal que o vincula ao evento danoso, isto é, a injusta privação da verba alimentar.
Posto isto, plenamente identificados os elementos da responsabilidade civil, passa-se à análise e quantificação do dano moral.
A simples privação de verba de caráter alimentar, devida em favor de pessoa hipossuficiente, configura situação típica de dano moral in re ipsa, nos quais a mera comprovação fática do acontecimento gera uma violação presumida, capaz de ensejar indenização. É desnecessária, portanto, a prova específica do abalo psicológico suportado.
Observam-se os precedentes desta E. Corte:
ADMINISTRATIVO. DEMORA INJUSTIFICADA NO CUMPRIMENTO DE DECISÃO JUDICIAL. INSS. IMPLANTAÇÃO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. DANO MORAL. CABIMENTO. INVERSÃO DO ÔNUS DE SUCUMBÊNCIA. APELAÇÃO PROVIDA.
1. Trata-se de pedido de indenização por danos morais, em razão da demora no cumprimento de determinação judicial relativa à implantação de benefício assistencial.
2. O Poder Público possui responsabilidade objetiva fundamentada pela teoria do risco administrativo, com o consequente enquadramento dos atos lesivos praticados por seus agentes no artigo 37, § 6º da Constituição Federal, bastando a comprovação da conduta lesiva, do resultado danoso e do nexo de causalidade, os quais estão presentes na hipótese dos autos.
3. No caso em apreço, a autarquia previdenciária não procedeu com a eficiência que se espera de um órgão público, privando a autora, por tempo considerável, de uma verba de natureza alimentar que já lhe havia sido assegurada judicialmente.
4. No tocante à fixação do montante a título de indenização por danos morais, algumas diretrizes hão de ser observadas, tais como a proporcionalidade à ofensa, a condição social e a viabilidade econômica do ofensor e do ofendido. Deve-se ter em conta, ademais, que a indenização não pode acarretar enriquecimento ilícito, nem representar valor irrisório.
5. Neste ponto da análise, a conclusão possível é a de que, atento às circunstâncias fáticas do caso concreto, é adequado fixar a indenização em R$ 10.000,00 (dez mil reais), acrescida de juros de mora e correção monetária.
6. Inversão do ônus sucumbencial.
7. Apelação provida.
(TRF 3ª Região, 3ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5197698-79.2020.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal NELTON AGNALDO MORAES DOS SANTOS, julgado em 23/04/2021, DJEN DATA: 29/04/2021)
DIREITO ADMINISTRATIVO. DEMORA EXCESSIVA NA IMPLANTAÇÃO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. DESCUMPRIMENTO DE ORDEM JUDICIAL. DANO MORAL CONFIGURADO. APELO IMPROVIDO.
(...)
02. No presente feito, o INSS objetiva a reforma da sentença para que seja afastada a indenização por danos morais, ao fundamento de que não deu causa à demora na implantação do benefício previdenciário, eis que, nos autos onde foi determinada a implantação do benefício (Processo nº 101/2009) a partir da citação, alega que, além de não ter sido citado naquela demanda, não possuía os parâmetros necessários para o cumprimento da ordem judicial.
(...)
06. Em análise ao presente caso, restou evidenciado o alegado dano moral, ante a excessiva demora da autarquia ré em implantar o benefício de aposentadoria por idade rural, o que acarretou a privação do recebimento da benesse, concedida desde 07/05/2009. Além disso, a referida vantagem possui natureza jurídica de verba alimentar, sendo suficiente para se concluir que a inercia prolongada da autarquia acarreta prejuízos de ordem moral à segurada.
07. Apelo improvido. Sentença mantida.
(TRF 3ª Região, 3ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 0002202-06.2010.4.03.6102, Rel. Desembargador Federal NERY DA COSTA JUNIOR, julgado em 09/09/2020, Intimação via sistema DATA: 11/09/2020)
Acerca da fixação do quantum indenizatório, seu arbitramento deve obedecer a critérios de razoabilidade e proporcionalidade, observando ainda a condição social e viabilidade econômica do ofensor e do ofendido, e a proporcionalidade à ofensa, conforme o grau de culpa e gravidade do dano, sem, contudo, incorrer em enriquecimento ilícito.
Nesse sentido é certo que na fixação da indenização por danos morais, recomendável que o arbitramento seja feito caso a caso e com moderação, proporcionalmente ao grau de culpa, ao nível socioeconômico do autor, e, ainda, ao porte da empresa, orientando-se o juiz pelos critérios sugeridos pela doutrina e jurisprudência, com razoabilidade, valendo-se de sua experiência e bom senso, atento à realidade da vida e às peculiaridades de cada caso, de modo que, de um lado, não haja enriquecimento sem causa de quem recebe a indenização e, de outro, haja efetiva compensação pelos danos morais experimentados por aquele que fora lesado. (REsp 1374284/MG, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 27/08/2014, DJe 05/09/2014)
A quantia estabelecida em primeira instância, de R$ 6.000,00, satisfaz as funções reparatória e punitiva que recaem sobre a indenização por danos morais, atende aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade e é condizendo com o costumeiramente arbitrado pela jurisprudência. Inexiste motivação idônea à sua redução.
Em face do exposto, nego provimento à apelação.
É como voto.
E M E N T A
PROCESSO CIVIL. ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS. MORA NA IMPLANTAÇÃO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. INJUSTA PRIVAÇÃO DE VERBA ALIMENTAR. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. CABIMENTO.
1. A responsabilidade civil tem cláusula geral nos art. 186 e 927 do Código Civil, e apresenta, como seus pressupostos, a ação ou omissão do agente, a culpa em sentido amplo, o nexo de causalidade e o dano, do qual surge o dever de indenizar.
2. Por sua vez, a responsabilidade civil do Estado é, em regra, objetiva, isto é, fundamenta-se no risco e prescinde da comprovação de culpa do agente, bastando que se demonstre o nexo causal entre a conduta do administrador e o dano. Está consagrada no art. 37, § 6º, da Constituição Federal.
3. No caso dos autos, é certa a aplicação da responsabilidade civil em sua vertente objetiva, tendo em vista que as alegações da parte autora narram a ocorrência de conduta comissiva, consistente na demora em implantação de benefício previdenciário, com interposição intempestiva de diversos recursos administrativos, fato reconhecido até mesmo pelo Conselho de Recursos da Seguridade Social.
4. Não há dúvidas acerca do ato ilícito, visto que o apelado requereu a concessão de seu benefício previdenciário em 06/02/2020 e até o momento, mesmo após diversas decisões administrativas favoráveis, não obteve a implantação de sua aposentadoria. Ainda, há evidente liame causal que o vincula ao evento danoso, isto é, a injusta privação da verba alimentar.
5. Posto isto, plenamente identificados os elementos da responsabilidade civil, passa-se à análise e quantificação do dano moral.
6. A simples privação de verba de caráter alimentar, devida em favor de pessoa hipossuficiente, configura situação típica de dano moral in re ipsa, nos quais a mera comprovação fática do acontecimento gera uma violação presumida, capaz de ensejar indenização. É desnecessária, portanto, a prova específica do abalo psicológico suportado.
7. Acerca da fixação do quantum indenizatório, seu arbitramento deve obedecer a critérios de razoabilidade e proporcionalidade, observando ainda a condição social e viabilidade econômica do ofensor e do ofendido, e a proporcionalidade à ofensa, conforme o grau de culpa e gravidade do dano, sem, contudo, incorrer em enriquecimento ilícito.
8. Nesse sentido é certo que na fixação da indenização por danos morais, recomendável que o arbitramento seja feito caso a caso e com moderação, proporcionalmente ao grau de culpa, ao nível socioeconômico do autor, e, ainda, ao porte da empresa, orientando-se o juiz pelos critérios sugeridos pela doutrina e jurisprudência, com razoabilidade, valendo-se de sua experiência e bom senso, atento à realidade da vida e às peculiaridades de cada caso, de modo que, de um lado, não haja enriquecimento sem causa de quem recebe a indenização e, de outro, haja efetiva compensação pelos danos morais experimentados por aquele que fora lesado. (REsp 1374284/MG, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 27/08/2014, DJe 05/09/2014)
9. A quantia estabelecida em primeira instância, de R$ 6.000,00, satisfaz as funções reparatória e punitiva que recaem sobre a indenização por danos morais, atende aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade e é condizendo com o costumeiramente arbitrado pela jurisprudência. Inexiste motivação idônea à sua redução.
10. Apelação improvida.
